Capitulo 9: A ultima rajada no deserto
Em meio à destruição, Jasper permanecia pensativo. Seus instintos primitivos imploravam para que abandonasse aqueles novos conhecidos e fugisse para salvar a própria vida.
Mas, ao se lembrar da gentileza de Kaern e da ajuda, mesmo que ranzinza, do Caçador de Ossos, tomou sua decisão.
Eu sempre convivi com a morte e tive medo… não quero me arriscar, mas sinto que, se não conseguir superar esse desespero, nunca vou alcançar a vida melhor que tanto almejo.
Calculando mentalmente a distância e o impulso necessário, Jasper saltou do penhasco sem hesitar. Ignorando o medo que o paralisava, arriscou tudo do pouco que tinha, confiando em suas habilidades ocultas para alcançar o Caçador de Ossos.
Durante o breve instante no ar, teve certeza de que falharia, mas sua percepção especial estava mais aguçada do que nunca. Os quinze metros ao redor, onde conseguia captar até a menor alteração, pareciam diferentes.
Ele sentia as correntes de vento movendo-se sutilmente, quase coordenadas, como se o próprio ar conspirasse para sustentá-lo. E Jasper entendia o motivo daquilo.
A asa… Pelo visto, foi uma boa escolha não ter devorado aquele abutre.
Pela primeira vez, manipulava conscientemente seu “sentido do vento”. Com a ajuda da asa do abutre, conseguia permanecer num breve estado de voo, uma sensação de liberdade nostálgica percorreu sua mente.
Se pudesse, viveria naquele estado para sempre, solto pelos céus.
A realidade o puxou de volta — começou a despencar. A ausência de uma segunda asa causava desequilíbrio, reduzindo sua sustentação.
— Droga, droga, droga — repetiu, buscando desesperadamente uma solução.
Lá embaixo, o mundo parecia prestes a se despedaçar. O solo do deserto estava tomado por crateras fumegantes, colunas de poeira subiam aos céus como torres cinzentas, e as sombras dos abutres riscavam as dunas deformadas pelo calor e pelas explosões.
No centro do caos, Jasper avistou seu alvo: o ciclope ósseo, lutando contra Bestiais com prazer visível, refletido no pulsar das placas sobre o corpo.
O problema era que Jasper estava prestes a colidir com ele — um projétil humano em queda livre.
Sua única opção era fazer o oposto do que vinha tentando: inverter o fluxo das correntes ao redor, tentando frear a queda.
No solo, o Caçador cravava outra lança em uma criatura espectral. Mas, antes que pudesse retirá-la, seus sentidos dispararam.
— Hã? — murmurou, antes de ser atingido.
CRASH!
Jasper caiu sobre o Caçador, os dois rolando entre a areia e fragmentos de ossos. A pancada gerou faíscas entre as placas da armadura do garoto e o corpo ósseo do ciclope, enquanto uma nuvem de poeira os engolia num redemoinho sufocante.
— Mas que porra! — o Caçador se ergueu tossindo, com a expressão marcada por dor, raiva e surpresa.
Seu elmo rachado estalava levemente, mas o único olho já estava fixo em Jasper, caído de bruços, ofegante.
O garoto virou-se lentamente, encarando o Desperto com um sorriso nervoso.
— Vim retribuir o favor de antes — disse ofegante, tossindo em seguida. — Algum problema?
O silêncio tenso entre eles foi quebrado apenas pelos gritos distantes das feras e o rugido metálico da Dama da Ruína se aproximando.
— Sim. Primeiro: você é uma péssima isca! — disse o ciclope, arrancando a lança de um dos Bestiais. — Segundo: agora nós dois estamos com um pé na cova.
A resposta de Jasper veio com ação: um corte limpo com sua lâmina de ossos abriu o torso de um artrópode como se fosse papel.
— Bem… Se for pra morrer, pelo menos vou levar você pro inferno junto comigo — provocou, enquanto fatiava mais alguns inimigos que se aproximavam.
Sentindo o avanço de uma criatura pelas costas, o Caçador girou o corpo, desferindo um chute direto no crânio da fera. Os espinhos ósseos em seus pés rasgaram a carne, e a força avassaladora foi suficiente para arrancar a cabeça do inimigo.
Com as munições da Dama da Ruína se esgotando, os disparos passaram a ser feixes menores de energia. Jasper se tornou o novo alvo. As esferas de energia atravessavam as nuvens de poeira, avançando sobre ele enquanto enfrentava as criaturas.
Uma silhueta escura surgiu, interceptando o ataque, não era um inimigo, mas o lobo metálico: Kaern.
Seus segmentos brilhavam em tons mutáveis, e dentro de sua estrutura o Núcleo Mutante absorvia o feixe, convertendo-o em poder.
— Já estava na hora… — murmurou o líder do Undead lupino.
Jasper mal teve tempo de processar o retorno do aliado.O rugido de Kaern ecoou, e ele disparou uma esfera massiva de energia, atingindo a Dama da Ruína.
Mirage, relaxada com os pés sobre a mesa, foi lançada contra a parede, ricocheteando como uma bola de borracha.
— Aí, meus ossinhos de estimação! Quem foi o infeliz que ligou o modo terremoto?!
Zath usou vários tentáculos para se manter firme. Até então, mantinha a raiva sob controle, mas, ao ver sua criação sendo atacada, perdeu completamente a calma.
— Ativar o canhão principal. — A ordem veio com uma calma enganosa.
— Espera aí, chefe… e o lance de capturar o Vulto Negro vivo? Se atirarmos agora, ele vai morrer.
— Dane-se o Vulto Negro, dane-se a missão, dane-se a Igreja Amaldiçoada e aquele imbecil do Skarneth! Eu falei: ATIVAR O CANHÃO PRINCIPAL, AGORA!
A própria embarcação reagiu, liberando toda a energia do Núcleo Mutante. Placas espessas se abriram, o canhão principal: uma fenda monstruosa onde energia se acumulava em espirais violentas.
Cores oscilavam entre o violeta corrosivo, dourado febril e azul profundo, girando ao redor de um núcleo vivo, uma esfera pulsante de carne, metal e ódio condensado.
O Caçador de Ossos sabia que, se não agisse, seria o fim. Saltou sobre Kaern, pronto para partir, mas o lobo não se moveu.
— Tá de sacanagem? Numa hora dessas você vai travar?!
Com um sorriso torto surgindo no rosto, o ciclope entendeu: Kaern não partiria sem Jasper. Então, agarrou o braço do garoto e o puxou para cima do Undead lupino.
— Me agradeça depois, garoto… se é que estaremos vivos até lá. — soltou uma gargalhada histérica, enquanto o lobo acelerava com tudo que tinha.
O canhão vomitou um feixe de destruição pura, largo como um rio, veloz como um raio. A rajada cortou o céu como papel velho, deixando um rastro incandescente. A explosão inicial engoliu a paisagem com uma onda brutal, levantando dunas inteiras e pulverizando rochas milenares.
O céu se pintou de branco e laranja, como se uma aurora tivesse nascido à força no coração do deserto.
Nenhum sinal dos três fugitivos podia ser detectado pelo radar da Dama da Ruína.
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