Índice de Capítulo

    Boyak agiu mais rápido e conseguiu frustrar a fera com um soco, mas sabia que aquilo ainda não deteria a criatura. Mandaram um farejador. Humpf! Tão previsível.

    Sacou seu frasco e bebeu um pouco do fluido rapidamente. O estoque está acabando, ele pensou vendo que o líquido já não ocupava nem a metade do frasco. Vou ter que ser preciso.

    — Ei! — gritou para Anayê. — Você está bem?

    Antes que ela respondesse, uma bola de energia roxa saiu da boca do monstro e acertou o distraído Boyak. Seu corpo saiu girando e atingiu uma árvore velha desabando junto com ela. 

    O farejador avançou num salto e pousou diretamente no local onde o ceifador havia caído desferindo um golpe com os dois punhos fechados. 

    O chão estremeceu e uma rachadura se abriu devorando alguns galhos em seu caminho. 

    Anayê se levantou assustada com a velocidade que tudo acontecia. Mas tão logo ficou de pé, percebeu que Boyak tinha escapado do segundo ataque. 

    Ele estava posicionado a alguns metros da aberração.

    — Então você luta sujo, hein! — resmungou.

    O relance de uma memória cruzou sua mente. Seu mestre mastigando folha de hortelã enquanto ensinava como derrotar aberrações. Para derrotar uma aberração, você deve destruir o seu coração. Por mais retalhada que uma aberração possa ser, não adiantará se o coração não for destruído. 

    O ceifador se concentrou. Sentiu o fluido percorrendo cada centro nervoso de seu corpo e estimulando seus músculos. Deixe sua força fluir através de mim, ele recitou em pensamento. Reuniu toda aquela energia na mão direita. 

    O Punho de Deus estava pronto. 

    Ele investiu contra a fera.

    De longe, o que Anayê viu foi um relâmpago na direção da criatura.

    Mais uma bola de energia avançou da boca da aberração e se chocou diretamente com o punho de Boyak. 

    Uma gigantesca onda de vento se formou no local do choque e se alastrou por todo o platô. 

    Anayê tentou se manter firme diante da força do vento, mas acabou caindo e rolando para mais longe. 

    A carroça balançou e o cavalo se agitou tentando se soltar. Se Boyak não tivesse prendido o animal em uma árvore mais grossa, ele teria fugido.

    — Toma de volta! — o ceifador falou usando toda sua força para empurrar a bola de energia na direção do farejador.

    A atitude pegou a aberração de surpresa. Ela recebeu seu próprio poder em cheio na cabeça e caiu para trás levantando poeira e galhos quebrados.

    Boyak bateu as mãos.

    — Vamos lá, terceira rodada — falou para o monstro. — Vamos, garoto!

    A besta se recompôs. Partes de sua cabeça estavam machucadas e com hematomas, mas isso não impediu a formação de uma nova bola de energia.

    — Eu tô aqui — chamou a atenção da criatura.

    A bola de energia voou na direção do ceifador, mas dessa vez, ele se esquivou e se aproximou mais do monstro. Não pode lançar muitas rajadas simultâneas, precisa de um tempo, ponderou consigo. Um contra-ataque será perfeito.

    Mas, para a surpresa de Boyak, o farejador desferiu um soco em sua direção. O ceifador ergueu os braços e se defendeu, sendo arrastado por alguns metros pela mão gigantesca e pesada do adversário. 

    A aberração parecia impressionada com a força do jovem e ele aproveitou esse instante de distração para agarrar um dos dedos dela com as duas mãos. Mesmo incrédulo, o monstro não teve forças para revidar, e foi girado e lançado para longe. 

    A criatura saiu rolando pelo solo abrindo buracos e derrubando árvores velhas, mas se levantou depressa batendo com os punhos no chão. Todos os três olhos piscando e piscando como as asas de uma mosca.

    Mas então, em um piscar de olhos, Boyak apareceu em sua frente com a mão direita reluzindo como uma tocha e acertou seu peito em cheio. 

    O farejador recuou dois passos um pouco atordoado.

    O ceifador repousou ofegante. Sentiu parte de sua força nas pernas deixando-o. O efeito do fluido acabou, concluiu.

    Atrás dele, a criatura continuava tonta e, de repente, seu peito explodiu lançando um punhado de vísceras e sangue pelo chão.

    Boyak assistiu o corpo inerte do farejador desabar.

    Anayê, uma vez mais em pé, testemunhou todo aquele golpe sem quase piscar. Como pode existir alguém com tamanho poder? De que maneira ele enfrenta as aberrações? Seu poder deriva apenas do conteúdo daquele frasco ou existe algo a mais?

    Enquanto ponderava sobre isso, viu o corpo da criatura se dissipar aos poucos até se transformar em um corpo humano comum. A cena acertou sua mente em cheio. Seus pés se moveram atendendo o desejo de ver aquilo mais de perto.

    — Você está bem? — Boyak perguntou.

    Anayê não prestou muita atenção e caminhou na direção do corpo. Era uma mulher loira, de roupas rasgadas, exibindo várias cicatrizes e a runa de Astaroth em sua testa.

    — Infelizmente, ela já está morta. Impossível salvar um humano depois que ele se torna uma aberração nesse nível.

    — Ela era…

    — Uma pessoa — o ceifador completou. — Sim, muitas aberrações eram apenas pessoas.

    A moça se lembrou de ouvir gritos vindos da torre da alquimia inúmeras vezes. Será que eles estavam criando monstros assim?

    — Muitos deles, com o tempo, perdem a razão e se tornam esse tipo de besta irracional. Deixam de ser quem eram.

    Anayê estava impressionada por tantas descobertas. Primeiro, não conseguia entender o que levava uma pessoa a se tornar uma aberração daquelas. Teria que chegar em ponto de muito desespero para aceitar. Ou seria algum tipo de ganância?

    Segundo, ainda não compreendia como Boyak realizava aquelas proezas, mas estava grata por tê-lo encontrado, e sim, os ceifadores eram de verdade. Agora ela tinha certeza.

    — Você vai ter que se preparar melhor se quiser viver — ele falou. — Torci para que nenhum deles cruzasse nosso caminho, mas o primeiro veio, e logo mais farejadores virão.

    Ela olhou-o um pouco desolada.

    — É a sua runa — apontou para a marca na testa dela. — É o sinal de que você é propriedade de Astaroth e deve ser devolvida ao seu dono.

    Anayê tocou a marca em sua testa. Propriedade? Isso não é possível.

    Boyak notou toda a dúvida no rosto da moça e disse:

    — As runas de Astaroth são um constante lembrete de sua crueldade. A pessoa marcada nunca consegue se livrar dos farejadores, pois eles estão sempre em busca da marca. Vê essa mulher? — indicou o corpo. — Era um farejador. Enquanto você estiver marcada, eles continuarão vindo, farejando a sua runa.

    Anayê baixou a cabeça. Então… nunca vou conseguir me livrar deles? Quer dizer que isso foi em vão? Meu escape não valeu de nada?

    No fim, ter ficado ou ter fugido, tudo daria no mesmo? Ela agarrou uma mecha do cabelo sujo com toda a força que tinha nas mãos. Não pode ser, não pode ser, não pode ser! Tinha que haver um jeito. Se não tivesse, ela encontraria um. Nem que precisasse colocar Gluran de cabeça para baixo.

    — Deve existir uma maneira de me livrar disso — levantou a cabeça.

    — É claro que há — Boyak respondeu calmamente. — Eu não disse que não existia. 

    A testa dela se franziu.

    — E por que você não disse isso logo? — Anayê reclamou. — Ficou me assustando com essa história de marca como se a minha vida tivesse acabado.

    — Não foi minha intenção ser tão dramático… tá bom, foi um pouquinho.

    — Seu idiota! Meu coração quase saiu para fora do peito — ela deu um tapa no ombro dele.

    Boyak riu enquanto Anayê se sentou para se acalmar.

    — Então, diga logo, o que eu tenho que fazer para me livrar dessa runa?

    — Existe uma montanha nos reinos livres chamada de Sinai, você deve encontrar o legislador lá e ele te dirá o que fazer.

    — Só isso?

    — Por que precisava ser complicado?

    — Porque com você tudo parece complicado.

    — Ora, vamos, foi engraçado. Você ficou a ponto de ter um ataque. Há! Há!

    Ela cruzou os braços.

    — Você precisa ver as coisas de uma forma mais tranquila.

    Porém, abruptamente, o semblante dele mudou.

    — Aquilo é uma bandeira? — indagou.

    Apressado, subiu em uma árvore em três pulos e avistou uma pequena coluna de fumaça em meio a escuridão. 

    Anayê não conseguia enxergar nada.

    — Suba depressa na carroça — Boyak ordenou. — Precisamos sair rápido. Eles devem estar seguindo o rastro do farejador.

    — O que houve?

    — Uma bandeira da oitava legião — ele explicou. — Tem um general a caminho.

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