Capítulo 0111: Vitória
A batalha pelo Castelo Silvergraft levou menos de uma hora.
Cinquenta soldados se tornaram duzentos depois que os barões Kessel e Whitefield somaram suas forças às de Siegfried, Adrien e Hunter. E então a diferença entre os atacantes e defensores passou a ser de seis soldados para cada guarda do barão Silvergraft.
Não houve misericórdia.
Alguns se renderam, outros pularam as ameias e houve até quem tentasse se esconder dentro dos barris vazios na despensa. Ao todo haviam pouco mais de trinta guardas. Todos foram executados.
Além das três servas que Siegfried encontrou, os outros soldados capturaram mais três. Todas elas receberam coleiras e se tornaram escravas.
Os cadáveres foram levados em carroças, alguns voluntários foram trazidos para limpar a bagunça e quatro bandeiras foram hasteadas sobre a torre de menagem. A mais alta pertencia ao Rei Negro e exibia um castelo negro em fundo vermelho. As outras três estavam logo abaixo, todas na mesma altura para não ofender nenhuma família.
O brasão da casa Gaelor era uma mão vermelha segurando uma adaga em fundo verde; enquanto o da casa Kessel exibia uma cruz negra em fundo partido, meio azul e meio prateado; e o da família Whitefield, uma adaga negra em fundo branco.
Mas as verdadeiras questões foram resolvidas na reunião que tiveram mais tarde no segundo andar da torre, ocupado pelo barão Kessel. Obviamente todos estavam presentes: o barão Whitefield, seu sobrinho Hunter e também Adrien e Siegfried.
Depois de terem tomado os seus devidos lugares à mesa, o lorde Kessel deu a ordem e os guardas trouxeram o barão Silvergraft.
Tinham-no vestido com os mesmos trapos velhos que davam aos escravos e as correntes pareciam ser pesadas demais para o velho, que andava tão curvado quanto se tivesse uma corcunda. Apesar de estar perto dos cinquenta anos, sua aparência era a de um octogenário: olheiras profundas, uma longa barba grisalha e quase nenhum cabelo.
Adrien sorriu satisfeito quando o prisioneiro caiu e teve de ser arrastado o resto do caminho, mas foi para o barão Kessel que olhou. Tinha sido Adrien quem capturou o barão Silvergraft, segundo ouviu dizer. Talvez esperasse alguma gratificação pelos seus feitos.
Feitos bem pouco impressionantes, diga-se de passagem.
Decerto que uma armadura poderia fazer até um velho como aquele parecer ameaçador. Também não seria estranho de se imaginar que ele tivesse alguma habilidade em esgrima; este normalmente era o caso para a maioria dos fidalgos. Mas ainda era difícil acreditar que o barão Silvergraft tivesse sido mais que um desafio medíocre.
Patético. Era a única forma de descrevê-lo.
— Lorde Silvergraft — saudou o barão Kessel. — É uma bela fortaleza a que tem aqui.
— Se acham que podem escapar impunes depois desta barbárie, estão enganados! — disse o lorde Silvergraft. — O conde Essel–
— Será o próximo.
— E-está louco!? O conde tem um exército! E as tropas do duque Greenguard.
— Você quer dizer duquesa. Um velho de quase sessenta anos e uma garota de dezesseis. É isso o que devo temer?
— …
— Seja como for, não te trouxe aqui para discutir estratégias militares. Lembra dos meus termos?
— N-não pode estar falando sério.
— Alegre-se. Decidi poupar o seu garoto. Ele pode vir a ser um bom vassalo com o tempo. E se não for? Bem, sempre temos a sua filha.
— Desgraçado! Se tocar um dedo nela–
Antes mesmo que o barão Silvergraft tentasse se levantar, os guardas já o haviam derrubado. Após a sua pequena cena, o barão Kessel deu a ordem e seus homens o levaram embora.
Depois se virou para o lorde Whitefield:
— E então? O que acha?
— O ideal seria levá-lo vivo. Assim não haverão dúvidas de sua identidade.
— Apenas tenha certeza de não deixá-lo escapar.
— Se chegar a tanto, nunca é tarde demais para lhe cortar a cabeça. Também vou precisar da sua espada. O barão Coyle é um homem cauteloso e não gosta muito de mim, mas nem ele será capaz de negar sua identidade com tantas provas.
Nenhum dos dois barões sentiu a necessidade de explicar do que se tratava a conversa, por isso os próximos prisioneiros foram chamados.
Muito diferente de seu velho pai, Dedric entrou de queixo erguido e altivo, vestindo uma túnica de lã verde e calças negras; as cores da sua casa. Não tinha mais de quatorze anos, mas estava perto de se tornar o patriarca da sua família.
Elisa seguia o seu irmão como uma sombra, meio escondida atrás dele. Só uma garotinha tímida de seis anos, com um vestido de algodão verde. Era praticamente um filhotinho assustado.
Como antes, foi o barão Kessel quem conduziu a conversa:
— Dedric e Elisa, presumo.
— V-vossa graça — disse Elisa, segurando a saia do vestido e fazendo uma profunda reverência. — E-Elisa Silvergraft… A-ao s-seu dispor.
— Vamos direto ao assunto — disse Dedric. — O meu pai vai ser executado, não é?
— Eventualmente, sim.
— E quanto a mim?
— O que acha?
— Acho que não. Você precisa de mim para dar legitimidade ao seu domínio sobre essas terras.
— Ora, não me diga.
— A minha família tem governado esse baronato por mais de seiscentos anos. O meu povo nunca apoiará um governante sem sangue Silvergraft.
— Seu povo são meus escravos.
Foi só o que precisou.
Dedric deu uma olhada nos homens ao seu redor pela primeira vez. Siegfried e os outros tinham se reunido logo após a batalha, então nenhum deles teve tempo de se trocar, por isso usavam as suas armaduras manchadas de sangue.
O garoto estava em uma posição muito delicada e finalmente pareceu entender isso.
— V-você precisa de mim… Sou o único filho do meu pai. S-sem mim, o seu governo sobre essas terras não será legítimo! Os outros nobres–
— Vão me agradecer por ter dado fim à linhagem de um traidor. Caso tenha se esquecido, seu pai virou as costas ao legítimo rei de Thedrit e enviou homens para ajudar um falso pretendente.
— …
— Me diga, você também é um traidor?
— N-não… Vossa graça…
— Então quem é o legítimo rei de Thedrit?
— O Rei Negro.
— E é bom que não volte a se esquecer. Seu pai cometeu um pecado terrível e é responsabilidade sua pagar por ele. Você entende isso?
— Sim, senhor.
— Ótimo. Não quero enganá-lo, terá de trabalhar muito para reconquistar a confiança que sua casa perdeu, mas você parece ser um rapaz esperto e vejo bastante potencial no seu futuro. Certamente que não me desapontará, lorde Silvergraft.
— Jamais, vossa graça.
Até segunda ordem, os irmãos Silvergraft ficariam ambos confinados ao último andar da torre, tendo dois guardas sempre à porta. Como as servas do castelo já tinham sido enviadas para a prisão com os outros escravos, o lorde Whitefield ofereceu as suas próprias escravas para servirem às crianças como camareiras:
— Suas antigas servas não seriam confiáveis de qualquer modo. Minhas garotas são educadas e dóceis. Servirão bem.
O barão Kessel concordou, mas insistiu que seus homens seriam mais aptos para proteger o quarto e as crianças.
Quando a reunião terminou, já estava escuro e os soldados comemoravam.
O Castelo Silvergraft havia caído.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.