— CAPÍTULO QUINZE —

    O Mar e o livro

    — Era uma noite fria e chuvosa, um breu tomou conta do nosso acampamento. Estávamos no continente das maldições, o lugar que todo mundo teme hoje. Fomos enviados pelo reino de Falkenhein para uma investigação minuciosa do porquê os soldados do grupo número 0509 haviam sumido.

    — Por que um trabalho de investigação? — perguntou Stuart.

    — Naquela época, fazíamos trabalho de caça, sim, mas as investigações com certeza davam mais dinheiro para bancar o grupo.

    — Sim, o que aconteceu depois?!

    — Eu estava com Kael e duas amigas nossas, Aurora e Mila…

    A mãe! Pensou Luca, espantado, mas ainda muito enjoado para falar. Estava encostado na borda do barco, caso fosse soltar alguma coisa.

    — …Vimos uma torre por perto e saímos na direção da torre para procurar. Encontramos vários corpos cortados ao meio e queimados. Nosso único erro foi achar que não seria tão difícil, mas tudo mudou quando Kael notou uma sombra estranha vindo da torre.

    — Um monstro? — perguntou Churra, tão baixo que quase ninguém pôde ouvir.

    — Não, não era um monstro — respondeu Kael, no mesmo tom.

    — Olhamos para cima e vimos um pescoço enorme — continuou Hassini aproximando-se — com escamas vermelhas e pretas, olhos alaranjados, garras enormes e uma cauda gigante. Era um Zilant, e foi exatamente aí que a batalha começou. Eu nunca tinha visto antes uma criatura capaz de fazer seu corpo queimar por inteiro. Foi o que aconteceu quando Kael tentou atacá-la de perto. Aurora elaborou uma estratégia muito boa para derrotarmos aquilo. Ela gritou: “Ataquem a mesma região, vocês dois, de preferência no pescoço.” Aurora era uma espadachim de classe. Nenhum monstro normal poderia derrotá-la se ela estivesse em um bom dia.

    Aurora? Pensou Karl, curioso, tentando saber quem seria ela.

    — Eu e Kael atingimos ele com um soco hilário no pescoço ao mesmo tempo. Mila completou com um ataque com flecha que, com o impacto, explodiu. O monstro lançou todos nós pelos ares, estava voando tentando nos abocanhar enquanto descíamos, mas Kael me salvou chutando minhas costas. Cada um voou para um lado e, quando chegamos para ajudar Aurora, ela havia cortado ainda mais seu pescoço, deixando uma parte extremamente exposta e sangrando. 

    — Foi quando eu segurei Kael e o mandei direto no pescoço do bicho. Ele cortou o pescoço dele e, antes de morrer, o monstro se banhou em fogo, mas aquela escama nunca derretia. A gente recolheu e fez alguns itens maneiros, igual à espada de Kael aí.

    Kael tirou a espada daquele pequeno saquinho que ele carregava consigo. Antes, Luca pensava que era apenas de moedas, mas pensou: como uma espada caberia dentro de um saco?

    — Essa espada repele qualquer dano de fogo usado contra ela, também é capaz de cortar o próprio fogo. Considero-a uma espada lendária, por ter presenciado a força do Grande Peixe Branco.

    — Um dos monstros do deus Futy!? — perguntou a moça, assustada.

    — Sim, o último entre eles.

    Luca, Karl e Lótus ficaram ainda mais impressionados com a espada que Kael carregava, não esperavam que fosse tão forte.

    — Mas é isso, né? Tá na hora de dormir, e eu já vou indo — disse Hassini, descendo as escadas.

    O pessoal não demorou muito lá em cima e fez o mesmo. Luca não quis descer, porque ainda estava enjoado demais. Eles apagaram as luzes de cima, e a luz natural das duas luas no céu tomou conta. Uma era enorme e amarela, a outra era menor e um pouco azul, ambas tão belas quanto qualquer outra coisa que ele pudesse ver, imaginou Luca.

    Sentiu um enjoo forte e soltou tudo para fora no mar.

    — O que foi, rapazinho? — Era a mulher com os cabelos despenteados e o andar peculiar.

    Luca tomou um susto e quase caiu do barco.

    — Eh, nada. Eu não ando muito de barco, na verdade, nunca andei. Tá sendo um pouco difícil para mim.

    — Oh, que dó. Queria poder ajudá-lo. — Luca reparou na voz meiga que ela tinha e nos olhos castanhos claros, redondos, com cílios volumosos e uma pálpebra simples.

    — Muito obrigado… não vai dormir?

    — Eu gosto do céu do mar, longe daquelas luzes mágicas, vejo um pouco durante a noite.

    — Eu achei lindas, seu nome é Anna, certo?

    — Sim, e você é?

    — Luca, Luca Stellara.

    — Ah, então você se apresenta com seu sobrenome… intrigante.

    Luca sentiu outro enjoo forte e soltou novamente no mar, enquanto rapidamente ela dava tapas leves nas costas dele.

    — Não se preocupe, é muito normal isso acontecer com uma ou duas pessoas no barco, Hassini também era assim, sabia?

    — Sério? Ele parece ser tão…

    — Forte? Ele também deve ter suas fraquezas. Por agora, vou te deixar. Olhe bem quando você vai dormir, viu? — Ela se virou e entrou na cabine principal.

    Luca se inclinou no barco e olhou, ficando cada vez mais encantado com tudo o que via.

    O mar refletia o brilho das estrelas e das luas, que pareciam estar tão perto dele. As ondas eram suaves, quase inexistentes, e o barco as cortava e deslizava como uma faca cortando um vegetal. Quanto mais olhava, notava peixes, não normais, mas cintilantes, brilhando em tons de azul, branco e dourado, como se fossem luzes únicas e puras.

    Seus movimentos criavam um rastro de luz, um espetáculo de cor. Grupos enormes seguiam o navio e nadavam sincronicamente, formando padrões maravilhosos. Às vezes, um peixe ou outro saía de sincronia, mas voltava tão naturalmente que parecia ser uma dança única.

    O som suave das águas contra o casco se misturou a tudo o que acontecia, tranquilizou Luca e fez o enjoo dele parar.

    Quando ele começou a notar algo estranho vindo do fundo, um contorno quadrado, meio que retangular, à medida que “aquilo” se aproximava e seu brilho se intensificava, ele teve uma visão mais clara de um objeto que parecia um livro reluzente.

    De uma hora para outra, o mar se moveu. As ondas, antes quase imperceptíveis, pareciam vivas, moldando-se em um espiral, como um redemoinho ao lado da embarcação. 

    A água se ergueu, tomando a forma de braços líquidos que se estendiam na direção de Luca com o livro, como se fosse algo tão importante que o próprio mar o entregaria. Com delicadeza, o mar segurou o livro e o estendeu para Luca.

    Quando Luca o segurou, o brilho do livro sumiu, e o mar voltou a ser como estava antes de brilhar, como se nada disso tivesse acontecido. O livro era bem antigo, estava seco, parecia que as águas do mar nem o tinham tocado. 

    A capa era de um material polido e limpa, o livro não pesava, mas também não era tão leve quanto ele imaginava. Ele passou os dedos pela capa, sutilmente, tocando as letras gravadas como se fossem em fogo. Não abriu o livro, apenas leu o seu nome em voz baixa:

    A semente… Criado por Kieran Miyamori.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (2 votos)

    Nota