Capítulo 169: ISE
O som do disparo ecoou como um trovão, cortando a tempestade que rugia ao redor. Marcus apertou o gatilho novamente, e a bala rasgou os trezentos metros com precisão mortal, abrindo um rombo perto do ombro da criatura. Carne e veias pulsavam, tentando se reconstruir ao redor da Pedra Lunar incrustada em seu corpo, mas Marcus já havia identificado o local exato.
Com um movimento fluido, ele ergueu a Carabina ISE e começou a correr. Seus passos eram rápidos, firmes, enquanto o cenário ao seu redor se desfazia em uma mistura de janelas quebradas, paredes destruídas e corredores abandonados. Ele saltou por uma pequena barricada e, ao virar para o lado, percebeu o Felroz mudando de direção. A criatura havia abandonado Juno para segui-lo.
Exatamente como ele planejou.
O corredor à frente inclinava-se em uma descida abrupta, uma rampa natural formada pela destruição do prédio. Marcus não hesitou; deslizou de costas, os calcanhares controlando a velocidade, enquanto o som da perseguição ressoava acima.
Um estrondo colossal sacudiu o edifício. Ao atingir o andar inferior, Marcus olhou para cima. A parede explodiu em pedaços, e o Felroz surgiu, seu corpo agora ainda mais grotesco, inflado pela fúria e pela Energia Cósmica que pulsava dentro dele. Menos de vinte segundos. Marcus registrou o tempo mentalmente, sua mente funcionando como uma máquina de precisão.
Sem perder um instante, ele girou a Carabina. O brilho azulado do cano iluminou o corredor escuro. Outro disparo, mais potente desta vez. O projétil encontrou um dos braços da criatura, arrancando-o completamente. O Felroz tombou, seu corpo monstruoso girando no chão, mas seus olhos predadores não desviaram de Marcus.
— Está com medo de mim? — provocou ele, erguendo a ISE em direção à tempestade que rugia além do prédio. Antes que a criatura pudesse reagir, Marcus apertou o gatilho novamente e disparou, usando o momento para correr.
O Felroz o seguiu, seus três braços restantes destruindo tudo em seu caminho. Cada passo da criatura fazia o chão tremer, os berros bestiais preenchendo o espaço como um aviso de morte iminente.
Marcus alcançou o fim do corredor e parou. Lá, no limite da escuridão, ele ajustou a mira novamente.
— Bicho idiota — murmurou, antes de disparar outra vez.
A bala encontrou a perna da criatura, arrancando-a em uma explosão de carne e osso. O Felroz caiu, tentando se equilibrar com os braços restantes. Mas quando tentou avançar, um brilho fraco iluminou o corredor mais uma vez.
— A tempestade mudou de direção — disse Marcus, com um leve tom de desprezo na voz. — Balas de Energia Cósmica têm seus próprios efeitos. Aposto que você não sabe disso.
A primeira bala, na direção da tempestade, voltou em um ângulo similar, golpeando seu braço, e caiu tombando.
A criatura hesitou por um instante, mas sua fúria logo o impulsionou novamente. Ele avançou com ferocidade, destruindo o que restava das paredes e lançando-se pelo corredor, mais rápido e mais destrutivo a cada segundo.
Marcus correu para a próxima curva, sentindo o calor do monstro se aproximando. Seus berros agora eram ensurdecedores, um som de pura agonia e ira. Ao virar outra esquina, Marcus avistou o que precisava: uma viga metálica robusta no final do corredor.
Ele deslizou para trás de uma grande caixa de aço, apoiando os cotovelos sobre a superfície e ajustando a mira da ISE. Os dedos firmes encontraram o gatilho mais uma vez, e ele respirou fundo, deixando o mundo ao redor desaparecer.
— Estou aqui — sussurrou para si mesmo, enquanto o brilho azulado do cano crescia. — Consegue sentir meu cheiro, não consegue?
O rugido da criatura atravessou o corredor como um trovão distante, reverberando pelas paredes corroídas e rachadas. Marcus, sem hesitar, apertou o gatilho mais uma vez. O disparo ricocheteou na viga metálica, curvando-se em um ângulo impossível antes de explodir no ombro do Felroz. Um urro de dor seguiu-se ao impacto, ecoando entre os destroços como o lamento de um monstro ferido.
Marcus não esperou para ver o resultado. Ergueu a Carabina ISE, girando nos calcanhares, e correu, seus passos leves e rápidos abafados pela neve acumulada. O som de dor e ódio da criatura parecia se agarrar a ele, um fantasma que se recusava a ser deixado para trás.
Ao alcançar uma janela quebrada, ele saltou sem hesitação, caindo em uma rampa coberta de neve que o levou até a rua. O frio cortante o recebeu, mas Marcus não parou. Seus olhos analisaram rapidamente o ambiente. Estava entre as ruas 13 e 15, um setor em ruínas e mais baixo que o restante da cidade.
O silêncio momentâneo foi interrompido pelo som ensurdecedor do Felroz colidindo contra a parede acima. A estrutura tremeu, enviando pedras e destroços rolando pela rampa onde Marcus havia passado momentos antes. Ele se agachou atrás de um carro destroçado, o metal frio contra suas costas, enquanto ajustava a Carabina em suas mãos.
Fechou os olhos por um breve instante. Deixou o som do caos ao seu redor desaparecer, concentrando-se apenas no ritmo constante de seu coração. Um pulsar, dois pulsares. A calma voltou a ele como uma velha amiga, mesmo diante da iminência da morte.
— Não vai vencer sozinho. — A voz soou dentro de sua mente, fria e cortante. Veronica. Sempre Veronica. A mesma voz que atomentava Juno desde Centro de Pesquisa.
— Ele se regenera mais rápido do que você consegue feri-lo — continuou ela, impassível.
Marcus deixou escapar uma risada curta, amarga, que mais parecia um grunhido.
— E o que propõe? Que eu fique aqui sentado esperando a morte porque você acha que sabe de tudo?
A risada desapareceu tão rapidamente quanto veio, substituída por um olhar de aço.
— Se coloque no seu lugar, Veronica. Quando eu quiser sua ajuda, eu peço.
O silêncio caiu novamente, quebrado apenas pelo som pesado dos passos do Felroz se aproximando. Marcus apertou o cabo da ISE, sentindo a energia cósmica pulsar dentro da arma.
— Vamos acabar com isso — murmurou para si mesmo.
Assim que ele levantou já injetando a Energia Cósmica, um vulto elétrico azul passou bem ao seu lado, rasgando o ar. Juno usou pedaço de viga para acertar o Felroz bem no meio do peito e o mandar pra dentro do prédio, quebrando suas paredes e caindo escombros.
Ao arrastar o pé no chão, sentiu os dois braços tombarem e sua perna fraquejar. Marcus tinha ganhado tempo pra ela, mas não para ela se jogar na primeira oportunidade. Por algum motivo, cada uma dessas pessoas que Dante tinha trago pro abrigo possuía umas ideias idiotas.
— Nem se aguenta em pé. — Ele continuou com a Carabina apontada para frente. — Quer mesmo continuar pensando que é o Dante? Ele consegue fazer isso sozinho, a gente não.
— Por que acha que ela quer isso? — perguntou Veronica, achando graça. — Aquele velhote não tem nada de especial a não ser pela força. Juno é mais técnica, mais rápida, pode ser melhor.
— Mas, não é agora. O que você está vendo é uma garota que pensa que tudo pode ser resolvido usando a força bruta. — Marcus continuou sério. — Força é pra usado com inteligência. Então, comece a usar a cabeça, garota. Ou vai morrer mais cedo do que pensa.
O rosto de cansaço dela já indicava que estava por um fio. Marcus respirou bastante para não falar besteira. Levantou a arma, e mandou que se aproximasse.
Quando ela se aproximou, Marcus agarrou seu braço com firmeza e a puxou para baixo, escondendo-a atrás do carro destroçado. Ele se abaixou ao lado dela, seus olhos analisando rapidamente o rosto cansado e a postura tensa de uma jovem que parecia carregar o peso do mundo nas costas.
— Ei, pare de fazer coisas que sabe que não consegue. — Sua voz era baixa, mas havia um tom cortante, impossível de ignorar.
Juno desviou o olhar, mas Marcus não permitiu. Ele segurou seu queixo e a forçou a encará-lo.
— Estou falando com você. Pare, agora. Se continuar assim, vai acabar se matando. Por que todo mundo parece que precisa provar alguma coisa?
Juno suspirou profundamente, encostando a cabeça contra a porta amassada do carro.
— Eu… só queria fazer algo que me desse orgulho. Estou tentando… muito.
— Sei que está tentando. Vejo isso todos os dias. — A voz de Marcus perdeu parte de sua dureza, mas não o peso. — Mas não é assim que se ganha batalhas. Não é assim que você sobrevive.
Ela assentiu com relutância, mas seus olhos não se desviaram desta vez.
— Meus braços ainda estão dormentes, — admitiu, erguendo as mãos com esforço. Seus dedos se moviam lentamente, quase trêmulos. — Sempre acontece quando lanço algo de perto. Não consigo lutar assim.
Marcus pegou as mãos dela, analisando-as. As palmas estavam secas, ásperas como pedra, marcadas por rachaduras finas que falavam de esforço extremo. Ele apertou seus dedos, notando como ela mal reagia.
— Você está se destruindo. Mas tem jeito. — Ele soltou as mãos dela com cuidado, endireitando-se. — Vamos precisar voltar ao abrigo para cuidar disso. Mas até lá, você vai lutar de longe. E vai fazer exatamente o que eu mandar.
O som das pedras rolando interrompeu a conversa, seguido por um rugido profundo que reverberou pelas ruas desertas. Marcus ergueu os olhos para o prédio parcialmente destruído de onde o Felroz emergia.
— Esteja pronta quando eu disser. — Ele falou com calma, mas seus olhos estavam fixos no inimigo. — Vai usar suas correntes para me segurar e as outras para se lançar para cima. Vamos usar os prédios a nosso favor.
Juno assentiu novamente, desta vez com mais convicção.
— Entendido.
Marcus desviou o olhar, focando no som que vinha do monstro. Seu rosto endureceu, e ele fechou os olhos, buscando o ritmo familiar do silêncio interno. Sem distrações, sem incertezas. Apenas a luta. Apenas… sobreviver.
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