— CAPÍTULO VINTE E SEIS —
Magia silenciosa
A magia, em sua forma majestosa, atravessou diversas árvores e sumiu na floresta, deixando um rastro de brilho fugaz entre os galhos cobertos de neve. Os olhares se encontraram: Yuki, com admiração, e Mila, com um sorriso animado pela expectativa de ver como a filha se sairia, seus olhos castanhos claros brilhando com uma mistura de orgulho e ansiedade.
— Tudo bem, eu consigo… — Yuki segurava o arco com firmeza. A madeira, diferente de tudo que já vira, e a corda, feita de um fio forte e rígido, tornavam-no especial. Pronta para executar a magia, ela exclamou:
— Vamos!
Apontou o arco para a floresta, tensionou a corda e se preparou para conjurar.
— Sagittae quae caelos… — Um brilho surgiu das mãos de Yuki, uma luz pálida que contrastava com a neve ao seu redor, enquanto Mila observava, torcendo silenciosamente por ela, as mãos apertadas junto ao corpo. — …Attingunt! — Uma pequena esfera de energia foi formada, disparada e, ao tocar o chão, murchou, transformando a neve em um pequeno círculo de água congelada.
Ambas olharam para a bolinha e caíram na risada, o som ecoando pela floresta silenciosa. Mila tentava disfarçar o riso, enquanto Yuki ria abertamente, sem qualquer vergonha, feliz por ter conseguido gerar algo com sua conjuração, mesmo que a magia não tivesse se completado, seus olhos brilhavam de alegria.
— Mãe! Você viu?
— Claro que vi! — respondeu, com um sorriso largo no rosto.
Não achei que ela fosse gerar de primeira, será que ela é especial? A Pearl tentou por muito tempo fazer uma bola de fogo. Depois da primeira magia é até fácil aprender outras, mas até conseguir a primeira…, pensou Mila.
— Vou tentar de novo! — O semblante de Yuki mudou, mostrando determinação, seus olhos agora fixos no arco.
Primeiro, pensar na conjuração, aquelas quatro palavras estranhas. Ela posicionou as mãos corretamente, como havia feito na primeira vez. Preciso fazer a flecha, uma flecha igual àquela. Agora, vamos, Yuki. Sagittae quae caelos attingunt… De repente, a flecha foi disparada com uma velocidade implacável, agitando tudo ao redor. As árvores se moviam, a neve subia, e os cabelos de Yuki, assim como seu rosto, expressava um susto completo diante daquele súbito poder.
Um silêncio se fez presente, o ar parecendo pesar com a intensidade da magia.
Mila estava pasma.
Os cabelos de Yuki estavam completamente bagunçados, a neve grudada em algumas mechas.
— Você falou… alguma… coisa? — perguntou Mila, ainda em choque, sua voz quase um sussurro.
— Falei? Não…? Falei?
— Yuki… você não falou nada! Isso é incrível! — Mila segurou as mãos de Yuki com entusiasmo, apertando-as levemente. — Você é demais! Você conseguiu fazer magia sem dizer uma única palavra! Isso é incrível! Faz de novo, faz!
Yuki, ainda um pouco atordoada com a situação, se virou, concentrou-se e disparou uma flecha contra uma árvore, derrubando-a. Em seguida, lançou outra na parte que estava caindo e mais uma, afastando a árvore de onde cairia, fazendo-a tombar para longe. Sem proferir uma única palavra, ela realizou tudo, mas o esforço a deixou exausta, a ponto de quase não conseguir se manter de pé. Seu corpo tremia levemente, a respiração estava ofegante e um suor frio escorria por sua testa. Era um desgaste físico enorme.
— Nossa, Yuki! É incrível! Você consegue usar magia sem conjurar! Você é especial demais! — Mila a abraçou fortemente, e Yuki, sem graça, não sabia o que dizer, além de estar muito cansada.
— Vamos fazer você aprender várias coisas, mas por hoje, descanse. Você vai aprender mais rápido do que qualquer outra pessoa no mundo! Amanhã mesmo, vou dar algumas instruções para Nyoha e você aprenderá alguns truques com ela!
Essa mudança fez Yuki ficar pensativa, mais do que o normal. A energia que agora sentia fluir entre seus dedos a afetava de um modo peculiar. Não era algo ruim, mas sim algo que a fazia se sentir bem, até demais, a ponto de se ver poderosa em vários momentos.
Ela sentia como se outra mente estivesse conectada à sua, e as palavras da conjuração, mesmo não sendo necessárias, não deveriam ser esquecidas. Então era isso que minha mãe falou sobre a mana guardar as magias aprendidas? Pensou deitada em sua cama, olhando para o teto, enquanto a luz suave do luar entrava pela janela, iluminando o quarto de forma tênue. Ela sentia seu corpo inteiro vibrar em energia, uma energia que parecia sumir e reaparecer de outra forma. De repente, ouviu-se uma batida na porta:
Toc-toc.
— Pode entrar! — disse Yuki, esfregando os olhos e saindo de debaixo da coberta e se sentando na cama.
Acendeu o abajur, revelando Mila, com seus cabelos longos e soltos de cor semelhante aos seus olhos caindo pelas costas, com suas vestes de dormir, peças leves como seda. Ela se sentou ao lado de Yuki.
— Você está bem, filha? E tome cuidado com aquela coisa, viu? — perguntou, aproximando-se mais de Yuki, com um olhar carinhoso e preocupado.
— Estou, mas tem alguma coisa estranha. Parece que a energia no meu corpo está se movendo de um jeito esquisito, eu consigo sentir. E sobre o Bluo, ele parece que vai dormir muito mais. — Ao olhar para Mila, assustou-se e quase caiu da cama, levando as mãos ao rosto em choque. Em vez de sua mãe, viu apenas seu esqueleto envolto por uma aura estranha, com as letras a, s, c, f, t, k e z escritas em diversas sequências com detalhes impressionantes, como se estivessem gravadas em ossos translúcidos. A visão desapareceu quando piscou, deixando-a confusa e ligeiramente apreensiva.
— Filha? Filha? Está tudo bem? — Mila segurou Yuki, com o rosto tomado pela preocupação, que estava ofegante e tremendo.
— Eu vi… — Yuki fechou os olhos com força, as pálpebras contraindo-se em repúdio, sem querer abri-los novamente.
— Tudo bem, está tudo bem. — Mila a colocou de volta na cama, arrumando o travesseiro e puxando o cobertor com delicadeza, e a cobriu. — Durma hoje, amanhã a gente conversa, pode ser?
Antes que Mila se afastasse, dando um passo para trás, Yuki a segurou, os dedos pálidos e frios agarrando as vestes de Mila.
— Me leva contigo, mãe! — Com as mãos trêmulas, apertou-a com força suficiente para que ela sentisse o medo que a invadia.
Por que você está assim, Yuki? O que você viu? Mila a levou para seu quarto, onde havia uma cama maior, onde ambas dormiriam. Ela a deitou e depois se deitou ao seu lado, envolvendo-a em seus braços, mas aquela noite não foi nada boa para Yuki.
Ela se encontrava em um lugar escuro e vazio, com árvores secas ao redor, seus galhos retorcidos como mãos cadavéricas, o chão era coberto por folhas secas. Alguém estava em sua frente, com os braços abertos, de forma que a protegesse.
— Pearl? É você?
— Fuja, Yuki! Fuja! — disse Pearl sem olhar para ela, sua voz carregada de urgência e desespero, a cabeça virada para o lado oposto de Yuki.
— Fugir? — Yuki começou a cair, agora estava no céu. Enquanto caía, gritava assustada, cortando o ar e prestes a ultrapassar uma nuvem.
Ao cair no chão com força suficiente para quebrar seu braço, este simplesmente sumiu. Seus batimentos cardíacos aumentaram, completamente descontrolados. Quando percebeu o lugar onde estava, era sua casa, mas uma versão sombria e distorcida dela. Ela foi ao segundo andar, olhou os quartos, mas nada viu. Algo estranho, muito estranho. As janelas começaram a brilhar com uma luz roxa esquisita vinda do céu. Ela olhou pela janela, mas não conseguia ver nada.
Girou a maçaneta e saiu de casa para tentar entender o que era aquilo, mas a luz roxa não podia ser enxergada; apesar de vê-la, não a compreendia, não a identificava, não a reconhecia. As casas estavam escuras por dentro, e as janelas só revelavam ainda mais isso, vazios negros que pareciam a observar. As portas não existiam. Ao olhar para trás, viu a própria casa no mesmo estado. Sua voz não saía. Então, ela viu uma única casa com as luzes acesas: a casa Lawrer.
Ela começou a andar para lá, mas parecia não sair do lugar. Ao olhar para trás, algo a perseguia. Era uma escuridão, não, uma forma, uma pessoa pequena, na verdade algo totalmente preto com a forma de uma pessoa. Ela correu, mas não conseguia se mover. Gritou, mas sua voz não saía. Caiu, mas não se machucou, e só conseguiu se mover engatinhando. Quando aquela escuridão a alcançou, ela se assustou.
Foi quando acordou, assustada, com o coração parecendo sair pela boca, os batimentos frenéticos ecoando em seus ouvidos, a respiração ofegante e irregular. Sentada ereta na cama, com a mão no peito, olhou para a janela. O brilho do sol batia levemente em seus olhos, em um pequeno feixe de luz que não havia sido coberto pela cortina.
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