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    — Aqui podemos ver a estátua de Fábio. Ela foi feita há uns dois anos quando… — Ela tentava lembrar a informação.

    Essa estátua era definitivamente uma característica muito egocêntrica da parte dele. 

    Ri levemente.

    — Amélia.

    — Huh?

    — Eu conheço esse local. Apenas pedi para você me acompanhar para não ficar sozinha.

    Seu rosto imediatamente ficou vermelho, como se tivesse cometido o pior dos erros.

    — M-me desculpa! Mas… você se sente sozinha, santa? 

    Não respondi.

    Acredito que o silêncio que deixei foi suficiente para que ela soubesse o assunto que havia tocado. 

    O jardim, de alguma forma, cheirava bem. O odor que exalava era parecido com Amélia, mas deveria ser por conta de sua presença nessa pequena floresta.

    Me perguntava como ela mantinha essas flores vivas, até porque pude identificar espécies que não se davam tão bem com nosso clima.

    Lado a lado, andávamos.

    E a nossos lados, lindos arbustos.

    — Essa flor… — Apontei.

    — É a flor de Lótus. Sabe, como o nome da igreja… Foi por isso que plantei ela aqui.

    Um pequeno sorriso abriu em meu rosto.

    Ela começou a me dar uma grande explicação para o surgimento dessa flor em Tyrael. O jeito com que falava mostrava uma grande empolgação, indicando amor por seu trabalho.

    Que pena.

    Amélia trabalhava para o Cardeal, não para mim. Iria amar ter uma jardineira para o meu jardim em Lótus.

    Foi um grande embalo, de apenas explicar a flor de lótus, para começar a explicar todas as outras próximas. 

    Camélia, Azaleia, Jasmin, Erica e Lírio. 

    Nessa sequência, ela explicou cada uma delas de forma prática e rápida. O seu surgimento, suas características, porque nascem aqui, entre outras curiosidades.

    Ver esses detalhes não me incomodava nenhum pouco. Pelo contrário, era interessante ver ela falar sobre o que gosta.

    E tinha uma coisa em comum que apenas notei quando terminou as suas grandiosas explicações. Esses nomes de flores eram também de grandes cidades próximas. 

    Gargalhei, como nunca havia feito antes.

    Amélia me olhava confusa perante a minha ação. Talvez tivesse quebrado a aparência de Santa que ela tanto amava, mas não me importei.

    Não consegui parar nem por um segundo, apenas… continuei.

    — Santa? 

    Foi quando retomei minha consciência.

    — Me perdoe. Apenas achei uma situação engraçada você apenas cultivar flores com nomes de cidades. 

    — Ah, então você percebeu! Nenhum outro jardineiro havia notado esse pequeno detalhe em meus cultivos — respondeu-me.

    — Eu gosto.

    — Que?

    — Eu gosto desse seu jeito de falar, Amélia.

    Seus gestos ficaram todos confusos, e errava palavras na tentativa de me responder. Era como se tivesse embaralhado tudo em sua mente.

    Essa reação eu já vi muito em minha vida.

    Está tudo bem.

    Respirei fundo.

    Amélia se levantou, indo para meu lado. Ela batia as mãos como forma de tirar a pouca terra que havia grudado em sua explicação.

    Fui à frente, sem falar nada. E Amélia apenas me seguiu como um pequeno cachorrinho.

    Não entendia essas suas ações. Tudo o que podia ver era uma pessoa se forçando a ficar ao lado de quem não gosta. 

    Todo aquele ouro de fiéis era gasto aqui.

    Podia confirmar essa óbvia afirmação, apenas olhando os materiais usados para a construção da mansão. 

    Me perguntava se ele pagava bem os funcionários, até porque os guardas da portaria pareciam bem desleixados. 

    Suas posturas nada nobres não compactuavam com poses vistas em guerreiros da nobreza. Talvez todo o dinheiro estivesse sendo desviado para outra pessoa.

    Sei quem é ela.

    E ela acha que não a vejo daqui.

    O mordomo principal seguia eu e Amélia, de forma discreta. Mas mesmo tentando esconder seus passos, o cheiro de seu sangue era muito evidente.

    Galileu, esse era seu nome.

    Sem nem mesmo olhar para trás, apenas segui pela minha caminhada até uma grande área atrás da mansão.

    — Aqui está diferente das outras — murmurei.

    — Essa parte é feita por outro jardineiro! Ele normalmente não está por aqui no meio da semana.

    — Entendo.

    Podia ver um grande arco de flores rosas, uma mesa para chá, alguns brinquedos infantis e principalmente a existência de várias empregadas. Outra coisa que havia me chamado atenção, era que toda essa localidade estava fechada por uma cúpula de vidro.

    E antes que pudesse acrescentar alguma coisa em nossa caminhada, Galileu se aproximou.

    — Madame — disse o mordomo. — Suponho que tenha vindo aqui para ver o Cardeal, estou correto?

    — Sim, está.

    Amélia logo percebeu a situação, se afastando rapidamente. Era melhor que ela fizesse isso mesmo, pois não sabia o que poderia ocorrer com quem está por perto de mim.

    — Ele está lhe esperando em sua sala, por favor, me acompanhe.

    Palavras nobres, para alguém tão podre.

    Mas sentia medo ao escutar sobre Fábio. Era fácil ignorar os abusos verbais, mas ele era diferente. Se fosse igual a todas as outras vezes, a humilhação que teria que passar…

    Os corredores pareciam repletos de olhos virados para mim. Uma sensação tão horrível e, ao mesmo tempo, tão familiar.

    As portas rangiam meu nome, as lamparinas acendiam chamas com meu rosto. Escutava meu próprio coração pulsando e meu corpo sentia-se tremendo por completo.

    Abri a porta, olhando a cara que tanto senti nojo e repulsa. Seus olhos frios perfuravam a minha barriga. 

    Cabelo para trás, um monóculo e vários acessórios banhados em ouro, podia resumir sua aparência nisso.

    Vestia roupas nobres, mas sujas de sangue. Ele não havia limpado sua vestimenta, e nem ao menos se trocado antes de vir falar comigo.

    — Perdão por atrapalhar o seu tempo livre, cardeal. — Abaixei minha cabeça em respeito.

    Ele não disse nada.

    Apenas se levantou, vindo em minha direção.

    — Eu deixei você vir até aqui?

    — Perdão, Cardeal! Mas tem assuntos importantes que devem ser resolvidos logo. E com a sua ausência em Lótus, achei melhor vir diretamente à sua casa!

    — Você sempre foi assim, Daiane.

    Ele me deu um tapa.

    — Por que você não pode apenas ficar calada?

    Um formigamento logo tomou conta de meu corpo. Não podia fazer nada quanto a essa situação, então segurei todas as palavras de ódio que poderiam sair da minha boca.

    — Perdão!

    — É sempre essa mesma fala, Daiane. Você sempre pede desculpas por tudo que faz, mas nunca aceita realmente as consequências.

    Ele veio para trás de mim, colocando todo o seu ódio no próximo soco que me deu. Agora, vindo das costas, foi o suficiente para me desequilibrar.

    — Fale logo o que você veio fazer aqui.

    — A verba, cardeal! Precisamos da verba para o festival que está vindo!

    — Ah… aquele festival. Bem que minha secretária havia falado disso mesmo.

    Ele sabia o quão próximo à festa estava.

    Estava caída aos chãos, e apenas a minha força não era o suficiente para me fazer levantar. No meio de minhas tentativas falhas de voltar a minha postura, Fábio logo me deu outro ataque inesperado.

    Chutando a minha barriga, fui parar quase do outro lado da sala. Podia agradecer por vir de casaco, esconder os hematomas seria mais fácil do que pensei.

    — Eu vou enviar o dinheiro. Mas da próxima vez, avise que está vindo. Não tenho nem um pouco de pena para invasores.

    Levantei-me do seu chão, com dificuldade, arrumando o casaco felpudo. 

    — Obrigada, Cardeal. 

    Fiz uma última reverência, antes de sair de sua sala.

    Meu objetivo de hoje foi concluído.

    E tudo que eu quero nesse momento é um pouco de café.


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