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    — QUINTUS, EU VI AS MENSAGENS! SEU TALARICO! ACHOU QUE IA ME DEIXAR FORA DESSA?

    A voz ecoou lá fora com a potência de um trio elétrico possuído por um demônio ciumento, sacudindo as paredes e fazendo o jovem Maximus estremecer tanto que o celular quase escapou das suas mãos suadas.

    — Mas que diabos…? — murmurou, enquanto seus olhos se arregalavam.

    — Parece que alguém está prestes a arrancar sua cabeça e usar como bola de boliche, cara. — disse Leon ecoando pelo alto-falante do celular. 

    — Olha só, finalmente vamos ver Quintus sendo desmembrado ao vivo! Preciso pegar pipoca. — comentou Gustavo, com um brilho sádico nos olhos.

    O jovem Maximus correu para o interfone e com o celular ainda firme na mão, apertou o botão para ativar a câmera externa. A imagem que apareceu na pequena tela do interfone fez seu sangue gelar.

    — Puta que pariu, é o Nyck! — exclamou com puro terror. Ele virou o celular para que Leon e Gustavo pudessem ver a imagem do interfone — É o maldito Mister Paranoia em pessoa!

    O que a tela mostrava era algo digno de um documentário sobre predadores territoriais. Nyck, o infame ‘Capitão Controle’, estava parado em frente ao portão como um touro enfurecido pronto para atacar. Seus olhos faiscavam com a fúria. 

    O rapaz extremista usava uma camiseta com o rosto estampado de uma garota, presumivelmente Eloisa, e batia no portão como um motoboy atrasado tentando acordar o zelador às três da manhã.

    — Ah, não! O Chato de Galocha em pessoa! — Gustavo soltou uma gargalhada histérica — O cara que transformou ciúme em olimpíada e ganhou medalha de ouro!

    — Eu conheço esse maluco. — acrescentou Leon, inclinando-se para mais perto da câmera — É o mesmo que fez um escândalo na cantina porque o vendedor olhou ‘de forma suspeita’ para a namorada dele quando ela pediu um suco.

    — Ele está falando de mensagens… — justificou Quintus sentindo o estômago afundar como se tivesse engolido um tijolo — Deve ter visto alguma coisa no celular da Eloisa sobre a festa da Illusia!

    “Se eu sobreviver a isso, juro que processo o Val Ferri até ele meditar na cadeia” — pensou, rangendo os dentes — “O cara me ofereceu um pacote de ‘acompanhantes para a festa da Illusia’. Resultado? Um stalker surtado tentando invadir minha casa. Isso não é desenvolvimento pessoal, é terrorismo emocional!”

    O som de mais murros no portão interrompeu seus pensamentos. Parecia que Nyck estava determinado a transformar o portão da entrada da casa em sucata de alumínio retorcido.

    — QUINTUS! EU SEI QUE VOCÊ ESTÁ AÍ DENTRO! SAI, SEU COVARDE! — rugiu o controlador tóxico.

    Uma pequena multidão de vizinhos já começava a se formar na calçada, atraídos pela gritaria como mariposas para uma lâmpada. A dona Jurema, de 67 anos, que normalmente reclamava até do barulho das folhas caindo no outono, estava lá com seus rolinhos no cabelo, filmando tudo com o celular como uma repórter de guerra experiente.

    — Cara, você precisa fazer alguma coisa! — insistiu Gustavo, que agora realmente estava comendo pipoca, saboreando o espetáculo como se fosse o último episódio de uma série viciante — Ele vai derrubar sua porta e transformar você em almoço!

    “Minha mãe vai voltar daqui a pouco! Se ela encontrar esse psicopata aqui, vai me matar antes dele ter a chance!” — pensou Quintus passando a mão pelos cabelos em desespero. 

    — Sem falar que a Snowbear deve estar chegando para vocês irem juntos à festa. — lembrou Leon — Ela vai adorar ser recebida por esse lunático.

    A menção de Snowbear foi como jogar gasolina no pânico já aceso dele. Seus neurônios entraram em modo de sobrevivência, disparando em todas as direções em busca de uma solução que não terminasse com ele sendo espancado ou, pior ainda, com sua mãe descobrindo o caos em que sua vida tinha se transformado.

    — Preciso me livrar dele! — declarou, subitamente tomado por uma determinação nascida do puro terror — Vou ter que sair escondido e resolver isso longe daqui.

    Ele desligou o interfone e correu para a janela lateral da sala, abrindo-a com o cuidado de quem desarma uma bomba. O plano era simples: escapar pela janela, pular o muro para o quintal do vizinho, e depois ligar para Nyck de algum lugar seguro para esclarecer o mal-entendido ou, na pior das hipóteses, dar as coordenadas erradas de sua localização.

    — Vocês dois, continuem online! — ordenou aos amigos — Se eu morrer, vocês são minhas testemunhas.

    — Isso se o sinal pegar no além, né? — provocou Gustavo, claramente se divertindo com a situação.

    — Boa sorte, soldado! — Leon fez uma saudação militar exagerada.

    Quando já se movimentava em direção à janela, para evitar a porta da frente e a humilhação pública de cruzar com Nyck, Quintus foi surpreendido pelo grito do próprio ciumento neurótico berrando com um de seus vizinhos:

    — Aí!? o que você está olhando, tiozinho! E essa vassoura na sua mão! Hum… Eu sei o que você está tentando fazer, viu? 

    —  Calma aí… — defendeu-se completamente confuso, o pobre senhor congelado com a vassoura na mão.

    — Calma aí? — retrucou lançando um olhar ameador, o cara que era claramente um VPN de namorada — Você acha que eu sou burro? Eu sei o que significa isso! A minha namorada… eu sei e pelo jeito voce também sabe que ela gosta de machucar… E suma daqui, pois nunca vai ser em você que ela vai brincar de… inserir isso!

    “Esse cara é completamente louco! Ele está ameaçando meu vizinho por causa de uma vassoura!” — pensou Quintus, ouvindo os gritos de Nyck do lado de fora.

    E como não bastasse, o ciumento paranóico implicou com o Sr. Teodoro, vizinho da esquerda que regava suas plantas no jardim da frente: 

    — E o senhor aí! Olhando para a janela do quarto da Eloisa todos os dias, não é? — acusou o espião do Instagram, apontando um dedo trêmulo — Acha que não reconheceria você e que não perceberia que não é ‘coincidência’ que você foi trabalhar de jardineiro na casa dela. 

    — Meu jovem. — defendeu-se o senhor de 70 anos com óculos mais grossos que um fundo de garrafa — Eu sou praticamente cego! Mal consigo distinguir se isso na minha mão é uma mangueira ou uma cobra!

    Nyck não se convenceu e girando nos calcanhares e apontou para Dona Jurema, que assistia à cena da janela de sua casa, disse:

    — E a senhora! Com essa desculpa de trazer ‘bolinhos recém-assados’ toda semana! Eu sei que ‘bolinhos’ é código para alguma coisa indecente! A receita tem formato fálico, não tem? CONFESSE!

    Dona Jurema, horrorizada, bateu a janela com tanta força que três gatos do quarteirão pularam simultaneamente.

    Com cuidado, Quintus passou as pernas para fora da janela, sentindo o vento frio em seu rosto como um presságio da caçada que estava por vir. Na pressa, ele colocou o celular sobre a mesa próxima à janela, prometendo a si mesmo que voltaria para buscá-lo assim que despistasse o predador ciumento.

    “É só pular o muro, correr um pouco e ligar para esse maluco de longe.” — pensou, tentando se convencer de que seu plano tinha boas chances de dar certo.

    Quintus aproveitou a distração momentânea de Nyck e começou a se afastar silenciosamente, mas o cara que era claramente o ‘dono da namorada’ tinha sentidos super-humanos quando o assunto era detectar potenciais ‘ameaças’ à suas posses.

    No exato momento em que ele aterrissou no jardim lateral e começou a se esgueirar em direção ao muro dos fundos, um movimento no canto de sua visão fez seu coração quase explodir.

    Nyck, com a agilidade de ladrão de celular em estação lotada, tinha escalado o portão da frente e agora erguia sua cabeça acima do muro lateral, seus olhos fixos no jovem Maximus como um predador que acabou de encontrar sua presa favorita servida em uma bandeja.

    — TE PEGUEI, SEU TALARICO! — rugiu o ciumento, com um sorriso com satisfação em proporções alarmantes.

    — PUTA QUE PARIU! — gritou Quintus, abandonando qualquer pretensão de discrição ou dignidade.

    O tempo pareceu congelar por um microssegundo. Os olhos dos dois se encontraram em um momento que poderia ter sido épico se não fosse tão ridículo. E então, como se um cronômetro invisível tivesse disparado, ambos entraram em ação simultaneamente.

    Nyck saltou o muro com a sutileza de um caminhão de gás dando ré num beco estreito, enquanto o jovem Maximus disparou em direção ao quintal vizinho com a velocidade de alguém cujas nádegas acabaram de pegar fogo.

    O quintal do Sr. Armando, um senhor aposentado que cultivava orquídeas e colecionava anões de jardim, tornou-se subitamente o cenário de uma perseguição digna de filmes de ação feito no bostil.

    Quintus pulou o muro, aterrissando em um canteiro de margaridas e causando o que provavelmente seria considerado um genocídio floral.

    — Desculpa, Sr. Armando! — gritou para o vazio, enquanto pisoteava as pobres flores que não tinham pedido para fazer parte daquela loucura.

    O problema é que, ao olhar para trás, viu que Nyck não só tinha pulado o muro também, como parecia ter sido injetado com algum tipo de soro super-soldado, pois avançava com uma velocidade inexplicável para alguém cujo exercício diário provavelmente consistia em fazer perícias digitais em mensagens apagadas, recuperar arquivos no Google Drive e interrogar reações de emoji como se fosse prova de adultério.

    Foi então que Quintus avistou sua salvação: uma pequena bicicleta infantil cor-de-rosa, com cestinha e fitas coloridas penduradas no guidão, repousando inocentemente encostada na parede da casa. Sem pensar duas vezes, ele se jogou sobre o veículo como se fosse o último bote salva-vidas.

    A cena que se seguiu desafiaria as leis da física e da dignidade humana. O jovem Maximus, com seus quase 1,80m de altura, pedalando furiosamente uma bicicleta projetada para uma criança de 8 anos, seus joelhos praticamente batendo em seu próprio queixo a cada volta do pedal. 

    Por um breve momento, ele se permitiu sentir uma pontada de esperança. Afinal, mesmo naquelas condições ridículas, estava sobre rodas, o que deveria lhe dar alguma vantagem.

    Essa esperança foi brutalmente assassinada quando, ao olhar para trás novamente, ele viu Nyck correndo como se tivesse sido treinado pessoalmente por Usain Bolt, diminuindo a distância entre eles a cada segundo.

    — MAS QUE PORRA! — ofegou Quintus, pedalando com mais força — VOCÊ É O QUÊ? UM TRIATLETA?

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