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    — Você me disse que estava presa por todo esse tempo, né? — perguntou Gaia, colocando seu manto apoiado num galho próximo. — Me desculpe. Fui muito ingênua de não perceber o que iria acontecer há cinco anos.

    O vento estava forte naquele horário, abafando as vozes que uma hora iriam sair de nossas bocas. 

    — Não foi sua culpa… — respondi, iniciando uma conversa da qual não queria começar. Iniciei alguns alongamentos que Karina havia me ensinado. — Tudo que eu quero agora é poder retribuir o que fizeram comigo.

    Estralei meu pescoço, iniciando um novo aquecimento. Tirei meu casaco, apoiando-o no mesmo galho onde Gaia colocou o dela.

    — Se vingar, né… Eu quero entender por que ela fez isso comigo — Gaia fechou seus olhos, criando sete marionetes.

    — Santa?

    — Não. Um herói — disse Gaia. Após perceber o que havia falado, paralisou-se. — Espera… A Samira que lhe prendeu?

    Só de escutar aquele nome, um ódio surgiu dentro de meu ser.

    Desgraçada… 

    Se ao menos eu pudesse ver seu rosto… Mas não! Não dava pra ver! Que merda, por que ela nunca mostrou aquele rosto?!

    — Foi… — murmurei, cerrando meus punhos.

    — Deixamos essa conversa para depois. Você não parece estar pronta para falar sobre isso — respondeu Gaia, dando forma às marionetes que ali estavam.

    Sete pessoas com cópias de bençãos, era assim que o poder de Gaia funcionava. Pelo menos foi dessa forma que ela me explicou…

    — Eu não sei se consigo vencer tantos assim — disse, coçando a cabeça. Me sentia um pouco arrependida de ter tido essa ideia, mas a curiosidade falava mais, muito mais.

    — É necessário. Você está com essa ideia estranha de explorar torres, então temos que treinar.

    O primeiro avançou, tentando me atacar por cima. Seus movimentos eram lentos aos meus olhos, sendo algo muito fácil de desviar. Me abaixei, o ar impulsionando meus movimentos, e lhe dei uma rasteira.

    A marionete foi jogada para longe, batendo em uma árvore, quebrando-se por completo. Arfava.

    Estou cansada só de ter feito isso? Não ferra…

    Gaia se surpreendeu com meus reflexos.

    — Você melhorou — disse, enviando um segundo. — Mas meus pequenos brotos ainda são melhores.

    À primeira vista, seu ataque reto em minha direção me deu uma leve sensação de estranheza. 

    Por que está tão óbvio assim? 

    Utilizei um pouco do metal que havia trazido comigo, criando um braço esquerdo temporário.

    Que droga! Ele ainda não fica estabilizado!

    Mesmo tremendo, consegui sincronizar por um breve momento. Com meu esquerdo, acabei impedindo o soco, e com meu direito, empurrei a marionete para o lado. Tudo acontecia muito rápido, meu cérebro acompanhar era um milagre.

    Após ter saído de meu campo de visão, pude ver que outra se aproximava por de trás da marionete anterior.

    Que droga! Era uma armadilha!

    Respirei fundo, meus olhos não parando de prestar atenção na arma branca que segurava. Não era ferro, impossibilitando meu uso. Em movimentos rápidos, estendi meu braço metálico para frente, segurando a cabeça da marionete com minha outra mão.

    A faca entrou dentro do ferro, que logo endureceu. O boneco se debatia, tentando tirar sua mão de dentro do metal, mas ela não ia sair, não até eu permitir. Segurando a cabeça do mesmo, imaginei com minha mente uma pequena chama.


    [Chamas da Criação.]

    A pequena floresta se iluminou por um breve momento, e a cabeça da marionete se encontrava totalmente queimada. O fogo se espalhava por seu corpo, da qual, agora se encontrava caído no chão.

    Pisei com meu pé na madeira queimada, apagando pequenas chamas do corpo, querendo evitar que algo maior ocorresse. Ainda não sabia muito bem como utilizar esses poderes de chamas vindas do Hefesto, mas deu tudo certo.

    Gaia parou, cruzando seus braços. Seu rosto estava sério, mais para preocupada do que brava.

    — O que você está fazendo?

    — Erm… Usando minhas bençãos, talvez? — respondi. Meio hipócrita de minha parte, levando em conta o ódio que eu sinto delas. Não aguento ser dependente.

    — Não, não estou falando disso — respondeu, se aproximando de mim. As marionetes haviam parado, como se tivessem sido desligadas naquele mesmo instante. — Você tá se matando assim.

    Ela pegou meu braço de forma brusca, olhando para a palma dele. Estalou a língua, jogando meu braço para longe com raiva. Não entendi sua mudança de humor repentina, mas algo havia chateado ela muito.

    — O que você viu, hein? — perguntei, olhando para a palma da minha mão. Não consegui perceber nada tão evidente naquele instante, mas ao focar um pouco, enxerguei o que havia lhe chateado.

    Minha mão estava se queimando aos poucos, queimaduras leves.

    — Percebe agora? Você não é tão resistente ao fogo quanto pensa — disse Gaia. — Essas chamas vem do seu coração! É nisso que Hefesto se baseia para criar elas. Você não saber como projetar esse fogo é muito ruim.

    Vem… do meu coração? Tudo fazia um pouco de sentido agora. Era como se seguisse minha força de vontade, se adaptando ao que sentia.

    — Como eu faço, então? — perguntei. Apalpava minha própria mão, sentindo-a perder o toque. Era um sentimento estranho.

    — Concentre a saída do fogo em vários pontos diferentes. Você cria uma explosão direta, mas isso está errado. — Gaia chegou mais perto, pegando em meu braço, guiando-me para uma posição melhor. Seu corpo estar tão perto me fazia sentir vergonha. — Aqui. Pense no fogo saindo da ponta de seus dedos.

    Fechei meus olhos, querendo evitar ver Gaia que me trazia vergonha, mas também focando no que havia me dito. Mentalizar esse tipo de coisa não era difícil, e nem um pouco difícil.

    Mas… minha mente não conseguia. Algo me impedia.

    O que? O que estava me impedindo?

    Eu quero concluir isso logo… Não aguento mais.

    Tudo é tão difícil.

    Por que tudo tem que ser tão difícil? Eu queria que fosse mais fácil.

    — Seven… não se perca em pensamentos — disse Gaia, voz calma, quase um sussurro. — Imagine a chama, mentalize-a. Ela passa por todo o seu corpo, suas veias são inundadas por fogo, e esse fogo chegará à sua mão. Sairá de forma fluida, queimando a sua vontade.

    Uma narração calma, da qual segui cada detalhe. Eu enxergava a pequena chama em meu coração, iluminando todo meu corpo. Percorria o mesmo caminho de minhas veias, saindo pela ponta de meus dedos.

    — Muito bem.

    As chamas saíam pelas pontas de meu dedo, se entrelaçando em um ponto principal. Escutava o fogo, a rajada de fogo na minha frente.

    Abri meus olhos pouco a pouco, com medo de tudo ter dado errado, mas não deu. As chamas iluminavam meu rosto, quase dançando em minha frente.

    Gaia estava feliz com o que havia feito, seu sorriso evidenciava seu entusiasmo.

    Eu tinha conseguido.

    Estava feliz.

    Muito feliz.

    Parei de expelir chamas, olhando para minha mão intacta. 

    — Vê? Quando você muda a área de um ponto fixo para vários, os danos diminuem no portador — disse Gaia, puxando-me para perto. Parecia muito mais feliz do que mostrava, seus olhos brilhavam diante dessa empolgação. 

    — É… lindo — disse. — Mas como você sabia disso?

    — É um exercício básico esse… — Seu rosto demonstrava um sorriso cínico, quase como se brincasse com minha cara.

    Ela me puxou para cima, tirando-me do chão. Igualou nossas alturas, algo que nunca aconteceria normalmente. Será que ela consegue diminuir seu tamanho?

    Nossos olhos se encontraram diante desse momento, ela sorrindo para mim, e eu sorrindo para ela.

    — Ah… como será que tá Karina agora? Espero que não tenha se metido em problemas — resmunguei.

    — Acredita que eu tava pensando nisso agorinha? — respondeu Gaia.

    Foi como se o tempo tivesse parado. Gaia começou a gargalhar, contagiando-me logo após.

    É isso que significa ser pais?

    Eu gosto desta sensação…


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