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    Ele cuspiu sangue sobre a neve. O vapor subiu como se sua alma tentasse escapar do corpo novamente. As mãos tremiam. A Pedra vibrava mais rápido, quase em frenesi. Como se quisesse romper a carne e voltar ao éter.

    — Reescrever as leis da morte… é fácil de dizer — murmurou, encarando a própria mão. — Mas ninguém fala do preço.

    Levantou-se com dificuldade. As costelas ainda ardiam. Parte do pulmão havia necrosado — ele sabia. Sentia a podridão se espalhando como um lembrete cruel: viver para sempre não era viver bem.

    Mas ele não desistiria.

    Não agora.

    — O mundo me teme porque sou o espelho — sussurrou para o vento. — Mostro o que todos escondem: que a vida, sozinha… é insuficiente. E só… ruim.

    Bastardo ergueu sua mão, sofrendo com a tremedeira. Mesmo que seu corpo ainda estivesse se adaptando, não podia deixar de admirar que a Energia fluía de sua pele como se fosse dele. Mesmo tendo que fugir, aquela tinha sido sua verdadeira batalha.

    A dor de não ter derrotado Dante era pequena demais pelo seu prazer do poder que reunia na ponta dos dedos.

    Os seus anos, torturados e cheios de tormentas, finalmente haviam sido recuperados pelo seu objetivo final. Ele precisava apenas entender seu próprio corpo agora, seu mais novo poder.

    — Os Feiticeiros do Oceânico Polar III. — Aqueles que tratavam o espírito como energia. — Eu farei uma visita a eles agora.


    O metal rangeu quando a lateral do Nokia inclinou sob o peso da onda. O céu já não era azul havia horas — só cinza, denso, pesado como chumbo. O vento cortava com a força de navalhas, e relâmpagos dançavam no horizonte. Mesmo assim, dentro da enfermaria principal, o caos era outro.

    Pomodoro mantinha os olhos fixos nos instrumentos, suando sob as lâmpadas pálidas que balançavam com o balanço do navio. Ao redor, dois assistentes seguravam Dante pelos braços enquanto o terceiro enfaixava o abdômen aberto com ataduras grossas e encharcadas de sangue.

    — Os batimentos estão caindo! — gritou um dos médicos.

    Pomodoro trincou os dentes. A mão esquerda tremia sobre o bisturi. A Pedra Lunar ao lado da maca vibrava em uma frequência irregular, como se sentisse a luta entre a vida e a morte.

    — Não me faça reconstruir você de novo, garoto… — murmurou, costurando com a precisão. Precisa estabilizar aquela energia solidificada. Mas, já tinha feito tantas vezes, e cada vez que abria um corte e o costurava, a pele se refazia em questões de minutos.

    Mas mesmo ali, no ventre do navio, todos sentiram quando algo mudou. A Energia Cósmica dele realmente tinha se tornado mais densa e forte do que o de um homem normal.

    O que ele tinha passado, Pomodoro não queria nem tentar entender.

    Um silêncio repentino, antinatural, caiu sobre o mar. Pomodoro ergueu o olhar. Um dos ajudantes, pálido como os lençóis usados, correu para a escotilha. E seu rosto se tornou ainda mais sombrio:

    — D-Dr. Pomodoro… tem… tem algo vindo. O que fazemos?

    — Um navio? — Ele pensou mais rápido quando o corte na extremidade da costela direita se abriu. — Pode ser qualquer maluco querendo um pedaço dele. Vamos terminar isso aqui antes de sairmos.

    Na torre de vigia, os sinos soaram. Um deles, o mais grave, tocado apenas em situações críticas. Depois de Dante ter assumido, eles nunca ouviram o mais grave. Era a primeira vez.

    Nero subiu as escadas com a capa balançando atrás de si, os pés ecoando nos degraus metálicos. Ao chegar ao convés, já encontrou os membros da Vanguarda ali: com uma espada já erguida, Miatamo apertava os olhos contra o nevoeiro, e Guaca em silêncio, os dedos tamborilando contra a empunhadura da espada.

    — Lá! — apontou um vigia. — A nordeste. Veja as velas.

    Aos poucos, mesmo entre as cortinas de chuva, eles surgiram.

    Primeiro, silhuetas. Depois, formas nítidas: seis navios alinhados como um cardume treinado, imponentes, avançando em velocidade incomum para embarcações daquele porte. Suas velas eram brancas, quase translúcidas sob os relâmpagos, mas havia algo nelas — um padrão como espinhos pretos, desenhados com precisão.

    As proas eram longas, curvas como garras. Nenhum som vinha deles, nenhum disparo, nenhum anúncio. Apenas aquela marcha implacável.

    Trahaus surgiu por detrás de um dos homens, sussurrando:

    — A Rainha do Norte.

    — Tem certeza? — perguntou Nero, encarando o turbilhão que se aproximavas deles.

    — Só ela usa esse brasão. Espinhos pretos sobre pureza branca. Frieza e punição.

    Nekop pigarreou, seco. O Anão, as vezes, por ser pequeno, quase não era visto por eles. Ele se aproximou dos demais, avistando com dificuldade as águas.

    — E também hospitalidade… às vezes.

    Nero avançou até a proa, os olhos fixos na frota inimiga — ou aliada. Era impossível saber.

    E então, um som estalou. Um globo metálico foi arremessado do navio da frente e caiu no mar com um silvo. Um instante depois, a voz surgiu, distorcida, clara, como se soprada direto aos ouvidos de todos no convés.

    — Aqui é a Frota da Rainha do Norte. Vocês estão entrando em águas controladas por Sua Majestade. Identifiquem-se imediatamente… ou se preparem para serem abordados.

    — Se eles querem uma luta… — os dois machados de Porto já tinham sido puxados do coldre. — A gente luta.

    — Com tantos feridos a bordo? Não. — Nekop recuou alguns passos. — Precisamos dela.

    — Responderemos?

    — Se não respondermos, eles tomam como ameaça. Se respondermos errado, disparam primeiro.

    Miatamo mordeu o lábio inferior, pensativo.

    — E se falarmos a verdade?

    — Que temos Dante a bordo, ferido? — Nero o olhou. — Que tentamos deter o Bastardo com nossas próprias forças e falhamos?

    — Talvez ela admire nossa tentativa — sugeriu Nekop, sarcástico. — Duncan avisou que tinha falado com ela antes, mas não podemos confiar na palavra de alguém que batalha por apenas influência.

    Pomodoro surgiu naquele momento pela escotilha, o jaleco tingido de sangue e algo azulado em algumas partes. Seu rosto, imundo por poeira e fuligem, eram piores do que os deles.

    — Se forem nos atacar, que o façam depois que eu terminar de salvar esse maldito.

    — Como ele está? — perguntou Nero.

    — Mal. Mas está vivo.

    O barulho de mais velas rasgando o vento os fez virar. Os navios se aproximavam rápido demais. Não pareciam prontos para disparar, mas também não os deixavam despreocupados. Era a chance deles terem um lugar para cuidar do seu Capitão, mas a palavra da Rainha ali era o que valia.

    Ações ou promessas para aquela mulher não eram nada.

    Nekop tinha um tom solene quando olhava para os navios. Até porque ela era a única que comandava o oceano estando em terra.

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