Capítulo 12 - Boa Noite, Estranho.
Enquanto caminhávamos, passamos por uma calçada que conectava a escola aos outros prédios. Ao lado dessa calçada, havia bancos alternados onde os alunos podiam se sentar e árvores que forneciam sombra.
O centro comercial ficava atrás da escola, a uma curta distância, e o dormitório parecia estar à direita, também a uma curta caminhada. Fiquei me perguntando se tudo isso era coincidência ou se havia algum propósito por trás.
Ao chegar no prédio dos dormitórios, Okawara me levou até o terceiro andar pelo elevador e me mostrou meu quarto.
— Aqui será o seu quarto. Toma esse cartão e guarda bem. Se perder, vai ter que pegar o reserva. E se perder o reserva, vai ter que pagar com pontos. E garanto que não será barato… Hahahaha! — disse ele, rindo de forma diabólica enquanto colocava um palito de dente na boca.
— Onde ele pegou esse palito? — pensei, confuso.
— Peraí, onde estão minhas coisas que estavam no carro? — perguntei.
Lembrei que tinha deixado minhas coisas no carro. Não eram muitas: algumas roupas que ganhei na CDA e o cubo mágico que a Emiko me deu.
— Suas coisas já estão aqui no quarto, pirralho! — respondeu Okawara, soltando mais um xingamento. — Eu comprei biscoitos pra você comer. Rápido e prático, sem necessidade de tarefas complexas, já que você tem apenas sete anos.
Okawara pegou o ramen de dentro da sacola e começou a exibi-lo para mim.
— Depois te ensino a preparar esse ramen também. Agora guarda tudo no armário e desce com o biscoito pra comer no caminho, porque vamos à rouparia pegar seu uniforme. Entendeu ou vou ter que repetir? — disse ele, com uma expressão impaciente no rosto.
— Tá bom! Eu entendi!
Okawara era realmente uma pessoa difícil de lidar. Além de impaciente, parecia bem agressivo. Melhor não brincar com ele, ou eu me arrependeria.
— Vou te esperar no primeiro andar. Dá uma olhada básica no seu quarto e desce rápido, não temos tempo a perder! — comentou ele, com um tom grosseiro.
O quarto era bem simples, mas, comparado à minha antiga casa, parecia um luxo. Pequeno, mas com tudo o que eu precisava: uma cozinha com fogão, armários, geladeira e pia. Uma sala com sofá e TV – algo que nunca tive. O banheiro era grande e confortável, e meu quarto tinha uma cama pequena e um guarda-roupa. Um espaço simples, mas muito melhor do que minha antiga casa. Eu me acostumaria rápido.
Depois de guardar os alimentos que Okawara comprou, saí do quarto e fui até o primeiro andar.
— Que demora, garoto. Por sua causa, agora vamos ter que andar bem mais rápido! — reclamou ele, levantando-se de uma cadeira na recepção.
— Ah… desculpa. Eu tava guardando as coisas que você comprou! — expliquei.
— Tanto faz. Vamos logo! — resmungou ele, já se virando em direção à saída.
Pra não ficar muito atrás, corri também. Mas no meio do percurso acabei tropeçando nos meus próprios pés.
A queda no chão machucou meu joelho. Nada muito sério, apenas um arranhão.
— Menino, você está bem?
Uma voz doce e feminina soou atrás de mim. Me virei para ver quem era. Seu rosto redondo não era familiar. Provavelmente era a primeira vez que a via.
— Oh garoto, meu Deus do céu, você não consegue nem andar direito? Vira homem, rapaz! — disse Okawara, vindo na minha direção.
Fiquei um pouco avermelhado de vergonha com o que acabara de acontecer. Respondi a mulher apenas com um aceno de cabeça.
Ela ergueu a mão para mim, claramente querendo me ajudar a levantar. Seus olhos vibrantes me encaravam com ternura.
O brilho das lâmpadas do teto refletia ao redor de sua cabeça, favorecendo sua boa ação, como se fosse uma espécie de anjo.
Com um lindo sorriso no rosto, ela disse:
— Não se preocupe, é normal tropeçar no chão. Na vida, sempre iremos cair. Isso só se torna um problema quando você cai e não se levanta mais.
Com essas palavras, peguei sua mão – macia como pelúcia e quente como uma panela que acabou de sair do forno – e me levantei.
Na vida, sempre iremos cair. E se pensarmos que cair uma vez significa que o destino é permanecer no chão, nunca mais levantaremos.
Mas eu creio que, se permanecer no chão fosse o único caminho para driblar a vida, também estaríamos driblando nossos sonhos e desejos. Estaríamos jogando fora uma vida de prazeres e felicidades.
Dito isso, prefiro cair várias vezes, mas sempre me levantar, do que permanecer caído e observar a felicidade desvanecer diante dos meus olhos.
— Ow, moleque?! Tá surdo? — gritou Okawara.
— Ah… desculpa! Eu tava pensando em uma coisa aqui… Obrigado, moça, por me ajudar! — agradeci.
— Por nada. Até mais, viu? — disse ela com um sorriso enorme.
Okawara, por outro lado, estava com a expressão fechada. Suas sobrancelhas quase se encontravam de tanta raiva.
— Você só me estressa, garoto! Só me faz passar vergonha nesse lugar?! — gritou ele, com os punhos fechados.
Levantei os ombros e os braços, pedindo desculpa.
— Não é culpa minha se você é estressado! — respondi, de olhos fechados.
— Droga! Enfim, vamos logo antes que eu mude de ideia!
Como se ele tivesse essa escolha.
No caminho até nosso destino, resolvi ficar calado para não estressar mais o Okawara.
Comi o biscoito que ele me pediu para trazer. Mesmo assim, não tirou minha fome. Minha barriga continuava roncando.
Enquanto segurava a barriga, vi um cara de capuz preto vindo na nossa direção. Não dava para ver seu rosto, então eu não fazia ideia de quem podia ser. Mesmo que mostrasse o rosto, provavelmente eu não saberia quem era.
Mas tinha algo estranho. Ele estava com as mãos no bolso e com capuz. E nem estava frio!
A cada passo que ele dava, eu me aproximava mais de Okawara, até segurar sua mão.
— Que isso, moleque? — disse ele, soltando minha mão.
Não disse nada. O homem estava perto demais e eu não queria que ele ouvisse.
Estávamos num caminho que levava à praça central, cercado por arbustos dos dois lados, limitando o brilho da lua. Isso deixava o caminho ainda mais escuro.
Quero muito ver o mapa desse lugar. Se esse caminho já é assim, imagina o resto.
Ele já está muito perto.
Em questão de segundos, o tempo pareceu desacelerar. Tudo ao meu redor ficou mais lento.
Tentei evitar olhar para o rosto do homem, mas não consegui. Virei os olhos na direção dele, com um único objetivo: olhar em seu rosto.
Vi. E não apenas isso. Notei que sua boca se mexia. Ele estava dizendo algo?
Seu rosto não era familiar. Nunca o vi antes.
Mas toda a tensão passou. Ele seguiu seu rumo, e nós seguimos o nosso.
De primeira, não prestei atenção ao que ele disse, pois eu estava focado em seu rosto. Mas agora me lembro. Ele disse: “Boa noite”.
Ou seja, todo aquele medo foi desnecessário. Me sinto tão patético agora.
Virei para trás, por reflexo, apenas para confirmar se ele realmente foi embora.
Mas, ao me virar, vi o homem parado, olhando para mim, com um sorriso extremamente suspeito no rosto.
— AAAAAAAA! — gritei, correndo para longe, apavorado com o que vi.
Que olhar terrível aquele homem tinha!
— Ow, que foi, sua peste?! Você não cansa de me estressar?!
Okawara correu atrás de mim e me alcançou em poucos segundos.
Ele segurou meu braço e perguntou, com um tom bem grosseiro:
— Que que foi agora? Viu o bicho-papão?
— O HOMEM! O HOMEM ATRÁS DE NÓS… ELE… ELE TAVA SORRINDO… TAVA PARADO, OLHANDO PRA GENTE!!! — tentei explicar, gaguejando de medo.
— Você está maluco? Para com essas gracinhas, sua peste! Se você é carente e quer atenção, não me envolva nisso! — disse ele, soltando meu braço e voltando a caminhar normalmente.
Fiquei paralisado olhando para trás. O homem não estava mais lá. Ou pulou nos arbustos ou correu muito rápido e se escondeu nas curvas do caminho.
O que foi isso? Alucinação? Ou o Okawara está aprontando comigo?
De qualquer forma, não quero ficar parado aqui, longe do meu professor.
Depois dessa loucura, conseguimos chegar à rouparia. Okawara pegou um uniforme com a funcionária para eu experimentar e tudo deu certo.
Esse lugar é bem bonito, tinha muitas roupas além de uniformes. Provavelmente vou poder comprar roupas aqui para mim, e já estou até mirando em uma, essa blusa preta com esse menino de quimono verde e preto, Tangerino Kamado é o nome que está nessa blusa, que legal!
— Tem outro caminho para a gente voltar não, professor? — perguntei.
— Vamos pelo caminho que eu quiser! — respondeu ele, com toda a grosseria do mundo.
— Tá bom…
Voltamos pelo mesmo caminho. E do mesmo jeito: ele em silêncio e o clima estranho. Mas dessa vez, nada aconteceu, e chegamos ao dormitório sem problemas.
— Descansa aí, porque amanhã é o primeiro dia de aprendizado comigo. Às seis da manhã estarei aqui na sua porta, e espero que esteja pronto, senão vai se arrepender… — disse ele, com seu jeito ameaçador.
— Tá bom, né… Boa noite pra você também, viu?
Ele saiu antes que eu terminasse de falar. Que cara chato…
Pela minha idade, é um pouco assustador me deixarem sozinho em um quarto. Podem acontecer várias coisas ruins, como eu botar fogo aqui ou até mesmo alguém entrar e me matar.
Espero que nada disso aconteça. Por enquanto, preciso focar em me tornar um bom aluno e me formar nesta escola, para poder sair daqui e ir atrás dos meus pais.
Eu realmente esqueci, por um curto tempo, que eles existiam e acabei focando só em mim. Mas não posso esquecê-los. Tenho muitos mistérios para resolver ainda, como o símbolo nos livros da minha mãe ser o mesmo das roupas das mães na CDA. Isso é muito estranho. Preciso investigar.
E quanto à mulher nos meus sonhos… Será que vou vê-la de novo hoje? Querendo ou não, ela é a única figura da minha vida antiga que ainda vejo.
Mesmo sendo só um personagem nos meus sonhos, não quero parar de vê-la. Só assim consigo não esquecer dos meus pais e dos meus objetivos.
Mas, por enquanto, preciso me adaptar a este lugar e aprender tudo que for necessário pra continuar com meus planos e investigações.
Boa noite, mãe. Boa noite, pai. E boa noite, Kuma, onde quer que estejam.
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