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    Em outra parte da cidade, duas pessoas caminhavam por uma rua pouco movimentada. As paredes ao redor estavam sujas e cobertas de pichações, sinal claro de que se tratava de uma área perigosa. Alguns delinquentes bebiam e fumavam encostados nos muros, lançando olhares mal-intencionados em direção aos dois estranhos que se aproximavam de um bar. No entanto, esses olhares não pareciam intimidar nenhum dos dois.

    Logo, um deles abriu a porta do bar, fazendo com que todos os presentes interrompessem o que estavam fazendo para olhar. A luz do sol que entrava pela porta rapidamente desapareceu, dando lugar a um clima frio e escuro. O céu, antes azul, agora adquiria um tom vermelho. O homem parado na entrada era Raishi, que entrou tranquilamente no bar com um sorriso estampado no rosto.

    — Mas que espelunca! — reclamou a garota que o acompanhava — Você só me traz aos lugares mais horríveis da cidade. Se a sua companhia não fosse boa, eu estaria extremamente chateada.

    Ela estava um pouco atrás de Raishi, relutando em entrar naquele local triste e sem vida, mas logo cedeu e o acompanhou, ainda que mantendo certa distância.

    — Olá, olá, desculpem-me a falta de educação, amigos. — disse Raishi com um tom teatral — Permitam-me me apresentar. Sou Raishi Kurogane, e sejam bem-vindos ao… Mundo Invertido!

    O sorriso no rosto de Raishi desapareceu repentinamente, e todos os presentes se levantaram assustados com aquele anúncio inesperado. Ruby se aproximou dele com uma expressão entediada e puxou uma cadeira, sentando-se sem dizer uma palavra. Enquanto isso, Raishi observava atentamente cada uma das pessoas ali presentes, como se as analisasse uma por uma.

    — Estão procurando encrenca?! Pois estão no local errado. — disse um dos valentões do bar, aproximando-se de Raishi — Seja lá o que for esse “mundo invertido”, eu aconselho que desfaça isso agora mesmo.

    Porém, antes que pudesse tocá-lo no ombro direito, o braço do homem foi completamente invertido, deixando seus ossos expostos. Um grito de dor ecoou pelo local enquanto ele se afastava rapidamente, segurando o braço com desespero.

    — N-Nós não fizemos nada! Não há necessidade disso. Por favor, deve haver algum engano.

    Disse o homem que estava atrás do balcão, tentando manter a calma apesar da tensão no ar. Parecia não querer confusão em seu estabelecimento

    — É proibido usar Manifestação Espiritual no meu estabelecimento. — Afirmou ele — Então, por favor, saiam.

    — Proibido?! Vocês ratos invadem esse mundo, se apropriam de coisas humanas e ainda impõem regras?! — exclamou Ruby, com desdém — Não me faça rir. Vocês são patéticos. Raishi, querido, seja breve.

    Ela brincava com um copo vazio que havia pegado de uma das mesas. Suas palavras duras ecoaram pelo local, atraindo olhares furiosos. Era evidente que todos ali eram Extra-humanos escondidos na Terra. Com um movimento casual e proposital, ela deixou o copo cair no chão, que se espatifou ao tocar o piso.

    — Eu farei apenas uma pergunta — disse Raishi, em tom firme — E eu sei que algum de vocês tem a resposta. Mas, antes, deixem-me contar algo sobre o Mundo Invertido… Vocês estão sobre as minhas regras, então tomem muito cuidado com suas escolhas.

    Ele caminhou lentamente até o balcão. À medida que avançava, mesas e cadeiras começaram a se retorcer e se inverter. Os clientes se afastavam, assustados com a manifestação. Num piscar de olhos, todo o bar estava de cabeça para baixo. As mesas e cadeiras presas no teto.

    — Estou procurando oito indivíduos. Para ser bem mais específico… Oito animais. Acho que vocês já devem ter ouvido sobre a Ordem dos Cavaleiros Brancos. Então aqui vai a pergunta. Onde eles estão? Se responderem corretamente, eu pouparei todos vocês.

    Um dos presentes gritou:

    — Você não tem poder para isso! Acha mesmo que uma ilusão dessas vai nos assustar?! Isso não nos fará dizer nada. Vamos acabar com eles agora mesmo rapazes!!!

    Alguns homens avançam contra Raishi e Ruby. Ela continuava sentada, indiferente. Antes que pudessem se aproximar, os ossos dos agressores se retorceram violentamente, quebrando-se em múltiplos pontos até que seus corpos tombassem no chão, já sem vida.

    — Falei para terem cuidado com suas ações no Mundo Invertido — Raishi dizia com a voz calma — Mais alguém quer sentir as consequências?! Ou será que finalmente me darão a resposta?

    Puxou uma cadeira e se sentou próximo ao balcão, encarando o atendente com um sorriso leve. Com o dedo indicador da mão direita, passou a tamborilar o balcão lentamente, mantendo os olhos fixos no homem.

    — O tempo está passando… Cada minuto aqui não é nada bom. Se não me responderem logo, esse local continuará a se inverter até um ponto que será irreversível. Basta me falar onde estão os oito animaizinhos e eu irei embora. É um pouco injusto eles esquecerem de um deles, não acha?

    — Um deles?! — exclamou um cliente qualquer — Então você é o Coelho?! Nesse caso, aquela garota é a Raposa! O que vocês dois fazem aqui?! Vocês desapareceram há muito tempo, por qual motivo estão atrás da Ordem?

    O balconista estava visivelmente assustado após descobrir quem eram aquelas duas figuras. Se realmente estavam atrás da Ordem, usariam qualquer método necessário para conseguir o que queriam.

    — Por qual motivo?! É simples. Um deles atacou e quase matou um dos meus discípulos, e eu não gostei nem um pouco disso. Então está na hora de pôr um fim nisso, não concorda?

    Os olhos frios e penetrantes de Raishi encaravam o homem, que começava a tremer de medo. Ruby, por sua vez, levantou-se da cadeira e caminhou lentamente em direção ao balcão, enquanto o bar já se tornava quase irreconhecível.

    — Se você tem um pingo de amor aos seus clientes — disse ela, entediada — Eu o aconselho a responder. Meu Coelho não costuma brincar, nem ao menos mentir. Apenas responda e vocês estarão livres.

    Ruby então tocou levemente a mão direita de Raishi, fazendo com que ele interrompesse o movimento repetitivo do dedo sobre o balcão. As poucas pessoas que ainda permaneciam ali estavam apavoradas demais para reagir. Ruby lambeu os lábios, saboreando o desespero que pairava no ar.

    — T-Tudo que eu sei é que eles realmente estão aqui na Terra. Dizem que eles pretendem tornar esta cidade um local livre e seguro para todos nós. Seus alunos e vocês são um problema, principalmente você. — Confessou gaguejando.

    De maneira desajeitada e tremendo muito, o homem entregou a Raishi um medalhão com uma pata. Aquele era o brasão da Ordem, e essa era a prova de que eles estavam mesmo na Terra.

    — Tudo que sei… — continuou ele — É que essa cidade está localizada em uma Fragmentação Dimensional, graças a isso ela seria ideal para um novo lar. Foi isso que eles espalharam para todos, que esse será o nosso novo lar e que pessoas como vocês dois tomaram isso apenas para si, por isso deveriam ser eliminados.

    — Eu concordaria com você, se esse objetivo não passasse de uma utopia. Esse não é o nosso mundo, e nunca será. Tomá-lo à força só prova o quanto não aprendemos com a queda do nosso antigo mundo. A Ordem está certa, eu não irei permitir que isso aconteça.

    Sem dizer mais nada, levantou-se. Ruby perguntou se ele havia terminado, e ele confirmou com um simples aceno. Juntos, caminharam até a saída do bar, que agora era uma janela deformada pelo espaço. Num piscar de olhos, o céu voltou a ser azul, e a luz do sol retornou como se nada tivesse acontecido.

    Mas dentro do bar, restavam apenas os cadáveres. Corpos pendiam das paredes e do teto, imóveis, sem vida. Todos ali estavam mortos desde o início.

    — Raishi! Você realmente matou todos! Você mentiu?! Ou sua intenção sempre foi matá-los desde o início? E agora? Qual o plano? Vamos atrás deles agora?

    Ruby o questionou, confusa. Ela o olhava surpresa por tê-lo visto quebrar sua palavra, mas também notou que o local já não era mais sujo e perigoso. Tudo aquilo era resultado da Manifestação de Raishi, que havia invertido o ambiente, substituindo-o por uma versão melhorada.

    — Não faremos nada. — Ele falou com naturalidade — Eles já estão de olho em nossos movimentos há muito tempo, agora eu lhes dei um motivo maior para que comecem a se mover. Eu tenho certeza de que eles morderam a isca. Vamos embora logo, já chamamos atenção demais por hoje.

    Ele seguiu calmamente pela rua, como se nada tivesse acontecido. Em determinado momento, desviou levemente o olhar para a esquerda, percebendo que algo pequeno os observava entre as sombras. Um leve sorriso surgiu em seu rosto, enquanto Ruby tentava segurar sua mão. Logo, os dois se retiraram dali, deixando toda aquela bagunça para trás.

    O ser que os observava das sombras tratava-se da Manifestação do Coruja. Prontamente ela vai à procura do seu dono.

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