Índice de Capítulo

    Clinc, clinc.

    Eu avançava pelo mar de fogo rolando uma pedrinha do tamanho certo na palma da mão. Era o item que o guia havia encontrado usando a habilidade Detecção de Sorte e depois me entregado… Claro que não era algo comum. Mas também não era nada extraordinário.

    “Vender não faz sentido…”

    Isso. Eu mesmo usaria. Poções e itens desse tipo não deviam ser dados nem para a família. Tomada a decisão, esmaguei a pedra com a força dos dedos indicador e polegar.

    【O personagem destruiu a Pedra da Alma da Terra.】

    【A resistência à Terra aumenta permanentemente em +3】

    【O poder espiritual aumenta permanentemente em +10】

    Não era um efeito que se pudesse sentir de forma gritante, mas era algo para a vida inteira. Ainda assim, depois de rodar tanto com Detecção de Sorte, ter conseguido apenas isso não era tão satisfatório. Ao menos havia uma compensação: tínhamos encontrado o mais importante de todos.

    “…Bom, mesmo assim não sei como isso vai acabar.”

    — A-Alí! Deve ser aquilo!

    O guia que corria na frente parou de repente e apontou. Os que vinham atrás logo começaram a murmurar. Era natural: aquilo que nenhum explorador poderia deixar de reconhecer estava bem diante de nós.

    — Um portal…?

    No meio das chamas ardentes, tremulava um portal. Mas diferente dos que costumávamos ver. Suas cores se misturavam em vermelho, azul, verde e cinza.

    Fuuuuum…

    A Porta dos Espíritos. O único meio de sair do Salão Eterno, e também…

    “…um atalho.”

    Passei pelo guia e me aproximei do portal, quando alguém atrás de mim gritou em alerta:

    — Cuidado! Não sabemos para onde esse portal pode levar…!

    Vindo de alguém que sabia muito bem do que se tratava, aquela advertência soava até engraçada.

    — …Ah! O senhor sabe algo sobre ele?

    — Mais ou menos.

    O portal tremulava diante de mim. A Porta dos Espíritos era uma porta para qualquer lugar.

    Até o nono andar. Desde que o explorador já tivesse estado lá ao menos uma vez.

    Com essas duas condições cumpridas, o portal levava ao local desejado. Também era possível usá-lo para ir a fendas ou campos ocultos…

    “…até mesmo para andares já fechados.”

    Claro, nesses casos o prazo de fechamento do nono andar servia como referência, e alguns segredos ocultos só podiam ser descobertos usando esse método… mas agora isso não importava. Até porque, em meio a um colapso dimensional, datas de fechamento não faziam diferença alguma.

    “Se eu entrar agora… o que será que acontece?”

    Tudo o que descrevi até aqui valia apenas em ‘situações normais’. E em quase dez anos jogando Dungeon & Stone, nunca tinha entrado em um portal desses durante um colapso dimensional.

    “Mas seria desperdício chegar até aqui e não entrar, né?”

    Decidi.

    — Assim que eu entrar, se as cores do portal mudarem, todos vocês entram também.

    — …O quê?

    — Não se preocupem. Não é perigoso. Esse portal pode levar a qualquer parte do labirinto.

    Expliquei brevemente sobre a Porta dos Espíritos e, com isso, os olhares desconfiados se acalmaram. Mas logo surgiu outra dúvida.

    — Então precisamos mesmo usá-lo? No fim das contas, quando o período de estabilidade terminar, o colapso vai recomeçar.

    — O período mínimo é oito horas, não significa que sejam exatamente oito.

    — Entendo. Então o senhor julgou que pode tirar proveito disso no intervalo.

    — Isso. Além disso, de acordo com um antigo tomo que li, só de atravessar esse portal já se recebe uma bênção.

    — Uma bênção… ah, quer dizer um batismo!

    — Isso mesmo.

    Aliás, os jogadores de Dungeon & Stone chamavam o batismo simplesmente de conquista.

    — Nesse caso temos que entrar!

    — Não se preocupe! Vamos atrás do senhor imediatamente!

    Os olhares dos sobreviventes mudaram na hora. A menção a conquistas tinha sido decisiva. Afinal, era raro um explorador que desprezasse bônus de atributos. Todos eram obcecados por essas ‘poções permanentes’.

    — Então está decidido…

    Dei um passo lento em direção ao portal.

    — Nos vemos do outro lado.

    Certo… agora, qual será o melhor destino?

    【O personagem entrou no Atalho.】

    Atalho. Na verdade, esse mapa não tinha nada de muito marcante. No jogo, ao atravessar a Porta dos Espíritos, apenas se abria o mapa. Bastava escolher o local desejado e pronto. Mas…

    “Então essa é a sensação real…”

    Não era a primeira vez que eu sentia o abismo entre os gráficos 2D em pixel art e a realidade. Fora assim também na Sala do Equilíbrio, quando usei o Desejo Controlado no Labirinto de Larcaz, e no templo, ao apagar uma essência. O jogo e a realidade eram bem diferentes. Como agora.

    “Então aquilo é o mapa…”

    Um espaço negro, como o universo. Ao erguer a cabeça, via um imenso tabuleiro dividido em andares.

    “O de cima deve ser o nono andar…”

    Tudo bem, mas como se chegava até lá? Pensava nisso quando olhei para mim mesmo.

    “O que é isso agora?”

    Eu segurava uma bandeirinha estranha na mão. Mais ou menos já entendia seu uso.

    “Se eu fincar isso, deve fixar o destino.”

    Mas isso não era o mais importante.

    Fuuuuum…!

    Meu corpo começou a brilhar em azul, como uma chama espiritual. Meus equipamentos haviam desaparecido, e eu estava nu, flutuando como um espírito. Estranhamente, a sensação de estar levitando parecia natural. Era como se tivesse adquirido um novo órgão: eu simplesmente sabia instintivamente como me mover, sem precisar dos pés.

    Ugh, que susto.”

    No mesmo instante em que pensei em avançar, meu corpo disparou para frente. A velocidade era absurda, mas não parecia rápida. Como se tivesse transcendido as leis da física.

    “Então é assim que se faz.”

    Já com a noção de como me mover, rumei para o andar mais alto. A visão do nono andar, o Túmulo Estelar, surgia diante de mim como se eu o observasse de milhares de metros acima.

    “…Embora não dê pra dizer que realmente seja isso.”

    O mapa mostrava apenas contornos, todo o nono andar coberto por uma névoa escura. O natural, já que eu nunca havia estado no Túmulo Estelar.

    “Então a vez que fui por fora da muralha não conta…”

    Era o esperado, nada decepcionante. Algumas áreas, no entanto, apareciam abertas entre buracos da névoa. Pareciam ser os locais que eu havia cruzado durante o colapso dimensional.

    “Os campos especiais flutuam separados como satélites.”

    Espaços independentes pairavam ao redor do nono andar. Um deles se destacava, completamente visível: o Salão Eterno, por onde eu tinha acabado de passar. Afinal, eu havia explorado muito durante o período de estabilidade…

    Fuuum…

    Com interesse, desci até ali. Visto de cima, o lugar parecia sombrio. Como se eu assistisse a tudo através de um filme sépia. As chamas rubras da zona de fogo eram cinzentas e imóveis, como se o tempo tivesse parado.

    “Claro, não dá pra entrar onde há névoa.”

    Tentei, mas como esperado, uma barreira invisível me bloqueou.

    Fuuuuum…

    Segui então pelo caminho sem névoa. No mundo real, tínhamos demorado mais de seis horas para explorar tudo aquilo, mas dessa vez cheguei à Porta dos Espíritos em um instante. Diante dela, meus companheiros estavam congelados como estátuas.

    Se eu marcasse aquele portal como destino, daria para atravessar a Porta dos Espíritos infinitamente?

    Enquanto me perdia em divagações inúteis, me dei conta:

    “Espera… mas que diabos?!”

    Aquilo não mostrava apenas o mapa. Se fosse só isso, meus companheiros não estariam ali na frente do portal.

    “Então… isso tudo é ao vivo…?”

    Um arrepio me percorreu. Mesmo como espírito, senti como se a pele se ouriçasse. Faz sentido.

    “Com isso… eu posso encontrá-los.”

    Sim, era possível. Encontrar os companheiros que se perderam durante o colapso dimensional.

    “…Nunca pensei que a Porta dos Espíritos tivesse esse tipo de recurso.”

    Era absurdo demais. Para mim, a única prioridade era buscar meus aliados, mas o risco que esse ‘modo ao vivo’ representava era indescritível.

    Não era questão de espiar por baixo da saia da sacerdotisa, flagrar roubos ou ver qual clã estava explorando onde. O problema era outro.

    “Se fosse em guerra, só por entrar aqui já daria para saber onde todo mundo está…”

    Com más intenções, seria possível rastrear e assassinar qualquer um. Pensando no Matador de Dragões, por exemplo. Se ele tivesse usado isso, já teria aparecido diante de mim do nada.

    Fuuum…

    Ao perceber a dimensão do poder da Porta dos Espíritos, voei direto para o oitavo andar. A ideia era descer andar por andar.

    “Esse é pequeno.”

    A Terra do Alvorecer, no oitavo andar, era minúscula comparada à vastidão do nono. Na verdade, os campos ocultos que flutuavam ao lado eram bem maiores.

    “Devido às fendas, o número aqui é enorme.”

    Mas estavam todos cobertos pela névoa. O único ponto digno de nota era a planície na entrada da Terra do Alvorecer, onde dezenas de exploradores se reuniam. Divididos em três grupos, mantendo certa distância. Pelo visto, a coincidência de períodos de estabilidade os fizera se encontrar.

    “Não vejo nenhum rosto conhecido…”

    Passei direto. Eu até reconhecia alguns colegas de profissão, mas não era o bastante para marcar destino por eles. Se fosse alguém como o Senhor Urso, aí sim pensaria duas vezes.

    “Então o sétimo andar é assim.”

    O sétimo andar estava dividido em dois: o Continente Negro e Rochedo Gélido. Flutuavam separados como ilhas. Eu já havia explorado bastante aqui, então o mapa mostrava uma grande área descoberta, embora ainda houvesse um terço coberto por névoa. O normal, já que explorar exigia sempre as rotas mais eficientes.

    “E quanto maior o continente, mais gente.”

    Vários exploradores passavam pelo período de estabilidade no sétimo andar. De cima, era fácil ver grupos a cada poucos minutos.

    “…Eles nem devem imaginar que há outros sobreviventes tão perto.”

    Era quase como ser um deus onisciente. Mas só parecia. Eu não podia avisar um grupo sobre outro acampado por perto, nem alertar sobre monstros espreitando na escuridão. Eu não era um deus de verdade.

    “Próximo.”

    Depois de varrer o sétimo andar, desci para o sexto. Como aqui se viajava de navio, a maior parte aparecia coberta pela névoa. Mas…

    “…Está mais calmo do que pensei.”

    Não havia ondas gigantes. Pelo contrário, o mar parecia até mais tranquilo que o normal. Fui até o local onde o Lorde das Lágrimas costumava ser invocado, mas não havia nada. E não estava no lugar errado.

    “…Será que ele também foi arrastado pelo colapso?”

    Parecia a hipótese mais provável. No sétimo andar, eu já tinha visto montes de monstros de outros andares.

    “Então aquele desgraçado deve estar em algum outro andar…”

    Um arrepio me percorreu de novo. Só o colapso dimensional já era dor de cabeça, agora tinha que me preocupar com aquela aberração também.

    “…Bom, ainda não cruzei com ele.”

    Lembrei-me do meu objetivo e segui a busca pelo 6º andar. Talvez meus companheiros estivessem em alguma das ilhas, sobrevivendo ao período de estabilidade. Vasculhei cada uma com atenção até que…

    “…Oh.”

    E pela primeira vez, encontrei rostos conhecidos.

    “…Não é possível.”

    Era a equipe de Baekho Lee.

    Um pequeno gesto, um grande impacto!

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