Capítulo 33: O levantar do corpo seco
— Unhudo, aprendemos com os animais que comem carniça, às vezes esperar que a presa morra por conta do acaso ou por outro predador para comer os restos é a melhor forma de sobreviver, e poupar energia, no entanto está é a carniça que te devora! — explica Li Han aos seus alunos, o que é aquele ser.
Seco, a carne está tão seca que é quase uma com os ossos, é possível ter a visão perfeita do esqueleto, visivelmente percebesse que se trata de um homem, do cadáver de um, deteriorado, sem lábios, sem narinas ou qualquer cartilagem, sem pelos algum, ao mesmo tempo que parece um defunto, a carne não está podre, sem nenhuma umidade, completamente seco, conservado.
Em estado medonho, o que assusta é a falta de mais camada de pele, a fina que resta, por esta desidratada se rompe facilmente, com coloração quase que transparente, o que deu cor a ele, foram as cinzas.
Li Han sempre quando depara com tal criatura, tem o mesmo pensamento intrusivo “É o sonho de muitos médicos, dá pra ver cada músculo com perfeição’’. Mas o pensamento de Dembele é o mais assombroso, seus olhos não desgrudam do monstro, se focando no buraco no plexo solar, algo que atravessou aquele corpo, que possui a mesma estatura.
— Aquilo é uma pessoa! — afirma Dembele, apontando para o monstro
— Você que sabe sobre essas coisas bizarras Saikyo, o que é aquilo? — questiona Hiro, após se assustar com a reação de Dembele.
— Parece um corpo seco, surgem quando nem mesmo o céus, a terra e o inferno aceitam tal defunto, até mesmo vermes rejeitam comer de sua carne, então o corpo seca, mais ainda permanece de alguma forma, com vida, dizem para tomar cuidado ao olhar direto para seus olhos, para não entregar a ele a sua alma! — descreve Saikyo.
— Não pode ser só alguém desnutrido com muita fome? — retruca Hiro, de forma irônica, mantendo o seu ceticismo.
O corpo seco abre a boca, é possível ver o vazio, faz gesto similar ao de bocejar, os alunos e Dembele ficam espantados, ao mesmo tempo intrigados para ver o que vai acontecer, Saikyo se pergunta “Este ser respira?’’.
O corpo seco suga ar, para dentro de si, apesar de seus pulmões não funcionarem. O que é ativado em seu corpo, são seus olhos completamente esbranquiçados, que mudam de cor, ficam com pupilas vermelhas, sem íris e a córnea fica totalmente enegrecida, sem presença de cor alguma, a luz não a toca mais.
É quando algo chama atenção de Hiro, que os outros não veem, ele pensa “O que é aquilo que eu vejo? Quase não tem cor, fumaça?’’, ele vê o ar que o corpo seco suga para dentro da boca, é uma espécie de névoa densa, cinza neblinada.
— Que névoa é aquela Saikyo? — pergunta Hiro a sua amiga.
— Névoa? — pergunta a garota, confusa sem ver o que Hiro se refere.
— É, parece até fumaça! — complementa o garoto, a sua explicação sem certeza do que realmente vê.
— Se a fumaça, há fogo, porém, eu posso não ser tão bom quanto o Picon, mas tenho certeza que eu sentiria o cheiro de algo, se não pudesse ver! — responde a garota, confusa com as afirmações de seu amigo.
— Devo estar alucinando! — afirma Hiro.
— Eu também, aquele corpo, pois aquilo é o cadáver de alguém que eu conheço! — afirma Dembele, que começa a tremer, apoiando a mão nas frestas do buraco do celeiro, segurando as lágrimas, certo de que aquele é o seu antigo colega de trabalho.
A umidade nos olhos de Dembele atrai o corpo seco, neste momento Li Han se aproxima do monstro, abrindo a base das pernas, as flexionando, se posicionando para o ataque, se concentrando, Hiro vê sair de Li Han a névoa que ia em direção a boca do corpo seco.
— Foque em mim! — diz Li Han, e este gesto é o suficiente para unhudo se focar nele.
Habilidoso, ele já liga um fio fino ao pomo de seu sabre, tão fino que para olhos comuns se torna invisível, o corpo faminto se atrai pelo corpo em sua frente, e salta ferozmente, executando a única tarefa que seu instinto ordena, devorar. Li Han reage erguendo sua espada acima de sua cabeça, apontando a ponta da lâmina para o corpo seco, e com veloz movimento durante a aproximação dele, some de sua frente, fazendo pequenos cortes em sua carne, e se colocando aparecendo do corpo seco. Que ao pousar no chão, nem se quer reage, apenas marcha em frente para atacar aquilo que está diante ao seu olhar, na fresta que ele mesmo abriu pelo celeiro, atraído pelas lágrimas presas.
— Está vindo para cá, ele quer se vingar de mim, eu o abandonei! Eu tenho culpa! — acusa Dembele, a si mesmo, se culpando naquele momento, apertando a madeira, a ponto da suas mãos sangrarem, ele fica paralisado.
— Eu não sei se o que fala é verdade, mais a gente não pode deixar você morrer aqui, antes de ter a chance de se redimir! — diz Hiro, heroicamente o garoto salta a frente para enfrentar o monstro que avança contra ele.
— Hiro se afaste, você não pode ferir algo que já está morto, é im . . . — Antes que Li Han concluísse sua fala, Hiro já havia lançado com tudo.
Tirando os pés do chão com a mão traseira à direita, que guarda para golpes mais potentes, desfere seu soco mais potente possível na barriga do corpo seco bem embaixo do buraco de seu peito.
O monstro nem se move, Saikyo que se aproximava para, e tem a mesma reação de todos, juntamente do olhar incrédulo, Hiro enquanto olha para a face esquelética do corpo seco, vendo ele escurecido coberto por sombras irreais, pensa “A carne dele é dura!? Quase nem se moveu, devia ter saído voando, quanto será que isso pesa?’’.
A paralisia deles, encobre a paralisia do monstro em sua frente, que fica sem se mover por instantes. Algo que Li Han se aproveita perfura diversas vezes com sua espada, depois puxando o fio de costura, costurando cada corte que fez no corpo seco.
— Agora eu quero respostas para explicar isso, intrigante! — diz Li Han, sorrindo alegremente, intrigado com o que acaba de acontecer, mesmo ele sendo um mestre sábio, ele não tem explicações, apenas dúvidas.
Por conta do efeito dos fios recobra seus movimentos, e grunhe, o barulho que sai de sua garganta não é humano, nem animal, não se assemelha a qualquer grunhido de ser vivo, é o som de carne se rasgando, que premedita seu ataque para cima de Hiro, batendo nele com seus braços,
O garoto levanta os próprios braços para se defender, do golpe que nem chega a acertar, o garoto demora para perceber, e ver que o corpo seco, está no ar, e errou seu ataque, logo em seguida, o corpo seco é puxado de costas para o chão, e lá é costurado, ficando preso.
— Nada da natureza do céu, na terra ou no inferno pode decompor um corpo seco, sua carne se recupera ao ingerir carne, seus ossos são duros, e com seus dentes podem devorar qualquer ser vivo. É possível exorcizá-lo, com cânticos antigos perdidos — explica Li Han, como uma forma de se exibir dessa vez.
— Eu te disse, coisas para muito além do sobrenatural existem em Hiro! — afirma Saikyo, cobrando Hiro pelo seu ceticismo.
— Eu não estou certo do que vi, e por que isso apareceu aqui! — diz Hiro, ainda em negação.
— É sinal do que vamos enfrentar, nosso caminho será cheio de cinzas — diz Li Han aos alunos, e joga sua capa em cima do corpo seco, a parte que o encobre brilha. – Tudo que vive sobre a lei do retorno, é preso sobre os elos que englobam os caminhos, da luz primordial e da escuridão eterna, ambas preenchem o vazio e unidas formam tudo. Grande firmamento do céu a terra, sem forma igual o trovão e a água, inabalável montanha, vento que inspira, alimenta a chama da vida, que cessa no lago da morte, fecha-se o arranjo astrológico, deste ciclo que nunca para! . . . — declama Li Han, o cântico para exorcizar o corpo seco, as últimas palavras ele sussurra.
E assim a capa volta às mãos de Li Han, enquanto o corpo se desfaz como pó, que ao cair no chão pode se notar que é sal. Dembele salta pelo buraco celeiro, e corre até o sal, o pegando com as mãos, o hidratando com as lágrimas que gotejam de seus olhos, ao lembrar que aquilo, era provavelmente a única coisa que restou de seu companheiro de trabalho.
— Leve, use quando precisar, que este sal abençoe seu caminho e o proteja de espiritos ruins. Derrame um pouco dentro do celeiro, antes de irmos dormir — diz Li Han a Dembele.
— O que você é? — pergunta o marmanjo olhando para Li Han, sem conseguir o entender.
— Sou muitas coisas, não importa. O seguinte, dormiremos aqui, tranquilos, estamos protegidos está noite, não há mais fantasmas — frisa Li Han, com o intuito de ignorar o que acabara de acontecer.
— Sensei? Pode sentir a presença de espíritos? Por que não nos ensinou isso ao invés de caçar insetos? — Saikyo no entanto, continuou a perguntar, insatisfeita com os ensinamentos do mestre.
— Hahahaha, acho que é um dom a mediunidade — disfarça Li Han, que ri descontraidamente.
— É, mas da próxima vez é melhor sentir ele antes que faça algo — crítica Hiro, incrédulo com a situação.
— Há . . . acho que o sono me atrapalhou! — justifica Li Han, em tom humorado.
O mestrando entra no celeiro junto do restante, e vai checar se Balu e Yasuke estão bem.
— Balu e Yasuke estão bem?
— Hehehe, vivo sim, morrendo de medo? É claro, já o garoto . . . — diz Balu, olhando alegre para o garoto.
— Qual é? Vamos dormir, eu to com sono — diz Yasuke, despreocupado.
— Ei moleque, por que não tá esperneando de medo? — questiona Dembele, se aproximando de Yasuke fazendo cafune em sua cabeça.
— Tá brincando, esses caras são fortes demais, perto desse tio eu to a salvo, ele é mais real do que qualquer bomba que possa vir até nós, não é não? — pergunta Yasuke retoricamente, dando soquinhos no braço de Li Han.
— Pode apostar — concorda Li Han sorridente, ao mesmo tempo que pensa: “Se ele acredita nisso, não vou estragar a noite do moleque com a realidade“. — Hora de vocês repousarem, eu vou tratar do cavalo.
O mestre vai tratar do cavalo ferido. Yasuke não tem problemas para cair no sono, mal chegou a ver o corpo seco, está convicto que ali está totalmente seguro, Balu apesar do medo, rapidamente cai no sono. consegue se manter tranquilo. Dembele antes de se deitar para tentar dormir, vai recolher em um saco o sal que venho do corpo seco, e espalha ele em volta do local, depois se deita. O tempo vai se passando durante a noite, escurecendo cada vez mais, a maioria consegue dormir.
No entanto Hiro, sofre com insônia, fica sem conseguir dormir, algo comum, que apesar da frequência com que ocorre, nos últimos dias parecia ter sido superado, seu mestre o acompanha. Porém, Saikyo não o deixaria sozinho, e ela não dorme, observando seu amigo, e vai até ele, que já se explica.
— Pode dormir, eu estou de vigia.
— Eu não vou te deixar sozinho — diz Saikyo, colocando a mão no ombro dele, enquanto se aproxima para fazer companhia. — Além disso, o mestre tá acordado ainda.
Em cima de um amontoado de feno, está o mestre tranquilo, fumando, perto do buraco aberto na parede, para que a fumaça não incomode o restante.
— Hã, ah droga, o único horário que vocês não podem ver eu fumando, estão me atrapalhando! Vão dormir, o local está protegido pelo sal! — diz o mestre, incomodado ao ser encarado por eles.
— Esse negócio do sal? É real mesmo mestre? — dúvida Hiro das palavras do mestre.
— Será? Por que não acreditar no que te faz melhor? Apenas por um momento, e fechar os olhos, dormir tranquilo, sabendo que algo te protege, e que talvez, só talvez, haja mais do que se pode ver, algo além do fim — discursa Li Han, enquanto solta fumaça de sua boca.
Após as lições do mestre Hiro se sente mais tranquilo, se aconchegando para dormir, Saikyo esboça um leve sorriso, pois finalmente seu amigo deixou um pouco de ceticismo de lado. E assim os dois alunos dormem, até o dia seguinte.
E quando amanhece, o brilho do sol percorre por todo local, facilmente penetra o celeiro por conta de seu estado, assim erguendo os viajantes que se aprontam para partir rumo à cidade juntamente dos cavalos que restam.
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