Índice de Capítulo

    O lugar onde passamos o quarto período de estabilidade foi o segundo andar, a Cova das Feras. Tirando o cheiro desagradável, era um andar até bem adequado para descansar. Por ser uma área mais baixa, o nível de dificuldade era reduzido. Bastava o sacerdote usar Proclamação de Erradicação do Mal, e as criaturas que habitavam a Cova nem sequer conseguiam se aproximar. É claro que, entre os monstros arrastados até aqui pelo colapso, podia haver algum capaz de atravessar a barreira… mas bastava manter uma ronda de vigília revezada para resolver isso.

    — …O que pretende fazer?

    Diante da pergunta de Armin, fiquei em silêncio por um momento, ponderando. Havia duas opções.

    Explorar os arredores em busca de algo, ou simplesmente deitar no chão e recuperar as energias.

    Não precisei pensar por muito tempo.

    — …Acho que vou dormir um pouco.

    — Entendido. Compreendo. Descanse.

    Sim, desta vez eu só ia descansar. Todos estavam exaustos de várias formas, e neste andar não havia nenhum evento relevante a ser tratado.

    “Se for pra ter alguma esperança, talvez seja encontrar outro grupo de sobreviventes durante a busca…”

    Sendo sincero, se encontrássemos, seria de grande ajuda. Tivemos muitas baixas desta vez. Sem reforços, as ondas seguintes ficariam cada vez mais pesadas de suportar. Mesmo que a chance fosse mínima, a busca era necessária.

    Mas…

    — Então reunirei os aventureiros que ainda têm energia e iniciaremos a varredura ao redor. Vossa Senhoria, descanse.

    — …Conto com você.

    Por um dia, deixar o trabalho nas mãos dos outros não faria mal. Afinal, os batedores e ladinos praticamente não tinham feito nada o tempo todo, eles precisavam de algo para justificar sua presença.

    — Desculpem interromper o descanso de todos! Precisamos formar o grupo de busca. Os seguintes nomes foram chamados: Creed Allen, Anton…

    Enquanto ouvia os aventureiros mais dispostos sendo convocados, ajeitei o corpo no chão e acabei pegando no sono. E então…

    Rrrrrrrr-r-r-rang! Au! Au!1

    Desta vez, não sonhei com nada. Foi como se tivesse apenas fechado os olhos por um instante e, ao abri-los, percebi um burburinho à minha volta.

    — …

    — …

    O que diabos estavam cochichando a essa hora? Todo mundo devia estar dormindo. Peguei o relógio do peito e, abrindo só um pouco os olhos, conferi a hora.

    【06:35】

    Ou seja, dormi um pouco mais de seis horas. Como o período de estabilidade durava no mínimo oito, ainda restavam uns trinta minutos para descansar em paz. Por isso, fechei os olhos outra vez, tentando dormir mais um pouco…

    — …

    — …

    Ah, droga. Com tanta gente cochichando ao redor, impossível conseguir dormir direito.

    — Uh, agora há pouco…? Acho que ele acordou.

    — Vá, vá você ver.

    — …Hum, talvez seja melhor esperarmos mais um pouco, só por precaução.

    Pelo som das vozes sussurradas agora audíveis, percebi que não adiantava tentar dormir de novo e apenas me levantei.

    — Huh…!

    — O Visconde acordou!

    — Mas que diabos está acontecendo desde agora há pouco?

    Talvez por ter acabado de acordar, minha voz saiu um pouco ríspida, e os sobreviventes ao redor se apressaram em se aproximar e fazer seus relatórios.

    — A equipe de busca encontrou outro grupo de sobreviventes. No momento, o senhor Armin está verificando suas identidades.

    — O quê? Encontraram? Quantos?

    — Bem… ao que parece, são mais de dez pessoas. Os detalhes, o senhor pode confirmar diretamente com o senhor Armin.

    — Mais de dez!

    Uma boa notícia, capaz de varrer qualquer resquício do mau humor do despertar. Claro, ainda havia uma dúvida.

    — Mas por que não me acordaram logo e ficaram só cochichando do lado?

    — Ah, é que o senhor Armin pediu para deixá-lo descansar o máximo possível até acordar sozinho…

    — …Entendo.

    A consideração é apreciada, mas não deixou de parecer inútil. Afinal, com esse falatório ao lado, como eu conseguiria dormir tranquilo?

    — Armin está… ah, ali está ele.

    Levantei-me completamente e avistei Armin um pouco afastado do grupo principal, então segui em sua direção.

    — Lorde visconde?

    — São eles? O grupo que a equipe de busca encontrou?

    — Sim. Explicando brevemente, três clãs acabaram se reunindo naturalmente durante o colapso e uniram forças. Durante a última onda, sofreram grandes perdas. Quatorze deles sobreviveram e estavam descansando quando nossa equipe os encontrou. Já estabelecemos contato e confirmamos sua intenção de se juntar a nós. A identificação já foi concluída, então o senhor pode verificar os dados.

    Mas que diabos, essa explicação não tem nada de breve. Peguei os relatórios e dei uma olhada geral, o nível médio deles era bem decente. Pareciam capazes o bastante para não dependerem totalmente de nós; em outras palavras, não seriam peso morto.

    — O motivo de estarem aguardando afastados do grupo principal é que, até o momento, ainda não tinham a autorização do senhor visonde…

    — Autorização concedida.

    Assim que dei o aval, os Aventureiros que estavam escutando a conversa entre mim e Armin, com rostos apreensivos, imediatamente se iluminaram.

    — Oooh…! Estamos salvos…!!

    — Encontrar o grupo do Visconde Yandel em meio ao colapso!

    — Só posso dizer que foi obra divina!

    — Viva o Visconde Yandel!

    Ao ver reações tão intensas, percebi mais uma vez o quão habilidoso Armin era em lidar com pessoas. Agora entendia: ele não me deixara dormir por mera consideração.

    “Estava ganhando tempo de propósito.”

    Quanto mais deixasse esses caras angustiados, mais clara ficaria a diferença de posições entre nós. E, consequentemente, minha autoridade sobre eles se fortaleceria. Parceiros de cooperação e sobreviventes resgatados… são coisas bem diferentes, afinal.

    — Visonde, posso dizer uma palavra?

    — Diga.

    — Já identificamos quem eles são, mas temo que seja imprudente aceitá-los tão facilmente. Já estamos sobrecarregados cuidando de nós mesmos…

    — Entendo sua preocupação. Mas como sabe, este colapso dimensional é um desastre de grande magnitude. De acordo com a Lei de Desastres do Labirinto, criada conjuntamente pela Coroa e pelas Guildas, tenho a obrigação de resgatar e enfrentar a calamidade junto com todos os sobreviventes.

    — Contudo, se por acaso eles causarem algum problema…

    — Basta.

    Interrompi Armin e voltei-me para os sobreviventes.

    — Vocês aí, não estão pensando em causar problemas, certo?

    — De jeito nenhum! Jamais faríamos isso. Se confiar em nós, faremos de tudo para corresponder à sua confiança!

    — Ouviu o que disseram?

    — … — Armin fechou a boca, visivelmente contrariado, e assim terminou mais uma pequena encenação improvisada.

    — Então, conto com vocês daqui em diante.

    — Sim, senhor Visconde! Obrigado por nos aceitar!

    Depois disso, os quatorze recém-chegados deixaram a periferia e se juntaram ao grupo principal, recebendo de Armin um breve treinamento: onde deveriam se posicionar quando a próxima Onda começasse, quais estratégias usamos e o que fazer em cada situação.

    “Certo, o tutorial está por conta deles, então…”

    Afastei por um momento o interesse nos novos membros e voltei o olhar para outro lugar, o ponto onde, antes de dormir, havíamos realizado um funeral improvisado.

    Ao contrário do que temia, o entorno estava em silêncio.

    — …Ainda bem, estão dormindo.

    — Faz pouco tempo que adormeceram, no entanto.

    Quem respondeu ao meu murmúrio foi Maze Reiner, o usuário de habilidades especiais. O primeiro sobrevivente que encontrei depois de me separar do Clã Anabada.

    — Senhor visconde, não se preocupe tanto. Eles não são crianças.

    Reiner olhava para os familiares(?) que haviam adormecido exaustos no local do funeral e falou com tranquilidade. Por um instante, pensei que ele fosse do tipo frio e sem coração, mas as palavras seguintes me fizeram assentir.

    — São pessoas que já sobreviveram até agora, não? Mesmo se deixarmos por conta deles, vão saber suportar. Querendo ou não, já passaram por algo assim pelo menos uma vez.

    Estranhamente, aquilo não soou insensível. Nem pareceu a fala de alguém que falava fácil por ser coisa dos outros. Afinal, Reiner também havia perdido todos os seus companheiros e vagava sozinho quando o encontrei.

    Ele apenas aceitara, ou talvez se resignara, ao destino miserável que acompanha a vida de um Aventureiro.

    — …E o que deu em você pra vir me dizer isso de repente? Vá descansar, em vez de se preocupar comigo.

    — Peço desculpas pela intromissão.

    Reiner fez uma reverência cortês e se retirou, deixando-me soltar um suspiro amargo.

    — Haa…

    O ar escapou do peito, mas sem aliviar nada. Parecia que um peso grosso permanecia preso à garganta. Ainda assim, em momentos assim, só me restava lembrar do que eu precisava fazer. Afinal, de que adiantaria? Nenhuma palavra de consolo traria os mortos de volta.

    Crac…

    Só me restava continuar me esforçando. Fazer todo o possível para levar com vida todos que estavam agora presos ao mesmo destino que o meu…

    — V–Visconde!

    Naquele instante, um Aventureiro que fazia guarda na periferia correu até mim, em pânico.

    — Um grupo de sobreviventes à frente…!!

    — O quê?

    Corri imediatamente e olhei na direção indicada pelo Aventureiro da classe de detecção. Dentro da escuridão pesada do labirinto.

    Clank, clank.

    Um visitante indesejado se aproximava, emitindo um som metálico arrepiante.


    As figuras que emergiram da escuridão não eram Aventureiros comuns.

    — Cavaleiros da guarda real…?

    — São cavaleiros do exército do reino!

    O grupo ostentava o brasão da família real no peito. É claro que sua aparência estava longe do esplendor e da limpeza vistos na cidade. A pele exposta estava coberta de sangue e pedaços de carne, e as armaduras, amassadas e sujas, revelavam indiretamente o quanto haviam lutado com ferocidade até chegar ali.

    — Parece que também se separaram do exército real!

    — Pena não serem uma equipe de resgate…

    Não foi difícil perceber que aqueles cavaleiros estavam na mesma condição que nós, sobreviventes isolados. Ainda assim, em tempos de desastre, encontrar funcionários da Coroa costumava causar uma sensação de alívio.

    — É mesmo… os deuses estão nos ajudando!

    Pelas reações ao redor, era nítido que a emoção predominante não era cautela diante de estranhos, mas alegria e esperança. Bem diferente de mim, que nutria uma profunda desconfiança em relação à realeza.

    — Já se aproximaram o bastante.

    Usei um tom ligeiramente agressivo e interrompi o avanço dos cavaleiros que se aproximavam, ao mesmo tempo em que contava rapidamente o número de pessoas.

    — …Visconde Yandel?

    O homem à frente do grupo pareceu me reconhecer. Inclinou a cabeça, surpreso, e deu um passo à frente.

    — Não ouviu o que eu disse? Não se movam.

    Reforcei a ordem num tom ainda mais duro. Gente assim precisava ser contida desde o começo.

    — Não há motivo para desconfiança! Como pode ver, somos cavaleiros do exército real de Rafdonia…

    — Primeiro, identifiquem-se e informem sua unidade…

    Mas, antes que eu pudesse concluir o procedimento de verificação, uma voz conhecida e um rosto ainda mais inesperado surgiram do meio dos cavaleiros.

    — Ei, Visconde Yandel…!!!

    Aquele olhar irritante, o corpo robusto com um pouco de gordura, e o couro cabeludo brilhante castigado pela calvície.

    — Illya Adnus…?

    O Mestre da Guilda.

    O mesmo que havia se unido à expedição junto do Clã Anabada em troca do ‘Coração do Dragão’.

    — Pode ficar tranquilo! Eles são cavaleiros reais de verdade! Foram eles que me salvaram quando eu estava perdido!

    Por um instante, minha cabeça travou. O que é isso? Cadê a Missha que deveria ter aparecido? E por que, do nada, esse sujeito resolveu surgir aqui?

    — Ah…

    — R–Realmente, fico feliz em revê-lo! Ah, agora tanto faz glória ou conquistas, só quero voltar pra casa vivo…!

    — O que é isso? Por que diabos você está aqui? E onde estão os outros?

    — Ah, isso… houve alguns imprevistos!

    Tamanho foi o choque que acabei esquecendo completamente dos cavaleiros e comecei ouvindo primeiro a história do Mestre da Guilda. Não era longa, tirando as lamentações e emoções exageradas, o resumo dos fatos era simples.

    — Então você escorregou e se separou do grupo, depois foi resgatado pelo exército real e, no fim, acabou me encontrando aqui. É isso?

    — Resumindo, sim!

    — E a Missha? O que aconteceu com a Missha?

    — A senhorita Karlstein? Aconteceu algo com ela?

    Infelizmente, o maldito Mestre da Guilda não soube me dar resposta alguma sobre a Missha. Sabia ainda menos do que eu.

    — Quando me separei, todos estavam bem! Ah, exceto pela senhorita Fenelin!

    Pelo que dava pra deduzir, o Mestre da Guilda foi o primeiro a se perder, e depois aconteceu algo que fez Missha se separar também. Mas então… o que diabos aconteceu com o grupo principal…

    — Cof, cof…

    Ah, certo, tinha esses também. Ao ouvir o pigarro, virei o olhar por reflexo, e o cavaleiro, vendo a oportunidade, começou a falar.

    — É uma honra conhecê-lo. Sou Saul Andreyako, capitão da 4ª Companhia do 3º Batalhão da Ordem dos Cavaleiros Reais.

    Era curioso. Achei que ele tivesse bom senso, já que ficou quieto enquanto eu conversava com o Mestre da Guilda.

    — Durante o colapso dimensional, sofremos um acidente e nos separamos do batalhão principal. Gostaríamos de pedir sua cooperação até conseguirmos nos reunir novamente.

    — Tá maluco?

    Cooperação, o quê.

    — Hã? O que disse agora…

    — Ah.

    Acabei deixando escapar o que pensava, mas não era grande problema. No fim, o importante em qualquer deslize é saber como consertá-lo, e continuei dizendo o que realmente queria dizer.

    — Cooperação o quê, você só tem duas opções.

    — Duas…?

    — Ou cai fora, ou se ajoelha.

    Quem ele pensa que é pra bancar o arrogante sem nem ter um título de nobreza?

    1. MrRody: É um ronco, juro kkk, como falei, enquanto estiver traduzindo do coreano, vou manter as onomatopéias no estilo deles.[]
    Um pequeno gesto, um grande impacto!

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