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    Biscoitos, pipocas doces, refrigerante e mais algumas tranqueiras. Foi isso que compramos naquele momento! Ahh… Como eu sentia saudades dessa sensação de comprar porcaria.

    Ainda mais quando ela mesma havia se oferecido para pagar por aquilo. Nossa! Essa foi a melhor parte, sério.

    Só que eu vou ter que pensar no que posso recompensar Cecília por estar pagando. Hmmmm…

    Talvez um…

    Sei lá. Os gostos dela mudaram desde então? Não sabia nem um pouco. Fazia tanto tempo desde que conversei com ela. 

    Vou perguntar da forma mais discreta depois. Quero preparar um agradecimento apropriado!

    — Aplicarei o desconto para casais: 10% no total da compra, viu? — disse a atendente, clicando nos botões atrás do caixa. — Pronto. No total, deu 9,28 euros. Como vai ser o pagamento? 

    C-casal?

    — Nós nã–

    Cecília tapou minha boca.

    — Muito obrigada, moça! A senhora tem olhos atentos, não é? O pagamento vai ser no cartão. Débito, por favor — respondeu Cecília, passando seu cartão na maquininha.

    Fiquei vermelha, muito vermelha! Era uma raiva e vergonha crescentes que quase me fizeram explodir ali mesmo. Quem ela pensa que é!? 

    Droga, mano! Por que diabos? Ah!

    Bagulho bobo de casal é esse? 

    Ah… Lembrei…

    Estávamos perto do Dia dos Namorados. 

    Dane-se, não ligo! Que momento inoportuno de encontrar a ex, então! Eu odeio isso… odeio muito.

    Cecília pegou as sacolas após o pagamento ter dado certo e logo saiu na frente. Acompanhei ela, com vários pensamentos em minha mente. Desde… até a mais pura raiva.

    — Desculpa — começou Cecília, entregando-me algumas sacolas. — Sei que fui muito egoísta em fazer isso. Então, não me odeie, viu? Tehee~

    “Tehee”? Por acaso ela achava que estava dentro de um anime? Que diacho. É por isso que odeio otaku.

    Mas…

    — Não ligo, sua boboca. — Virei o rosto. — Só não me envolva nesse tipo de brincadeira de novo. Pode ser desconfortável para você.

    — Desconfortável…? — retrucou, olhando-me com uma cara confusa. — Bem… Só vamos ver o filme logo.

    Não entendia suas ações, muito menos lia sua mente. Cecília era alguém imprevisível para mim, e isso me deixava… intrigada.

    Ela havia mudado. Pouco, mas mudou. 

    O suficiente para continuar com essas brincadeiras e ainda mostrar ser mais madura agora. O que havia acontecido nessas semanas?

    Bem…

    É melhor não querer saber. Vai ver conheceu umas boas companhias. Não quero invadir seu espaço pessoal.

    Passamos por todas as lojas que olhamos na vinda. O caminho parecia ser maior dessa vez, os corredores se alongando assim que levantava a cabeça.

    Os olhos. São os olhos. Sempre são os olhos. São sempre culpa dos olhos. Eles me olham com seu modo opressor e me deixam na miséria.

    É culpa deles.

    Culpa…

    Não me sentia bem. Nem um pouco bem. Pensar nessas coisas me fez…

    — Cecília, você pode pegar as sacolas…? — perguntei, suando frio. — Eu preciso… — Respirei fundo. — … ir ao banheiro agora.

    Não consegui ver o rosto de Cecília, mas poderia imaginar o quanto estava preocupada. Ela nunca havia visto esse meu lado, e hoje não seria a primeira vez que veria.

    Sem ao menos esperar sua resposta, deixei as sacolas no chão, correndo para o banheiro. Não lembrava ao certo onde ficava, mas seguia a intuição para achar o bendito!

    Esbarrava em várias pessoas, mas não me importava com isso. O coração estava acelerado, e me segurava ao máximo para não vomitar no chão.

    — Cadê…

    Virei mais um corredor, encontrando a placa que indicava os banheiros. Aquilo foi minha salvação! Uma das grandes mesmo.

    Meus braços tremiam muito, a cabeça começando a doer… Todos os sintomas voltavam com força para meu corpo de uma só vez. Era horrível!

    Entrei no banheiro feminino, indo em direção a um dos vasos, e ali mesmo vomitei. Uma vez? Não, foram duas vezes. Seguidas uma da outra.

    Foram todos os pãezinhos água abaixo. E, mesmo expelindo tudo isso, ainda tremia. Meu corpo tremia.

    Minha barriga ainda borbulhava pelo que acabara de fazer. Era nojento, mas recorrente. Pensei já estar acostumada com isso, mas não era esse o caso.

    Era a culpa voltando. A culpa por tudo ter acontecido. Um sinal de que não poderia esquecer o que já aconteceu.

    Um lembrete de que era uma assassina. Que tinha sangue em minhas mãos, sangue que não era meu.

    Preferia que fosse meu sangue.

    O banheiro estava vazio, algo incrível para aquele momento. Mas agradecia em muito por estar vazio! Ah… 

    Era mais refrescante.

    Me apoiei na porta, levantando-me do chão, as pernas bambas. Estava indo em direção à pia, pois estava na hora de…

    Peguei o remédio de minha bolsa, quase caindo ao chão no processo. 

    — Que droga… — Os tremeliques não me deixavam abrir o frasco. E isso era uma porcaria! — Ah!

    O frasco se abriu, e todos os remédios caíram no ralo da pia. 

    Meu mundo desabou naquele instante.

    Não conseguia pensar em mais nada. Tudo… 

    Ah…

    Era minha culpa mais uma vez. Se ao menos não fosse tão desprezível ao ponto de necessitar desses remédios…

    Se ao menos não tremesse tanto…

    Se…

    Deveria estar morta. Deveria ter perdido minha vida naquele carro.

    Não adianta viver mais se essa culpa que carrego me faz pensar mais e mais na vida após a morte. 

    Será que encontraria eles? 

    Esperaria que sim. 

    — Eu queria virar uma pedra. Apenas uma pedra que não sente nada e faz menos ainda — murmurei, encostando minha cabeça na parede do banheiro, descendo até o chão mais uma vez. — Deveria ser eu. Deveria ser eu. Deveria ser eu…

    Não parava de tremer. A falta dos remédios logo se tornaria grave, mas… não tinha forças para contestar.

    O silêncio era reconfortante. 

    Um silêncio que gostaria de escutar por toda a eternidade. Algo simples, mas que custaria muito.

    Acho que estraguei o cinema das garotas, não é? Que merda… Não queria fazer isso. É por esses motivos que me afastei de todas as pessoas.

    Não poderia negar que era apenas um peso.

    — Scarlett!? — Escutei uma voz. Sabia de quem era, mas não queria aceitar.

    Por que ela estava me procurando?

    Ah…

    Não faça isso, Cecília. Por favor, não me veja nesse estado agora.

    — Você está aqui? — A voz havia se aproximado. — Scarlett…?

    Até que vi a ponta de seus cabelos adentrando o banheiro. Era inevitável.

    Não poderia me esconder pra sempre.

    — Meu Deus! — gritou Cecília, largando todas as sacolas e se abaixando até mim. — Scarlett, o que houve? — Seus movimentos eram rápidos. Checou meu pulso e puxou uns lenços de sua bolsa. — Calma… Fique calma… Vai dar tudo certo!

    O tom da sua voz diminuía, enquanto todo o local se escurecia.


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