Capítulo 47 — As Presas gêmeas e a Garra do Lobo
O clima começava a mudar; o dia ensolarado tornara-se nublado e pesado. Akane olhava para ele com determinação e medo, não queria que Kamito enfrentasse aquilo, mas ele estava ansioso. Seus olhos permaneceram fixos nos do Coiote; o corpo lhe vibrava de adrenalina. Era a chance de revidar toda a humilhação que havia sofrido.
— O que foi, Coiote? — provocou Kamito, com um sorriso tenso — Você parece surpreso por eu conseguir te acompanhar com o olhar. Por acaso você não achou que eu não estaria preparado?! Lamento ter te desapontado… Dessa vez, é você quem irá cair! Invoque suas Relíquias, ou eu irei te matar agora mesmo.
Falou confiante, ajustando a postura, como quem convidava o inimigo para vir. Coiote não sorriu; os olhos dele brilharam com desprezo.
— E daí que você consegue me acompanhar com o olhar?! Isso não muda nada. Já te dei uma surra antes, hoje não será diferente! E sua confiança será o motivo da sua morte! Prepare-se para morrer, Kamito!!!
Num movimento quase imperceptível, Coiote avançou. Movia-se tão rápido que Akane chegou a perdê-lo de vista; Kamito, porém, acompanhou cada deslocamento. Quando o adversário tentou atacá-lo pelas costas, Kamito virou-se a tempo e ergueu uma barreira de chamas com o braço esquerdo, o corpo tenso.
— Então você também consegue reagir?! Interessante, muito interessante! Me mostre tudo que você tem! Vamos lá!!!! — gritou Coiote, empolgado, aproximando-se com a guarda alta.
— Se é o seu desejo, depois não se arrependa quando estiver na beira da morte! Agora é a minha vez de atacar! Prepare-se!!!!
Formou uma espada de chamas e, num corte preciso, partiu a barreira ao meio. O golpe surtiu efeito: Coiote recuou por um instante. Kamito aproveitou a abertura e desferiu uma série de ataques; o outro defendeu-os com rapidez e respondeu com contra-investidas que o obrigaram a recuar.
Akane tentou acompanhar os movimentos, mas, para ela, tudo que via eram vultos e clarões de luz.
— Por que você está na defensiva?! — provocou Kamito entre um golpe e outro, ofegante — Essa nem é a minha Relíquia. Qual o problema, Coiote? Por acaso ficou com o rabinho entre as pernas?
— Você está bem convencido! Você fala como se tivesse dominado sua Relíquia, mas em poucos dias é impossível até mesmo para um membro da Ordem conseguir essa façanha! E você não é nenhum prodígio!
De repente, Coiote inverteu a investida e passou à ofensiva total; Kamito teve de recuar e concentrar-se na defesa. Havia algo diferente no agressor, um orgulho ferido, uma fúria que tornava cada golpe mais implacável.
— Você ficou mais rápido, e sua energia está maior que da última vez, mas isso não significa que você está mais forte. E eu te mostrarei isso.
Coiote chutou o estômago de Kamito, impulsionando-se para trás antes de se afastar. O olhar dele transbordava ódio e desprezo. Kamito respirou fundo, recompôs-se e caminhou até o lado de Akane. Ela olhou para ele assustada; ele lhe sorriu, tentando tranquilizá-la. Ao ver aquilo, Coiote perdeu a contenção e avançou o mais rápido que pôde contra ele.
Kamito cruzou os braços em X, preparando-se para o impacto. Quando a colisão aconteceu, um estrondo devastador e uma onda de energia varreram o ambiente, arremessando janelas, portas e mesas para fora do prédio. Akane, sob a pressão, esforçou-se para manter-se firme e gritou o nome dele, em desespero.
— Akane… Desculpa por te preocupar. Eu só te causo preocupação, mas dessa vez não precisa se preocupar comigo. Eu irei vencer!
Da fumaça, uma ponta do cachecol de Kamito apareceu, ainda com fagulhas de chamas nas pontas. Aquilo bastou para que Akane respirasse aliviada. Aos poucos, a fumaça se dissipou, revelando que Kamito estava com sua Vestimenta Espiritual ativada.
— Eu… Eu confio em você, Kamito. Por favor, não se machuque. Eu estarei te esperando aqui quando você vencer.
Akane falou baixo, a voz embargada, enquanto segurava Camaleão no colo; um sorriso tímido lhe iluminou o rosto, cheio de fé.
— Quanta baboseira! Kamito, você jamais me vencerá. — zombou Coiote, batendo palmas de leve, com desdém — A nossa diferença de velocidade é como o céu e a terra. Você só está me acompanhando por eu não estar usando minhas Relíquias e toda a minha Manifestação, mas, se você realmente acha que é páreo para mim, eu realizarei o seu desejo e te matarei com as minhas Relíquias.
Coiote então elevou sua energia de forma violenta. Cruzou os braços em X; suas mãos passaram a brilhar até que, numa explosão de poder, duas lâminas semelhantes a presas surgiram em suas palmas. Ao cortar a fumaça ao seu redor, ele revelou tanto a Relíquia quanto sua própria Vestimenta Espiritual: a jaqueta de couro, a calça jeans rasgada, o semblante mortal.
— Sinta minhas Presas Gêmeas!!! — bradou ele, erguendo as lâminas com um sorriso cruel.
— I-Incrível… A energia dele subiu. Como eu suspeitava, você está começando a se soltar. Vamos lá, Coiote, vamos pôr um fim nisso.
Assim que recriou a espada de chamas, Coiote surgiu ao lado de Kamito e tentou golpeá-lo por baixo e por cima, num movimento em forma de tesoura. Kamito mal o acompanhou, mas desviou a tempo e bloqueou um dos ataques com a lâmina.
— A velocidade aumentou?! Então era como eu suspeitava. A Manifestação dele é realmente a velocidade. E ele fica muito mais veloz quando manifesta muito mais energia, principalmente com sua Relíquia.
— Qual o problema?! Você não conseguiu acompanhar aquele golpe simples?! Pensei que você era capaz de me acompanhar, ou estava só convencido?! Não interessa, você morrerá aqui mesmo.
Coiote zombou, avançando de novo com ainda mais rapidez. Por um instante desapareceu da visão de Kamito, o suficiente para agarrá-lo pelo cachecol e arremessá-lo contra a parede. Assim que Kamito bateu na parede, Coiote investiu com as presas, mas Kamito conseguiu escapar por pouco e desviar.
— Hahahahahaha! — Coiote provocou, rodopiando as lâminas — Toda a sua confiança se foi com apenas isso?! Vamos, Kamito, faça alguma coisa, ou essa luta acabará como a outra!
— Cala a boca! — retrucou Kamito, cerrando os dentes — Coiote, você acha que foi burrice minha ter pedido para você usar sua Relíquia, mas não foi! Eu sabia que não conseguiria lutar de igual para igual com você sem uma Relíquia, foi por isso que eu estava te testando. Agora você sentirá a Garra do Lobo Azul! Observe bem.
Kamito recompôs-se, afastou as pernas: esquerda à frente, direita atrás e dobrou os joelhos. Levou a mão esquerda à cintura e a fechou, como se segurasse algo; então começou a elevar energia nas duas mãos.
— “Garra do Lobo Azul”?! É algum tipo de provocação à Ordem? Além de fraco, você também debocha de mim?! Não adianta o golpe que você lance, você jamais me acertará.
Quando finalmente compreendeu, o rosto de Coiote transcorreu descrença.
— I-Impossível! Você está invocando sua Relíquia, isso não é possível! Uma Relíquia requer anos de experiência para ser invocada! Como em alguns dias você foi capaz de invocar a sua?! Isso é impossível até mesmo para nós membros da Ordem dos Cavaleiros Brancos. Quem realmente é você?
— Quem sou eu?! — Kamito respondeu, firme, avançando um passo — Boa pergunta, Coiote. Eu sou aquele que te vencerá e impedirá os planos da sua Ordem. Eu sou aquele que salvará essa cidade e todos os seus habitantes. Eu sou o Lobo das chamas azuis, e essa é a…
Ele aproximou a mão direita da esquerda num gesto de sacar espada. Uma lâmina começou a se materializar na sua mão, e um corte vertical de chamas azuis disparou junto com o movimento, rasgando o ar. O corte abriu as paredes ao meio; fragmentos e poeira voaram enquanto Akane recuava, assustada com a intensidade do poder revelado. Coiote ficou estático, incrédulo diante daquilo.
— A Garra Azul… Zendriq!!!!!
— I-Incrível, a Relíquia do Kamito está muito mais forte do que no treinamento. Agora que está 100% recuperado, ele parece não se segurar. A Manifestação do Kamito está tomando tudo ao seu redor.
Akane admirava aquele poder, incrédula. Mesmo já tendo visto a força dele durante os treinos, era a primeira vez que presenciava tudo aquilo em uma batalha real e decisiva. A sua barreira tremeu sob a intensidade das chamas.
— A… A energia dele dobrou de tamanho… Como isso é possível?! Ele despertou a Relíquia em poucos dias e já a manipula tão bem. Kamito! Você se chama de Lobo? Então isso é mesmo uma afronta à Ordem. Terei o maior prazer em te matar! Você pagará por isso tudo!
Coiote preparou-se para atacar, mas um silêncio pesado caiu sobre o local. Akane arregalou os olhos e, ao olhá-lo de novo, viu Kamito já com a espada empunhada e a ponta encostada na sua garganta. Ele ficou imóvel, surpreso.
— Como? Como você conseguiu ser mais rápido do que eu? Minha Manifestação é a velocidade, então como eu não fui capaz de acompanhar a sua velocidade? Por acaso isso tem a ver com a sua Relíquia?!
— Para alguém que estava tão confiante há alguns segundos, você está fazendo muitas perguntas de uma vez só. O que foi?! Não foi você que disse que eu jamais te acompanharia? Então por que você não conseguiu me acompanhar?! Coiote, eu já disse que eu te vencerei.
Kamito sorriu ao ver a expressão de incredulidade no rosto do adversário e recuou um passo, afastando-se com calma. Abaixou a lâmina até que a ponta tocasse o chão. Coiote o fitou com ódio latente.
— Eu consegui este poder para impedir a Ordem, e para te vencer. — Kamito disse com orgulho de seu próprio poder.
— Não importa se você ficou mais rápido. Nesse quesito, eu sou superior! Vou mostrar a você o que acontece com pessoas que pisam no meu orgulho! Espero que esse combate seja o mais prazeroso de todos!
Coiote assumiu a postura de ataque: ergueu o braço direito com a espada apontada para a direita de Kamito, enquanto o braço esquerdo se estendia à frente, lâmina na horizontal. Sorriu de modo insano, quase urrando de prazer pela luta. Kamito devolveu o sorriso, levantou o pé direito e deu alguns passos em sua direção, mas parou por um instante, olhou para Akane e sorriu novamente. Ela, sem compreender totalmente, apenas concordou com a cabeça, firme.
Assim que recebeu o aceno de aprovação de Akane, ele voltou a encarar o Coiote e começou a abaixar o pé. No instante em que o pé tocou o chão, Kamito já havia surgido à frente do adversário, golpeando a espada esquerda com força. Coiote reagiu, resistiu ao impacto e o empurrou para trás; Kamito segurou-se e, em seguida, passou a movimentar-se com rapidez, desferindo ataques vindos de todas as direções enquanto procurava uma brecha. O inimigo sorriu, bloqueando cada investida e tentando contra-atacar com precisão.
Eles se moviam tão velozmente que, aos olhos alheios, havia apenas duas trilhas de energia colidindo e circulando uma à outra. Kamito recuou por um instante para avaliar, e então investiu novamente. Desta vez, começou a contornar Coiote em alta velocidade, buscando distraí-lo e forçar um deslize, mas o adversário o acompanhava quase sem falhas. A velocidade de Coiote aumentava gradativamente, um sinal perigoso. O confronto tornou-se tão violento que as explosões de energia faziam o prédio tremer de maneira alarmante, e o piso sob os pés dos dois vibrava a cada impacto.


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