Capítulo 17: Estou Bem Azarada Esses Dias, Né?
— Não tem emprego, não — disse o atendente, uma expressão alegre, deixando o momento mais estranho ainda. — Desculpe, senhora.
Senhora é a tua mãe, desgraçado! Me fez ter tanta esperança nessa bosta que quase virei santa.
Vai se ferrar, maluco! Perdi o meu tempo nesse arcade de merda. Que idiota!
Bati o pé, mas não alto o suficiente para que ele percebesse minha frustração. Essa cara bonita é realmente… irritante agora.
Que nojo, maluco!
Apenas acenei com a cabeça, franzindo a testa de ódio. Por mais que não quisesse demonstrar as emoções, meu coração desejava outra coisa…
Ele queria que fosse notado. Que minha raiva fosse notada! O bonitão tinha sorte de eu não ter uma tesoura na minha bolsa para cortar esse cabelo dele sem consentimento.
Urgh…
Saí de perto segurando a alça de minha bolsa com força, escondendo um pouco o rosto pela vergonha que acabara de passar. Mas, de alguma forma, fui notada por algumas crianças que estavam dentro do salão de jogos.
E sabem o que estavam fazendo? Rindo! Só rindo da minha cara, mesmo que não soubessem de todo o contexto.
Uns capetinhas nessa terra, se é que me entende.
Corri o máximo para que pudesse me distanciar do estabelecimento. Aquilo seria o máximo que poderia fazer no momento!
Fugir da vergonha foi o que mais fiz em toda a minha vida. Sabe como é, né? Uma tímida sempre faz de tudo para correr dos problemas, principalmente quando eles afetavam minha imagem já deplorável.
— Droga! — resmunguei, puxando o celular de minha bolsa. — Espero nunca mais ver essa bomba de novo.
Liguei o celular, buscando observar que horas eram naquele instante. Afinal, ainda poderia ser necessária minha ida à universidade.
Ah…
A universidade.
“01:37 PM.”
Uma da tarde. Já havia passado do horário de entrada.
Que pena, né? Estou muito triste com isso…
Bem, tá na hora de ir tomar uma cervejinha, então.
Entrei na lojinha perto do meu grupo de apartamentos. Um simples estabelecimento, composto por máquinas de vendas e comidas.
Aquele era o supermercado que salvava o pessoal de longas caminhadas até o centro comercial, sabe? Essa franquia ajudou muito o pessoal que morava mais pra borda do distrito.
Pus o pé, sentindo o frio do ar-condicionado por toda minha pele. Era… incrível. Muito incrível.
Não era difícil dizer que aquele era o melhor ar frio que tinha sentido em meses. O Supermercado Heroes nunca erra quando o assunto é esse!
…
Espera…
Heroes…? Nunca tinha parado para pensar sobre esse nome. Será que faz alguma referência àquele livro?
Hmmmmmmmm…
Sei lá. Não vou gastar meu grande intelecto numa coisa boba como essas. Já basta esses tipos de coisas estarem acontecendo comigo…
Minha cabeça até doía só de lembrar o que havia acontecido. Aquilo foi tudo real? O sonho? As telas?
Ugh…
Vou aproveitar e comprar um paracetamol numa farmácia próxima, então.
— Ainda tenho de ver como recuperaria meus remédios de ansiedade… — murmurei, olhando para o que sobrara de minha carteira: 10 euros. — Não tenho receita pra eles… Isso vai ser um saco.
Queria deixar isso mais baixo.
Esse era um fato que ninguém deveria saber e muito menos presenciar. Os remédios que tomava nunca foram prescritos, mas…
Ah…
Me sinto mal por isso. Confesso que já havia tentado parar, mas não conseguia! Só me afundava mais e mais nesse abismo.
Só me afundava nesse vício. O prazer temporário não era o suficiente, e as consequências futuras estavam chegando com toda a força.
Talvez o erro foi… persistir nele.
Eu odeio lições de moral. São textos que só me mostram o quão deplorável minha vida se encontra.
O colapso que tive foi só um prelúdio do futuro. Talvez meu estado piore, e talvez sejam necessárias mais e mais cápsulas para preencher um vazio.
Um vazio que só aumentava a cada segundo, a cada remédio colocado na boca e… a cada vez…
A cada vez em que me sentia rachada.
Ficar triste me enoja. Nunca fui esse tipo de pessoa que ficaria triste com qualquer coisa.
Mas hoje em dia era diferente. Será que meu eu do passado aprovaria as minhas ações?
Será que a pequena Scarlett se orgulharia do que havia se tornado?
Não quero pensar nisso. É perda de tempo, a pequena Scarlett morreu há anos.
Quando voltei à realidade, percebi que ainda residia na porta do supermercado, imóvel e perdida em pensamentos que só atrapalhavam minha vida.
Pensar demais sempre foi um dos meus maiores defeitos. Me perder em linhas longas que me dissociavam da realidade ao meu redor…
Às vezes era insuportável, outras vezes era irritante. Sem meio-termo, sabe?
Os seguranças até me olhavam feio de tanto ficar parada. Talvez pensasse que era uma ladra, e até eu pensaria que fosse uma ladra se estivesse na situação deles.
Não consigo culpar eles.
Andei pelos corredores, procurando algo com que pudesse me alimentar por aquela noite. Já havia pensado em todo o plano: teria de organizar todo o dinheiro pro resto da semana.
Uma coisa quase… impossível. Mas aí é só comer miojo e beber cerveja, né?
…
Eu acho que isso não é muito saudável. Quem diabos recomendou uma porcaria dessas?
Antes que eu percebesse, a cerveja já havia se alocado em minhas mãos, junto de três pacotes de miojo.
— Oxi?! — Larguei os dois às pressas, colocando cada um no seu devido lugar. — Não tô maluca ainda. Consigo comer algo normal.
Os meus próximos passos foram calculados: peguei alguns legumes e arroz, junto da mistura mais barata que pude encontrar.
Foi um trabalho árduo? Foi. E merecia um longo descanso por isso!
Naquela hora não havia tanta pessoa no supermercado, então nem acabei enfrentando tanta fila assim.
Muito rápido, e agradecia por isso.
Fui em direção ao caixa, segurando os itens que acabara de colocar em uma das cestas disponibilizadas pelo estabelecimento.
E separei assim como vovó tinha ensinado: “Os legumes para a esquerda e a carne para a direita. No centro, coloque o que irá tomar. E é melhor ainda se for algo alcoólico!”
Uh…
Espera…
…
Pensando por esse lado, acredito que fui influenciado por essa velha maldita a ser uma alcoólatra.
Ugh…
Melhor deixar o passado enterrado, mesmo.
Assim que cheguei ao local de atendimento, coloquei cada um dos itens com cautela, observando o preço subir na telinha.
Hmmmm…
Por que não sobe?
Que estranho. Será que o atendente estava maluco?
Virei-me, tentando entender o que estava acontecendo, mas…
— Scarlett…? — murmurou o atendente. — É você?

Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.