Capítulo 020 — O Fantasma de Luz
Marco subia, apressado, as escadas da torre da mansão abandonada, um sorriso satisfeito no rosto enquanto segurava firmemente uma pequena sacola de couro. Dentro dela estavam o compasso, algumas réguas improvisadas, pergaminhos e um novo pedaço de carvão. Ele havia conseguido tudo o que precisava para continuar suas medições e anotações com Maera.
“Frequência de essência na área acima do esperado. Recomendação: extrema cautela”.
Marco franziu a testa, mas deu de ombros. Ele já tinha ouvido Nova exagerar antes.
No topo da torre, Maera estava parada de costas para ele, os olhos fixos no céu, observando as primeiras estrelas surgindo no horizonte. Seu vestido tremulava levemente com o vento da noite, e por um momento, Marco ficou apenas ali, admirando-a.
— Ei, Maera! — Ele chamou, animado. — Consegui o compasso! Agora
podemos fazer medições mais precisas.
Maera não respondeu imediatamente. Marco achou estranho, mas se aproximou, continuando:
— Estava pensando em medir a inclinação das constelações conforme a rotação do planeta. Podemos fazer anotações detalhadas toda noite e…
Antes que terminasse a frase, Maera se virou em sua direção. Sem aviso, sua mão disparou para a frente, agarrando Marco pelo pescoço.
— O quê?!
O choque foi tão grande que ele nem reagiu. Seus pés saíram do chão, e um aperto frio e impiedoso começou a esmagar sua garganta. Os olhos de Maera estavam diferentes. Frios. Vazios.
Com a outra mão, ela segurou o colar que Marco usava e o arrancou com um puxão seco. O pingente balançou por um segundo entre os dedos dela antes que runas douradas brilhassem ao seu redor.
— Não vamos precisar disso, certo? Materialização de Essência: Luz Destrutiva.
Não era a voz de Maera.
Parecia com ela… o tom, o ritmo, até a entonação — mas havia algo errado. Uma frieza artificial. Um vazio atrás das palavras, como se alguém estivesse apenas imitando o som dela.
Um feixe de luz cortou o ar, atravessando o colar. Ele brilhou intensamente antes de se despedaçar em partículas cintilantes.
Sufocando, Marco conseguiu forçar as palavras:
— Você… não é a Maera.
Os lábios dela se curvaram em um sorriso vazio. Ela abriu a bolsa tiracolo de Marco, retirando o Cetro de Clyve. O artefato reagiu imediatamente, tremendo em sua mão, tentando se libertar. Sem hesitar, Maera jogou Marco contra a mureta de pedra da torre com uma força brutal.
Marco colidiu com a parede, a dor espalhando-se por todo o seu corpo.
“Forte recomendação que você pare de se chocar contra paredes” Nova comentou, imperturbável.
No chão, Marco tentou se recuperar. O cetro na mão de Maera estava se contorcendo tentando se soltar, puxado por alguma força invisível em sua direção. Ele sentiu a conexão entre ele e o artefato vibrar em sua mente.
“Maera” percebeu isso e franziu a testa. Ela por fim o soltou.
— Solidificação de essência: Barreira de Luz.
Uma parede translúcida e brilhante surgiu entre o cetro e Marco. A arma colidiu com a barreira, emitindo um som agudo enquanto girava rapidamente, liberando um fluxo de essência negra. A barreira tremulou e, em questão de segundos, o cetro perfurou a proteção e voou diretamente até Marco, pousando suavemente em sua mão.
A impostora suspirou.
— Me avisaram que isso ia ocorrer. Então vou ter que te levar comigo mesmo.
A barreira de luz desapareceu, e ela avançou com passos lentos e controlados.
Marco ainda sentia o corpo dolorido, mas se forçou a reagir. Com um movimento rápido, levantou-se e ergueu a mão.
— Materialização de Essência: Esfera de Chamas!
Uma esfera incandescente surgiu em sua palma, queimando com intensidade. Ele a arremessou diretamente no rosto de Maera.
A explosão de fogo iluminou a torre, e Marco viu, atônito, o corpo dela se desmanchar em milhares de cristais brilhantes que flutuaram pelo ar antes de se dissiparem completamente.
Um silêncio tomou conta do ambiente.
E então, uma voz ecoou do canto escuro da torre:
— Isso… não me avisaram.
Das sombras, um homem se tornou visível. Seus olhos frios estavam fixos em Marco, e aos seus pés, a verdadeira Maera jazia desacordada.
Marco recuou instintivamente, o coração martelando no peito ao ver Maera caída no chão, inerte. Ele engoliu em seco e levantou o cetro, apertando-o com força.
O inimigo, por outro lado, parecia relaxado. Ele ajeitou a manga do terno, retirando um fiapo invisível do tecido impecável antes de voltar sua atenção para Marco.
— Isso foi inesperado. — Sua voz soou quase divertida. — Parece que subestimaram sua capacidade de reação.
Marco não respondeu. Seu corpo ainda doía do impacto contra a mureta, mas a adrenalina o mantinha de pé. Seus olhos alternavam entre Maera, imóvel no chão, e o homem, cuja postura despreocupada o incomodava profundamente.
— E você é…?
— Elucydor Yre Praegeon. Chamam-me de O Fantasma de Luz.
Marco sentiu um calafrio percorrer sua espinha.
— Então você é mais um desses caçadores de recompensa?
Elucydor soltou uma risada baixa.
— Oh, não. Eu sou um profissional. E, diferentemente dos incompetentes que vieram antes de mim, não costumo falhar.
— Por que pegou Maera?
— A senhorita Olaraeth foi apenas um meio conveniente de chegar até você. Me informaram que você só saia do lado da General para vê-la.
Ele começou a caminhar lentamente na direção de Marco, as mãos nos bolsos, como se o confronto não fosse nada além de um incômodo passageiro. Marco respirou fundo. Seu instinto gritava que não podia deixar Elucydor chegar perto. Ele ergueu o cetro e canalizou sua essência.
— Materialização de essência: esfera de chamas. — Marco invocou.
A esfera cortou o ar, indo diretamente na direção de Elucydor. Mas no instante em que deveria atingi-lo, a imagem dele distorceu, como um reflexo quebrado. O ataque atravessou o espaço vazio, acertando apenas o nada.
Marco arregalou os olhos.
— Você precisa se esforçar mais. — A voz de Elucydor soou atrás dele.
Marco girou o corpo instintivamente, levantando os braços para se defender, mas o ataque veio de cima. Algo o atingiu como um raio — um chute certeiro no ombro, lançado de um ponto onde não havia ninguém instantes antes. O impacto o jogou contra o chão com violência, fazendo o ar escapar de seus pulmões.
— Você realmente não é ruim. — A voz do homem soou próxima, quase um sussurro. — Mas ainda está muito longe de ser uma ameaça para mim.
“Analisando cenário de combate”. A voz de Nova soou em sua mente. “Conclusão: você não tem a menor chance. Mas aprecio seu espírito de luta”!
Marco se levantou com dificuldade, sentindo o gosto metálico do sangue na boca. O impacto o deixara zonzo, e seu corpo gritava em protesto.
Elucydor ajustou os punhos do terno com um movimento lento e meticuloso, como se nem estivesse prestando atenção ao rapaz ferido à sua frente. Seus olhos frios brilharam com algo próximo da curiosidade.
Ele estalou os dedos. Fragmentos de luz começaram a se formar ao redor dele, múltiplos reflexos de sua figura surgindo como se o espaço estivesse se partindo em pedaços. Cada um deles segurava uma lâmina idêntica, movendo-se com elegância letal.
Elucydor não lhe deu tempo para pensar. Todas as cópias avançaram ao mesmo tempo, vindas de diferentes direções.
Marco tentou recuar, mas um corte fino abriu-se em sua lateral. Ele girou, tentando identificar o verdadeiro inimigo, mas outra lâmina deslizou rente ao seu pescoço, obrigando-o a se abaixar.
Marco rangeu os dentes. Ele não podia simplesmente esperar ser massacrado.
— Materialização de Essência: esfera de chamas!
O fogo explodiu em sua mão e ele lançou a esfera ao chão, criando uma cortina de luz intensa e calor escaldante. O clarão rompeu as ilusões, mas apenas por um instante.
Elucydor emergiu do brilho como se fosse parte da própria luz. Com um movimento suave, deslizou para trás de Marco e cravou a adaga em seu ombro.
A dor queimou como metal incandescente.
— Um truque bom — disse Elucydor, sua voz quase apreciativa. — Mas insuficiente.
Ele puxou a lâmina e Marco cambaleou para trás, pressionando a mão contra o ferimento.
“Dano recebido: crítico. Quer que eu registre suas últimas palavras?”
Cala a boca, Nova!
— Para ser sincero, preferia que a general Lou-reen estivesse aqui. Enfrentá-la seria… satisfatório. Mas estou a trabalho. E meu trabalho hoje envolve você.
Ele então suspirou, um toque de frustração em seu tom.
Elucydor baixou a lâmina ligeiramente e desviou o olhar para Maera, que gemia baixinho ao recobrar a consciência.
— Hm. — O assassino inclinou a cabeça, observando-a com desinteresse. — Eu já consegui o que queria. Você não é mais necessária.
Ele começou a se mover em sua direção, a adaga brilhando com uma luz pálida. Marco tentou gritar, mas sua voz falhou. Seus dedos se fecharam com força ao redor do cetro, impotente diante do que estava prestes a acontecer.
E então, uma memória o envolveu.
Malrath
Marco não estava mais na torre, mas em meio ao caos de um castelo em chamas. Soldados corriam, gritos de batalha ecoavam, e lâminas reluziam à luz das tochas.
No centro da carnificina, uma mulher usava as unhas como garras, derrubando inimigos com violência pura. Serana Vaelor lutava sem hesitação, sem medo.
A poucos metros dela, Clyve observava, os olhos estreitos com algo entre admiração e vigilância.
Então, Marco viu. Um inimigo emergindo da fumaça, a espada levantada, prestes a atacar Serana pelas costas.
Clyve não hesitou.
— Manipulação de Essência: Acelerar.
A energia fluiu por todo o seu corpo e, em um instante, ele já não estava onde estava antes. Seu movimento foi um borrão de velocidade e quando a lâmina do inimigo desceu…
Clyve já estava lá.
Sua espada interceptou o golpe e, em um único movimento, ele despachou o atacante com precisão letal.
A memória se desfez.
O tempo parecia desacelerado quando Marco voltou a si. O mundo ao seu redor ainda girava de dor e exaustão, mas seu coração batia acelerado.
O brilho pálido da adaga de Elucydor refletiu nos olhos arregalados de Maera enquanto ele se preparava para o golpe fatal.
Marco se moveu.
— Manipulação de Essência: Acelerar!
A energia queimou dentro dele como uma corrente elétrica. Seus sentidos explodiram em atividade. Cada detalhe do ambiente se tornou cristalino. O vento cortando a torre. O som da respiração fraca de Maera. A luz fria da lâmina descendo…
E então ele já estava lá.
Elucydor piscou, surpreso, quando Marco apareceu na sua frente, o cetro bloqueando sua adaga.
— O quê?
Cara a cara, Marco ergueu a mão.
— Materialização de Essência: Esfera de Chamas!
O fogo brilhou intensamente, e a explosão engoliu Elucydor antes que ele pudesse reagir.
Por um instante, Marco acreditou que tinha conseguido, mas quando a fumaça dissipou, tudo o que restava eram milhares de pequenos cristais brilhantes, flutuando no ar e desaparecendo.
— Uma ilusão… — Marco sussurrou, sentindo o suor frio descer por sua nuca.
Uma voz ecoou pela torre.
— Hm… Isso foi inesperado.
Elucydor se tornou visível novamente, a alguns metros de distância. Mas agora, sua postura tinha mudado. O tédio havia desaparecido de seu rosto, substituído por um interesse frio e perigoso.
— A brincadeira acabou.
Uma luz cortante brilhou no ar.
Um feixe de energia pura atravessou o peito de Marco.
A dor foi instantânea e paralisante. Marco arfou, cambaleando, sentindo a queimadura ardente que se espalhava por seu peito. Ele caiu de joelhos, suas mãos tremendo.
“Alerta extremo! Seu estado físico está se deteriorando rapidamente! Medidas de emergência necessárias!”
A visão de Marco começou a escurecer, mas antes que ele perdesse completamente a consciência, a voz de Nova soou, agora diferente, urgente.
“Chamando a cavalaria.”
Base do Exército Imperial – Yhe-for
Lou-reen estava sentada à mesa, encarando Kaertien, quando um brilho cortou o ar.
O disco de selenita em seu bolso vibrou, emitindo uma luz intensa.
Os olhos de Lou-reen estreitaram-se imediatamente.
Kaertien olhou para ela, confuso.
— Algum problema?
Lou-reen não respondeu.
Ela simplesmente desapareceu.
O vidro da janela explodiu em mil pedaços quando seu corpo atravessou a abertura em um borrão de velocidade.
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