Capítulo 021.2 (BÔNUS) — Aula 01
— Onde o sol nasce? — Marco perguntou.
Maera apontou para o horizonte sem pensar muito.
— Em algum lugar pra lá.
— Mas, exatamente onde?
Ela deu de ombros.
— Ninguém sabe…
— Vou te ensinar a saber.
Ele caminhou até um trecho limpo do pátio do CEAET e fincou uma estaca no chão plano.
— Isto é um gnomom.
Maera prendeu o riso.
— Parece só o cabo de uma lança quebrado.
— Era. Até eu pôr a mão. Agora é instrumento astronômico.
Ele amarrou uma pedrinha na ponta de um barbante e deixou pender junto da estaca. Esperou o fio parar de balançar. Ajustou a base com duas pedras até ficar perfeitamente vertical.
— Se a estaca não estiver reta, todo o resto erra.
O sol fez uma sombra nítida. Marco prendeu o barbante no pé da estaca, amarrou um pedaço de carvão na outra ponta e, como um compasso, traçou um círculo ao redor.
— Este círculo é nossa referência. Vamos marcar onde a ponta da sombra tocar o círculo.
Ele mediu a sombra com o olho e ajustou o raio para ficar igual ao comprimento agora. Endireitou o corpo e apontou o horizonte.
— Aqui vocês dizem “onde o sol nasce”. No meu mundo é LESTE. Onde ele se despede é OESTE. Se você apontar o braço direito para o Leste e o esquerdo para o Oeste, na sua frente está o NORTE e atrás, o SUL.
— E isso é importante? — Maera arqueou a sobrancelha.
— É importante porque dá coluna pro mundo. Sem direção, tudo é “pra lá”; com Leste, Oeste, Norte e Sul, vira caminho. Com isso você volta pra casa sem se perder, encontra o rio de novo, combina ponto de encontro, desenha mapa, ergue estrada. E quando a gente medir como a sombra muda nesses lados, a gente descobre o meio do dia, entende as estações e sabe quando plantar. É o passo que tira a gente do “acho” e põe no “sei”.
Ela assentiu, séria.
— Certo. O que eu faço?
— Quando eu disser marca, você encosta o carvão no ponto exato da ponta da sombra e escreve a letra.
Ele olhou o chão. A ponta da sombra coincidiu com o círculo.
— Marca A.
Maera agachou e escreveu um “A” pequeno onde a sombra tocava a linha. Limpou o carvão no pano.
— A é de…?
— A fica do lado onde a sombra aponta de manhã. Aqui é Oeste. Vamos ver o outro lado mais tarde.
Eles seguiram com outras tarefas do pátio. A luz subiu. A sombra foi encurtando, grudando no pé do gnomom.
— Marca o mínimo. Escreve “MEIO DO DIA”.
Maera circulou o ponto e anotou. Marco apenas conferiu o alinhamento, satisfeito.
— Este é o alto de Lauris. Guarda isso.
A sombra voltou a crescer, avançando para o lado oposto. Eles esperaram junto ao círculo até a ponta encostar na linha do outro lado. e, depois, começou a crescer de novo para o lado oposto.
— Atenção — Marco chamou. — Assim que tocar o círculo do outro lado, marca.
A ponta avançou, nítida, até encostar na linha.
— Marca B.
Maera escreveu “B” do lado oposto. Marco se agachou ao lado dela.
— Agora une A e B com um traço reto.
Ela ligou os pontos com cuidado.
— Esta é a direção da caminhada diária da luz: LESTE ↔ OESTE — Marco disse. — A (manhã) ficou do lado Oeste; B (tarde) do lado Leste. Braço direito pro Leste. Esquerdo pro Oeste.
Maera testou o gesto. Direita para o “B”, esquerda para o “A”. Respirou fundo, como se o corpo tivesse entendido antes da cabeça.
— E o Norte e o Sul?
— Saem daqui.
Marco mediu o segmento A–B com o próprio barbante, achando o meio. Marcou um pontinho no centro: M. Depois, riscou uma segunda linha do pé da estaca até M.
— Perpendicular à caminhada da luz. Esta é a nossa coluna: NORTE ↕ SUL — ele falou. — Fica em pé no pé da estaca. Mantém B/Leste no braço direito e A/Oeste no esquerdo. O que está na sua frente é Norte. Atrás, Sul.
Ela se posicionou como ele disse. Olhou a linha recém-traçada, depois o horizonte. Sorriu.
— O mundo parou de ser “pra lá”.
— Anota no caderno — Marco disse, já revisando as linhas no chão. — Dia 11 desde a chegada, Yhe-for. Gnomom em prumo. Círculo traçado. A (manhã/Oeste), B (tarde/Leste). Linha A–B = Leste–Oeste. Linha pé–M = Norte–Sul. Meio do dia marcado.
Ela escreveu rápido, letra firme.
— E amanhã?
— Amanhã a gente repete pra confirmar e começa o relógio de sombra. Agora que o mundo tem coluna, dá pra dividir o dia inteiro.
Maera olhou o desenho no chão, as duas linhas cruzadas, o círculo, as letras. Simples. Limpo. Incontestável.
— Tá. Hoje eu cheguei sem saber onde o sol nasce.
— E agora? — Marco provocou.
Ela apontou, braço direito estendido, sem hesitar.
— Leste.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.