Maryse estreitou os olhos e avançou na direção da elfa, os olhos frios e cheios de desprezo. Kalamera cerrou os punhos e recuou ligeiramente, preparando-se para o embate. Seu olhar não vacilou: ela sabia que Maryse era perigosa, mas estava pronta

    — Não sei como sobreviveu ao meu veneno da última vez — Maryse disse, a voz carregada de ameaça. — Mas garanto que não sobreviverá agora. Manipulação de essência: transfiguração.

    Os braços de Maryse se alongaram, retorcendo-se em cobras escuras com olhos amarelos brilhantes. Elas silvaram, afiando as presas enquanto se lançavam para agarrar Kalamera. Mas a sargento não hesitou. Assumiu sua posição de boxeadora, os quatro braços erguidos, esperando o ataque.

    As cobras investiram. Kalamera esquivou-se de uma, mas a outra enrolou-se rapidamente ao redor de seu braço direito, apertando com força. Maryse sorriu.

    — Vocês nunca aprendem, não é mesmo? — zombou.

    Mas Kalamera sorriu de volta.

    — Não. Nós evoluímos.

    As peças metálicas de seu braço se soltaram e caíram. Sem apoio, a cobra de Maryse apertou apenas o vazio, retorcendo-se e se enroscando nela mesma. Antes que pudesse reagir, as peças de Kalamera se reorganizaram no ar e voltaram à sua forma original, e seu punho disparou direto no queixo de Maryse.

    O impacto fez a elfa cambalear para trás. Ela rangeu os dentes e lançou suas cobras novamente, mas Kalamera usou a mesma estratégia. Seus braços desmontavam e remontavam antes do aperto mortal, permitindo que ela se esquivasse e contra-atacasse sem esforço. Combinando isso à sua agilidade, seus socos atingiam Maryse repetidas vezes, obrigando-a a recuar.

    Ao lado, Marco observava, mudo por um segundo. Era a primeira vez que ele via Kalamera lutar e, honestamente, nunca tinha imaginado. Na Terra, engenheiros eram gente de bancada: costas curvadas sobre computadores e cálculo; atléticos só na corrida pelo café, lutadores então, só no cinema. Mas ali, cada gesto dela era geometria: ângulo de quadril, torque no ombro, alavanca limpa. Eficiência, reaproveitamento, zero ornamento: engenharia aplicada ao corpo. Lou-reen o treinara para aguentar em pé; Kalamera mostrava como pensar com os punhos. A ficha caiu inteira: ele não precisava escolher entre soldado e cientista. Podia ser os dois. E funcionaria.

    Taref escolheu mal a hora. A adaga saiu por baixo da mesa, buscando a costela de Marco. A espada de Faey já estava na mão quando o metal brilhou. Trava no punho, giro do guarda-mão, um clac na borda da cadeira. A adaga quicou no chão. Taref sentou de volta, pálido.

    — Fica. — Marco nem levantou a voz.

    Maryse rosnou ao perceber que seus ataques não estavam surtindo efeito. Kalamera se movia com mais agilidade do que antes, seus quatro braços respondendo com precisão e força a cada tentativa de golpe. A engenhosidade das próteses era impressionante. Diferente da última vez que haviam se enfrentado, agora Kalamera não apenas resistia, ela dominava o combate.

    Irritada, Maryse recuou alguns passos, seus olhos brilhando com uma determinação selvagem.

    — Chega disso. Se você quer lutar como um monstro, então eu vou te mostrar o verdadeiro poder da transfiguração!

    Ela inspirou fundo e ativou sua essência primordial.

    — Manipulação de essência: Transfiguração máxima!

    O ar ao redor tremeu quando seus braços começaram a pulsar e se transformar. As duas cobras que substituíam seus braços se dividiram, criando quatro serpentes enormes e sinuosas, cada uma movendo-se com autonomia. Mas não parou por aí. Seus cabelos também se agitaram, as mechas se retorcendo e ganhando vida própria, transformando-se em um enxame de pequenas serpentes. Os olhos de Maryse brilhavam com um tom esverdeado e hipnótico.

    Ela sorriu, sentindo o novo poder percorrer seu corpo.

    — Vamos ver o que você faz contra isso, Kalamera.

    Kalamera não recuou. Seus olhos percorreram cada detalhe da transformação de Maryse, analisando os padrões de movimento das novas cobras. O perigo era real, mas ela não sentia medo. Pelo contrário, um sorriso determinado se formou em seu rosto.

    —Maryse, evolução não é apenas sobre mudar, é sobre se adaptar.

    Maryse avançou como uma tempestade de serpentes, seus braços e cabelos se alongando, tentando cercar Kalamera por todos os lados. As presas das cobras passavam a centímetros de seu rosto, mas cada vez que estavam prestes a mordê-la, Kalamera se movia com precisão cirúrgica, desviando por uma fração de segundo.

    Os braços mecânicos de Kalamera se desmontavam e se reconstruíam constantemente, impedindo que as cobras conseguissem se prender a ela. Cada vez que uma serpente tentava enroscar-se, o braço simplesmente se desfazia, fazendo a criatura se apertar contra o próprio corpo e, logo depois, as peças se reorganizavam novamente em um golpe certeiro contra Maryse.

    A luta se intensificava, e com sua forma de hidra, Maryse finalmente começava a superar a defesa de Kalamera. As cobras deslizaram entre os golpes velozes da adversária, uma delas se enrolando em seu pescoço enquanto as outras avançavam para mordê-la. O olhar de Maryse brilhou com triunfo.

    Mas Kalamera não se abalou.

    — Disparar. — Ela sussurrou.

    Uma sequência de cliques metálicos ecoou pelo bar, e em um instante, dezenas de projéteis foram lançados das próteses, atingindo com precisão as cabeças das cobras. Maryse gritou de dor, recuando instintivamente. Os membros serpentinos retornaram à sua forma original, mas agora estavam feridos, sangrando nos pontos onde os tiros haviam perfurado sua pele.

    Maryse gritou, ergueu a manga e mostrou o bracelete de madeira rara. Veios escuros em relevo, uma runa gravada no aro.

    — Isso é… — Kalamera começou a falar, reconhecendo o padrão.

    A frase morreu quando Maryse ativou. A essência preencheu a runa; os veios acenderam por dentro como circuito e as bordas da madeira começaram a carbonizar, soltando um cheiro doce de fumaça.

    Ela ficou mais rápida de um jeito que o olho não gosta. Avançou, derrubou Kalamera com o primeiro impacto. A sargento rolou e se levantou no mesmo movimento, mas Maryse já estava em cima, sem descanso.

    A voz de Nova soou na mente de Marco: “runa de potenciação detectada. Converte essência primordial em cafeína + taurina. ‘Energy shot’ de conveniência de posto: força e velocidade sobem; juízo despenca. Aja agora ou a Kalamera vira adubo”.

    Marco não hesitou.

    — Manipulação de Essência: Acelerar.

    O corpo dele respondeu. O bar pareceu ficar viscoso; com todo mundo parecendo estar em câmera lenta. Marco entrou no intervalo entre as duas, a espada de Faey subindo para tirar a linha do golpe que mirava o pescoço de Kalamera. Aço contra presa.

    Maryse sorriu de canto, olhos âmbar frios.

    — Vou destruir todos vocês que destroem a floresta com esse “progresso”.

    A lâmina de Marco acompanhou o primeiro braço-cobra, aparou o segundo, o terceiro já vinha por baixo. Ele segurou, mas sentiu o limite: ela estava em outro patamar. Kalamera recuperou base ao lado, porém Maryse voltava sempre um passo à frente.

    Marco percebeu que não ia segurar Maryse no braço.

    — Nova, ajuda.

    A resposta veio na mente, ácida e objetiva: “Beleza! Vamos de… calmante express. Mandando a fórmula estrutural…”

    Marco manteve a guarda com o braço direito em alta cadência. Visualizou a magia e começou a desenhar com a mão esquerda: traço, círculo, essência encaixando no ar, química e runa falando a mesma língua.

    Lembrou de Lou-reen fazendo exatamente aquilo contra o leão-de-Qsia, só que, desta vez, era ele quem protegia alguém.

    Nova seguia com o direcionamento: “Isso, esses hexágonos aí. Nota: tenta não inspirar você mesmo”.

    Marco abriu espaço com um empurrão seco no peito de Maryse e cravou a voz:

    — Materialização de Essência: esfera de diamante.

    Faces hexagonais translúcidas cresceram ao redor dele e de Kalamera, cúpula quase fechando. No último instante Marco arremessou a runa para fora antes de a esfera completar o encaixe.

    — Materialização de Essência: Nebular.

    A runa se ativou e estourou em névoa clara que correu pelo bar e Maryse respirou no reflexo.

    O olhar de Maryse vacilou; as “cobras” perderam cadência. O joelho falhou. Ela tombou de lado, ainda tentando odiar enquanto apagava. O bracelete sobreaquecido trincou por dentro e se desfez em cinza sobre o assoalho.

    “Bingo. A diva caiu. Dose certinha. Sem sequelas. E sim, eu acabei de salvar o bar e o seu ego. De nada”.

    A porta arrebentou e uma patrulha entrou em tropa apressada: botas batendo, lanças erguidas, olhos varrendo o estrago. Metade do bar já se espremeu pelas laterais, cadeiras raspando, copos levados às pressas, a garçonete sumindo pela cozinha. O cheiro de pinho e fumaça doce ainda estava no ar.

    Os soldados deram a geral, miras girando… e congelaram ao ver quatro braços.

    — …É a Wynrae — o cabo reconheceu, baixando um palmo a lança. — Sargento.

    Kalamera nem perdeu tempo; apontou Maryse caída:

    — Essa é a terrorista que o general tá atrás.

    Marco indicou a mesa vazia:

    — E o Taref… ele tava entregando um… pacote.

    Olhares para o tampo: só o retângulo limpo de pó.

    “Notícia ruim: o pacotinho criou pernas. Tradução: Taref…”

    — Sumiu — Marco completou.

    Kalamera estalou a língua, seca:

    — Droga.

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