Capítulo 398 - A Base
Abel não conseguia forjar a base com a mesma perfeição de quando usava seu Martelo Horádrico, mas seus músculos treinados garantiam que cada golpe fosse certeiro.
Ele nem ouvia os aplausos ao redor. Estava completamente concentrado em golpear a base com seu martelo. Sua mão esquerda segurava firme a tenaz que prendia a peça, buscando a posição exata para o próximo golpe.
Tudo acontecia em um instante. O segundo golpe veio logo após o primeiro. Faíscas negras começaram a saltar. A base nem se moveu da tenaz. Ficou ali, firme, enquanto o martelo de 700 libras continuava a descer sobre ela.
“Já foram dois golpes”, murmurou o Mestre Morry.
Quando o que era considerado “incomum” se tornava o novo padrão, todo o espanto dava lugar a uma espécie de entorpecimento. Todos estavam vibrando com Abel no início, mas quanto mais viam o martelo descendo sobre a base, mais silenciosos ficavam, hipnotizados pela cena.
Depois de cem marteladas, Abel parou e colocou a base de volta nas chamas. O silêncio se tornou absoluto. Tudo o que se ouvia era o som do fogo rugindo. Abel pegou a base novamente. Estava pronto para mais uma rodada de marteladas.
Por mais insano que fosse aquele martelo de 700 libras, ainda não se comparava ao Martelo Horádrico. Precisava de dois golpes para acertar um de verdade. Ele não estava muito satisfeito com isso, mas, para os outros mestres, aquilo já era impressionante demais.
Depois que a base atingiu o nível de 150 forjas, só conseguia aumentá-la a cada três ou quatro golpes. Quando tirou a base do fogo pela quinta vez, faltava muito pouco para transformá-la em uma peça de ferro refinado.
Foi então que começou a baixar o martelo.
“Desculpem pessoal”, disse Abel, decepcionado. “Não consegui. Essa criação foi um fracasso.”
“Espera, como assim, Mestre Abel?” perguntou o Mestre Morry. Para ele, a base estava quase idêntica a uma peça de ferro refinado puro.
Abel suspirou antes de responder: “Bem, achei que conseguiria forjar uma peça refinada agora mesmo, mas acho que me superestimei.”
Essa declaração atingiu o Mestre Morry em cheio. Ele já passava dos quinhentos anos de idade e mal conseguia criar uma base com 120 fojas. E aquele jovem à sua frente, um simples adolescente, não só erguia um martelo de 300 libras como se não fosse nada, como ainda se dizia decepcionado por não conseguir criar uma peça refinada com as próprias mãos?
Admirado, o Mestre Morry exclamou alto para Abel:
“Você deveria ser um grão-mestre, Mestre Abel! Até o maior ferreiro da nossa história só conseguia forjar uma base com 150 forjas! Você está quebrando todos os recordes!”
“Ah, não, não”, Abel balançou a cabeça. “Ainda sou só um iniciante, Mestre Morry. Estou longe de merecer esse título que você mencionou.”
Abel não estava tentando ser modesto. De fato, a maioria de seus equipamentos ainda era criada com o Cubo Horádrico. Ainda levaria tempo até que pudesse forjar o que desejava apenas com sua própria habilidade.
Quando Abel se virou para voltar ao seu lugar, o Mestre Morry o chamou:
“Pelo menos me permita cumprir minha promessa, Mestre Abel. Por favor, leve o martelo com você. Se ficar comigo, será apenas uma peça decorativa, mas com você! Com você, ele ganha vida!”
Em vez de recusar, Abel colocou o martelo em sua bolsa dimensional. Os anões eram famosos por sua teimosia. Se recusasse, eles poderiam entender como um gesto de desrespeito.
O Mestre Morry pegou a base com a tenaz e se virou para a multidão:
“Por favor, todos de volta aos seus lugares. Vamos seguir para a próxima atividade assim que eu terminar de limpar isso aqui.”
“Bem, por que não falamos primeiro sobre quem vai ficar com essa base, Mestre Morry?” disse Hoover de repente. Ele estivera em silêncio o tempo todo.
O Mestre Morry lançou um olhar severo para ele:
“Essa base é propriedade da União dos Ferreiros! Nós é que vamos ficar com ela!”
O Mestre Hoover respondeu no mesmo instante:
“Bem, o Mestre Abel vem do Ducado de Camelot! Acho justo que o Ducado fique com aquilo que ele criou.”
O Mestre Robin também se levantou:
“Não, não, você entendeu tudo errado! O Mestre Abel aprendeu suas técnicas em nossa União. Eu é que deveria ficar com o que ele forja!”
Antes que o Mestre Morry pudesse responder, todos os outros mestres começaram a discutir, exigindo que a base fosse distribuída ali mesmo, na frente de todos. Abel não esperava que ficassem tão exaltados por causa de uma criação “fracassada”. A base estava quase refinada, mas ainda assim, não passava de uma tentativa incompleta.
Bem, ele estava cansado demais para se importar. A forja exigira muito dele, então decidiu apenas ir até um assento e descansar. Felizmente, ferreiros não eram conhecidos por suas habilidades de combate. Havia Hoover, o comandante dos cavaleiros, mas nem ele seria insano o bastante para brigar por uma base de metal.
No fim das contas, o Mestre Morry fez uma proposta: todos tirariam a sorte para decidir a ordem, e cada mestre poderia ficar com a base por um mês. Se não fosse assim, eles provavelmente brigariam por vários dias seguidos.
Eventualmente, os mestres voltaram aos seus assentos. Todos fizeram a mesma coisa ao passar por Abel: demonstraram sua gratidão. Afinal, foi ele quem mostrou a eles que existia um patamar mais elevado na arte da forja.
Quando Abel voltou para seu lugar, estava deixando claro que abria mão da base. Se realmente a quisesse, como seu criador, bastaria dizer, e ninguém teria como impedir.
Como se nada tivesse acontecido, o Mestre Morry retomou os anúncios:
“Agora vamos exibir as novas obras de cada um dos nossos mestres! Seguiremos a mesma ordem da vez anterior.”
Mais uma vez, Abel era o único que não sabia o que fazer. Ao olhar ao redor, viu que os ajudantes dos outros mestres estavam trazendo as obras prontas.
Quando a primeira peça foi colocada no palco, seu criador começou a comentar sobre os pontos fortes e fracos do item. Depois, dois mestres ferreiros elfos faziam observações sobre o valor estético da obra, ou o que poderia ser melhorado.
Em seguida vieram as armaduras, armas, arcos e anéis élficos. Todos tiveram seu momento para examinar as peças. Foi nesse momento que Abel percebeu do que mais sentia falta.
Mais uma vez, o que lhe faltava era experiência. Toda vez que um mestre pegava uma peça, era capaz de identificar quase que imediatamente de que era feita e o que ela podia fazer. E claro, também sabiam quais feitiços estavam indicados pelos padrões rúnicos. Era comum usar ferramentas para verificar os efeitos dos encantamentos.
Abel, por outro lado, apenas jogava a peça dentro de seu Cubo Horádrico. Por mais prático que fosse, isso o fazia pular etapas importantes de aprendizado.
Era uma pena, de verdade. Pensando bem, muitos anos atrás, quando Lorde Marechal lhe pediu para aprender a forjar, era para que Abel aprendesse a analisar uma espada. No entanto, à medida que progredia nesse caminho, começou a esquecer os fundamentos e passou a focar apenas em eficiência e estatísticas.
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