Capítulo 058 - Acredite, como um benfeitor!
Capítulo 058 – Acredite, como um benfeitor!
Assim que a primeira luz do sol arranhou o céu encoberto de Katze, escutou-se o som dos cascos dos cavalos se afastarem na partida.
Guerreiros do batalhão dos batedores desapareceram aos poucos no nevoeiro cinzento que eles procuravam.
O som das ferraduras ecoou pelas terras ressecadas, despertava quem tinha o sono frágil, mas foi necessário. Aqueles homens tinham uma missão: reconhecer o terreno e identificar o foco da praga que corrompia aquelas terras.
Horas se passaram, foram longas e tensas, arrastando-se sob os olhos inquietos de todos que permaneceram no acampamento. Assim que os batedores finalmente retornaram, com seus exaustos cavalos, foram recepcionados por Kord.
— Senhor, senhor!
Os homens desciam das suas montarias com tamanha pressa, que alguns tropeçaram nas próprias pernas.
— Me diga o relatório, soldado. — A voz de Kord soava um pouco rouca.
— Senhor, foi terrível, pensávamos que não iriamos retornar!
O subalterno de Yelena pôde perceber que aquele grupo todo estava exausto e de olhos arregalados, suados e ofegantes. Ele tratou de acalmá-los primeiro. Assim que parcialmente descansados e alimentados, um conseguiu respirar um pouco mais e começara a dialogar com o Lâmina-fria.
— Um local sinistro que parecia ser o grande coração dessas planícies arruinadas… Lá, meu senhor, no meio do nada… Uma horda de pelo menos oitenta zumbis que se arrastavam em um círculo bizarro.
— Oitenta? — Kord se surpreendeu, é claro que. Para um reino que venceu quase dois milhares de goblins, menos de uma centena de zumbis não parecia um grande desafio.
— Sim, senhor.
— Mencionaste que eles se arrastavam em um círculo bizarro, o que quer dizer com isso? — indagou Lâmina-fria.
— Rodeavam uma figura… Eles rodeavam um certo ser, imóvel. Um homem envolto por um manto que oscilava, ele empunhava uma esfera que se dividia em duas cores… Uma metade púrpura e uma metade negra como carvão… Nós não ousamos nos aproximar, voltamos com medo. — O batedor abaixou a cabeça.
Kord não poderia julgá-lo, não era missão deles enfrentar coisa alguma, mas agora, com uma localização, seria mais fácil desprender das forças do reino para a aniquilação desse mal.
Essas informações correram rápido, primeiramente para Claude e Yelena, depois para Celérius e todo o seu batalhão. Repousando finalmente nos ouvidos de Ayel e do esquadrão, que arquitetou necessariamente o que precisaria ser feito.
Não tardou e o acampamento imergiu em agitação, era possível escutar o som das armaduras ajustadas, o som distante das vozes dos clérigos fazendo suas últimas preces em murmúrios desamparados, afiava-se o aço. O silêncio de outrora fora sobrepujado.
O alto sacerdote Celérius tomou a liberdade, com o poder das suas palavras diante dos outros comandantes, sugeriu uma divisão estratégica das forças do seu batalhão: Ele, junto de parte dos clérigos, permaneceriam no acampamento, que passaria a funcionar como um refúgio, uma base médica. A retaguarda que poderia ser utilizada em casos de urgência.
A outra parte dos sacerdotes acompanharia o batalhão dos batedores, encarregados de purgar os mortos com a luz da fé.
Nessa ocasião em específico, as forças do templo se provariam tão úteis quanto os guerreiros em nome da coroa, o mana branco age como um fogo divino em mortos-vivos. O clero demonstraria sua força total.
— A formação é boa, mas não podemos tolerar algum tipo de falha, diferente do incidente com os goblins. Agora, nós, quem está invadindo terreno alheio, não sabemos o que esperar.
Ayel dissera, na frente da sua luxuosa tenda estavam todos os representantes dos batalhões, ali estavam sendo discutidos os últimos detalhes para o ataque.
— Concordo, meu rei. — Assentiu Yelena. — Com parte dos clérigos se unindo ao meu batalhão e o restante ficando no acampamento, tornam-se apenas duas frontes, a sua e a nossa.
— Temo que precisaremos desfazê-la ainda mais, eu acredito que o grande problema seja a horda, não o homem que segura a orbe. Eu e o esquadrão poderemos cuidar disso.
— Majestade, o senhor tem certeza disso? — indagou Claude.
— Sim… Não posso permitir que ocorra falhas da parte de vocês para com a horda, não são criaturas simples de serem finalizadas como foram os goblins. Certo? — O rei bárbaro encarou Kassandra e Bruxo Negro, a mulher de cabelo cobre apenas assentiu com a cabeça.
Bruxo Negro coçara a garganta.
— O rei está correto, zumbis… Até onde se sabe, podem espalhar sua infecção a partir da mordida ou do arranhão. É possível que aqueles que forem infectados possam ser salvos com poções de Nox Arcana ou tratamento correto vindo do clero, entretanto, caso vocês caiam… Se tornarão automaticamente um morto, tal qual nossos inimigos.
E o silêncio venceu. O perigo de ser infectado atingiu os representantes, imagina os guerreiros menores.
A preocupação de Ayel era válida, sendo esse o caso. Os batedores estariam com quase todo o exército para derrotar os zumbis, enquanto apenas os membros do esquadrão tratariam de cuidar do homem que segurava a orbe macabra.
— Alguém tem alguma objeção? — Dissera o rei, levantando-se e guardando sua espada bastarda nas costas.
Todos estavam de acordo.
No oposto extremo daquele acampamento, ergueram-se os estandartes do clã Alvorada, como um aviso para o presságio obscuro a que todos estavam destinados. Celérius e os clérigos iniciaram seu processo de criar diversas camas utilizando restos dos panos de tenda enquanto o restante todo da tropa cavalgava alinhada em direção à horda que havia sido avistada.
Lilian, uma das clérigas em nome do templo, acompanhava o Esquadrão do Centro da Praça. Eles estavam inseridos no centro do batalhão e seguiriam adiante enquanto o restante estivesse cuidando dos zumbis.
Passara um tempo considerável até que a horda pudesse ser vista na linha do horizonte, então, o exército de Sihêon estava cada vez mais perto do combate. Todos estavam tomados por uma sensação muito estranha, era uma mistura solene de ansiedade com medo. Cada homem e mulher presente na cavalaria sabia que estava marchando para um campo onde não existia descanso, um local onde a morte não dava sossego algum.
Rumavam a um confronto sem misericórdia, talvez zumbis sejam as criaturas mais difíceis de serem combatidas, difere-se de um monstro que tenha seu instinto selvagem ou amor à vida. Um zumbi é um erro da natureza, algo que não deveria continuar se mexendo, mas ainda assim fazia.
O coração de todos eles estava transbordando esperança, mas essa mesma esperança parecia muito frágil. Pois, a qualquer momento, tudo poderia dar errado.
Esse era o misto de emoções que todos passavam naquela hora.
Havia diversos cavalos galopando com força sob o solo insalubre, o som dos cascos sobressaia em relação ao resto que poderia ser escutado, os membros precisavam gritar entre si para que pudessem se fazer compreender.
— Chegamos! Conseguimos criar contato! — gritara Kord, erguendo as mãos, chamando a atenção dos sentinelas, que espelharam suas ações em Yelena, que sacou o arco.
Ainda longe, mas aproximando-se gradativamente, era possível ver a horda que estendia como um tapete negro sobre a terra sem vida. As criaturas cambaleavam, andando sem muita destreza. A pele desses zumbis variava entre diversos tons, os mais chamativos eram esverdeados e roxos, muitos dos quais tinham a carne tão ressecada que pareciam múmias reanimadas do que cogitar que fossem cadáveres de mortes recentes.
Os olhos deles lembravam piscinas leitosas, brancos, opacos e sem brilho. Sem vida.
Lembravam os olhos do exício.
Como havia sido dito nos relatórios, estavam realmente fazendo um círculo, uma ciranda morta ao redor de uma figura no centro da planície. E no centro daquela espiral profana, como se aquilo fosse o olho de uma tempestade apocalíptica. Erguia-se e permanecia uma figura negra. O homem que segurava a esfera pulsante.
Estavam mais próximos do que nunca.
— Qual o seu plano? — indagara Kassandra, levando seu cavalo para próximo do alazão do rei.
Victoria e o arcano cavalgavam próximos também, atentaram-se ao assunto.
— É apenas um homem, você e o Bruxo Negro vão saber o que fazer com a orbe, eu e o esquadrão vamos cuidar do resto, vamos acabar com ele.
A necromante e o bárbaro gritavam um para o outro sem tirar seus olhos do homem com a orbe. Ele não se movia, não é como se precisasse, já que toda a horda girava ao seu redor como devotos putrefatos em uma festa necrófila.
Por mais que o medo consumisse os presentes, o batalhão seguiu.
O choque estava prestes a acontecer, o esquadrão visualizava Yelena e os seus homens prontamente arqueavam seus golpes. Kassandra estava ofegante, animada, mas apreensiva. A calma do rei ao seu lado a deixava ainda mais preocupada, ela precisava entendê-lo.
— Como pode ter tanta certeza de que eu ou o Bruxo somos capazes de cuidar de algo assim, meu rei?
Ayel batera com as rédeas, o som do couro chicoteando sob a crina do cavalo fez o mesmo relinchar, ele encarou a Morta-viva nos olhos e sorriu com uma confiança estupenda.
— Eu apenas sei.
Regras dos Comentários:
Para receber notificações por e-mail quando seu comentário for respondido, ative o sininho ao lado do botão de Publicar Comentário.