Capítulo 079 - Retorno d´arco!
Capítulo 079 – Retorno d´arco!
A comitiva de Sihêon retornara ao reino após diversos dias de marcha pelas veredas nortenhas, cruzando as florestas cerradas até visualizarem os portões que eles conheciam.
A visita do imperador a Hayit mostrou-se proveitosa, assim que passaram pelo domínio do bárbaro, tanto Nael quanto Alyssius regressaram para seus descansos. Ayel se viu de volta a sua estranha calmaria.
Seu castelo de pedra mantinha uma quietude que ele por um instante havia esquecido, os criados o tratavam bem, era palpável visualizar a mudança com o decorrer do tempo, o respeito pelo ruivo florescia. Mas era calmo demais, pacífico demais.
O Alvorada ficava completamente frustrado, se estivesse no seu bando em tempos de outrora, os bárbaros fariam peleias entre si pelo tédio.
Nesse período, o bárbaro recebeu algumas visitas: Victoria, Bruxo Negro, Alyssius.
Ele pensou que viria sua sentinela, mas nada.
O jovem monarca procurara por Yelena por mais de uma ocasião, mas sua criada, Onore, havia mesmo dito que não via a loira há muito tempo.
Isso perturbou o tribal, seus pensamentos passaram a se tornar um misto de curiosidade com preocupação.
Até que, dias depois do seu regresso, ele escutara a porta do salão principal. O ruivo estava sentado no seu trono, demonstrando um certo desconforto assim que viu a sua subalterna entrar.
Os olhos de Ayel faiscaram, e sua expressão fechara enquanto seguia os passos da sentinela com os olhos.
A líder da guarda real surgiu marcada, aquela pele pálida e macia estava com diversos cortes, arranhões e hematomas que denunciavam sua batalha recente. Incrustada de poeira e barro naquele rosto que, em algum momento, foi imaculado.
— Onde esteve? — perguntara Ayel, sua voz grave estava ecoando.
Interrompeu a reverência da loira, que ergueu o olhar com um cansaço ímpar que refletia seus olhos.
— É assim que demonstra a sua preocupação comigo?
Havia ramos secos e folhas agarradas aos cabelos quase esbranquiçados, seus trajes de couro estavam opacos e sujos.
— Eu apenas não sabia que a minha líder da guarda real poderia abandonar o posto sem que tivesse um motivo aparente. — Alvorada retrucou.
Atrás de si, Yelena arrastava um saco de pano atado com cordas grossas, era enorme. Dele, escorriam frágeis gotas de sangue. Sem cerimônia alguma, ela lançara o saco ao chão.
O impacto fora poderoso, retirando o embrulho desgrenhado e então rolou a cabeça do Roca para frente.
O imperador arregalou os olhos, magicamente sua ira e frustração dissiparam-se em um sopro. Tornou-se uma admiração brilhante.
— Roca… Há quantos anos eu não via um…
— Explicado? — replicara a sentinela, exausta e com a voz de quem estava impaciente.
O monarca cerrou os punhos, sua respiração estava pesada. Ele encarou profundamente para a mulher na sua frente.
— Existiu, então, uma ameaça ao meu reino a ponto de surgir um Roca e eu só fiquei sabendo quando o mesmo foi derrotado? — Ele suspirou. — Quem estava com você?
— Os batedores me informaram da aproximação da fera… Eu estava com Badaboom.
Ela ergueu o peito com um pouco de esforço.
— O mudo? — O jovem ergueu a sobrancelha.
— Sim… Ele.
— Quem mais?
O imperador não perguntava de forma que estivesse tentando ofender a sua subalterna, ele compreendia a força de um Roca, inclusive batalhou com um no seu passado, ele tinha a total ciência que precisaria de uma poderosa tropa para que pudesse ser derrotado.
— Mais ninguém… Apenas eu e ele.
O ruivo caiu em silêncio, isso era um feito inimaginável.
Ele transbordava um orgulho no seu semblante.
Horas mais tarde, uma clériga aplicara sobre a pele da loira um pouco do seu mana branco. Cicatrizando as suas feridas, Yelena depois repousara em um dos inúmeros aposentos do castelo, por ordem do imperador, fora banhada em uma grande bacia de madeira aquecida com pedras ferventes.
O vapor enevoava o ambiente com vigor e o ar impregnava com aromas de ervas esmagadas e flores secas.
As criadas esfregavam o corpo nu da líder da guarda real, enquanto a água manava, levando os tons escuros de sangue e terra embora.
Relaxada, a moça solicitou para que elas a deixassem sozinha por um momento, assim, Yelena permaneceu. Fitava a janela do sol do meio da tarde que invadia o seu aposento, imersa nos seus pensamentos.
Um toque à porta a fez retornar para a realidade.
— Sou eu. — Era a voz do imperador.
— Majestade… Por favor, entre.
O homem passou pelo batente, claramente envolvido pelo calor e o perfume das ervas. O vapor formava pequenos véus que parcialmente ocultavam a visão do ruivo, mas, no fundo do aposento, os seus olhos encontravam a pele clara da mulher, agora úmida e rosada.
Ela estava de costas, despejava sobre os ombros uma concha de água escaldante, partes da sua claríssima pele avermelhavam, mas ela não parecia incomodada com tal.
Ele não desviou os olhos, quebrou o silêncio sucessivamente por um certo tempo, encarando-a se banhar.
— Como se sente?
— Bem melhor… — murmurou a loira.
— Então, agora acredito que possamos conversar.
Por mais que a janela de frente para a bacia de madeira da loira estivesse aberta, não havia nenhuma corrente de ar, o que criava um ambiente quente, acolhedor.
Continuava sendo a calmaria de que o Ayel parecia estar tentando se distanciar, mas havia um bom tempo sem ver a sua subalterna, ele se permitiu relaxar.
— Sobre o que deseja falar? — indagou a sentinela, sem virar o seu corpo.
Ayel sentou-se na borda da cama, seu olhar estava ardendo em direção à figura daquela loira, o seu corpo estava lindo e chamativo, o ruivo começara a corar, embora ainda estivesse tentando disfarçar o desejo.
— Não é segredo… Todos sabemos o que pode chamar a atenção de um Roca. Sei que você sabe das lendas.
Ela ficara pensativa, murmurando para si mesma.
— Acúmulo de riquezas… Desequilíbrio de forças…
Então, o imperador franziu o cenho.
— Bom, não possuímos ouro suficiente para atrair a ira de um Roca… Porém, há algo em nossos domínios que poderiam desequilibrar o poder.
— O que seria, meu senhor?
A jovem girou o corpo, revelando-se por inteira no meio do vapor.
Ayel mordeu o lábio inferior ao contemplá-la.
— Bom… Acredito que seja a orbe que entregamos para a Kassandra, o Bruxo Negro me preveniu sobre o poder do artefato… Cheguei a chamar ela para o castelo, mas ela apenas não veio. Ouvi dizer que ela acabou tombando fazendo alguns experimentos, torço que não tenha sido usando essa maldita orbe.
— Como você deseja proceder, majestade?
O coração do bárbaro estava pulsando agressivamente, ele começara a esquentar, ele perdeu-se momentaneamente na nudez daquela mulher, mas ele precisava deixar a lasciva de lado e continuar agindo como o líder de um reino no qual ele era.
— Não sei se devemos tomar o artefato dela, ou entregar ao Bruxo Negro… Já que ele mesmo se recusa a tocá-lo.
— Pretende repreendê-la?
— De alguma forma, sim. Mas eu não sou o tutor da Morta-viva… Nem sou um sábio dos arcanos para conseguir instruí-la de alguma forma. Talvez eu precise contar com o auxílio de Nox Arcana, se é que aceitariam esse tipo de tarefa…
Enquanto dizia, o tribal retornava ao silêncio, seus pensamentos vagavam enquanto acompanhava o som da água que gotejava da Yelena na banheira.
Mais véus erguiam-se do vapor da água quente, o aposento parecia um templo antigo com diversos incensos.
— Eu compreendo… — A mulher falou quase em um sussurro.
As chamas das tochas ardiam com uma certa preguiça, sem tanta necessidade devido ao clarão da tarde ainda iluminar ambos no recinto.
Algumas ervas ainda estavam presas nos braços e costas da loira, ela mantinha a concha cheia de água e a despejava calmamente para continuar o seu ritual do banho.
O homem continuara sentado na beira da cama, lentamente os seus cotovelos foram apoiados no joelho, fitando a loira como quem estivesse encarando o próprio problema que ele estava para enfrentar.
— Esse tipo de situação não pode ser tratado como um mero acaso… — Ayel murmurava. — Uma criatura alada como o Roca não ousaria se aproximar de Sihêon sem uma boa razão… Se há forças que foram despertas, Yelena… É algo que estamos sendo forçados a agir.
Seus olhos ardiam.
A sentinela retornou ao seu banho, virando-se mais uma vez e continuando a se molhar, relaxada.
— O senhor acredita que a Kassandra seja realmente a causa? — Ela perguntou.
Ela emergiu o máximo que a dimensão da bacia de madeira permitiu, fazendo algumas bolhas com a boca que estava abaixo d’água, potencializando o vapor que subia.
— Não creio…
Alvorada inclinou-se para frente, seus punhos estavam cerrando aos lentos.
— Kassandra recebeu a orbe de mim, e o Bruxo Negro me advertiu do seu poder… O fato dele mesmo ter se recusado a tocar na pedra… Talvez apenas a existência da pedra possa ter sido o suficiente para atrair a atenção do Roca, se ela utilizou a pedra e então o convocou… Bom, aí o buraco seria mais embaixo.
— Como vai agir então, majestade? — indagou Yelena, virando levemente o rosto, com o vapor contornando os seus traços.
O bárbaro sorriu friamente, com um pouco de crueldade.
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