Índice de Capítulo

    Siegfried descansou as costas em uma pilastra de madeira e assistiu de longe enquanto Brynna era posta de joelhos em frente ao trono, com dois guardas às suas costas e meia centena de vozes soltando insultos a seu respeito.

    — Que cena familiar — brincou.

    — Cê tá rindo? — perguntou Gwen, parando ao seu lado.

    — Que foi? Não posso?

    — Hum. Sei lá. Só achei estranho. A cara emburrada combina mais contigo.

    — …

    — Cê tá bem tranquilo pra alguém que tá prestes a ver a namorada ser executada por traição.

    — Ela não é–

    — Tá, tá, tá. Celibato, honra e blá-blá-blá. É, eu lembro. Mesmo assim, cê tá tranquilo demais… É um julgamento de fachada, né?

    — …

    — Cê podia pelo menos negar. Bem, tanto faz. Mas agora tô meio curiosa, qual é o plano?

    — Passar uma mensagem.

    — Pra quem?

    Ele sorriu.

    O conde ergueu a mão e esperou o falatório morrer aos poucos, antes de começar:

    — Brynna!

    — Vossa graça.

    — Você é acusada de vazar informações para os rebeldes e conspirar contra a família Gaelor. Você nega sua traição?

    — Não, vossa graça. Não nego.

    Os murmúrios recomeçaram. Zumbidos irritantes de pessoas cheias de ódio, sempre prontas para ofender e desmerecer.

    O conde os ignorou.

    — Você serviu lealmente minha família por anos. Cresceu ao lado de minha filha. Era a sua amiga mais próxima. Me nego a acreditar que tenha sido tudo mentira. Por que fez isso?

    — Vossa graça, sou grata ao senhor por ter me acolhido. Sei que é muita pretensão de minha parte, mas sempre o vi como um pai. E a lady Emelia… Não há palavras pra descrever o quão arrependida estou por não ter lhe dito antes. Eu jamais faria algo para machucá-los.

    Ela encenou algumas lágrimas falsas, não que a multidão tivesse simpatizado com ela por causa disso. Pelo contrário, os insultos apenas se intensificaram.

    Então secou o rosto e prosseguiu:

    — Não há desculpa para minhas ações, mas não foi algo que fiz por vontade própria. Vossa graça, outra pessoa conspirou para derrubá-lo!

    Por um momento, o salão inteiro se calou, antes de explodir em agitação.

    Então todos começaram a falar ao mesmo tempo; os mais estúpidos perguntavam uns aos outros a quem ela se referia, como se alguém ali tivesse a resposta, enquanto os menos burros pediam silêncio para ouvir o que Brynna tinha a dizer — e é claro que isso só uniu mais vozes à multidão e transformou o falatório em uma tempestade fora de controle.

    — Silêncio! — gritou o conde, e o salão obedeceu. Então se virou para a garota: — Continue.

    — Obrigada, vossa graça. Como estava dizendo, fui forçada a entregar informações aos rebeldes. Essa pessoa ameaçou a mim e a minha família. Jurou que cortaria a garganta da lady Emelia na calada da noite e poria a culpa em mim se eu contasse a alguém. Agora vejo que foi um erro. Devia ter corrido até o senhor e dito tudo o que sabia, mas temi que não acreditasse. Temi que as ameaças dele fossem reais. Mas não posso mais temer.

    — Quem deu a ordem?

    — O barão Frost, vossa graça.

    Siegfried já estava olhando para o barão quando Brynna disse seu nome, por isso viu o momento exato em que sua expressão mudou. De calma à surpresa, e então raiva.

    — Sua puta mentirosa! — gritou o velho.

    A multidão formou um círculo ao seu redor, se afastando dele como se fosse um leproso. Isso só o deixou mais furioso, então avançou:

    — Retire o que disse!

    — Guardas! — disse o conde, e dois soldados derrubaram o barão Frost no chão.

    — O que estão fazendo!? Me soltem!

    — Kastor!

    — Vossa graça… O que significa isso? Diga pra me soltarem!

    — Você é acusado de traição.

    — O-o quê…? N-não pode estar falando sério…

    — O que tem a dizer em sua defesa?

    — É claro que é mentira! Essa vadia mentirosa…

    “Ele entendeu”, notou Siegfried. Não que fizesse qualquer diferença. Como se ganha um julgamento, quando o juiz está contra você?

    — O que foi? — perguntou o conde; seu rosto era tão frio como o de uma estátua, mas podia-se ver o brilho em seus olhos. Estava feliz. — Não tem nada a dizer em sua defesa?

    — P-provas… — sussurrou o barão, cerrando os dentes com tanta força, que pareciam ao ponto de quebrar. Então gritou: — Ela não tem provas, tem!?

    — …

    — Só a sua palavra. A palavra de uma traidora de baixo nascimento! Ela está mentindo! Só quer salvar a sua própria pele! Vai mesmo acreditar em uma serva, mas não no pai da sua esposa!?

    Sem surpresa, o salão ficou ao lado do barão. É claro que ficaria. Até que a condessa se levantou:

    — Tem a palavra de mais uma pessoa, pai.

    — C-Cassie…?

    Ela deu uma olhada para o seu marido, respirou fundo e então prosseguiu:

    — Não irei mais protegê-lo! O senhor tem feito de tudo para me pôr contra meu marido desde que chegou aqui. Fechei os olhos para a semente de sua traição por tempo demais. Não quis acreditar que o homem que me criou pudesse ser tão vil e invejoso ao ponto de desejar a fortuna do marido de sua própria filha.

    — O-o que está dizendo…?

    — Vossa graça, sinto muito — ela disse, se virando para o conde. — Devia ter lhe contado antes. Rezei para que estivesse enganada, e isso pôs em risco a nossa família.

    — Não é culpa sua, querida — respondeu o conde. — A traição do sangue é sempre a mais difícil de ver.

    A condessa congelou por um momento, então se virou para o seu pai e continuou:

    — Eu, Cassandra Gaelor, testemunho contra meu… Não. Contra o barão Frost! Ele conspirou com os rebeldes para assassinar meu marido e tomar o condado! Sua ganância e luxúria foram tão longe, que este homem, o homem que me criou, tentou vender sua própria neta para os rebeldes em busca de apoio!

    Ninguém se atreveu a abrir a boca. Ou talvez tenham apenas se esquecido de como falar. Mesmo o barão Frost estava sem palavras:

    — E-eu sou seu pai! Como pode–?

    — Mesmo que seja meu pai, meu lugar é ao lado do meu marido. Eu sou uma Gaelor! E o senhor ameaçou minha família… Um traidor é um traidor, mesmo que seja do meu próprio sangue!

    — N-não… E-eu…

    O rosto do barão ficou tão pálido que era como se já estivesse morto, e aos poucos o salão tomou o partido da condessa. Estava condenado e sabia disso.

    — N-não! — gritou o velho. — É-é mentira! Ela está mentindo! Não veem!? Estão tentando me incriminar! Eu sou a última oposição que resta! Primeiro o Kellen e agora eu! Seu governo está desmoronando, não conseguem ver!?

    Quando ninguém o apoiou, ele mudou sua estratégia:

    — Tsc. É tudo culpa dele!

    O barão apontou para Siegfried e, aos poucos, o salão inteiro passou a observá-lo com interesse e apreensão, enquanto o velho continuava:

    — Tudo começou a dar errado depois que ele apareceu! Não acham isso estranho? Um mercenário rebelde aparece e, do nada, todos que eram próximos ao conde começam a morrer, enquanto ele ganha poder!? É claro que está envenenando a mente do conde. Ele é o culpado!

    — N-não! Não é! — Dara avançou em direção ao trono, se afastando da multidão curiosa a passos lentos e hesitantes. Então parou ao lado do trono da condessa e se virou para o barão Frost, com a mão tocando o peito e os lábios trêmulos. — É o senhor que está mentindo!

    Quando o salão esqueceu de Siegfried e passou a prestar atenção nela, Gwen sussurrou:

    — Hum. Não sabia que a Dara tava metida nessa também.

    — Ela não tá! — respondeu o rapaz.

    — Eu o vi ameaçar Brynna! — prosseguiu Dara. — O senhor jurou que mataria a Eme, e forçou ela a falar com os rebeldes. Não sabia o que pensar na época. Acho que, assim como minha tia, também esperava estar enganada. Mas se o senhor realmente tentou vender minha irmã, não posso mais me esconder…

    Ela engoliu em seco e então gritou:

    — Kastor Frost é um traidor sujo!

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