Índice de Capítulo

    A última refeição antes da batalha foi carne seca com pão assado e leite com mel. Não que tenha sido um jantar animado. As garotas tinham muito pouco pelo que estarem ansiosas.

    Se o castelo caísse, então toda a esperança que pudessem ter de serem libertadas seria enterrada junto com ele. Nenhum fidalgo marcharia contra o inimigo por uma casa derrotada — e muito menos para libertar alguns plebeus escravizados. Depois disso, o melhor que poderiam esperar seria servir Siegfried pelo resto de suas vidas… Dificilmente o sonho de qualquer garota.

    Mas mesmo que o barão Silvergraft resistisse, ele não tinha forma de expulsar os invasores e tomar o vilarejo de volta. Nada mudaria.

    Fosse qual fosse o resultado, ficaria ainda pior se Siegfried morresse. Se tivessem sorte, talvez seu novo mestre também não abusasse delas, mas o mais provável era que se tornassem escravas de cama. No pior dos casos, seriam enviadas até um bordel e acabariam como todas as outras; usadas dia e noite até morrerem de uma doença venérea qualquer.

    Não havia boa perspectiva para nenhuma delas e sabiam disso.

    Podia sentir os olhos das garotas sobre si. Lavina sentava ao seu lado e de vez em quando tentava tocar a sua mão discretamente; Elsa dava comida para Will, que era o único ali comendo com vigor, enquanto ela mordiscava de vez em quando; até Allane parecia preocupada e encarava o prato da mesma forma que encararia um cadáver; só Ethel e Siegfried comiam normalmente.

    De vez em quando ouvia o raspar de talheres em porcelana ou o som de alguém mastigando, mas ninguém disse nada até que o rapaz terminou de comer e já se preparava para levantar.

    — Você vai morrer? — perguntou Allane.

    Todas congelaram por um momento e ficaram em silêncio. Até mesmo Ethel parou de comer e suas mãos começaram a tremer. Siegfried sorriu:

    — Você quer que eu morra?

    — …

    — Sinto muito desapontá-la, mas pretendo voltar. Vivo, caso ainda tenha dúvidas.

    — Todo mundo quer voltar vivo.

    — Nem todo mundo tem uma armadura.

    Isso pareceu devolver o brilho aos olhos delas, tal como sabia que iria. Tinha dito algo parecido para Dara, antes de partir. As garotas pareciam pensar que uma boa armadura era o mesmo que alguma bênção divina; se você a tiver, voltará vivo.

    Realmente era difícil matar homens de armadura, mas elas eram mais úteis para impedir que algum golpe de sorte os matasse no meio da confusão e serviam bem melhor em soldados verdes.

    Mas não via necessidade em explicar nada disso.

    Deixou o prato vazio na mesa e voltou para o seu quarto. A armadura negra que o conde Gaelor fez para ele estava montada em cima de um cobertor de lã forrado no chão; não havia qualquer sinal de ferrugem em parte alguma, mas passou óleo nas partes articuladas e poliu ela com cera até que as placas estivessem brilhando, só para garantir. Os forros internos também estavam em bom estado, o que era ótimo, porque teria sido difícil encontrar novos.

    Tinha cuidado da armadura ele mesmo, apesar de Ethel ter se oferecido para fazer isso:

    — Uma sacerdotisa aprende a servir de todas as formas. A madre priora fez questão disso. Se um irmão da Alma Branca nos visitasse, éramos nós quem cuidávamos da sua armadura, armas e até de seus cavalos.

    — Eu cuido das minhas próprias coisas!

    O equipamento de um soldado é a sua vida. Não pretendia ser rude com a garota, mas não tinha a intenção de colocar a própria vida nas mãos dela, por mais competente que fosse. Além disso, usou a oportunidade para ensinar Will como se fazia.

    O garoto ainda era muito novo para acompanhar Siegfried no campo de batalha, mas se pretendia mantê-lo como escudeiro, era bom que soubesse dessas coisas. Talvez também devesse começar a treiná-lo…

    “Depois de tomarmos o castelo”, jurou.

    Então trocou a roupa empoeirada e foi se deitar.

    O sono veio rápido, mas não sonhou.

    Ainda era de madrugada quando voltou a acordar e descobriu alguém subindo na sua cama. Estava escuro e tinha a vista meio embaçada, mas ainda conseguiu girar por cima do invasor e dominá-lo.

    Lembrou de Will o atacando no meio da noite e o seu coração disparou, mas não parecia ferido em parte alguma. O que queria dizer bem pouco com o sangue fervendo daquele jeito. Poderia ter uma faca enfiada no peito e não saberia dizer.

    — M-me desculpe — sussurrou a garota. — Não queria assustar o senhor. E-eu só…

    Levou menos de dez segundos até que pudesse enxergar novamente e lá estava ela, com os seus longos cabelos loiros cacheados espalhados pelo travesseiro, o rosto corado, seus lábios carnudos meio abertos da respiração ofegante…

    — Lavina!?

    — E-eu só queria ver o senhor… A-a batalha…

    De repente notou que ela não usava o pijama, só o vestido de chemise, mas o tecido era tão fino e curto que subiu até a sua cintura quando o rapaz girou por cima dela, deixando-a nua do umbigo à ponta dos pés. As suas coxas grossas presas em volta da cintura dele.

    Siegfried fechou os olhos de imediato e tentou se controlar. Qual era o problema das garotas? Será que todas elas ficavam excitadas em ver homens indo para a guerra ou só as que ele conhecia?

    “Você não pode ter todas!”, lembrou das palavras.

    Levou quase um minuto inteiro, mas conseguiu se acalmar. Soltou Lavina, levantou da cama e disse:

    — Está tarde.

    — M-mas eu…

    — É melhor você ir.

    — N-não. — Ela se agarrou aos lençóis como se fossem sua vida e então seus olhos se encheram de lágrimas. — P-por favor. E-eu… Eu te amo!

    — …

    — Não preciso ser sua esposa, posso ser a sua concubina! S-sou leal… E útil. O senhor mesmo viu. S-serei o que quiser! Por favor.

    — Saia!

    — N-não…

    A garota não se moveu, ao invés disso começou a soluçar e chorar descontroladamente. Isso só o deixou mais irritado. Lembrou de Beth, Izzie e a garota do lago, mas também de outras. Garotas que não chegou a ver, mas ouviu enquanto saqueavam a Vila do Lobo.

    “Por que ela tá chorando!? Eu não toquei nela!”

    Podia sentir seu sangue ferver. Os olhos arderem como se estivessem pegando fogo. Então viu sua espada ao lado da cama.

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