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    Aquela noite foi de comemoração.

    Depois de um mês e meio de cerco, finalmente o Castelo Silvergraft havia sido conquistado.

    — Nós vencemos!

    A notícia se espalhou depressa e logo as ruas da Vila do Lobo se transformaram em um verdadeiro antro de libertinagens. O racionamento de comida permanecia, mas não demorou muito até que os bêbados aparecessem.

    Os mais sensatos trancaram as portas e janelas, confinando as crianças dentro de casa, enquanto os loucos tomavam conta das ruas.

    Os bordéis ficaram tão cheios que mais escravas logo tiveram de ser trazidas. Homens arrastavam garotas com metade da sua idade para qualquer canto vazio e as violavam ali mesmo; os rapazes também, alguns foram usados como mulheres e outros foram usados por mulheres.

    Era a noite da invasão tudo de novo.

    Cães latiam, garotas gritavam, bardos tocavam e soldados brindavam. Siegfried ignorou todos eles e seguiu em frente, conduzindo o cavalo por ruas escuras. Tentando se manter longe da multidão.

    Não funcionou.

    Havia soldados e escravos em cada canto.

    Viu um homem bêbado mijando em uma escrava caída no chão, desacordada e nua; outro usando a sua como um cão usa uma cadela; e até dois soldados que dividiam a mesma garota, um pela frente e outro por trás. Mas os homens não eram os únicos se divertindo naquela noite.

    Ao virar em uma esquina, o rapaz encontrou uma mulher de quarenta anos estuprando um escravo de dezesseis.

    O garoto parecia um pouco afeminado, bastante limpo e delicado. Pequeno demais para a mulher adulta que montava nele, mas ela não parecia se importar; seus quadris se moviam cheios de vigor e a mulher gemia feito uma rameira.

    “Igual a Anna.”

    Foi só o que precisou. Podia sentir o seu coração pulsando e o seu sangue fervendo só de lembrar dela. Tinha sido apenas uma brincadeira; a forma que os seus homens encontraram para expressar a ‘preocupação’ deles com Siegfried. Mas mesmo assim, as coisas que ela fez…

    “Você não pode ter todas.”

    Quando finalmente chegou ao Dragão Assado, a porta de entrada estava trancada, mas depois de chamar por Ethel, abriu.

    — Milorde?! — Ela o abraçou por um segundo e então se apressou em puxá-lo para dentro, antes de trancar a porta novamente.

    Estavam todas no salão de entrada.

    Allane tinha uma faca na mão, enquanto Elsa se encolhia em um canto agarrada ao Will e Lavina se apressava para vir abraçar Siegfried, mas ao contrário de Ethel, a jovem se demorou bem mais que um segundo:

    — Que bom que o senhor está bem. A-as ruas… As pessoas enlouqueceram.

    — Só estão comemorando.

    — Comemorando?

    De repente o salão ficou em silêncio e todas elas prenderam a respiração, até que Ethel reuniu um pouco de coragem e perguntou:

    — O-o castelo… Ele…?

    — Tomamos o castelo esta tarde.

    Pela expressão que Ethel fez, bem parecia que o rapaz tinha acabado de esbofeteá-la.

    Nenhuma delas disse nada, mas o luto estava lá. Seriam escravas pelo resto da vida. Elsa agarrou Will com ainda mais força, Allane deixou sua faca cair no chão e fugiu com lágrimas nos olhos, mas Ethel manteve a dignidade e Lavina parecia ser a mesma de sempre.

    Apesar da pressa com que Ethel puxou Siegfried para dentro, o rapaz teve de sair novamente para levar o cavalo até o estábulo ao lado da taverna e alimentá-lo. Quando voltou, se dirigiu até o quarto para retirar a sua armadura com a ajuda de Ethel, enquanto Lavina preparava o banho.

    Ethel estava desafivelando a parte de trás do seu peitoral, quando finalmente reuniu coragem para perguntar:

    — Milorde, se não for muito atrevimento da minha parte… P-poderia me dizer o que foi feito com as pessoas do castelo?

    — Você tinha amigos lá?

    — …

    — Os guardas foram todos mortos. Encontramos também algumas servas. Elas foram levadas até a prisão e vão se tornar escravas. Sinto muito.

    — E as crianças?

    — Crianças? As únicas que encontramos foram as do barão Silvergraft.

    Ela não disse mais nada depois disso; se limitou a terminar de retirar sua armadura e então fugiu depressa, com a desculpa de ir preparar o jantar.

    Nessa altura, a banheira já estava pronta.

    Ao contrário da amiga, Lavina se deixou ficar no quarto e o ajudou a se despir, embora tivesse as mãos mais trêmulas e desajeitadas que o normal. Depois de dez segundos tentando desamarrar os laços da sua camisa de linho, Siegfried pegou as mãos dela nas suas:

    — Tá tudo bem, eu faço isso.

    Se a garota o escutou, não esboçou qualquer tipo de reação e preferiu manter a cabeça baixa.

    — O-o que vai acontecer agora?

    — Como assim?

    — A-agora que tomaram o castelo… A-acabou? O senhor vai voltar pra casa?

    — Não. Ainda não acabou. Na verdade, é agora que a nossa campanha realmente começa. Esse castelo é só um posto avançado.

    — Então o senhor vai embora.

    — Vou.

    Quando Lavina levantou o rosto, suas bochechas estavam vermelhas e os olhos cheios de lágrimas:

    — Me leva com o senhor. Por favor. E-eu sei que não me acha atraente. Os garotos sempre diziam que eu era muito gorda. Me chamavam de coisas feias… M-mas eu posso ser útil. Mesmo que não seja como sua esposa, nem sua concubina. Sou útil em outras coisas. E leal, juro. Só ao senhor e a ninguém mais. Farei o que disser!

    — Tá bom.

    Pela expressão que a garota fez, nem ela mesma parecia acreditar no que ouviu, mas essa sempre tinha sido a intenção de Siegfried. Eventualmente teria de libertá-las quando voltasse ao Salão dos Poucos, já que não teria condições de mantê-las, mas por enquanto eram úteis.

    Lavina ficou tão feliz depois disso que insistiu em ajudá-lo a se lavar, mas as lágrimas não paravam de escorrer, por isso o rapaz mandou ela enxugar o rosto e ir ajudar Ethel com a comida.

    Quando finalmente terminou de tomar banho e se vestir, as garotas já haviam se acalmado. Embora tenham parecido um pouco amigáveis demais.

    Ethel era praticamente a mesma, mas Elsa olhou Siegfried nos olhos pela primeira vez e até Allane foi educada quando se dirigiu ao rapaz. Diferente do habitual silêncio, as garotas conversaram com ele e entre si, sorrindo e brincando.

    “Elas estão imitando a Lavina?”

    Depois do jantar, Siegfried fez uma barricada com a mesa para tranquilizar Elsa e as outras. O rapaz tentou explicar que ninguém invadiria as casas ou lhes faria mal, mas nenhuma delas quis escutá-lo. Na noite da invasão, soldados arrombaram portas e assassinaram pessoas em suas camas; não era o tipo de coisa que se esquecia facilmente.

    As garotas lavaram a louça, lhe deram boa-noite e então todos foram se deitar.

    Uma noite tranquila.

    Até de madrugada.

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