Capítulo 13 - Questões e Silêncio
O céu desta manhã se perdeu há algum tempo dentro de Fyodor.
Durante esse período, Raisel caminhou até os cadáveres da mulher e do espadachim para saqueá-los enquanto se recuperava.
Não tinha nada muito interessante além dos seus armamentos, mas seria o suficiente.
Agora, ele está se banhando em um pequeno lago na extremidade da ilha.
Por conta da água densa, ele se banha controlando os níveis de energia com refino ao usar ela como barreira em diferentes distâncias.
“Minhas costas na camisa e no colete estão totalmente rasgadas… Eu tomei uma espadada? Não, eu acho… Não tô com nenhum ferimento nas costas…”
Passando um pedaço de pano contra a pele, retira o excesso de sangue dos danos que recebeu nessa última batalha 一 O corte no ombro direito e o disparo de flecha fortalecida de raspão na costela direita.
“Fazer o Schaltung de Aquarius é melhor pra me recuperar. Então cada Schaltung é melhor em alguma coisa… Só que ainda é estranho. Por que eu consigo ter dois?”
“De qualquer jeito, o circuito de Aquila tá mais incorporado em mim. Deve ser por isso que eu consegui aquela habilidade. Ziele Ordnung. O vovô também deve ter ela além da sua própria habilidade exclusiva.”
“Bom, acho que os próximos passos são desenvolver melhor Aquarius e ver os limites dessa habilidade nova. O único problema é que Aquarius gasta muito Gewissen por causa da quantidade de estrelas e linhas.”
“Mas foi estranho a sensação de ter unido dois Schaltung… Minha energia foi aumentada ao invés de diminuída… Tem tanta coisa que eu não sei.“
Suspirou.
Durante o seu período introspectivo, o rapaz se vestiu apropriadamente após o banho.
Nas costas, equipou a grande espada de Teuram. Na cintura pelo lado esquerdo, está a espada fina. Pelas costas na cintura, está o par de adagas de Ellen.
“Queria ter pego o arco, mas eu danifiquei muito o corpo do arqueiro… Não sobrou nada pra ser reutilizado. Não vai ser dessa vez que eu pratico as suas técnicas de arco, vovô.“
Se espreguiçando, de acordo com a posição do sol artificial no céu, deveria estar próximo do meio dia.
“Acho que até próximo do fim da tarde tô recuperado. Lá do alto do pilar eu vi uma parte que parecia uma floresta. Vou ver se tem algum animal por lá…. Preciso comer alguma coisa.“
Pondo a mão contra o abdômen, sente o estômago roncar com certo desespero.
Em uma corrida comum, o garoto se encaminha até a floresta. Não é tão longe, mas está mais afastado das áreas dos pilares ou do lago na extremidade oposta.
Conforme se encaminha, ele vai observando os arredores além da ilha. Como não tem nenhuma nevasca e é uma área mais aberta que predomina aqui, seria melhor escolher o seu próximo destino o quanto antes.
“Hm… Acho que o melhor é ir no castelo mesmo. São duas ilhas de distância daqui.”
“A ilha mais próxima é um deserto, mas julgando pela experiência na ilha de neve, não é tão bom me guiar por ilhas assim… Vou ir pra uma mais longe contornando esse deserto.”
“Deixa eu ver…”
Flexionando bem as pernas, o rapaz prepara um salto e vem a se impulsionar o mais alto possível para ter uma perspectiva melhor.
“Ó, ali na direita tem uma ilha que parece um grande santuário. Vou ir lá e depois seguir em frente pegando aquela outra que parece uma montanha escura. É isso!”
Caindo, Raisel pousa com suavidade ao usar um pouco de energia nas pernas. De frente para a floresta, ele respira com cuidado e se concentra.
“Mudar com calma… Preciso dos sentidos de Aquila agora… Aquila”
Dentro dele, os números de pontos e linhas são reduzidos e a forma da Constelação de Águia se estabelece.
De imediato, a audição capta o som de diversos animais na floresta. Desde pássaros à coelhos e pequenas raposas. O olfato percebe o aroma sutil de frutas e flores. A visão já consegue identificar pegadas de um animal maior e, o tato nota uma intenção assassina primitiva vindo de dentro da área.
“Os herbívoros estão fugindo. Um predador… Pelas pegadas, é uma espécie de felino. É melhor eliminar esse animal antes.”
Adentrando na mata, o jovem se move com cautela sem expelir o seu Gewissen. Pelo contrário, ele está restringindo o seu eu quase completamente.
Com uma das adagas em mãos, está seguindo os rastros das pegadas que estão cada vez mais úmidas 一 O que fortalece sobre o quão recente elas são.
“Esse animal deve ter vindo pra cá por conta da luta nos pilares, eu acho… O curioso é que não vi nenhuma pegada no caminho e a forma como elas estão espalhadas é esquisita…”
Parando para se agachar próximo a um desses vestígios, Raisel põe a mão livre contra o chão em busca de mapear melhor a área usando a vibração dos passos de outros seres próximos.
“Silencioso… Acho que os animais já se esconderam depois de perceberem a presença dele. Não o sinto ainda.”
Contudo, o som de algo rasgando o ar à esquerda é captado pelo garoto!
Em um movimento rápido, ele se esquiva ao pular para trás. A emboscada do predador passa como um vulto e desaparece…
“É uma pantera… Ela entrou na sombra das árvores? Então é um animal abençoado por uma Constelação… Todo esse lugar é o território dele.”
Encarando os arredores de soslaio, a atmosfera está pesada. As sombras das árvores, a floresta nunca pareceu tão escura e perigosa.
Movendo-se lentamente para desembainhar a outra adaga, o som de algo rasgando o ar vem novamente, mas dessa vez pela direita!
O rapaz se vira, mas não há nada… Os olhos dele decaem bruscamente como um reflexo.
“Por baixo!”
O olhar dele e do animal se cruzam.
Em um salto, se esquiva do arranhão sobre os tornozelos enquanto arremessa uma das facas em direção a criatura afundada parcialmente em sua própria sombra.
Contudo, a ágil pantera evita com facilidade. Ela parece deslizar subitamente ao ponto da lâmina cravar sobre o gramado.
Raisel cai enquanto rola se preparando para desembainhar a lâmina fina na cintura.
“É muito rápido pra acertar… Em um combate direto eu estou em desvantagem por conta desse afundar em sombras. O que eu faço?”
A fera se move por entre as árvores já fora da sua habilidade, o que a revela completamente. Os vultos dela como o breu da noite buscam confundir a percepção dele sobre quando virá a atacá-lo.
“Trocar pra Aquarius agora é perigoso… Vou tentar usar aquilo, mas com menos Gewissen e ver se consigo usar só no arremesso da faca.”
Em um respirar profundo, a energia do protagonista banha a si mesmo, mas rapidamente passa a se concentrar somente na adaga.
“Ziele Ordnung.”
Como da última vez, a perspectiva da visão muda.
O ambiente é monocromático em um tom de preto com contornos esbranquiçados, os únicos pontos distinguíveis em cores diferentes são os dos seres vivos, mas estão restritos com o tamanho das suas vontades.
Olhando para a própria mão, observa essa região como um dos pontos por conta da concentração de energia.
Em seguida, passa a olhar o felino em câmera lenta sendo um respectivo tom púrpuro.
Devido a mudança na percepção, é visível uma constelação sobre a cabeça dele. Tal habilidade característica da pantera foi concedida pela Constelação de Caelum.
O menino, por sua vez, visualiza a linha de atração que seria a responsável pelo amplificar da velocidade. Logo, arremessa a adaga enquanto libera a técnica.
Na visão do animal, foi como se um clarão ofuscasse as suas sombras e a atingisse como um relâmpago. A costela do predador foi perfurada com força o suficiente para cravá-lo contra uma árvore.
O rugido de dor foi emanado para os arredores…
A fera foi vencida.
“Deu certo… Mesmo com menos energia, é bastante preciso. Essa habilidade deve ser mais pra projéteis então. Bom, faz sentido já que é a Constelação do vovô que é um arqueiro~”
Raisel sorri enquanto se encaminha até a criatura.
A espada de lâmina fina é sacada.
一 Foi mal… Não queria ter que fazer isso, mas é preciso.
Quando a arma está prestes a decapitar a pantera, a mesma permanece a encarar o garoto de soslaio com extremo rancor.
一 Espera!
Uma voz fina como a de uma criança fez com que os braços de Raisel parassem antes da finalização.
Sem entender, o rapaz olha de lado.
É um pequeno coelho com franja que está ali.
一 O coelho… falou?
O rapaz cochicha confuso, mas as orelhas do animalzinho captam com nitidez.
一 Sim! Foi eu!
A confirmação veio do próprio meliante.
Uma feição completamente surpresa se instaura no protagonista paralisado. A sobrancelha direita sobe e desce como um espasmo, não acreditando que é verdade.
Contudo, ele logo se recompõe afastando a espada, mas a mantendo em mãos.
一 Você vai poupar ela, senhor humano?
一 Hã… Acho que sim. Eu só me defendi da emboscada dela.
一 Desculpa por ela ter te atacado! Ela não gosta de humanos, já que geralmente eles vem aqui e caçam a gente…
Ao ouvir aquilo, Raisel parece petrificar e desvia o olhar. Em seguida, coçou a garganta pondo o punho livre em frente aos lábios.
一 Ghrm… Pra falar a verdade, eu também iria caçar vocês. Eu tô com fome.
A pantera atrás ruge com ferocidade ao tentar se soltar, mas também dar um aviso.
一 E-Então vo-você…
A feição do coelho se torna melancólica, está prestes a chorar enquanto treme de medo. Na perspectiva dele quando ouviu aquelas palavras, o menino é ainda mais aterrorizante…
一 Ah! Não, não… Eu não posso fazer isso mais… Digo, não tem porque eu matar vocês. Claro, eu prefiro comer carne… Mas notei que tem frutas por aqui e isso é o suficiente.
Meio desesperado e com dó do animalzinho fofo, Raisel balança as mãos para tentar confortar o coelho.
一 Você tá falando a verdade?
一 Tô. Eu prometo!
Ele põe o palmo livre contra o peitoral enfatizando a sua vontade.
一 Então tá bom!
A criaturinha abre um sorriso genuíno de felicidade.
Por outro lado, a pantera parece decepcionada com a atitude do coelho. Incrédula por ver tanta ingenuidade…
一 Como você se chama, senhor humano?
一 Raisel. E você? Tu tem um nome?
一 Eu me chamo Shishika! E essa atrás de você é a Asparsia!
“Ah… É uma coelha.”
一 Prazer, Shishika. A Asparsia também fala?
一 Não… O Soberano Valdrien retirou a permissão de fala do clã das Panteras…
“Valdrien? Quem é esse?”
一 Entendi. Não precisa ficar triste. Sei que tudo vai dar certo, tá bom?
Raisel se agacha em frente a coelha.
一 Tá bom… Obrigada, senhor Raisel!
As orelhas de Shishika balançam para cima e para baixo diversas vezes enquanto saltita.
O menino sorri com certa felicidade e se levanta.
一 Vou tirar a adaga que tá prendendo a Asparsia. Ela não vai me atacar, né?
一 Te garanto que não! Se ela atacar, vamos contar tudo pra mãe dela!
Completamente rendida, a pobre pantera apenas desiste de tentar impedir o humano de seguir em frente…
Ao se aproximar da fera, o protagonista muda o Schaltung com cuidado enquanto se agacha.
Guardando a espada fina e a outra adaga, uma das mãos se impõe sobre o cabo da arma fincada na criatura negra.
O Gewissen de Raisel é exalado sutilmente para amenizar a dor contra a ferida conforme tira a lâmina sobre o corpo de Asparsia.
Quando sente a energia do humano, a pantera arregala os olhos. Uma reação parecida com a do garoto quando sentiu o frio aconchegante de Hiseld pela primeira vez.
No fim, tudo ocorreu sem problemas.
一 Pronto. Acho que ela vai ficar bem agora.
A besta escura ronrona com certo grave para a direção do rapaz, mas em seguida se contorce para começar a lamber a ferida.
一 Obrigada, senhor Raisel! Você disse que tá com fome, né? Vou te levar até as nossas frutas mais deliciosas!
一 Beleza… Aliás, Shishika, só você fala aqui?
一 Não, senhor! A maioria dos animais aqui falam, mas eles não gostam de fazer isso quando tem um humano por perto, sabe? Igual eu disse, humanos são muito egoístas!
一 Quando tentamos conversar com eles, eles dizem algo como “Um animal falante… Isso deve dar uma baita grana”, ou algo assim.
A interpretação da fala maligna e o carisma da coelha são impressionantes. Raisel até ri um pouco dessa atuação no papel de humano.
一 Sei como é~ Pelo jeito, a maioria das pessoas são ruins. Vocês fizeram bem em se esconder. Só que não entendo de você ter começado a falar comigo. Eu não sou assustador?
O garoto segue a coelha que saltita pelo gramado.
一 Hm… Eu estava com medo sim, mas eu senti um cheiro doce e agradável quando senti a sua energia! Então meu medo foi um pouco embora!
“Ela sentiu a essência da minha energia? É parecido com a forma como eu e Hiseld nos conectamos…”
Com certa saudade, os olhos do garoto se tornam cabisbaixos.
一 Chegamos, senhor Raisel!
Ao levantar o olhar, está diante de uma fruta vermelha e pulsante como uma maçã. A única diferença é que essa está transbordando uma energia avermelhada.
一 Essa é uma Valfra! É uma fruta típica da nossa floresta, a Floresta Lobelis!
Como um espetáculo, Shishika pula ainda mais alto enquanto gira no ar como um peão completamente animada.
Receoso em comer isso, ele sente certa similaridade com a Tifra. Mas não entende o porquê. É como se a sua intuição estivesse apontando essa semelhança.
“Naquela vez, eu comi a Tifra e fiquei bem por causa do Kimich e sua alquimia… Mas essa fruta é totalmente desconhecida… Eu deveria comer?”
一 O que você tá esperando, senhor Raisel? Ela não te agradou?
Preocupada, a coelha se questiona sobre os gostos humanos em frutas. Afinal, essa é tão gostosa e todo mundo aqui come ela.
一 Não é isso… É seguro eu comer mesmo? Não sinto um bom pressentimento vindo dela.
一 Hm… Acho que é. Todo mundo aqui come as frutas dessa floresta, elas são muito, muito boas!
Seguir a sua intuição e continuar com fome ou se arriscar comendo aquilo? É uma decisão difícil considerando que não há maldade nessas criaturas.
De qualquer modo, Raisel suspirou fundo e se lembrou de onde está.
一 Foi mal, Shishika… Não vou comer isso. É melhor eu seguir em frente.
Ao dizer essas palavras, o ambiente ao redor paralisou. Desde as folhas, o vento, os pilares e qualquer outra criatura no ambiente.
Sem entender, o protagonista encara surpreso. A sensação de levitação percorre o seu corpo, mas como? Ele ainda está numa ilha.
Em um piscar de olhos, todo o ambiente ao redor se comprime. O espaço da ilha é reduzido a um mero quadrado que está à frente dos olhos do garoto.
Esse quadrado mostra exatamente um outro humano comendo a Valfra, mas não é Raisel. Quem é aquele? Por que aconteceu isso com a ilha?
São muitas dúvidas. No fim, ele apenas manteve o ar nos pulmões apesar de querer suspirar.
Novamente, ele se encaminha até a ilha do enorme santuário, o seu próximo destino.
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