Dois dias antes.

    Derek avançava em sua busca incessante por mortos-vivos especiais. A cidade em ruínas permanecia impassível sob o sol escaldante, mas ele não sentia o calor em sua pele morta. O vento cortante soprava entre os prédios abandonados, erguendo poeira e folhas secas que se acumulavam nos cantos das ruas esquecidas pelo tempo.  

    Um silêncio opressivo dominava o ambiente, interrompido apenas pelo som inquietante do vento e pelos ocasionais grunhidos dos mortos-vivos. A atmosfera carregava um peso difícil de ignorar, como se algo maior e mais ameaçador espreitasse entre os escombros.  

    Derek caminhava com cautela extrema, seus olhos atentos a cada esquina, cada sombra, cada movimento mínimo que pudesse indicar perigo. Segurava uma faca em cada mão, pronto para atacar antes que ele próprio se tornasse presa. No entanto, apesar de sua vigilância e esforço incansável, a busca seguia sem frutos.  

    “Preciso de mais…”  

    Já fazia dias que não encontrava um especial. O último, que ele abateu em um beco escuro, foi devorado sem hesitação. A criatura lutou com brutalidade feroz, mas no fim não foi páreo para sua determinação e genialidade. 

    Nove dias antes. 

    O momento em que encontrou aquele morto-vivo especial marcou um ponto de virada. Sem hesitar, Derek o provocou, atraindo sua atenção e arremessando uma das facas. O golpe atingiu de raspão o ombro do adversário, falhando em ser fatal, mas surtindo efeito imediato.  

    A criatura reagiu como um animal encurralado. Com um rugido grotesco, começou a espumar pela boca, lembrando um cão raivoso prestes a atacar. Seus músculos, embora já necrosados, demonstravam um vigor assustador, e Derek logo percebeu que o morto-vivo tinha força suficiente para persegui-lo com velocidade impressionante.  

    “Fudeu.” Pensou, sentindo o pânico crescer como um fogo consumindo suas entranhas.  

    Seu corpo morto não precisava de ar, mas seus músculos, desgastados pelo tempo e pelo esforço, logo começaram a demonstrar sinais de exaustão. A criatura se movia com agilidade perturbadora, suas passadas rápidas ameaçando encurtar a distância entre eles.  

    Se continuasse assim, seria alcançado em questão de instantes. Precisava reagir. Precisava de um plano.  

    Num impulso desesperado, lançou-se contra um grupo de mortos-vivos comuns, derrubando-os enquanto passava. O impacto repentino causou uma breve confusão, atrapalhando seu perseguidor por alguns segundos preciosos.  

    Em meio ao caos, avistou um beco estreito e decidiu entrar. Mas logo percebeu seu erro: estava sem saída.  

    Agora, encurralado, sentia-se como um rato acuado por uma cobra. O silêncio se tornou sufocante, e apenas o som seco e cadenciado dos passos que se aproximavam denunciava o inevitável confronto.  

    Derek se posicionou, preparando-se para o ataque iminente. O morto-vivo rugiu uma última vez antes de investir contra ele com toda a sua fúria.  

    No instante exato em que estava prestes a alcançá-lo, tropeçou em uma corda estendida no chão e caiu com um baque surdo.  

    “Funcionou!” Pensou Derek entusiasmado.  

    Na verdade Derek já vinha observando aquela criatura havia algum tempo, mantendo distância enquanto arquitetava uma estratégia precisa para capturá-la. Quando finalmente viu a oportunidade de colocar seu plano em prática, não hesitou.  

    A criatura se apoiou no chão, tentando se erguer. Derek agiu antes que ela tivesse tempo de reagir, mirando seus olhos com precisão e cravando a faca com força.  

    O golpe atingiu seu alvo, mas não foi suficiente para matar.  

    A criatura, furiosa e guiada por puro instinto, voltou a avançar. O cheiro de carne e sangue seco que ainda impregnava Derek parecia intensificar sua sede por violência.  

    Derek recuou rapidamente, avaliando as possibilidades. Apesar de estar cega, a criatura parecia saber exatamente onde ele estava.  

    Quando investiu mais uma vez, Derek estava pronto. No instante decisivo, puxou o braço para trás e empurrou a faca profundamente no olho do morto-vivo.  

    Dessa vez atingiu o cérebro. Mas ainda não foi suficiente.  

    O morto-vivo cambaleou, mas não caiu.  

    “Mas hein?!” Derek ficou ainda mais surpreso e, por um instante, o medo quase o paralisou.  

    Mas sua reação foi rápida. Com uma das mãos, segurou o ombro da criatura, impedindo que ela chegasse perto demais. Com a outra, repetiu os movimentos, empurrando a faca com violência crescente, até finalmente alcançar a profundidade necessária.  

    Agora sim, foi o suficiente. A criatura caiu, sem vida. Derek se ajoelhou ao lado do corpo.  

    “Quase… quase vou jogar no Chapecoense.” 

    Apesar do pavor, sentiu uma satisfação inesperada. Não pelo combate, mas pela eficácia da armadilha que Stéfany lhe ensinou.  

    Derek ficou feliz ao pensar nela, dando um sorriso em pensamento.  

    “Certo, não posso ficar parado aqui. Preciso me curar… e encontrar Stéfany.”  

    Fez um breve minuto de silêncio em respeito à pessoa que aquele morto-vivo fora um dia. Então, sem hesitação, começou a devorar seu cérebro.  

    A sensação calorosa percorreu seu corpo, mas sua satisfação durou pouco. Diferente das vezes anteriores, a regeneração foi mínima, quase imperceptível.  

    “E se esse processo funcionasse como um sistema de níveis? Talvez, no início, a evolução fosse rápida, mas quanto mais alto o nível, mais criaturas eu preciso consumir para continuar avançando.”

    Uma suposição de um ex-gamer, talvez…  

    ✥—————✥—————✥

    E assim, nove dias se passaram. Enquanto continuava sua busca por mortos-vivos especiais na escuridão silenciosa da noite, um som súbito cortou o ar. Disparos, ao longe.

    Derek interrompeu seu movimento instantaneamente. Seu corpo enrijeceu.

    “O quê…? Há alguém por perto?”

    Se fossem humanos, o perigo seria imenso. A chance de ser morto não poderia ser ignorada. Seu instinto gritava para seguir outro caminho, evitar qualquer contato.

    Mas, ao se virar, sua mente foi tomada por lembranças indesejadas. Flashes de Insane. O medo sufocante, a certeza de que não sobreviveria. E, acima de tudo, a promessa que fez a si mesmo: enfrentar seus medos.

    Mesmo ciente dos riscos, mesmo com a lógica dizendo que aquilo poderia significar seu fim, ele ergueu a cabeça e, com determinação, seguiu na direção que ouviu o som.

    De volta ao presente.

    Derek vasculhou prédio após prédio, sem sucesso. O vazio das ruas e os corredores empoeirados reforçavam a sensação de desolação, e por um instante, ele cogitou desistir.  

    Mas algo dentro dele não permitia. Uma urgência inexplicável pulsava em sua mente, um instinto que dizia que ainda havia algo ali.  

    Foi então que avistou o hospital antigo.  

    As paredes, marcadas pelo tempo, eram um testemunho silencioso da decadência. Rachaduras se espalhavam pela estrutura, enquanto trepadeiras e musgo se agarravam ao concreto, como se reivindicassem o lugar para si.  

    Havia algo naquele prédio. Algo que o chamava. Não era um convite. Era um desafio. Mesmo sem sentir frio, um arrepio percorreu sua espinha. Derek apertou as mãos, tentando dissipar o receio que começava a tomar conta dele.  

    Recuar? Fugir? Poderia. Já fez isso antes. Já evitou ir em diversos lugares por medo antes, porque agora seria diferente? Derek sabia que poderia passar a vida inteira fugindo, e essa não era uma opção que ele queria aceitar.  

    “Não mais!”

    E assim, determinado, deu seus primeiros passos em direção a entrada do hospital.

    Regras dos Comentários:

    • ‣ Seja respeitoso e gentil com os outros leitores.
    • ‣ Evite spoilers do capítulo ou da história.
    • ‣ Comentários ofensivos serão removidos.
    AVALIE ESTE CONTEÚDO
    Avaliação: 100% (1 votos)

    Nota