Capítulo 28 - O Limiar da Verdade
Derek não conseguia esconder sua surpresa. Estava estampado em seu rosto.
Os cabelos, a pele, os lábios… tudo era exatamente como ele se lembrava de Stéfany. Tudo, exceto o vestido que ela usava e a íris dos olhos — moldadas como flores de quatro pétalas, brilhando em um rosa intenso
A gosma que estava consumindo Insane, agora se dissipava lentamente.
Derek tentou falar, mas as palavras não saíam. Sua voz parecia um disco arranhado.
Ele estendeu a mão, querendo tocar o braço dela, confirmar que era real. Mas antes que conseguisse, ela desapareceu.
Não houve desespero.
Suas mãos começaram a tremer, o coração disparou. Lágrimas brotaram e escorreram sem controle.
Não era medo. Nem tristeza. Era felicidade.
— Você está bem… Que alívio — murmurou, sorrindo entre as lágrimas.
Elas caíam sem parar, pingando no chão.
De repente, Stéfany reapareceu diante dele. Agachou-se, levou as mãos ao rosto de Derek e, com delicadeza, enxugou suas lágrimas. Ergueu seu rosto, guiando-o com suavidade para que a olhasse.
Ela sorria com ternura.
Naquele instante, parecia que o vídeo de seu corpo lutando desacelerava, quase congelando.
Derek e Stéfany se levantaram juntos.
De pé, ele passou o braço pelo rosto, secando as lágrimas. Apesar da alegria de vê-la, seu bom senso ainda o mantinha alerta.
Ela estava ali, em silêncio, com um sorriso fixo. Derek a observou dos pés à cabeça.
Os olhos chamavam mais atenção que tudo. Depois, o vestido. E aquele estranho jeito doce.
Mas ele sabia. Aquela não era a verdadeira Stéfany.
— Quem é você? — perguntou, recuando alguns passos.
Ela pareceu surpresa por um breve momento, mas logo voltou a sorrir.
Então, diante dele, seu corpo se desfez em flores que voaram na direção de Derek, atravessando-o.
Ele manteve o olhar firme, tentando parecer forte, mesmo com os punhos tremendo discretamente.
— Eu? — disse ela, sua voz misturada ao voo das pétalas. — Vou te contar quem sou. Mas antes…
Ela bateu as mãos duas vezes, com elegância.
O som das palmas ecoou.
Antes que pudesse continuar, Derek ouviu um estalo — algo se quebrando.
Ergueu os olhos. Rachaduras se espalhavam pelo teto, como se fosse feito de vidro. Elas se multiplicavam, aprofundando-se.
Derek observava, curioso e apreensivo.
Fragmentos começaram a cair, revelando uma imagem clara por trás da superfície.
Não houve tempo para processar. O teto inteiro se estilhaçou e despencou.
Derek cerrou os olhos e protegeu a cabeça com os braços.
O som dos cacos atingindo o chão ecoou por alguns segundos e então, silêncio.
Ele abriu os olhos devagar, abaixando os braços.
Não acreditava no que via.
O cenário sombrio havia se desfeito como fumaça ao vento. Agora, diante de Derek, estendiam-se campos verdejantes que ondulavam suavemente pelas colinas. No topo de uma delas, erguia-se uma árvore imponente, solitária, com galhos largos e folhas que dançavam ao sabor da brisa. O céu acima era de um azul cristalino, sem nuvens.
Derek sentiu a grama fresca sob os pés e o vento acariciando sua pele.
Incrédulo, esfregou os olhos.
— Isso… não pode ser real — murmurou.
Ao olhar ao redor, seus olhos encontraram Stéfany. Ela estava sob a árvore, acenando com um gesto suave, como se o chamasse para casa.
O vento soprava ao longe, fazendo as folhas da árvore se desprenderem e flutuarem lentamente até o chão.
Derek caminhou até ela. Ela estava sentada com as pernas esticadas, encostada no tronco.
Ele parou diante dela, hesitante. Sabia que não era a mesma Stéfany — não podia ser — mas a emoção o dominou. Agachou-se devagar, como quem se aproxima de um sonho prestes a se desfazer.
Ela o encarava com um sorriso sereno, os olhos brilhando com uma confiança que parecia eterna.
Derek levou a mão ao rosto dela e tocou.
Ela não desviou o olhar. Continuou firme, olhando dentro dele.
Ele ergueu as sobrancelhas, surpreso. A pele era quente e macia.
Sua mão tremia. Era tão real que quase acreditava.
Um sorriso suave surgiu em seus lábios, enquanto os olhos se enchiam de emoção.
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Depois de alguns instantes, Derek se recompôs. Sentou-se à frente dela, cruzando as pernas.
Respirou fundo, pronto para perguntar quem ela era — mas ela o interrompeu com leveza.
— Esse lugar é agradável, não acha? — disse, com entusiasmo quase infantil.
O vento voltou a soprar, mas Derek permaneceu em silêncio.
— Ah… então não gostou? E eu achando que um lugar calmo assim te agradaria — comentou, fechando os olhos e balançando a cabeça. — Se não gostou, talvez devêssemos mudar de cenário.
Ela abriu os olhos e ergueu a mão, prestes a estalar os dedos.
O mundo tremeu. Como se estivesse prestes a se despedaçar, como o vazio anterior.
— Só responde minha pergunta! — gritou Derek, com os olhos ardendo de fúria.
Surpresa, ela piscou três vezes rapidamente.
— Tá bom, tá bom… eu digo — respondeu, afastando os dedos. O mundo parou de tremer.
Inspirou fundo.
— Por onde começar… minha origem? O que me motiva? O que eu quero? Você precisa ser mais específico.
— Tudo. Primeiro: o que diabos é você e o Insane? — disparou Derek.
— Como Insane já te disse: nós somos você. Mais precisamente, partes de você — respondeu, apontando para o peito dele.
Derek franziu a testa, insatisfeito.
Ela o encarou e ele manteve a expressão firme.
— Tá certo. Sei como você é difícil de lidar, mas tudo bem, temos tempo — disse ela, olhando para cima.
A projeção do corpo real ainda passava lentamente, como se o tempo ali fosse outro.
— Pra essa história, você vai querer pipoca — disse, batendo as mãos duas vezes. Um balde de pipoca apareceu entre as pernas de Derek.
Por dentro, ele se impressionou. Por fora, manteve o olhar sério.
Ela então suspirou e começou:
— No princípio, criou Deus os céus e a terra. Mas a terra estava sem forma e vazia; havia trevas sobre o abismo, e o Espírito Sa—
— Você tá me zoando, né? — interrompeu Derek, irritado.
Ela caiu na gargalhada, lágrimas escorrendo dos olhos.
Derek cerrou os dentes.
— Tá legal, tá legal… parei — disse ela, limpando as lágrimas com as costas da mão.
— Vamos começar de verdade. Sou Asha. Represento a esperança e a bravura — declarou, colocando a mão sobre o peito com delicadeza. — E a essa altura, você já deveria saber o que somos.
— Esperança? Tipo Elpis? — perguntou Derek, confuso. — E como eu deveria saber quem vocês são, se nunca me contam nada?
Ela assoprou o dedo indicador, como quem pede silêncio.
Asha se levantou lentamente. Nesse instante, o vento cessou. As folhas da árvore congelaram no ar. Até a retroprojeção do corpo de Derek parou.
Ela caminhou em volta dele, com passos leves, quase flutuando.
— Vejamos… por onde começar — disse, com um tom suave, quase maternal. — Você quer respostas. E vai tê-las.
Derek a observava em silêncio, o coração ainda acelerado. Ele não sabia se devia confiar, mas algo nela o fazia querer ouvir.
— Eu sou Asha. A esperança que você enterrou. A bravura que você esqueceu. E Insane… — ela estendeu a mão, como se tocasse algo invisível — …é o medo que você alimentou. A raiva que você negou. Somos fragmentos. Ecos do que você é, do que foi, e do que pode ser.
Derek permaneceu sem entender.
— Tudo bem. Sabia que não iria entender assim. Então vamos do início. No início…

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