Índice de Capítulo

    Olá, segue a Central de Ajuda ao Leitor Lendário, também conhecida como C.A.L.L! Aqui, deixarei registradas dicas para melhor entendimento da leitura: 

    Travessão ( — ), é a indicação de diálogos entre os personagens ou eles mesmos;
    Aspas com itálico ( “” ), indicam pensamentos do personagem central em seu POV;
    Aspas finas ( ‘’ ), servem para o entendimento de falas internas dentro da mente do personagem central do POV, mas não significa que é um pensamento dele mesmo;
    Itálico no texto, indica onomatopeias, palavras-chave para subverter um conceito, dentre outras possíveis utilidades;
    Colchetes ( [] ), serão utilizados para as mais diversas finalidades, seja no telefone, televisão, etc;
    Por fim, não esqueça, se divirta, seja feliz e que os mistérios lhe acompanhem!

    A cama rangeu em um suspiro de madeira velha, mas dessa vez, suas mãos não buscaram os próprios olhos. O peso do corpo parecia estranho, como se algo o tivesse atravessado durante o sono e deixado um vazio.

    A luz filtrava pela janela, mas o amanhecer não trazia alívio. Era pálido, indiferente. A neve acumulada nos galhos das árvores desabava em pequenos montes silenciosos, um ciclo sem testemunhas, sem importância. Leonard observava o mundo lá fora, sentindo-se desconectado, como se estivesse a olhar para uma pintura feita por um artista que nunca conheceu a dor.

    Mas ele conhecia.

    O celular tremia sobre o criado, um item atual que o ancorava na realidade. 06:22. Tempo demais para pensar, tempo de menos para esquecer. Um frio familiar se instalava na nuca, o tipo que acompanha aqueles que já viram o fim do mundo e voltaram sem saber se ainda pertencem a ele.

    “Tudo isso foi real…”

    O pensamento latejava em sua mente como um martelo contra vidro trincado. 

    Leonard virou o rosto para dentro do quarto, seus olhos ainda úmidos. Calli e James dormiam profundamente, a respiração deles preenchendo o silêncio. Eram sua única âncora, sua única certeza em meio ao caos. Eles não compartilhavam absolutamente o mesmo sangue, mas a ligação entre eles era mais forte do que qualquer genealogia.

    “Se eu quiser que isso dure… preciso impedir a destruição do mundo.”

    A convicção apertou seu peito, sufocante como uma corrente invisível. Passou as costas da mão pelo rosto, tentando apagar as lágrimas como se fossem um erro. Mas sabia que nada daquilo seria tão simples.

    Foi só então que percebeu. Algo em seu corpo havia mudado. Seus músculos, antes frágeis, estavam mais rígidos, mais densos. Não era visível, mas ele sentia. Um eco do inferno que atravessara. Mas, ao mesmo tempo, uma ausência queimava dentro dele. Uma parte sua havia sido arrancada.

    A chama que o acompanhara desde a ida… agora era extinta.

    Ele fechou os olhos.

    “Visão Eterna da Loucura… Calius… mundo dos sonhos… energia da alma…”

    O eco das palavras o enojava. Ele teria rido se não tivesse tanto medo.

    E então veio a lembrança.

    A criatura, a gosma com tentáculos e um olho grotesco. O arrepio subiu por sua espinha. Sentiu o estômago revirar.

    “Aquilo era um demônio? Não… parecia… algo diferente. Como se o próprio mundo tivesse cuspido uma falha genética.”

    Leonard afastou os pensamentos e se forçou a se levantar.

    O carpete gelado mordeu a sola de seus pés. Deu um passo, outro. A vertigem o atingiu como uma maré invisível. O corredor familiar, azul-celeste, expandiu-se, dissolvendo-se em algo inumano.

    O espaço se distorceu.

    À frente e atrás, o corredor se transformava em uma espiral interminável. O som da calefação parecia vivo, sua falha ecoando como um sussurro frenético por todas as paredes. O mundo estava dobrado sobre si mesmo, os cantos da realidade tremulando como um papel prestes a ser rasgado.

    Leonard apoiou-se na parede, engolindo a bile que subia em sua garganta. Cada passo era uma luta contra a gravidade invertida de sua própria mente.

    A porta entreaberta do banheiro era sua única saída.

    Ele se arrastou para dentro, fechando-a com um estalo seco.

    O banheiro era o mesmo de sempre—sujo, pequeno, decadente. O box de vidro opaco, a pia com a torneira que nunca fechava completamente, a tinta cinza desbotada nas paredes. Um lugar tão insignificante, mas que, por um instante, trouxe-lhe um resquício de alívio.

    Então, o aperto voltou.

    O banheiro parecia menor. As paredes se aproximavam. O teto parecia mais baixo. O espaço ao seu redor estava comprimindo-o, espremendo-o como se o mundo tentasse expulsá-lo de si mesmo.

    Leonard agarrou a pia, fechou os olhos, respirou fundo.

    “Merda… até quando vou ficar assim?”

    Ao entrar no box, Leonard girou o registro. O encanamento velho estremeceu em um protesto metálico, e um jato de água marrom despencou do chuveiro. Ele recuou instintivamente, encostando as costas frias contra o azulejo rachado.

    O jovem respirou fundo. Isso era normal. Apenas a ferrugem dos canos corroídos pelo tempo, um detalhe de suas condições, um incômodo passageiro. Mesmo assim, ficou parado, observando a água suja escorrer pelo ralo como se esperasse algo emergir dela.

    Depois de um minuto e meio, a cor começou a se dissipar. Quando a água finalmente ficou límpida, Leonard se despiu. Sua pele era branca como a neve acumulada lá fora, pálida demais, marcada apenas por sombras de tensão sob os olhos e marcas invisíveis, lembranças de um mundo que ninguém acreditaria se ele contasse.

    A água morna caiu sobre ele, e por um instante, sentiu um tipo primitivo de conforto. Dignidade. Tão simples, tão efêmera. Depois de tudo que viu, de tudo que tocou, qualquer coisa da atualidade parecia um luxo.

    “Eu preciso entrar em alguma organização se eu quiser impedir ele…”

    O pensamento se formou, direto, cortante. Era necessário. Se quisesse interferir na visão de Dante, se quisesse ter qualquer chance de impedir o que vira, precisava de influência, precisava de poder. E não havia poder sem estrutura.

    O vapor preenchia o banheiro, dissolvendo as bordas do espelho, tornando tudo enevoado, indistinto. Leonard abaixou a cabeça, deixando a água escorrer por seus cabelos, por seu rosto.

    E então, o cheiro mudou.

    Ferro.

    Quando levantou os olhos, a água já não era translúcida. Torrentes carmesim desciam por seus ombros, manchando o chão do box.

    Sangue.

    Seus pulmões travaram. O ar se tornou espesso, quase sólido. Ele deu um passo para trás, o vidro frio contra suas costas. Não era possível. Mas ali estava, girando em redemoinhos rubros pelo ralo, escorrendo por seus braços, por suas mãos.

    Quis gritar, mas o som não veio. Apenas o silêncio surdo de um pesadelo lúcido.

    “Isso não pode estar acontecendo.”

    As paredes pareciam se fechar ao seu redor. O peso do sangue o puxava para baixo, para dentro de algo que ele não queria ver.

    Com um movimento brusco, Leonard socou a parede. O impacto reverberou pelo banheiro, um som agudo que cortou o transe como uma lâmina. A água voltou a ser apenas água. O sangue desapareceu.

    Ele ficou ali, arfando, sentindo a dor pulsante na mão.

    — Esses são os danos que o príncipe disse? — sussurrou, observando os nós dos dedos avermelhados, a pele latejando.

    O espelho lhe devolveu um olhar que não reconhecia. Por um segundo, achou que fosse outra pessoa. Não eram apenas os músculos um pouco mais definidos—era a estrutura do rosto.

    Os traços eram mais firmes, mais esculpidos. Seus olhos, antes inquietos, agora tinham algo de assombrado, de resoluto. Leonard sabia. Ele estava começando a se parecer com Calius.

    O príncipe louco.

    O pensamento grudou nele como um presságio.

    Algo estava mudando.

    Não, algo já havia mudado.

    Sem mais tempo para reflexões, terminou de se secar e vestiu-se. No primeiro andar, hesitou por um instante antes de pegar a mochila e sair para a rua. O frio cortante mordeu sua pele, mas não o incomodou.

    O caminho até a biblioteca era longo, mas, por alguma razão, ele sentia que já havia trilhado cada passo antes.

    — Hoje será um bom dia… — murmurou, mas o tom em sua voz era estranho. Como se já soubesse.

    Passando por uma loja de móveis, as televisões nas vitrines já estavam ligadas, vomitando notícias na tela. Leonard parou, fixando o olhar. O déjà vu se intensificou, afundando-se em seu estômago como um peso morto.

    As palavras do jornalista eram previsíveis. Não porque eram óbvias, mas porque ele já as ouvira antes.

    [ Agora são 07:23, no jornal de hoje em Mont Tremblant, vamos conhecer a nova organização de investigadores que se instaurou em Ottawa, chamados de Pendular da Noite, liderados pelo investigador de grau veterano 2, Louis Solomon. ]

    Leonard sentiu o coração desacelerar.

    “Achei.”

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