Olá, segue a Central de Ajuda ao Leitor Lendário, também conhecida como C.A.L.L! Aqui, deixarei registradas dicas para melhor entendimento da leitura:
Travessão ( — ), é a indicação de diálogos entre os personagens ou eles mesmos;
Aspas com itálico ( “” ), indicam pensamentos do personagem central em seu POV;
Aspas finas ( ‘’ ), servem para o entendimento de falas internas dentro da mente do personagem central do POV, mas não significa que é um pensamento dele mesmo;
Itálico no texto, indica onomatopeias, palavras-chave para subverter um conceito, dentre outras possíveis utilidades;
Colchetes ( [] ), serão utilizados para as mais diversas finalidades, seja no telefone, televisão, etc;
Por fim, não esqueça, se divirta, seja feliz e que os mistérios lhe acompanhem!
Lembrem-se de comentar… Isso ajuda muito e me motiva xd
Capítulo 23 — Os Três Mosqueteiros
28 de dezembro de 2024 — 08:21
O frio mordia a pele como dentes de vidro, penetrando camadas de tecido e carne, até se alojar nos ossos. O inverno era um tirano silencioso, roubando o calor de tudo que tocava, cobrindo a cidade com seu véu branco e indiferente. O céu, de um cinza opaco, pairava imóvel sobre Mont-Tremblant, pesado como se estivesse prestes a desabar.
Leonard estava sentado em um banco da praça, em frente ao Place St-Bernard, observando a neve pousada sobre os galhos nus das árvores. Havia uma beleza estranha naquela cena: a neve absorvia o som, tornando o mundo mais silencioso, mais contido, como se a cidade inteira prendesse a respiração. Pequenos fragmentos de folhas secas se misturavam à neve, respingos de ferrugem sobre um mármore pálido.
“Que bom que o Calli ficará em casa hoje. Se ele tivesse que trabalhar, não sei onde deixaria James”
Pensamentos dispersos pairavam em sua mente, leves como a névoa de sua respiração no ar gélido. Pela primeira vez em muito tempo, ele sentia um instante de paz. Um momento sem urgências, sem expectativas. Apenas existir, apenas respirar.
Encostou a cabeça no encosto do banco, deixando o corpo escorregar levemente para trás, até que ficou olhando o mundo de ponta-cabeça. O céu parecia ainda mais vasto assim, como um oceano de chumbo. Um pássaro solitário cruzou seu campo de visão, uma silhueta escura contra o cinza opaco.
“O mundo também consegue ser belo. Desde que aquela vertigem passou, tudo tem sido estranhamente mais belo.”
As pessoas se moviam ao seu redor como engrenagens em um mecanismo invisível: passos rápidos, vozes distantes, risadas infantis quebrando o silêncio. Tudo continuava girando, indiferente à sua presença.
Então, sentiu um movimento ao seu lado.
Sem precisar pensar, voltou à posição normal, recompondo-se antes mesmo de ver quem era.
— Ah, me desculpe.
A figura ao lado dele lhe era familiar. Um instante de estranhamento, uma dúvida, até que a memória se encaixou.
Cabelos cor de marfim, olhos castanhos-escuros. Liam.
Leonard piscou, um fragmento de lembrança emergindo como um reflexo na água.
“Então ele não havia saído mais cedo por acaso?”
Liam sorriu, um daqueles sorrisos que pareciam sempre guardar algo por trás.
— Ei, Leo. O que você veio fazer aqui?
A pergunta era simples, mas algo no tom o fez hesitar.
— Estou esperando o Dante. Aliás… bom dia.
Liam inclinou a cabeça ligeiramente, estudando-o por um momento antes de responder:
— Entendi. Ele te convidou também para a organização?
Leonard sentiu um calafrio que nada tinha a ver com o inverno.
— “Também”…?
Liam soltou uma risada curta, um som sem calor.
— Pelo visto, para onde um for, o outro irá também. Sempre.
Leonard sustentou o olhar do amigo, tentando encontrar ali alguma resposta que fizesse sentido. Mas Liam sempre foi um mestre em esconder mais do que mostrava.
“O Liam não estava lá. Não onde eu observei… Então, por que parece que ele sempre esteve?”
Antes que pudesse falar, um carro preto deslizou para a vaga em frente a eles.
Um Honda CR-V, janelas negras como olhos vazios.
O vidro do passageiro se abaixou devagar, revelando Dante.
Ele se inclinou ligeiramente para frente, estudando-os com uma calma calculada. Seus olhos azul-acinzentados tinham um brilho frio, de quem sempre está pensando algumas jogadas à frente.
— Desculpem o atraso.
Liam reagiu primeiro:
— Sem problemas.
Leonard, no entanto, estava fixado na mulher ao volante.
Havia algo nela… algo que fazia sua mente tropeçar. Ela lhe era familiar, mas de uma maneira estranha, como um rosto visto apenas em sonhos. Seu rosto era pálido, os cabelos loiros presos de maneira simples. Mas havia algo em sua postura — uma rigidez discreta, a forma como seus dedos repousavam imóveis no volante, como se segurassem algo invisível.
O silêncio se estendeu por um segundo a mais do que deveria.
Então ela falou.
— Você não vem?
A voz era baixa, indiferente. Mas havia algo quebrado ali, algo que Leonard reconhecia. Era o tom dos soldados que voltam da guerra e não sabem como falar do que viram. O tom dos homens que encaram o inferno e saem dele com cicatrizes que ninguém pode ver.
Liam já estava com a porta aberta, esperando-o.
No banco traseiro, uma mulher de cabelos vermelhos mexia no celular, alheia a tudo, como se a cena à sua volta não merecesse sua atenção.
Leonard hesitou.
Algo dentro dele dizia que, se entrasse naquele carro, cruzaria uma linha invisível.
Mas ele já sabia que iria.
Respirou fundo, sentindo o frio preencher seus pulmões.
E então se levantou e entrou no carro.
A porta se fechou com um clique seco.
…
— Ah…
Quando menos percebeu, Leonard estava espremido no banco do meio, esmagado entre Claire e Liam como se fosse um sanduíche humano. Ele tentava encontrar uma posição confortável, mas a cada curva recebia um empurrão involuntário de um dos lados. Já tinha aceitado seu destino.
Se ao menos a motorista fosse alguém tranquila, talvez o ambiente ajudasse. Mas não, Katherine falava sem parar, cheia de energia, como se tomasse café direto na veia.
— Vocês tinham que ver, foi hilário! O Dante quase se cagou de medo aquele dia! — gargalhou ela, sem tirar os olhos da estrada.
— Ei, Katherine, não precisa entrar em detalhes! — protestou Dante, visivelmente incomodado.
— Consigo imaginar, até mesmo o Dante cheio de medo. — Claire riu, trocando olhares cúmplices com Liam, que já segurava o riso.
“Quando foi que eles ficaram tão amigos?”, pensou Leonard, sentindo-se cada vez mais deslocado.
Tentava acompanhar a conversa, mas parecia um cachorro tentando entender álgebra. No fundo, tinha certeza de que estavam falando rápido demais de propósito. Mas ninguém parecia notar seu silêncio — ou, se notavam, simplesmente concluíam que ele era devagar. O que, pensando bem, não estava de todo errado.
— Não vejo a hora de ir para minha primeira missão e me tornar verdadeiramente uma investigadora. — Claire ergueu o celular e, sem aviso, bateu uma foto. Liam desviou a tempo, mas Leonard, perdido nos próprios pensamentos, saiu com uma cara de completo idiota.
— Meu Deus! Essa foto é impagável! — Claire explodiu em risadas.
Leonard só percebeu o que aconteceu quando Claire exibiu a tela triunfante. Seu rosto, uma mistura de confusão e surpresa, estava agora imortalizado no celular dela.
— Apague isso! — exigiu ele, estendendo a mão.
— Nunca! — Claire segurou o celular para longe, enquanto Liam ria de lado.
O bate-boca infantil continuou por alguns segundos até um som seco cortar o ar. Dante fechou seu livro com força.
— Ei, crianças, chega! — Sua voz era carregada de irritação. — Não é porque estão prestes a virar investigadores que devem estar tão felizes. Na verdade, deveriam estar preocupados. A profissão paga bem, sim, mas sua vida estará em risco a todo momento. Entendem isso?
O silêncio desceu sobre o carro. Até mesmo Katherine deu uma olhada pelo retrovisor, observando as expressões dos passageiros. Leonard sentiu um peso estranho no peito.
“Perigo de vida? Se eu soubesse disso, tinha ficado em casa…”
Katherine, porém, revirou os olhos e quebrou a tensão como quem afasta poeira de um móvel antigo.
— Tá, tá, chega, velho rabugento. Deixa eles se divertirem, falta pouco para chegarmos. — Ela zombou, lançando um olhar de canto para Dante.
No entanto, ninguém retomou a conversa. O aviso ficou pairando no ar como um fantasma. Cada um no banco de trás mergulhou em seus próprios pensamentos. Nenhum deles compartilhava suas preocupações, mas todos tinham um motivo para estar ali — fosse ele brilhante ou não.
A estrada começou a mudar. A floresta sem folhas, coberta de neve, deu lugar a uma Ottawa cintilante. A cidade pulsava com luzes e movimento, nem fria demais, nem quente demais. Para Leonard, parecia outro universo. Ele nunca tinha visto algo assim de perto.
Suspirando, encostou a cabeça no banco e fechou os olhos por um instante. Mas antes que pudesse relaxar, algo no canto de sua visão chamou sua atenção. Claire segurava o celular, mas não olhava para a tela. Seu olhar estava fixo na janela, perdido em alguma memória distante. Seu rosto trazia um traço de melancolia que Leonard não esperava ver ali.
“Talvez até ela tenha encontrado algo assustador já…”
Virou os olhos para Liam e quase se engasgou com a própria saliva.
“O miserável está dormindo!”
Leonard franziu o cenho e cutucou Liam com o cotovelo.
— Uááá… — Liam bocejou, espreguiçando-se com gosto e batendo a mão no teto do carro. — Já chegamos?
Leonard olhou para ele, indignado.
“Podemos estar sendo sequestrados para o nada e você dormindo tranquilamente? Idiota!”
Katherine riu pelo retrovisor.
— Estamos próximos, dorminhoco. Vocês vão gostar do pessoal de lá. Todo mundo é bem amigável… pelo menos na superfície. — Ela piscou.
Demorou cerca de três minutos até finalmente pararem em frente a uma grande casa. Não era exatamente uma mansão, mas ainda assim parecia colossal. Leonard calculou mentalmente: talvez umas oito vezes o tamanho da casa dele. O mundo das organizações realmente jogava em outra liga.
“Que lugar bonito…”
Mas, por mais que a casa tivesse sua imponência, havia algo de estranho nela. Algo difícil de explicar. Não era por ser antiga, nem pelo tamanho. Era como se ela tivesse uma presença própria. Como se alguém — ou algo — estivesse observando do lado de dentro.
Um fio fantasmagórico puxado de uma tapeçaria invisível.
O vento soprou forte, levantando neve do chão. Os três do banco de trás engoliram em seco.
— Bem-vindos à nova vida de vocês — disse Katherine, desligando o carro.
E nenhum deles sabia ao certo o que os esperava do outro lado da porta.
Nos vemos novamente na quinta!
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