Índice de Capítulo

    Olá, segue a Central de Ajuda ao Leitor Lendário, também conhecida como C.A.L.L! Aqui, deixarei registradas dicas para melhor entendimento da leitura: 

    Travessão ( — ), é a indicação de diálogos entre os personagens ou eles mesmos;
    Aspas com itálico ( “” ), indicam pensamentos do personagem central em seu POV;
    Aspas finas ( ‘’ ), servem para o entendimento de falas internas dentro da mente do personagem central do POV, mas não significa que é um pensamento dele mesmo;
    Itálico no texto, indica onomatopeias, palavras-chave para subverter um conceito, dentre outras possíveis utilidades;
    Colchetes ( [] ), serão utilizados para as mais diversas finalidades, seja no telefone, televisão, etc;
    Por fim, não esqueça, se divirta, seja feliz e que os mistérios lhe acompanhem!

    Leonard estava sentado no sofá, assistindo à televisão em um fim de tarde de outono chuvoso.

    Naquela época, Calli tinha cinco anos e Leonard, oito. Enquanto ele se distraía com o programa, o pequeno Calli brincava no tapete com dois bonecos de super-heróis. O desenho animado que passava na TV era um de seus favoritos, Ed, Edd n Eddy.

    “Caramba, que incrível!”

    Sophie, vindo da cozinha, trazia duas canecas de chocolate quente. A mãe deles tinha feições inesquecíveis: pele clara, cabelos loiros e olhos cinzentos que brilhavam entre seus traços meticulosamente delicados.

    — Meninos, está pronto. Tomem cuidado para não sujarem o sofá! E lembrem de respeitar a vovó Morgiana quando ela chegar.

    — Tá bom, mamãe! — diziam os dois em uníssono, Calli animado e Leonard em um tom de voz comum, quase que indiferente.

    “É muito bom mesmo…”

    Após alguns goles e sopros no chocolate quente, a campainha soou. O mais novo largou os brinquedos e correu para a porta, deixando a caneca na mesinha de centro.

    — É a vovó! É a vovó! Abre a porta, Leo! — A euforia o fazia pular de um lado ao outro na porta. Aguardava ansioso que seu irmão mais velho chegasse e abrisse a porta, já que não alcançava a fechadura.

    Leonard, alguns segundos atrasado, finalmente chegou em frente à porta. Ficando na ponta dos pés, girou o punho e conseguiu destrancar a porta onde já repousava a chave na fechadura, embora não conseguisse chegar à altura da maçaneta.

    Morgiana, a avó dos dois, vestia calças floridas e uma camisa longa, igualmente colorida. As luvas pretas em suas mãos contrastavam com o sorriso caloroso que iluminava seu rosto, com um calor cuja chama vento algum conseguiria enfraquecer. Ele não se lembrava do rosto de sua avó que não estivesse sorrindo; era uma mulher muito alegre e amigável com todo mundo, assim como Calli era nessa época.

    — Vovó! Como a senhora está?! — A avó apenas abraçou ambos de uma só vez, quase interrompendo a fala da criança eufórica. 

    — Vou bem, pequeno, mas e você, aprendeu muitas coisas na escolinha? 

    O abraço dela era quente e reconfortante. Mesmo Leonard, que sempre parecia indiferente ao mundo, não resistiu ao calor proporcionado pelo abraço e soltou um pequeno sorriso.

    — Vão me deixar entrar? Ou vamos ficar aqui fora a noite inteira? — disse Morgiana, ainda em um tom brincalhão para os dois pequenos agarrados aos seus braços.

    Os três entraram novamente naquele ambiente quente e confortável novamente que chamavam de casa após fecharem a porta. A avó deixou seus dois netos na sala de estar — o mesmo lugar onde antes estavam e foi para a cozinha mal iluminada. Lá, Sophie havia acabado de fazer uma torta e comia alguns pedaços antes de deixar esfriar. 

    — Ah… Oi, mãe… 

    — Como vai? 

    Na sala, Leonard reunia ambas as canecas, agora só com um pouco de pó do achocolatado no fundo, e ia levando à cozinha, mas parou ao perceber o tom sério da conversa. Encostou-se na parede da cozinha e ficou ouvindo em silêncio.

    — Estou indo bem, mas você tem certeza de que continuará fazendo esse tipo de serviço, Sophie? Isso está te fazendo mal e você sabe disso… 

    — Mãe… — Sophie hesitou, uma expressão de desconforto atravessou o seu rosto. Sentiu um leve chute no ventre e segurou a respiração por um momento. — Está próximo de acabar… Eu só preciso de um pouco mais de dinheiro…

    — Filha… Isso está te destruindo, você sabe disso… Os dois estão tão felizes agora, mas o que acontecerá depois? Sabe que isso não influencia apenas você, mas também os dois? Ou você acha que no futuro, com pessoas descobrindo isso, vão achar normal duas crianças terem pais diferentes? Por que não retornar, simplesmente, para a vida de investigadora paranormal?

    — Três… São três. — Sophie desviou o olhar, quase sussurrando. 

    — Três? Leonard, Calli… Quem é o terceiro? Não me diga que está grávida novamente?! 

    — Estou, mãe. 

    — Não me diga que é com outro homem… É? 

    — Sim. 

    Leonard, mesmo sem entender toda a conversa, percebeu a tristeza no tom de voz da avó. Isso bastava para ele saber que algo grave estava acontecendo.

    “A vovó parece… triste…”

    Naquele dia, após Sophie sair de casa, Calli continuou brincando no tapete. Ele, pelo contrário, permaneceu quieto, observando Morgiana na cozinha. A avó ficou lá por muito tempo, chorando em silêncio, enquanto Leonard, impotente, não conseguia fazer nada para ajudá-la. Nesse mesmo dia, ela demorou algumas horas até que recuperasse o seu sorriso e voltasse à sala para brincar com os netos. E também foi a primeira vez… que ele viu sua avó dessa maneira.

    Calli era muito apegado à avó. Leonard percebia que ele parecia se espelhar nela para manter a alegria constante. Durante a noite, os três adormeceram no sofá enquanto assistiam a um filme de comédia que os irmãos amavam. A tristeza de Morgiana foi substituída por um sorriso inesquecível, gravado na memória dele durante os anos seguintes…

    A última imagem daquele dia ficou marcada pelo mesmo sorriso do mais novo, uma lembrança preciosa que persistiu até três anos depois.

    ***

    Era um dia cinzento. Sophie carregava James no colo, enquanto Leonard e Calli caminhavam pelos corredores do hospital.

    — Mãe, a vovó está bem? — dizia Calli ainda com um sorriso no rosto, pois aprendera com a sua avó que mesmo nos piores momentos deveria sorrir para transmitir felicidade ao próximo. Sophie apenas se manteve quieta.

    Sophie não respondeu. Seguiu calada, com o rosto carregado. Enquanto avançavam pelo corredor frio e impessoal, Leonard observava de relance os pacientes ao redor. Alguns tossiam sob máscaras, outros mancavam, e havia aqueles com ferimentos visíveis. As macas transportavam corpos frágeis, em condições que preferia não entender.

    Se o mundo fosse o inferno, o hospital era a penitência dos fracos. O som dos aparelhos ecoava em seus ouvidos, os bipes incessantes criavam uma atmosfera sufocante. Ele percebeu que o irmão do meio também parecia confuso e inseguro. Então, decidiu segurar a mão do irmão, determinado a oferecer um pouco de força. Aquele não era um momento em que podia vacilar.

    Ao chegarem ao quarto, uma enfermeira saiu e esbarrou em Leonard, que apenas soltou a mão de Calli. O irmão correu para a cama da avó, que estava deitada, com a respiração assistida por máquinas.

    O quarto era pequeno, mas pelo menos aconchegante, se não fossem as máquinas ajudando no tratamento e aqueles bips malditos. Sophie entregou com cuidado James aos braços de Leonard, enquanto se aproximava de sua mãe. 

    — Oh, mãe… Estamos aqui, ok? Estamos aqui por você — disse Sophie, com a voz trêmula, acariciando a bochecha de Morgiana.

    Calli, com os olhos marejados, segurava a mão da avó como se aquele gesto pudesse impedir o inevitável. 

    As lágrimas escorriam silenciosas por suas bochechas, refletindo a pureza de sua dor. Sophie, com a respiração entrecortada, não conseguiu mais conter o pranto. Afundou o rosto no peito da mãe, abraçando-a como quem tenta segurar o tempo. O quarto, impregnado pelo cheiro estéril dos medicamentos, parecia cada vez mais apertado, quase sufocante.

    Leonard desviou o olhar para a janela, tentando encontrar algum ponto de escape para a angústia que o dominava. Lá fora, o céu nublado parecia carregar todo o peso daquela despedida. O vaso de azaleias brancas ao lado da cama, outrora revigorantes, mostrava agora flores murchas, as pétalas soltando-se uma a uma. A brisa que entrava pela fresta da janela as carregava, quase como uma metáfora da fragilidade da vida que se esvaía.

    “Será que vai ficar tudo bem?”

    Naquele instante, enquanto observava Calli soluçar baixinho ao lado da avó, sentiu algo mudar. O sorriso que o irmão sempre ostentara, tão cheio de esperança e ingenuidade, parecia se despedaçar diante de seus olhos. 

    Ele sabia, por algum motivo, com uma certeza dolorosa, que aquele sorriso jamais voltaria a ser o mesmo.

    ***

    Leonard despertou no meio da noite, com a chuva ainda caindo. Lágrimas escorriam de seu rosto, misturando-se à água que o encharcava. A tempestade não cessava, mas agora lhe trazia lembranças de um passado quase esquecido.

    Levantando-se, espreguiçou-se e soltou um bocejo. Após isso, foi até um fruto que havia caído da copa e o devorou rapidamente. Sentia-se no melhor estado que podia após todo o tempo passado naquelas estranhas terras.

    Ele decidiu se aventurar, mesmo na chuva, para fora dali. Este sonho, embora trouxesse recordações de tristeza, também o lembrava de que tinha um lar e pessoas que provavelmente o estavam esperando. Após andar um pouco para fora da área da árvore, misteriosamente a chuva cessou e um dia sem nuvens o preencheu, e ele estava incrédulo.

    “O quê?! Como isso faz sentido, choveu por tantas horas e do nada parou após curtos passos? Não… Será que?”

    Deu alguns passos de volta para a árvore e, imediatamente, a chuva retornou, caindo com força. Leonard ficou perplexo.

    “Como isso é possível? Tinha até trovões! Isso não faz sentido algum… Que lugar esquisito…”

    Apertou a própria bochecha algumas vezes para ter certeza de que estava acordado e, confirmando isso, juntou as peças e tentou raciocinar novamente o que estava acontecendo.

    “Quando cheguei até ela, estava começando a chover, tenho absolutamente certeza disso, então… Por que continua chovendo quando chego próximo e para quando fico longe? Teria sido influência dela antes?” 

    Sem respostas para suas inúmeras dúvidas, Leonard só tinha uma coisa a dizer sobre tudo isso, um pensamento sincero, simples e completo. 

    — Que loucura!

    Seguiu por uma trilha entre as árvores de carvalho-vermelho, todas comuns, nenhuma semelhante à que lhe servira de abrigo. Mesmo assim, o lugar permanecia envolto em mistério. As perguntas cresciam em sua mente, mas ele se sentia aliviado por não encontrar as criaturas aterrorizantes que já enfrentara.

    Nada daquilo sequer fazia sentido. Ele não encontrou naquele caminho mais nenhuma árvore semelhante àquela em toda a caminhada. Buscando respostas sobre onde estava, horas se passaram e as perguntas o atormentavam, mas, ainda assim… Era bem melhor que não encontrasse nenhuma criatura aterrorizante, semelhante àquela que viu no longo desfiladeiro logo quando chegou, ou aquelas malditas flores que tentaram devorá-lo.

    Horas depois, encontrou uma lagoa. A água parecia pura e limpa, uma raridade naquele mundo insólito. Observou a paisagem à sua volta, onde pássaros de anatomia bizarra repousavam nas árvores.

    “Eu preciso tomar água… Mas o que é isso?”

    Ainda assim, havia algo que ele não podia ignorar: às vezes se sentia observado, não sabia de onde nem o porquê, mas para Leonard esse era um dos menores problemas no momento. Quando a noite chegou, ele ainda não havia encontrado um lugar para dormir e, diferentemente do dia, sabia que provavelmente, à noite, coisas estranhas deveriam acontecer naquele lugar mórbido.

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