Capítulo 42 — Sexta Pessoa

Segundos depois, Leonard se recompôs do baque, agora tinha forças para conseguir falar sem sentir uma enorme falta de ar.

— Onde estão Katherine e Liam? — comentou Leonard, com um tom um pouco sério, mas tentava disfarçar.

“Eu… preciso descobrir o que está acontecendo sozinho. Por algum motivo, sinto que isso é uma paranoia minha, não é? Provavelmente deve ser…”

Ele ponderou por alguns instantes, ainda remoía uma certa alienação em sua mente, mas não disse nada, cedo ou tarde descobriria algo. 

— Eles estão ajudando o Senhor Luke — comentou Cassiano, agora não tão preocupado, mas sua voz parecia carregar ainda mais um significado oculto.

— Entendi…

Claire estava mexendo no celular, tirando algumas fotos com a neve, provavelmente para guardar de lembranças sobre sua primeira viagem. No entanto, isso por algum motivo, incomodava ele, a despreocupação que a garota exalava o deixava desconfortável. 

Leonard olhou para o céu cinzento, observando como as nuvens belas, o deixava com uma sensação ainda mais esquisita. 

— Você já ouviu falar sobre algo chamado “Grande Ceia”? — Leonard esticou o braço, se espreguiçando, buscava parecer indiferente para o que estava acontecendo, embora provavelmente fracassaria. 

— Grande Ceia? — murmurou Cassiano, enquanto tentava se lembrar, colocou uma mão no queixo. 

O som dos animais parecia conectar os pensamentos, pela lógica, a tal Grande Ceia, usariam esses animais para se fartar em uma espécie de cerimônia? 

— Pessoal… 

“Grande Ceia… animais… essa seria a causa dos sons?”

Leonard absorto ao momento, decaia em uma espécie de devaneio sórdidos, crendo que encontraria uma resposta correta para a questão. 

— Eu ouvi eles comentando algo… 

Cassiano se virou para Claire, prestando atenção na garota que parecia saber algo.

“Mas se é uma ceia, para o que eles estão planejando fazer? É algum tipo de festa?”

— A Grande Ceia parecia ser sobre uma tal divindade que eles cultuam chamada de Awain, o deus da igreja local. 

Antes que Leonard pudesse chegar a uma conclusão, a voz de Claire o despertou, enquanto ela o encarava séria. — Leo?

— Hã? — murmurou Leonard, antes de voltar para a realidade. 

— Você escutou o que eu disse? — A garota o observou com cuidado. Seu cabelo ruivo caia em cascata para o lado. 

Leonard piscou, afastando os pensamentos que rodopiavam em sua mente como flocos de neve em uma ventania.

— Sim, escutei — omitiu, mas o olhar de Claire indicava que ela não acreditava. Havia algo de penetrante em seus olhos castanhos escuros, uma qualidade que parecia ver além das palavras ditas, como se pudesse revelar verdades enterradas.

— Awain, a divindade local. — Claire repetiu, lenta e deliberadamente, como se testasse a importância do nome na mente dele. — O povo daqui o venera com grande devoção… para eles a tal ceia é uma forma de agradecer pela proteção dele no inverno rigoroso, foi o que eu ouvi dizer.

Cassiano franziu o cenho. O Muralha não era do tipo que se impressionava facilmente, mas a menção de uma divindade local, o deixava inquieto.

— Mais um deus… que coisa complicada. — Cassiano bufou, mas sua postura estava de certa forma tensa. — Essas coisas nunca terminam. Quando as pessoas se tornam devotas a algo, junto vem costumes e crenças…

— Algo como sacrifícios? — Leonard estreitou os olhos, tentando parecer cético, mas o garoto já estava desenhando cenários sombrios.

— Não me olhe assim. — Cassiano cruzou os braços, inclinando-se contra uma árvore próxima. Ele parecia lutar contra uma memória que preferia esquecer. — Tudo começa com festas e rituais inofensivos e depois? Sabe-se lá o que vêm.

O vento carregava o cheiro da neve e algo mais, algo cheiroso e sutil, Leonard não conseguia identificar tal cheiro, mas vinha muito provavelmente de alguma carne. 

Ele olhou novamente para o céu, mas as nuvens cinzentas impenetráveis, escondia como uma cortina qualquer verdade além daquilo que pudesse ver.

“A visão eterna não se mostrou mais nada… isso é bom, mas, ao mesmo tempo, sinto falta.”

— Talvez seja só uma tradição local. — Claire tentou desviar o tom para algo mais leve, mas até ela parecia hesitante. — Nem todo ritual precisa ser sombrio, Cass.

— Então por que eles apenas sussurram sobre isso? — retrucou Cassiano, fixando-a com um olhar duro. — Por que ninguém fala disso diretamente?

Leonard, que se mantinha a ouvir em silêncio, finalmente se pronunciou novamente.

— Eu não sei o que esperar, mas… algo me diz que isso é mais do que parece. 

A neve ao redor deles era tão branca que parecia brilhar, mas o ambiente carregava uma estranha melancolia, como se tudo estivesse suspenso entre o familiar e o inquietante. Era impossível ignorar os sons. Os animais ainda estavam ali, mãe o que antes parecia ser ruídos distantes agora pareciam mais próximos, mais organizados.

— Leonard, você está estranho desde que chegamos aqui. — Claire deu um passo à frente, sua voz tinha uma doçura cuidadosa, mas também uma firmeza que o prendeu. — Você está bem mesmo?

Leonard abriu a boca para responder, mas antes que pudesse dizer algo, sons de passos se aproximando o deixou quieto. Observando na direção, os três viram Liam, Katherine e Luke voltando de seu caminho anterior.

— Muito obrigado por me ajudarem nisso, Dante e Katherine. — comentou Luke, com um certo sorriso no rosto, carregava alguns pedaços de madeira nos braços.

— Não há de quê — respondeu Liam, mesmo que de longe fosse perceptível o desconforto.

“Dante? Damian… espera.”

Leonard se aproximou de Claire e sussurrou: 

— Finja que não sabe o seu nome. — A voz de Leonard embora sussurrada, parecia densa.

“Eles acham que somos os mesmos que vieram da última vez?”

Cassiano se manteve quieto, observando a situação se desdobrar, provavelmente ambos haviam chegado à mesma conclusão.

— Entendido… — Ela sussurrou de volta, se preparando. 

Quando os três finalmente chegaram perto o suficiente para conversarem diretamente, o Senhor Luke disse algo novamente.

— Uh, Cassiano e Damian, vocês podem nos ajudar?

Cassiano tomou a dianteira, nesse momento, Leonard quase se sentiu como um espectador se não fosse o nome “Damian” que era como se dirigiam a ele.

— Claro que sim. — respondeu Cassiano, dando alguns passos à frente. 

Leonard repetiu e ambos pegaram os troncos de madeira que estavam superlotando os três.

— Muito obrigado mesmo, Kassandra, você pode ajudar a Katherine? — perguntou Luke novamente.

“Kassandra, então é isso que eu pensei mesmo… então, o que aconteceu com a sexta pessoa?”

— Claro que sim! — comentou a garota com uma falsa animosidade, pegando alguns galhos.

Com isso, os seis seguiram um caminho em direção a algum lugar semelhante a um armazém para o vilarejo.