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    Inicialmente, ele achava que apenas Thalya era doida. Ela tinha aquela aura de imprevisibilidade, como se pudesse rir de uma piada interna que ninguém mais entendia, ou fazer algo completamente absurdo só para ver as reações dos outros. Mas, à medida que observava o grupo, ele percebeu que todos ali pareciam carregar um pedaço dessa insanidade. 

    Uns mais, outros menos, mas todos compartilhavam essa mesma essência perturbadora, como se fossem peças de um quebra-cabeça que não se encaixava direito.  

    Víctor, o homem do copo de uísque, parecia ser o mais tranquilo do grupo — pelo menos à primeira vista. Ele tinha uma postura calma, quase contemplativa, como se estivesse sempre analisando o ambiente ao seu redor. Mas, quando Calli olhou mais de perto, percebeu algo estranho nos olhos de Víctor. Eles pareciam carregar o peso de incontáveis histórias, como se ele fosse um museu ambulante de todas as experiências que já viveu. Cada olhar, cada gesto parecia ter uma profundidade que Calli não conseguia decifrar.  

    Já o homem alto e forte, que havia arremessado alguém como se fosse um saco de batatas, se chamava Kyan. Ele era o oposto de Víctor: explosivo, barulhento e cheio de energia. Parecia que tudo na vida dele se resumia a quantos socos ele poderia dar em alguém — ou em algo. Ele estava sempre se movimentando, como se a quietude fosse inimiga. 

    Até mesmo agora, enquanto conversava com alguém que Calli não reconhecia, Kyan gesticulava com as mãos grandes e calosas, como se estivesse ensaiando um golpe.  

    Thalya, ao lado de Calli, parecia se divertir com a expressão de perplexidade no rosto dele.  

    — E aí, gostou do nosso pequeno grupo? — perguntou ela, com um sorriso malicioso. — Cada um aqui tem a sua própria… peculiaridade. Alguns são mais quietinhos, outros são como o Kyan. — Ela apontou para o homem alto, que agora estava rindo alto de algo que só ele achava engraçado. — Mas no fim, todos estamos no mesmo barco.  

    Calli olhou para ela, tentando entender o que ela queria dizer com “mesmo barco”. Mas antes que pudesse perguntar, Thalya já estava se virando, caminhando em direção a Kyan, como se quisesse se juntar à conversa animada dele.  

    Calli ficou parado, observando o grupo. Ele sentia que estava no meio de algo muito maior do que podia compreender, e a sensação de que todos ali sabiam algo que ele não sabia era quase palpável.  

    Observou o grupo com uma mistura de curiosidade e desconforto. A energia do lugar era caótica, mas, ao mesmo tempo, parecia haver uma ordem oculta, como se todos ali soubessem exatamente qual era o seu papel — todos, exceto ele.  

    Thalya agora estava rindo alto ao lado de Kyan, que contava uma história animada, gesticulando de maneira exagerada. A garota albina, que havia curado Calli, observava a cena de longe, sentada no sofá ao lado da jovem de cabelos prateados. As duas pareciam compartilhar um silêncio cúmplice, como se estivessem conectadas de uma maneira que ele não conseguia entender.  

    Víctor, por sua vez, continuava no balcão, bebendo seu uísque com calma. Seus olhos, no entanto, estavam fixos nele, como se estivesse estudando cada movimento, cada expressão.  

    — Então, garoto — disse Víctor, quebrando finalmente o silêncio. — O que você acha do nosso pequeno refúgio?  

    Calli hesitou, tentando encontrar as palavras certas.  

    — É… diferente — respondeu ele, escolhendo a resposta mais neutra possível.  

    Víctor riu baixinho, como se a resposta de Calli fosse exatamente o que ele esperava.  

    — Diferente, sim. Mas você vai se acostumar. Ou não. Depende de quanto tempo você aguentar.  

    — Quanto tempo eu aguentar? — repetiu Calli, confuso.  

    Víctor não respondeu imediatamente. Em vez disso, ele levantou o copo de uísque, como se estivesse brindando a algo que só ele entendia.  

    — Todo mundo aqui tem uma história, jovem — disse ele, finalmente. — Algumas mais longas, outras mais… dolorosas. Mas, no fim, o que nos une é o fato de que não temos para onde correr. Este lugar, essas pessoas, são tudo o que nos resta.  

    Calli sentiu um frio percorrer sua espinha. A fala de Víctor era carregada de um peso que ele não conseguia ignorar.  

    — E o que exatamente nos une? — perguntou ele, tentando manter a calma.  

    Víctor olhou para ele por um momento, como se estivesse decidindo o quanto revelar.  

    — Você ainda vai descobrir — disse ele, finalmente. — Mas uma coisa eu posso te adiantar: não importa o quanto você tente fugir, o passado sempre alcança a gente. E aqui, ele alcança mais rápido.  

    Antes que Calli pudesse responder, um barulho alto vindo da outra ponta da sala chamou sua atenção. Kyan havia derrubado uma cadeira enquanto ria de algo que Thalya dissera, e agora os dois estavam em pé, se encarando como se estivessem prestes a começar uma briga — ou uma competição.  

    — Aposto que você não consegue me derrubar de novo! — disse Kyan, com um sorriso desafiador.  

    — Ah, é? — respondeu Thalya, girando o guarda-chuva nas mãos como se fosse uma arma. — Vamos ver quem ri por último.  

    Calli olhou para Víctor, esperando alguma reação, mas o homem apenas levantou o copo novamente, como se aquilo fosse a coisa mais normal do mundo.  

    — Não se preocupe com eles — disse Víctor, com um tom casual, enquanto tomava um gole do uísque. — Eles sempre fazem isso. É a maneira deles de… se divertir.  

    — Se divertir? — repetiu Calli, incrédulo. — Eles parecem prestes a destruir o lugar.  

    Víctor riu baixinho, como se a preocupação de Calli fosse engraçada.  

    — Ah, garoto, você ainda não viu nada. Espera até o Kyan começar a quebrar as paredes. Aí, sim, vai ser divertido.  

    Enquanto isso, Kyan e Thalya continuavam se encarando, como dois predadores prestes a atacar. De repente, Kyan deu um passo à frente, fechando a distância entre eles com uma velocidade impressionante para alguém do seu tamanho. Thalya, no entanto, não pareceu intimidada. Ela girou o guarda-chuva com uma habilidade surpreendente, o usando para desviar do primeiro golpe de Kyan.  

    — Mais rápido, grandalhão! — provocou ela, rindo enquanto se movia com agilidade ao redor dele.  

    Kyan respondeu com um soco poderoso, que Thalya desviou por pouco, fazendo com que o punho dele atingisse a parede atrás dela. O impacto foi tão forte que rachou o reboco, espalhando poeira no ar.  

    — Quase! — gritou Thalya, pulando para trás com um salto gracioso. — Mas você vai ter que se esforçar mais do que isso se quiser me pegar.  

    Calli observava a cena com uma mistura de fascínio e horror. Era como assistir a uma luta coreografada, mas com um nível de intensidade que deixava claro que aquilo não era apenas uma brincadeira.  

    — Eles… eles vão se matar — murmurou Calli, sem conseguir desviar os olhos.  

    — Relaxa — disse Víctor, ainda calmo. — Eles sabem até onde podem ir. Mais ou menos.  

    — Mais ou menos? — Calli olhou para Víctor, esperando uma explicação melhor, mas o homem apenas deu de ombros, como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo.  

    Enquanto isso, Kyan e Thalya continuavam sua “brincadeira”, com Kyan tentando acertar Thalya com golpes cada vez mais fortes, e ela desviando com uma agilidade quase sobrenatural. A garota albina e a jovem de cabelos prateados observavam a cena de longe, parecendo mais entretidas do que preocupadas.  

    — Você vai se acostumar — repetiu Victor.

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