Capítulo 33 - O Homem da Mecha Roxa
Uma parte de mim quer muito ler esse livro agora, nesse instante, mas outra parte clama por cumprir meu objetivo, que é ler os bilhetes.
Mas eu não sei se vou ter outra oportunidade de vir aqui tão cedo… é uma boa hora para eu ler esse livro.
Vou olhar as letras dos bilhetes bem rápido, para dar tempo de ler pelo menos um pouco.
Peguei o bilhete que fala do tesouro e deixei aberto em cima da mesa.
Fiz o mesmo com a caixa onde estavam todos os bilhetes dos alunos e comecei a olhar a letra um por um.
Porém, enquanto olhava as letras, minha mente estava focada no livro. O que será que vou encontrar nele? Pode ser algo bem importante que pode me ajudar.
O brilho da lamparina refletiu no anel que estava em meu dedo, o anel que minha mãe me deu.
Ele é uma lembrança dela, e pelo visto, toda vez que vejo esse anel, as memórias com ela vêm à tona.
Os momentos felizes e tranquilos… era tudo perfeito.
Lembro como se fosse ontem quando ela cantava minha música favorita para eu dormir. A voz dela calma, como de um anjo, e seus olhos lindos que me deixavam encantado.
Eu podia jurar que, não importava o que acontecesse, ela estaria ali comigo.
Agora estou aqui sem ela, e nem sei como está a situação dela. Meu coração dói só de pensar no que aconteceu naquele dia.
Ficar girando o anel em meu dedo é o que me tranquiliza.
Minha mãe disse para mim que, quando eu estivesse ansioso ou com medo, era para girar o anel no dedo, e dessa forma eu estaria fechando a porta dos meus sentimentos e deixando apenas a coragem para fora.
A coragem para defender o que é precioso para mim.
Porém, estou sentindo que estou ficando sem coragem. Tá difícil ficar sem você aqui, mãe.
O tempo vai passando e, a cada dia, eu me sinto sozinho. A dor no peito não me deixa em paz. Se você estivesse aqui, iria me tranquilizar tanto…
Por favor, me dê coragem, mãe. Eu preciso dessa coragem para prosseguir, para te encontrar novamente.
— Por qual motivo uma criança tem um anel desse tipo?
Uma voz surgiu atrás de mim do nada. Fiquei em choque, sem tempo para reação.
Nem sequer me virei para ver o rosto do homem.
— E por qual motivo você está aqui, em um lugar restrito?
Sabia que ia acontecer algo de errado. Aquela menina estava planejando algo contra mim desde o dia em que a envergonhei na frente das suas amigas.
Parei de girar o anel em meu dedo e me virei lentamente para o homem.
Seu cabelo era preto com mechas roxas. Parecia que ele tinha passado gel e puxado todo o cabelo para trás, deixando apenas uma única mecha roxa à frente de seu rosto.
Sua face era limpa, sobrancelhas bem pequenas e quase invisíveis, nariz fino e um rosto bem simétrico. Pelo visto, ele havia passado algo nos lábios, já que estavam azulados.
Com seus olhos pretos, ele me encarava com uma expressão séria, muito ameaçadora.
— Não vai responder? Vai ficar me encarando aí por quê? Por algum a caso perdeu algo em meu rosto…Yuki?
Ele sabe meu nome? Como?
Olhei de cima a baixo para ele. Seu estilo era bem sociável: um terno azul com listras pretas regulares em perfeito alinhamento.
Até os sapatos estavam combinando com o terno.
— Eu… não sei…
Não consegui pensar em nada. O que poderia dizer nesse momento?
— Não sabe o quê? — disse o homem, andando lentamente para mais perto de mim.
— É que… sabe… eu vim aqui porque a Abe me pediu. Segundo ela, eu estava autorizado a subir aqui…
Ele franziu a testa e fez uma expressão como se eu tivesse contado uma piada.
— Autorizado? Hahaha… Deixa de mentira. Ninguém fora o diretor tem autorização para subir aqui. Por esse motivo não tem nem elevador que pare nesse andar.
Ele ergueu o braço em minha direção, claramente querendo me agarrar.
Eu esquivei e me afastei dele, cuspindo palavras de defesa:
— É sério! Foi ela quem disse! Tenho até o Sasori e o Fuutaro como prova. Pergunta pra eles!
Ele ajeitou o terno calmamente, assim como o cabelo.
— Você não está entendendo a situação mesmo, né? Descumpriu uma ordem de estar fora da sala e ainda entrou em um local proibido. Isso é muito sério!!
— Mas, moço, é sério o que estou dizendo. A Abe realmente disse que eu podia estar aqui! — exclamei, preocupado, me levantando da cadeira.
O homem à minha frente estava prestes a dizer algo. Seu corpo se posturou de uma forma que dava a entender que ele iria me pegar à força.
Mas, do nada, ele parou e revirou os olhos para o lado direito.
Sem dizer mais nada, parado ali na minha frente, sua expressão mudou de raiva para preocupação. Seus olhos se arregalaram e sua face ficou pálida.
O que parecia que ele iria fazer, desistiu de repente.
— Enfim… tenho que ir agora! Considere isso sorte!
E assim o homem rapidamente, com passos largos, se afastou de mim e sumiu do meu campo de visão.
— Mas o que foi isso?? — murmurei.
Meu coração estava acelerado, mas o problema não foi esse.
Eu não consegui pensar em nada além de medo. Meu corpo não respondia aos comandos do meu cérebro. Na verdade, nem meu cérebro estava conseguindo enviar comandos para o meu corpo.
Isso que era estranho. Eu nunca na minha vida tive um momento sequer em que meu cérebro parecia um vasto nada, enquanto meu corpo tremia sem controle.
Que sensação horrível.
Sentei novamente na cadeira para respirar, já que minha respiração estava tão pesada que mal respirei durante a conversa.
Consegui ouvir alguns passos vindo da porta. Eram passos rápidos. Pelo visto, a pessoa estava correndo.
— Droga… será que ele voltou de novo? — comentei.
Ao me virar na direção da porta, surgiu um homem ofegante.
— Moleque!! — gritou o homem.
Era Okawara, com o rosto escorrendo suor e respiração tensa — com motivos, já que estava correndo.
Ele deve ter visto, pelo relógio, que eu estava em um lugar proibido, e deve ter corrido para me impedir.
— Professor… me desculpa por ter vindo…
— Você está bem?? — indagou Okawara, me interrompendo.
Fiquei surpreso. Ele estava preocupado comigo? Por qual motivo?
— Ah… eu tô bem, sim… Por quê?
Ele se aproximou de mim e, com sua mão direita, puxou minha orelha, começando a me arrastar com ele.
— Ai, ai, ai, minha orelha! O que foi, professor?? Por que tá fazendo isso??
— Você sabe muito bem o motivo, moleque!!!
Após me tirar do local, ele fechou a porta do sótão e trancou com uma chave azul.
— Essa chave… — murmurei.
Olhei com atenção para ela e, pelo pouco que vi, a cor e o desenho destacado nela eram iguais aos do meu anel.
Ou eu estava vendo coisas.
— O que disse?
— Essa chave… é sua? — indaguei, apontando para a chave em sua mão.
Ele olhou para a chave e, rapidamente, a guardou no bolso.
— Não é da sua conta! Você tem que se preocupar é consigo agora!
Okawara pegou firme no meu braço, me arrastando com ele.
— Por que… tenho que me preocupar comigo… agora?
Ele andava com tanta pressa que estava difícil acompanhá-lo. Até falar estava complicado.
— Cala a boca! Você é inteligente ou não? Devia saber que, se entra em lugar proibido, o mínimo são consequências sancionadas!
Descemos a escada até o andar debaixo, entramos no elevador e, finalmente, ele largou meu braço.
Onde ele tinha apertado, ficou vermelho com a marca dos seus dedos.
— Mas… como você sabia que eu estava aqui?
Ele certamente sabe que eu não faço ideia de que o relógio tem uma câmera embutida, então me daria uma resposta esfarrapada.
— Fui notificado de que um menino estava entrando em uma área restrita. Logo imaginei que seria esse local.
Olhei de recanto para ele, com uma expressão de dúvida.
— Ué, tá me olhando assim por quê, moleque? — indagou Okawara, franzindo a testa.
Eu não poderia perguntar demais, senão acabaria levantando alguma desconfiança. E ele não pode desconfiar de mim a respeito do relógio.
— Nada não… Você é muito inteligente, senhor Okawara.
Bati palmas leves para ele.
Mas, como sempre, ele fechou a cara e me xingou.
Obviamente, não quis perguntar o motivo dele estar desesperado ao me ver. Tenho certeza de que ele sabia que havia aquele homem comigo.
E, pelo desgaste físico, ele estava com muita pressa. Se chegou a esse ponto, significa que o homem que falou comigo não era um professor.
Lembro da aparência e do estilo dele. Nunca o tinha visto até então.
Por qual motivo… e como ele soube de mim e do meu nome?
E por qual motivo ele saiu correndo?
A cada dia que passo aqui sinto que estou sendo vigiado e perseguido por muita gente. Estou ficando com medo e me sentindo pressionado.
Mas, pela minha sorte, tenho o Okawara para me ajudar, como fez até hoje várias vezes.
Porém, deixando isso de lado, acabei não vendo todas as letras dos bilhetes. Com toda essa confusão, não consegui fazer muita coisa. Mas amanhã os meninos terminam para mim. Não será problema, já que estão em dois.
E, a respeito dos livros que explicam a origem das partículas Oni, por sorte consegui pegar o primeiro volume para ler. Antes que o Okawara chegasse, escondi o livro por debaixo da blusa, entre a calça e a cintura.
— Vou te levar de volta para seu dormitório, e amanhã me espera que eu te busco para a aula. — disse Okawara, com uma expressão séria.
Acenei com a cabeça, sorrindo.
Mesmo tendo medo, com o Okawara por perto eu consigo me sentir seguro. Mesmo com sua grosseria e xingamentos ríspidos, dá para ver que ele se importa comigo.
Talvez seja o trabalho dele se importar até o início das aulas do ano que vem, mas, mesmo sendo obrigação ou não, eu posso confiar.
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