Não consegui andar devagar; acabei apertando os passos.
    Quando fiquei de frente à mão, de frente à porta, na minha direção… estava a Itsuki, com um sorriso enorme no rosto.

    — Yuki!!! — disse ela, com as bochechas vermelhas e seus lindos olhos azuis brilhando.

    — Que difícil encontrar você, hein?

    Assim que disse isso, ela puxou minha mão e me levou para dentro do quarto da Ayumi.
    Acabei caindo no chão.

    — Aiai… — reclamei de dor.

    — Desculpa, Yuki hehe. É porque ninguém pode ver você aqui! Aliás… por que está aqui??? — indagou, mudando sua expressão de felicidade para tensão.

    Ainda no chão, respondi:
    — Porque eu queria te ver.

    Ela mudou de novo a expressão — da tensão para um rosto tímido, voltando às bochechas rosadas.

    — Ah… bom, mas por que queria me ver??

    Ela ergueu a mão para mim, querendo me ajudar a levantar.
    Aceitei a ajuda e peguei em sua mão — macia, igual da última vez.
    É incrível como consigo sentir uma alegria quando toco nela… me lembra a minha mãe.

    — Bom, é uma longa história, viu? Vamos conversar no sofá?

    Ainda agarrada à minha mão, dava pra ver que ela não prestava atenção no que eu dizia; seus olhos estavam fixos nas nossas mãos unidas, e suas bochechas ainda mais vermelhas.
    O que deu nela? Será que estou apertando demais?

    — Ham… vamos pro sofá? — indaguei novamente.

    Sem reação. O que está passando na cabeça dela?

    Perdendo a paciência, levei ela — que parecia nas nuvens — até o sofá.
    O problema: onde fica o sofá? O quarto da professora Ayumi era completamente diferente do quarto do Okawara.
    Além de mais vibrante e colorido, era bem espaçoso.

    — Onde fica o sofá, afinal? — perguntei, olhando ao redor.

    Olhei para Itsuki e ela ainda estava estática, plena, sem esboçar reação.

    — Ei, ei! Que foi? Alô? Terra chamando Itsuki, está me ouvindo?

    Nada. O melhor a fazer seria beliscar de leve seu braço.
    Belisquei delicadamente — e, pra minha surpresa, ela não reagiu.

    — Meu Deus… virou zumbi agora?

    No meio da minha revolta, ela finalmente voltou ao normal.

    — Ah… desculpa, Yuki…

    Ela soltou minha mão rapidamente, como se estivesse queimando.

    — Ei, calma. Por que ficou paralisada do nada? Nem respondia, nem se mexia! O que aconteceu?

    — Ham… não sei explicar, sabe… tem a ver com essas partículas. — disse ela, olhando para a própria mão. — Às vezes, quando fico de mãos dadas com a Ayumi, consigo sentir os sentimentos dela… escutar a voz da consciência. E quando isso acontece, eu… meio que desligo do mundo.

    — Nossa… então você conseguiu sentir meus sentimentos agora? Por isso ficou desligada?

    Ela levantou a cabeça; seu olhar recaído se expandiu, e um pequeno sorriso apareceu.

    — Não… eu não consegui ver seus sentimentos. Nem escutar sua consciência. É a primeira pessoa que eu toco e não consigo ver nada. — disse ela, sorrindo.

    Isso era estranho. Conseguir ver sentimentos e ouvir consciências é algo assustador, ainda mais se ela não tem controle.
    Mas por que ela não conseguiu ver os meus? Talvez seja os meus olhos cinzas que interfere no dom dela.

    — Entendi, Itsuki. Mas se você não conseguiu ver meus sentimentos, então por que ficou desligada?

    — Foi porque eu estava tentando entender por que não estava funcionando. Eu senti as células Oni se conectando com o seu corpo, então era pra ter funcionado.

    — Que estranho, né… — comentei, curioso.

    Toda vez que seguro a mão dela, sinto algo diferente mesmo. Devem ser as células Oni tentando se conectar.

    — Mas enfim, me mostra um lugar legal pra gente sentar e conversar? — pedi, estendendo a mão.

    Itsuki olhou pra minha mão… depois pra dela.
    E, após alguns segundos de hesitação, segurou.

    Mais uma vez, senti aquela vibração — e um sentimento impossível de explicar.
    Ao olhar pra ela, estava normal, consciente… e com as bochechas coradas.

    Ela me levou até uma sala enorme, onde havia uma grande televisão e uma mesa de vidro fosco.
    Sentamos nas cadeiras e ficamos nos encarando por alguns segundos.
    Acho que ela esperava que eu começasse a falar.

    — Itsuki, tenho várias coisas pra conversar com você, sabe? Eu te considero minha amiga, e me preocupo com você, entende?

    Vi suas bochechas corarem mais, e ela desviou o olhar, tímida.
    Ela assentiu com a cabeça.

    — Que bom que entende. É que aconteceram umas coisas estranhas comigo… e preciso te fazer umas perguntas, tudo bem?

    Ela desviou o olhar de novo, mexendo no cabelo rosa.

    — Tudo bem… — murmurou baixinho.

    — Alguém deixou um bilhete estranho pra mim. Dizia pra eu ir a um certo lugar, caso contrário meu “tesouro” sofreria. Dito isso… você viu algo suspeito recentemente?

    — Algo suspeito? Hmmm… deixa eu pensar! — disse ela, olhando pra palma da mão. — Acho que nada. Até porque sempre fico aqui quando não estou em aula. Raramente saio com a Ayumi.

    — Que bom, fico aliviado. — disse, passando a mão na testa.

    — Mas… por que a pergunta?

    — Bem, é que eu pensei que esse tal… ham…

    Na verdade, por que pensei que o “tesouro” era ela? Só porque disseram que iriam machucar? Isso é loucura.
    Se eu disser isso, ela vai me achar estranho.

    Levantei da cadeira, nervoso, tentando disfarçar a confusão na minha cabeça.

    — É que esse bilhete me levou até um local abandonado, onde um homem de capuz tentou me pegar. Então queria ver se você estava bem!

    — Ham?? Você… se preocupou… comigo?? — disse ela, corando ainda mais.

    — Mas é claro! Você é minha amiga, e eu disse que iria te proteger, não disse?

    Ela levantou da cadeira, veio até mim com pequenos passos leves, pegou meu braço e segurou minha mão.

    — O que está fazendo? — perguntei.

    Ficou segurando minha mão por alguns segundos, depois largou, como se nada tivesse acontecido.

    — Queria saber se você está falando a verdade. Eu também consigo sentir isso… mas com você, realmente não funciona.

    Ela tem convicção no que faz. Conhece bem suas células Oni.
    Mas, diante de mim — alguém que bloqueia esse dom —, ela não parecia frustrada…
    Pelo contrário, um sorriso lindo nasceu em seu rosto.

    — Por que você está feliz? — perguntei, observando seu rosto.

    — Porque agora eu não preciso ter medo de segurar sua mão.

    Que surpresa foi essa?

    — Que bom, hihi! Então pode ficar de mãos dadas comigo — como melhores amigos!

    Ela assentiu, ainda sorrindo.

    — Mas o que eu estava dizendo é importante… tem muita coisa estranha acontecendo comigo desde que cheguei aqui! — disse, levando-a até o sofá.

    — Estranhas como? — perguntou.

    — Depois te conto. Mas quero que escute o que eu vou dizer, certo?

    Ela assentiu de novo, afastando a franja do olho esquerdo.
    O cabelo rosa dela, iluminado pelo sol, reluzia como seda. Era um brilho lindo — me lembrava um sonho que tive com aquela mulher.

    — Que bom. Então, continuando… tem um homem me perseguindo desde os meus primeiros dias aqui. Ele usa uma blusa de moletom azul e vive de capuz. Você já viu alguém assim?

    Itsuki olhou pra mão direita enquanto fazia um som familiar, o mesmo som que se faz quando está pensando em algo.

    — Acho que nunca vi ele, Yuki. Desculpa… — disse, triste.

    — Ah, tudo bem! Mas quero que fique alerta, caso veja um homem alto de capuz azul, certo?

    — Certo!

    Ela deu um sorriso tímido, com as bochechas coradas.

    — Que bom, hihi! Agora outra coisa… por que você não pode sair sozinha? Tive que vir até aqui pra te ver poxa, muito perigoso isso!

    — Heh… desculpa por isso. É que a Ayumi não deixa eu sair sozinha. E eu também não gosto de sair… pelo menos aqui, ninguém me incomoda, sabe? — disse, com o olhar triste e cabisbaixa.

    — Aquelas meninas te incomodam tanto assim, Itsuki?

    Ela assentiu, cabisbaixa.

    — E a Ayumi sabe disso?? — perguntei, em tom firme.

    — Ela… não. Eu não contei pra ela…

    — Mas por que não? Talvez ela possa te ajudar! Ela é professora, não é?

    — É complicado, Yuki. Você não vai entender…

    — Eu não quero entender, eu quero que você fique bem e feliz!! — gritei, levantando do sofá.

    Não queria gritar, mas foi inevitável.

    — Não!! Isso não faz sentido! Minha felicidade não importa, nunca importou!!

    — Como assim? Por que está dizendo isso??

    Ela ainda sentada, abaixou a cabeça e cobriu o rosto com as mãos.

    Me agachei na frente dela.

    — Como assim, Itsuki? Quem disse que sua felicidade não importa?

    — É que… é complicado, Yuki! Eu não posso…

    Antes que terminasse, levantou o rosto — e vi o brilho das lágrimas escorrendo.
    O coração dela estava em pedaços.

    Obviamente eu não tenho a confiança dela o suficiente para me contar algo tão profundo.

    — Tá bom… entendi. — disse, me levantando. — Pegue minha mão.

    Estendi a mão diante dela. Seus olhos, cheios de lágrimas, a encararam.

    — Vai, pegue!

    Depois de alguns segundos, ela segurou minha mão.
    Levantei-a, e, ainda cabisbaixa, ela evitava olhar pra mim.
    Levantei seu rosto com a outra mão e enxuguei suas lágrimas.

    — Eu sei que ainda não confia totalmente em mim, mas eu vou conquistar sua confiança.
    Porque eu sou seu amigo. E quero te proteger de tudo.

    Ao dizer isso, olhei em seus lindos olhos e a abracei com delicadeza.
    Achei que isso a acalmaria… mas, ao contrário, ela começou a chorar ainda mais.

    Há uma ferida enorme dentro do coração dela.
    E, de alguma forma, eu sinto que preciso ajuda-la.
    E vou fazer isso.

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