Capítulo 29 | O Rugido e o Silêncio
Silêncio absoluto.
A arena, devastada pela Técnica de Morte: Rei Silencioso, ainda tremia com resquícios da aura sombria que Sander havia lançado. Cinzas flutuavam como neve negra, e o chão onde Kaede fora atingido jazia despedaçado, rachado como se o próprio solo tivesse sido enforcado pelo ataque.
Mas… ali.
No centro do caos.
Uma figura tremia.
Um joelho se ergueu. Depois o outro.
As mãos trêmulas afastaram escombros. A fumaça dissipava lentamente, revelando os olhos de Kaede Shizuma — ardendo em vermelho, como brasas engolindo dor.
A plateia engasgou num só fôlego coletivo.
FWTV ativou os sensores de combate.
Ameaça Recalculada: Kaede Shizuma
Nível de Risco: Top 10 do Torneio.
Status: Inadmissível ignorar. Risco de escalada extrema.
Nas cabines, os comentaristas estavam em choque.
— “Ele… ele ainda tá de pé?! Esse garoto acabou de tomar o Julgamento dos 100 Reinos do Silêncio!”
— “Isso… isso ultrapassa resiliência. Isso é quase suicídio em nome de orgulho.”
A câmera cortou pro rosto de Kaede. Sangue escorria da boca. O corpo tremia, mas a coluna ereta desafiava a própria gravidade. Seus dedos se fecharam em punhos. Um calor absurdo começou a subir da base de seu corpo.
Infância. Um garoto de cabelos vermelhos demais, voz alta demais, socos impulsivos demais.
“Você fala demais.”
“Você nunca vai ser alguém assim.”
“Menos intensidade, Kaede.”
“Seja como os outros.”
Frases afiadas, ditas por treinadores, colegas, até familiares. Sempre o reprimindo.
Mas o garoto não calava.
Ele nunca calou.
Kaede, agora no presente, estalou o pescoço e sorriu entre os dentes partidos.
— “E mesmo assim…”
— “…eu nunca me calei.”
E então, sua energia mudou.
Não só um Sen.
Não só uma aura.
Era como se um trovão roncasse dentro dele, acordando uma tempestade adormecida.
O chão sob seus pés trincou com a pressão de seu retorno.
Uma energia flamejante, vermelha com traços de dourado, começou a tomar conta do seu corpo — feroz, barulhenta, viva. Como um rugido que se materializava em poder.
Na tribuna, Ryuji sussurrou:
— “Esse é o Kaede… de verdade.”
O rugido… ainda não havia começado.
As pedras ainda caiam dos céus partidos quando Kaede avançou.
Nada de grito, nada de pose exagerada.
Dessa vez, ele apenas andou — cada passo estalando como trovão abafado, cada movimento envolto por uma chama vermelha que parecia viva, pulsante, faminta.
Sander, impassível, ergueu o queixo.
Sua aura voltou a crescer como névoa escura, densa, sufocante. Um rei silencioso… mas agora em alerta.
Eles se encontraram no centro do campo.
Os olhos de ambos diziam tudo.
Sem árbitro. Sem plateia. Sem mundo.
Só dois reis.
E apenas um trono.
CLANG.
Primeiro impacto. Punho com punho.
Chamas contra silêncio.
O som da colisão parecia quebrar a realidade.
— “Você berra,” disse Sander, no meio do segundo soco, “porque tem medo do silêncio.”
— “E você se cala,” respondeu Kaede, desviando de uma rasteira, “porque tem medo de sentir.”
Sander avançou, girando com uma palma envolta em raios.
Kaede defendeu com o antebraço, que fumegou sob o impacto.
Mais trocas.
Mais choques.
A cada golpe, os estilos se chocavam tanto quanto os corpos.
Sander era limpo, metódico, como se medisse a distância entre um golpe e uma lição.
Kaede era bruto, mas preciso. Como quem grita não por fraqueza, mas pra garantir que o mundo escute.
— “Você quer ser rei por quê?”
— “Porque ninguém nunca gritou por mim. Agora eu grito por todos.”
Kaede avançou, e ao receber um chute no abdômen, não caiu.
Não dessa vez.
Em vez disso, cravou o pé no chão e cuspiu sangue no lado.
— “King’s Vow.”
Uma nova onda de Sen explodiu dele.
A aura flamejante começou a mudar — ganhando contornos dourados, como uma coroa viva em volta de seu corpo.
Cada golpe que ele tomava, cada vez que resistia, fazia essa aura crescer. Era um pacto. Um voto. Um juramento inquebrável:
“Enquanto eu me levantar, eu sou rei.”
Sander franziu a sobrancelha.
— “É isso? Você se fortalece na dor? Você chama isso de poder?”
Kaede sorriu.
— “Não. Eu chamo isso de viver.”
Sander rangeu os dentes.
Avançou.
Kaede também.
Dois golpes, dois rugidos silenciosos.
Duas auras colidindo com o peso de ideologias.
BOOOOM!
Eles se acertaram ao mesmo tempo —
Um chute de Sander no flanco esquerdo.
Um soco flamejante de Kaede no queixo.
Ambos voaram pro lado oposto.
O campo tremeu.
Os dois rolaram no chão e pararam, ofegantes, de costas um pro outro, caídos como guerreiros que não sabiam o que era ceder.
Na plateia, nem os comentaristas falavam.
Só o som do vento entre escombros.
Só o ressoar de duas almas que escolheram reinar com o que tinham.
Um com o silêncio.
O outro com o grito.
Ambos… ainda vivos.
Ambos… ainda em guerra.
E no meio disso tudo, uma única certeza ecoava nos corações de quem assistia:
A história não era sobre quem venceria.
Era sobre quem não aceitaria perder.
A poeira mal assentava.
O mundo parecia respirar com dificuldade — como se o próprio ar estivesse cansado de assistir.
No centro da arena partida, dois corpos se levantam.
Primeiro Sander. Depois Kaede.
Ambos com os joelhos trêmulos, o sangue nos cantos da boca e as almas ardendo feito brasas.
Nenhum deles queria recuar.
Não era mais sobre vencer ou perder.
Era sobre provar que o que acreditavam… era real.
Kaede cuspiu no chão e limpou o rosto.
— “Você ainda de pé? Boa… isso tá ficando interessante.”
Sander não respondeu. Apenas encarou. Seu olhar, calmo como uma lâmina mergulhada em gelo, nunca tremia.
Mas algo diferente brilhou ali.
Algo antigo.
Uma vila apagada no mapa.
Chuva cinza caindo num mundo já sem cor.
Sander ainda era só um menino quando tudo acabou.
A guerra não pediu licença.
Não avisou.
Ela só chegou.
Explosões. Gritos. Chamas.
Corpos caindo. E o som… o som era o que mais doía.
Ele se escondia com a mãe atrás de uma casa semi-destruída.
Ela o abraçava com força. Tremia.
Sussurrava, como se isso fosse suficiente pra mantê-lo vivo.
E então, ela cometeu um erro:
Gritou.
Em menos de um segundo, um soldado virou a esquina.
Sander só lembra dos olhos da mãe.
Do barulho do tiro.
E de como, desde aquele dia…
Ele aprendeu que quem grita, morre primeiro.
De volta ao presente, Sander limpou o suor da testa com a manga da roupa rasgada.
— “Chegou a hora, Kaede Shizuma.”
Ele ergueu a mão direita.
Do vazio, algo se formou.
Um cetro.
Negro como um eclipse. Silencioso como um túmulo.
A aura à sua volta se recolheu, ficou densa, pesada… como se todo o universo segurasse o fôlego.
— “Técnica Suprema — Cetro Real: Julgamento do Silêncio.”
CRAACK!
O chão se abriu. A arena se dobrou sobre si mesma.
Kaede foi engolido.
Quando abriu os olhos, estava em outro lugar.
Nada ali fazia som.
Nem os passos.
Nem a respiração.
Nem o próprio coração.
Uma prisão de silêncio absoluto.
Cada movimento de Kaede doía. Não só no corpo — mas na alma.
Era como se o silêncio fosse uma lâmina, cortando suas memórias, sua esperança, sua vontade de gritar.
Mas então…
Ele entendeu.
Sander não era arrogante.
Ele tava ferido.
Kaede caiu de joelhos. Suando, sangrando, respirando pela boca.
Mas ao fechar os olhos, ele pensou em Renji.
Em Ryuji.
Em Tsubasa.
Em Genjiro.
E naquele dia…
Num campo de treinamento qualquer, ele jurou:
“Vou ser rei. Mesmo que ninguém escute.”
Kaede se levantou devagar.
A aura dele, antes flamejante, agora ardia como fogo celestial.
Um rugido silencioso atravessou a ilusão.
— “Meu rugido… não precisa ser ouvido.”
Seus olhos queimavam.
Seus punhos brilhavam.
— “Precisa ser sentido.”
Ele avançou. Cada passo quebrava o chão da ilusão.
Sander tentou deter, lançou feixes de energia silenciosa.
Mas nada parava Kaede agora.
Ele gritou.
Não com a voz.
Com a alma.
— “Royal Storm Breaker!”
Uma sequência de dez socos flamejantes irrompeu do corpo dele.
Cada um com uma memória, uma dor, uma chama.
- A promessa de infância.
- O medo de nunca ser visto.
- A solidão das derrotas.
- A risada dos que duvidaram.
- O grito de quem ele defende.
- O peso de ser o “reizinho.”
- A raiva de ser subestimado.
- A fé que ainda o guia.
- O amor que ele tem pelos amigos.
- E o juramento mais verdadeiro de todos:
“Nunca vou me calar.”
A sequência explodiu no peito de Sander.
O silêncio se despedaçou.
Como vidro, a ilusão quebrou.
BOOOOOOOM!
O campo virou uma tempestade.
Não de vento, mas de vontade pura.
As técnicas colidiram como dois meteoros batendo de frente.
De um lado, o silêncio absoluto —
o peso da dor engolida.
Do outro, o rugido flamejante —
a força de quem escolheu sentir até o fim.
A arena não suportou.
Sensores explodiram, plataformas racharam.
Painéis de energia crepitaram, tentando conter algo que já não podia ser medido.
A plateia inteira levantou.
Ninguém conseguia respirar direito.
A luta tinha ultrapassado a técnica.
Era mitologia viva.
A poeira baixou devagar…
Como véus sendo retirados de uma estátua divina.
Dois corpos se revelam no meio dos escombros.
Um…
Ajoelhado.
Respiração pesada. Mãos no chão. Ombros caídos.
Outro…
De pé.
Trêmulo, sangrando, com o braço direito caído.
Mas ainda assim… de pé.
KAEEEDEE… SHIZUMAAA!
O grito rasgou a arena.
O juiz, quase sem acreditar no que via, ergue a mão.
— “Vitória: Kaede Shizuma!”
Sander, ajoelhado, olhou pro chão por um instante.
Depois ergueu o olhar.
Seus olhos não mostravam frustração.
Nem raiva.
Só respeito.
Ele sorriu. Não muito — só o suficiente.
— “Muito bem…”
A voz era baixa, mas clara.
— “Eu não esperava nada menos… de um Rei.”
E então ele caiu de costas, respirando fundo, como se finalmente pudesse descansar.
Ryuji Arata
Olhos arregalados.
Um meio-sorriso nasceu no rosto dele.
— “Esse filho da puta… conseguiu.”
O peito dele vibrava, não só de orgulho, mas de admiração crua.
Ele sabia o que era estar ali.
Sabia o que era lutar com o coração exposto.
Renji Asakura
— “HAHAHA! ISSO!”
Pulou da cadeira, mesmo com curativos pelo corpo.
— “Eu sabia que o reizinho era um monstro! Ele fez aquele Sander ajoelhar!”
Mas no fundo, os olhos dele também estavam sérios.
Ele entendeu o quanto aquilo custou.
Tsubasa Hayashi
Braços cruzados, olhando fixo.
Quase não falou. Só murmurou:
— “Kaede… Você se superou.”
Mas os dedos cerrados mostravam que ele estava emocionado.
Genjiro Okabe
— “PQP… Que porrada foi essa?”
Quase derrubou o energético que segurava.
— “O cara virou um Rei de verdade na porrada, mano… que cena.”
E com um leve sorriso:
— “Agora eu quero ver alguém tirar esse maluco do pedestal.”
DE VOLTA À ARENA
Kaede ficou em pé por mais dois segundos…
Depois, caiu de joelhos.
— “Argh…”
A mão dele ainda tremia.
O corpo gritando de dor.
Mas ele sorriu.
Um sorriso real. Sincero. Sagrado.
Ele tinha vencido.
Mas mais do que isso…
ele tinha sido reconhecido.
Sander se arrastou um pouco pra sentar, limpando o sangue da boca.
Olhou pro céu, depois pro chão rachado.
— “Sabe… Eu lutei contra gente forte. Silenciosa, barulhenta… desesperada.”
— “Mas você foi o primeiro que me fez sentir… que eu tava errado.”
Ele fechou os olhos.
— “Talvez nem todo grito seja um pedido de socorro… às vezes, é uma declaração de existência.”
Kaede olhou de lado, respirando fundo.
— “E talvez nem todo silêncio seja covardia… às vezes é só dor demais pra virar palavra.”
Os dois rei e rei… se entenderam.
Num mundo onde ninguém se entende.
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