Capítulo 41 - O fim da reunião (Parte 1)
Os acontecimentos do capítulo anterior trouxeram mudanças de rumos dentro da cúpula da segurança do Castelo de Shuigang.
Não só Dail se contentou ao saber da índole de Viktor, mas aos demais soldados do reino também.
Entretanto, esse sentimento não estava totalmente aflorado no guardião que, mesmo recuando um pouco em seus julgamentos, se manteve focado em saber mais do jovem humano.
Enfim, a história continua, minutos depois da algazarra do time de Lilac junto a Viktor.
Após as constatações frente ao time da dragão púrpura, Dail continuou o assunto acerca dos planos dos Red Scarves.
Cogitações, suposições, teorias, ideias… Tudo foi devidamente levantado até que o monarca chegasse no ponto principal da conversa.
— Nós conseguimos simular a radiação da pedra do reino, mas essa radiação só emana uma fração a nível de polegadas do que um resquício teria. Agora imaginem uma máquina feita para condensar essa radiação diretamente dos resquícios. Reviver a Jóia do Reino é definitivamente uma possibilidade que não descartamos.
Dail tinha muito a falar, como costumava fazer. Mas ele não era o único.
— Pô, o Spade tem tino de empreendedor, mas isso aí tá bem acima da catiguria dele… — completou Carol, surpresa.
— Porque acha isso? — perguntou Dail.
— O mané nunca foi dessa de “de volta ao planejamento”, saca? O Spade gosta de ver o circo pegar fogo e fazer parte disso, não só assistir — a gata tinha mais a dizer, cruzando os braços. — Conheço a peça, modus operanti e déjà vu do ninjita marrento. Essa parada cheira a coisa grande.
Ying olhou para Carol, percebendo que ela estava mesmo falando sério.
— O que está dizendo é um indício fortíssimo de que devemos manter este fico. Está certa disso, Carol?
— Pode crer, Ying… opa, quero dizer, guardião! Eu e minha diva linda aqui conhecemos o Spade o suficiente — a felina estava com seu rosto demonstrando seriedade desta vez.
O tom do assunto que tratavam havia subido, deixando o clima mais denso.
Lilac levantou uma questão em seguida.
— Reviver a Jóia do Reino sequer foi levantado por Neera Li, muito menos Royal Magister. Os cientistas de Shang Tu também não ousariam ir tão longe com essa loucura… — ela pôs uma das mãos em seu queixo, mostrando preocupação. — Me pergunto o quanto Spade tenha evoluído com essa sua nova abordagem.
— O que vocês estão fazendo para lidar com isso? Nota-se que esse clã é muito perigoso! — falou Viktor, olhando para Dail.
— Não, Viktor… É algo impossível — Lilac respondeu, se virando para o rapaz. — Esse clã é muito grande e não há como saber ao certo onde ficam escondidos. Eles têm bases no mundo todo.
— É, piá… — Carol concluiu. — Para os Red Scarves, Avalice é quase como um imenso brechó, saca? Tu entra num lugar desses e sempre vai achar um lenço vermelho fedorento por lá, nyah!
O ceticismo tomou conta do assunto.
Por mais que os agentes de Shuigang tivessem evidências, não eram concretas o suficiente; esse era o sentimento em comum de ambas as frentes.
Mas porque, Dail? Porque Spade se daria o trabalho de reunir os resquícios? — perguntou Milla.
— Tenho certeza que Spade quer criar defesas… — o soar de sua voz parecia trazer uma camada de decepção. — Mas, conhecendo meu irmão, eu sei que ele vai usar isso pra cobrar pelo “serviço” de proteger Avalice.
Carol entendeu a colocação de Dail.
— Ah, o velho joguinho: ele quer “salvar o mundo” do jeito dele. Malandro é malandro…
— … e mané é mané, né Carol? – disse Milla, completando o que a felina iria dizer.
— Hahahaha! É isso mesmo, fofinha linda! Nyah! – disse, enquanto abraçava sua amiga.
— Ah, para! Está me fazendo cócegas!
— Que fofucha cute cute, dios mio! Nyah!
Embora disse uma cena agradável, Lilac precisou impor limites.
— Carol, pare com isso! Estamos falando bem sério! O assunto exige isso.
— Tá, mommy. Foi mal… Mas a Milla é muito fofinha!
Rapidamente, a dragão voltou ao assunto.
— Bem, Dail, o que você sugere que digamos a Royal Magister?
— Bem, deixar Spade à vontade não é uma boa ideia, já que isso oferece riscos a qualquer nação. E tem mais uma coisa…
— O que?
— Porque reviver a Jóia em momentos de paz? Entenderíamos se estivéssemos em guerra, como foi com Brevon. Não faz sentido.
No mesmo instante que Dail disse esse nome, os punhos de Ying se serravam com uma força fora do comum.
Esse detalhe não passou despercebido por Lilac, que estava próximo do panda, e conseguiu perceber isso perfeitamente.
Embora isso tivesse algum significado, a jovem dragão manteve suas atenções ao assunto.
E Dail continuou:
— Meu irmão deve saber de coisas que ainda não sabemos. Ao contrário de nós, ele não tem limites para obter informações confidenciais. Ele tem espiões em todo lugar.
— Nós precisamos investigar todas as movimentações da The Red Scarves — Lilac disse, caminhando em direção a Dail. — Temos que achar os resquícios que eles têm em mãos e evitar que façam besteira. E, também, os que estão por todo o planeta.
— Sim. Exatamente isso. Os Três Reinos estão unidos nessa missão. A Espiral do Reino pode ter trazido um novo horizonte para os povos de todo o planeta, mas sabemos que isso não será obtido sem turbulências.
— Royal Magister estava mesmo certo em se preocupar. Temos mesmo que impedi-los. Se isso que você disse se confirmar, teremos muito trabalho pela frente.
— Eu concordo — Dail falou, voltando a se sentar nas poltrona central. — Isso é de interesse de todas as nações, Diga a ele que Shang Mu precisa saber dos riscos. Mayor Zao 1 precisa saber disso. Eu mesmo mandaria algum emissário, mas a informalidade talvez seja a melhor alternativa.
A conversa estava seguindo tranquilamente, como deveria ser. Mas existia uma tagarela no grupo e:
— Tu viu? Apareceu escrito outra vez! – disse Carol, surpresa.
— Vi o que, sua boba? — perguntou Lilac.
— Escrito “referência subiu” brilhando que nem um vídeo game!
— Para com isso, Carol! Nós passamos vergonha sempre que você vem com essas suas maluquices!
— Tá, bonita! Se tu quer ignorar isso, então vou fazer o mesmo! Depois não vem chorar no meu ombro se a Illusia, acho que é esse o nome novo, banir o escritor.
— Para com isso agora, Carol!
A gata verde (tagarela) se reservou a voltar para o lugar onde estava, restando a Lilac a prosseguir com o assunto que estavam falando.
Guardadas as devidas proporções, a reunião foi muito proveitosa.
A reunião com o monarca serviu para saberem dos interesses dos Red Scarves com relação aos resquícios da Jóia do Reino que não foram obliteradas na atmosfera durante a batalha de Lilac contra Brevon.
Além disso, existia a teoria de que Spade estaria revivendo o tal artefato precioso, o que mudaria totalmente o grau de emergência dos Três Reinos.
Sabendo disso, agora as garotas deveriam retornar até Shang Tu para informar a Royal Magister sobre o ocorrido.
Mas, como era tarde da noite, o guardião tomou a palavra.
— Oferecemos instalações ao seu time, Sash Lilac. Seria de muito bom agrado que recuperasse suas energias neste nobre lugar.
— É sério isso?! — disse Carol, com brilho nos olhos. — Deu bom, time! Deu bom demais, nyah!
— Carol, tenhas modos! — Lilac novamente impondo limites a sua amiga. — E muito obrigado, Ying.
— Disponha — ele referenciou a dragão, ainda mantendo seu semblante sereno. — Significa muito para o Reino de Shuigang cuidarmos de nossos colaboradores.
Caminho aberto e acomodações das melhores. Isso, enfim, concretizou o fim da reunião.
Mas:
— Entretanto, tenho um pedido a fazer.
Foi o próprio guardião que disse isso.
Lilac o olhou, dizendo:
— O que seria?
Ele andou até Viktor e, olhando para bem dentro de seus olhos, disse:
— Nossa equipe médica e científica gostaria imensamente de examiná-lo.
— Hã?! O que?! — o rapaz deu um passo para trás, impactado pela surpresa.
Não seria por menos essa reação. Tanto que Lilac falou o que era esperado.
— Porque, posso saber? Claro, com o devido respeito.
— Sash Lilac, é sabido por todos que Viktor não é de Avalice. Por mais que já saibamos de sua índole, o que quero acreditar fortemente que seja honesta, sua natureza é única. Seres singulares de outros planetas podem ter comportamentos e reações diferentes em nosso planeta. Vale o cuidado.
— Então essa parada de cutucar o piá aí é só pra fazer um check-up geral, na maciota? — perguntou Carol, com seu jeito despojado de sempre.
— Exatamente. Depois de tudo que aconteceu, recuperar suas energias tornou-se o meu maior foco — Ying, de forma gentil, respondeu, olhando novamente para o humano. — Peço, por favor, que aceite, Viktor.
Não precisou mais do que segundos até que o jovem respondesse.
— É claro, Ying. Eu aceito, sem dúvidas.
— Agradeço pela cooperação — o guardião tornou a caminhar, dizendo em seguida. — Me acompanhe, por favor.
Isso causou um pouco de estranheza no time de Lilac, que não tardou em dizer:
— Espera, para onde o levará?
— Para a policlínica do Castelo de Shuigang, situada no primeiro andar. Porque, cara dragão?
— Eu imaginava que todos nós iríamos juntos também.
— Hum… — Ying entendeu o que ela queria dizer. — Todas vocês terão suas energias recuperadas, ademais.
— Hã? Como assim?
Não foi preciso falar muito após isso. A cena a seguir já explicava tudo que era necessário.
Ala termal do Castelo de Shuigang
Quintal Onsen de recuperação | Noite adentro
— Ahh! Putzgrila, mano… Era disso que eu tava precisando!
E era exatamente o que Carol já havia explicado.

Era um banho termal tradicional, estilo japonês2 do nosso mundo.
A água quente borbulhava na banheira de pedra, enquanto o vapor sobe no ar.
Em volta da banheira, havia bambus altos, seixos polidos3 e grandes rochas cobertas de musgo.
A luz natural, proveniente dos feixes lunares, entrava pelas janelas, criando uma atmosfera serena e relaxante.
O trio de garotas que compunham o time de Lilac estavam se banhando confortavelmente nas águas termais do Castelo. Como tradição da região, era uma incrível fonte de recuperação de energias.
As três pareciam extasiadas com a maravilhosa sensação de quentura e relaxamento, praticamente as deixando até coradas pelo prazer gerado.
— Puxa, isso é tão bom, né? — disse Milla.
— Ó, se é! — desta vez era Carol. — Mó bom tá aqui. Não é, Lilac?
Com a dragão isso era ainda mais importante: por ser uma Dragão Aquática, o poder de cura e relaxamento era ainda mais poderoso. A água era a principal fonte de recuperação de Lilac, e águas termais eram o extremo disso tudo.
Com isso, Lilac não só estava corada como seu nível de meditação Bodhi4 a fez ir para um outro patamar, quase uma dimensão paralela.
Como se viu isso? Simples: ela estava brilhando com uma aura lilás, esboçando um sorriso de satisfação no quilate de chakra.
Mas…
— Ô, Lilac! Para com isso! — Carol a segurou com força, a arremessando para o fundo. — Chega desse lance viajado aí, pô! Tamo conversando contigo!
A dragão surgiu no meio das águas quase como um gigante de filme japonês, indo até ela.
— COMO VOCÊ OUSOU ATRAPALHAR MINHA MEDITAÇÃO? — a textura de seu rosto se assemelhava a de um dragão real.
— Ih, lá ela… — Carol não se amedrontou. — Tu que ficou nessa aí de relaxamento e esqueceu da gente aqui! E se vier de “carocha realista” pra cima de mim, te mando pra lua!
— GRR, então tenta! — a dragão estava ainda mais ameaçadora.
As duas começaram a se atracar com violência na água, quebrando o clima tranquilo. A confusão entre as duas não foi o suficiente para atingir Milla, que se manteve serena o tempo todo.
E, enquanto a dupla se digladiavam, a pequena levantou uma ideia.
— Hm… como será que o Viktorius está se saindo lá na policlínica?
Essa simples pergunta desfez a tensão e rivalidade das duas briguentas, que pararam imediatamente.
Tão logo, Carol falou:
— O piá é normal, não tem nada demais com ele. O “Einstein de QI alto” lá de Shang Tu já deu o recado.
— Mesmo assim, Carol… — desta vez era Lilac dizendo. — O Ying pediu com gentileza, mas porque só ele? Tudo bem que ele não é de Avalice, está evidente, porém acho que isso só foi um pretexto.
— Como é? Que quer dizer?
— Eu não sei. Não sei mesmo… Mas desconfio que…
Muito se disse após a fala da dragão.
E as revelações não haviam chegado ainda.
Havia muitas nuances improváveis, todas enigmáticas.
- REFERÊNCIA SUBIU↑[↩]
- nota: Os banhos termais japoneses, chamados onsen, são conhecidos por seus efeitos medicinais e têm sido usados há muito tempo para revigorar o corpo e o espírito. As águas termais japonesas são ricas em minerais e podem ajudar a tratar diversas doenças, como: dores musculares, rigidez articular, resfriados, cortes, queimaduras, fadiga generalizada etc.[↩]
- nota: seixo polido é um fragmento de rocha ou mineral com uma face polida naturalmente e que adquire brilho após ser lavado. É um elemento decorativo que pode ser usado em ambientes internos ou externos, como para delimitar áreas e caminhos de jardins, decorar vasos, entre outros.[↩]
- nota: A meditação budista, ou Bodhi, é uma prática que tem como objetivo a iluminação. Os termos mais próximos de “meditação” nas linguagens clássicas do budismo são bhavana e desenvolvimento mental.[↩]
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