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    Prefeitura de Shang Mu | Noite

    Um clima de resignação foi imposto. 

    Essa era a vontade de Mayor Zao: organizar um torneio de artes marciais puramente para fins populistas.

    O pequeno prefeito ainda estava extasiado com o sucesso absurdo e repercussão ímpar de suas nova empreitada em sua cidade. 

    Diante da algazarra de Zao, Viktor, se colocando como interlocutor dessa vez, estava conversando com o panda vermelho a fim de tentar reverter a situação adversa.

    — Sr prefeito, acho que deveria voltar atrás nisso tudo. Como eu te disse mais cedo, esse clã Red Scarves está atrás desse resquício. A senhorita Lilac estava totalmente focada em lhe avisar sobre isso antes de mais nada! 

    Zao tinha baixa estatura. Isso o incomodava muito, aliás. Ter de sempre olhar para cima ao conversar com qualquer pessoa era algo muito frustrante (para ele).

    Por causa disso, em quase todo lugar da Prefeitura de Shang Mu, havia um dispositivo para, quando acionado, surgir uma plataforma que o erguesse até uma altura condizente com a outra parte.

    E foi isso que aconteceu: ele apertou um botão de sua vestimenta e subiu até o nível da altura de Viktor.

    — Rapaz, acho que você não entendeu bem a situação… — disse, olhando-o nos olhos. — Não sei de que planeta você veio, mas aqui as coisas, ah meu rapaz, elas funcionam diferente. 

    — Do que está falando? O Sr acabou de anunciar um torneio onde o principal prêmio é justamente o motivo de estarmos aqui para lhe avisar!

    — E daí? — Zao não mudou seu semblante tranquilo. — Eu vejo isso como uma oportunidade.

    — O que?! — o humano se surpreendeu, dando um passo para trás. — Oportunidade para quê? Para que aqueles ninjas saibam onde está o resquício?

    — Não, meu rapaz esquisito. Você acha mesmo, de verdade, que meu reino não tem segurança? Haha, os Red Scarves pensariam duas vezes antes de tentar algo. Eles sabem do que minha força militar pode fazer, esteja certo disso! 

    — Mesmo assim, eles saberão onde está o resquício! 

    Zao sorriu, de forma honesta, sem deboches. Pareceu uma prova de satisfação, pois foi muito espontâneo.

    — Haha! Isso é perfeito!

    — Hã? Perfeito? Onde isso é bom? 

    — Meu rapaz, raciocine: eu estou organizando um torneio de artes marciais para TODOS, eu disse TODOS, participarem. E se eu disse TODOS, então isso abrange TODO lutador, inclusive ninjas Red Scarves, haha!

    — O que?! — Viktor percebeu a realidade da situação, ao conhecer um pouco mais do prefeito. — Isso é loucura! Eles estão atrás do resquício para fazer coisas ruins e o senhor ignora esse perigo?

    — Isso só engrandece o torneio, haha! Imagina só: em um cenário onde o mundo corre perigo, onde inimigos planejam o desconhecido, onde destemidos lutadores que lutam pela justiça e a paz entram em um torneio e… — ele foi interrompido, justamente onde começaria a recitar um monólogo enorme.

    A responsável pela interrupção foi Carol, que puxou Viktor com toda a força pelo braço, o levando para longe de Zao.

    Ele, surpreso, disse: 

    — Ei, porque você fez isso, Carol? 

    — Piá, tu tá enxugando gelo, na boa.

    — Hã? O que isso tem a ver? 

    — Tu tá tentando convencer o Zao a fazer o carinha não ganhar inscritos. Só isso. 

    — Hã? Eu estou tentando o convencer, mas de não pôr o resquício gigante como um prêmio para entregar a localização do resquício!

    — O que, para o Zao, é inútil. Ele não vai te ouvir, esquece! Porque tu acha que a Lilac saiu sem nem se dar o trabalho?

    Em segundos, Carol entregou a Viktor o panorama. Aliás, o jovem percebeu tão rápido quanto.

    — A senhorita Lilac nem tentou, por conhecê-lo e saber deste detalhe, é isso?! — ele falou com um tom de voz agudo, tamanha sua surpresa. 

    — Trim, trim! Bingo! — Carol simulou estar batendo em um sino. — Ela já sabia que o carinha lá nem ia dar papo.

    Viktor ficou deveras preocupado. Também frustrado, já que não conseguiu somar com alguma solução.

    Ele olhou novamente para onde Zao estava, onde Milla conversava com o panda vermelho.

    — Eh, não acha melhor tentarmos outra vez? 

    — Esquece isso, tá? A Milla mesmo nem tá falando isso com ele, tu pode ver.

    Carol, caminhando para fora, chamou pelo humano.

    — Vamo lá falar com a Lilac, piá. Se eu conheço ela bem, deve tá full pistola.

    Combinado, eles se dirigiram até o:

    Quintal da Prefeitura de Shang Mu | Noite

    O local, bastante arborizado e florido, se assemelhava a uma praça oriental. Uma fonte d’água adornava o ambiente, gerando uma harmonia perfeita.

    Como estava de noite, a iluminação destacava ainda mais a área verde, com um caminho formado por pedras rústicas.

    Sentada em um dos bancos de praça do local, Lilac estava pensativa, talvez um pouco mais que o normal. 

    Claro, novos dilemas a golpearam.

    — “Porque as coisas simplesmente precisam ir sempre contra os meus planos? Era uma missão simples, bastava avisar ao Mayor Zao e, do nada, tudo muda para algo maior do que deveria ser! Essa é a tal teoria do caos que a doutora Tuvluv falava?”

    A surpreendendo, eis que Carol e Viktor apareceram à sua frente, com a felina dizendo:

    — Tu não tá na fossa, né? Nem tá na hora pra isso. 

    — Você sabe muito bem como eu estou quanto ao que aconteceu, Carol. 

    — É, sei sim… — disse, se sentando ao lado da amiga. — Paciência, né? Tu não tá sozinha nessa. 

    Viktor também mostrou sua posição.

    — Carol está certa. A senhorita não está sozinha. Se precisamos lutar no torneio, então faremos isso. 

    Lilac até esboçou um singelo sorriso, sabendo que seus amigos a estavam apoiando, mas, subitamente, se dispôs a opinar.

    — Viktor, eu aprecio sua consideração. Significa muito para mim, mas eu realmente não quero envolver você nisso. 

    — E posso saber o porquê? — perguntou o humano, curioso.

    Viktor estava um pouco irritado, mas nada que assustasse Lilac. 

    Aumentando o coro, Carol também queria saber. 

    — Isso aí. Responde o piá, Lilac. Porque ele não pode participar? Tu tá vendo que o cara tá em ponto de bala pra lutar e vai ignorar isso?

    Lilac precisava falar um bom motivo para que não deixasse evidente a proteção que havia prometido a Ying. 

    — “Carol sempre foi assim, desinibida e sem filtros. E o Viktor, como o Ying disse, quer puxar para si a responsabilidade. Eu preciso falar com sinceridade sem ofendê-lo. Já imaginava que isso iria acontecer.”

    Lilac tinha um pequeno desafio pela frente. 

    Como lidaria com mais este dilema?

    Enquanto isso…

    Prefeitura de Shang Mu | Noite

    Como sabido, Milla ficou conversando com Mayor Zao dentro do prédio.

    A pequena, a seu jeito, tinha como maior vantagem a característica de ser acessível a praticamente qualquer pessoa.

    Por isso, a conversa se manteve em um tom bastante amigável e que se desenrolou normalmente.

    — Aí o Royal Magister disse para virmos para cá e te avisar sobre o resquício grandão.

    — Entendo… — Zao estava um pouco mais pensativo, mas não deu sinais de que voltaria atrás. — Magister precisa saber cuidar melhor de seus assuntos. Aqui em Shang Mu as coisas funcionam diferente. 

    — Como assim? Você sabia dos Red Scarves?

    — Eu?! Haha… — ele gargalhou, como se estivesse debochando da situação. — Tenho coisas muito mais importantes pra me preocupar “como a minha reeleição, hehe”, mas…

    — Mas o quê? 

    Milla ficou curiosa, principalmente porque o panda vermelho caminhou até próximo de uma das estantes de livros do local. 

    Ele pegou um livro, o abrindo. Essa ação desencadeou uma dúvida ainda maior em Milla. 

    — O que foi? Porque você pegou o livro? 

    — Eu li muitos livros daqui e do mundo. Mas… Bem, se lembra que eu disse que não tenho o mínimo interesse nos Red Scarves? Pois bem, temos nosso setor de inteligência, fofinha.

    — Setor de inteligência?

    — Sim. E ele é secreto. Então, se tiver mesmo um risco para o meu reino, eles vão lidar com isso “e eu com minha reeleição, hehe!”. Você entendeu?

    Sim, ela entendeu. E muito bem. 

    Milla sacudiu sua cabeça em sinal de confirmação. 

    Mas, aproveitando o assunto, a pequena se lembrou de algo, uma sub tarefa.

    — Ah, o General Gong pediu para te entregar isso! — disse, mostrando os livros que ela carregava. — Estão em perfeito estado.

    — Uh? Livros? Eu lembro que recomendei a ele alguns, mas nenhum livro daqui da prefeitura pode deixar esse lugar. Me deixe vê-los, sim? — Zao os verificou. — Ah, sim… Esses livros são da Biblioteca do Centro. 

    — Ah! E onde fica? 

    — No centro da cidade, perto da Praça Central. 

    Foi de muita ajuda a conversa. 

    Todavia, havia um outro fator naquela noite que todos ignoraram, mas não Zao.

    — Eh… Vocês não vão participar do torneio?

    — Sim. Porque?

    — Então, vocês precisam cumprir o prazo.

    — Prazo?!

    Lilac e seu time precisam se mexer o mais rápido possível.

    Voltando ao quintal…

    No exato momento que a gata selvagem perguntou.

    A questão era Viktor e como Lilac lidaria com os argumentos certos a fim de protegê-lo sem que transparecesse essa ação. 

    E, nesse meio segundo, Carol ficou atenta à atitude da dragão, como fez anteriormente. 

    Por fim, Lilac respondeu:

    — Você precisaria de muito mais tempo para treinar. Em um torneio como esse, estar em um nível aceitável é a primeira coisa que um lutador tem que se preocupar.

    — Hã?! — Viktor, contrariado, esboçou um semblante mais irritadiço. — Você acha que eu não aguento?

    — Uma luta? Talvez. Você mostrou garra contra a Neera, mas… — Lilac tomou ar, escolhendo muito bem o que estava dizendo. — E se forem mais lutas? Digo, adversários consecutivos no mesmo nível de Neera é um desafio muito grande, você não acha?

    Foi um bom argumento. E sem levantar suspeitas. Carol concordou com esse ponto. 

    — Tá. Ok. Ela tá certa, piá. Tu foi badass ao suportar a pandurona lá, mas quatro “Neeras” seguidas ia te fazer virar paçoca, nyah!

    — É um torneio de times, Viktor — falou a dragão, mostrando tranquilidade em seu rosto. — É algo realmente complicado. E, além disso, não te envolver nesses assuntos é um dever meu. Não se esqueça que ainda está sob custódia do Reino de Shang Tu.

    Viktor até iria se opor, mas, ao ver o rosto de Lilac, seu coração o conteve, como se não quisesse desagradá-la.

    Aceitando a exigência da garota, o rapaz recuou.

    — Tudo bem. Eu entendi. Você precisa de pessoas prontas para lutar. Eu sei como é — ele não abaixou a cabeça, mesmo assim. — Talvez conseguisse vencer a Neera, mas eu precisaria estar bem preparado. Não sabia que ela era tão forte assim. 

    Não foi exatamente o que esperava ouvir, mas Lilac conseguiu o que queria. 

    — “Bem, ele aceitou não lutar. Mas, ele falando assim, dá a entender que não entendeu ainda a grande diferença entre um Natural e alguém que possui Nirvana. Por isso é perigoso que participe de qualquer torneio em Avalice.”

    Um problema a menos, será? 

    Desta vez, Viktor aceitou os argumentos de Lilac, se resguardando e indo a resignação. Sua vontade de não desagradar a jovem era maior que a sua de lutar no torneio. 

    — “Vou ficar na minha. Desde Shuigang não vejo a Lilac tão concentrada assim. Eu acredito que seu estresse deve a estar torturando o tempo todo, ela gritou com a Carol várias vezes. Vou facilitar a vida dela, mas vou tentar ajudar de alguma forma!”

    Chamando a atenção do grupo, Milla, saindo de dentro da prefeitura, veio correndo, gritando por: 

    — Lilac! Lilac! — bradava a pequena, mostrando urgência em seu tom de voz. — Tenho notícias! Temos que correr bem depressa!

    Milla havia trazido notícias.

    Determinantes para o desenrolar da noite.

    Minutos depois…

    Centro da cidade de Shang Mu

    Praça Central | No meio da noite

    — Droga! Só temos quatro horas para inscrever o time!

    Essas foram as palavras de Lilac, dando a entender perfeitamente a notícia dada pela canina mais cedo.

    Sentados na praça, local ornamental e cheio de verde por todas as partes, aguardavam por Lilac, que estava afastada do time fazendo contato com o Reino de Shang Tu, mais precisamente com Neera.

    Ao seu retorno, eras visível de que não foi uma conversa produtiva no que diz respeito à missão.

    — Más notícias.

    — Ih, lá vem… — disse Carol, já mostrando insatisfação. — Manda a braba.

    — Gong e Neera estão fazendo uma expedição em Shuigang. Eles nunca chegariam aqui a tempo para entrar para o time. 

    — Então, da patota, não tem ninguém, né? 

    — Sim, Carol… — Lilac manteve o seu olhar preocupado o tempo todo. — E as regras do torneio pedem cinco, o que nos traz mais dificuldade.

    — Ferrou, então… — a felina se levantou indo até sua amiga. —  Sem zuera dessa vez: o que vamo fazer?

    — Não sei, mas… — ela se mostrou pensativa.

    — Tá, pula esse clichê de “nanana, MAS…”! Vai direto ao ponto!

    — Aquela sua ideia é a única que vejo mais prática no momento. 

    — A da combinação de botões?! — Carol estava levando isso a sério no tom de sua voz.

    — Não, sua boba! — esbravejou a dragão, mostrando irritação. — Me refiro a selecionar gente anônima mesmo! 

    Pela primeira vez (ou segunda), Carol esboçou um semblante mais sério, totalmente destoante de sua personalidade. 

    Ela entendeu que aquilo precisava de uma abordagem rápida e precisa, já que não tinha muito tempo até o término do período de inscrição.

    Desta forma, ela mudou o tom da conversa. 

    — Tá, Lilac. Pra gente encontrar dois membros vai ser difícil, sendo bem sincera contigo. 

    — Você tem mais experiência nisso do que eu. Tem alguma ideia?

    — Tenho sim… — disse, a caminhar para longe do grupo. — Você confia em mim? 

    — Hã? Hm… — a garota dragão pensou um pouco mais de 3 segundos antes de falar. — Eu confio em você, Carol. 

    — Beleza, então… — disse, olhando para o restante do time. — Vocês dois aí, alguma coisa pra dizer, nyah?

    Milla e Viktor gesticulavam, juntos, com a cabeça, em sinal de negação.

    Pois bem, Carol voltou seu olhar para frente e tossiu, como se estivesse disposta a limpar a garganta.

    Após isso, tocou fôlego e, para surpresa do grupo, gritou o mais alto que conseguiu: 

    — Alguém que saiba lutar, e que gosta de sangue e ossos quebrados, quer entrar pro nosso time? Tamo indo pro Tormenta!

    Todos os transeuntes do lutar olharam para Carol e, por consequência, para todo o grupo da dragão. 

    E todos do time ficaram cotados, envergonhados com a enorme chamada de atenção da felina tagarela.

    Lilac, muito mais irritada, também gritou, mas com: 

    — CAROL! — ela agarrou a felina pelos ombros e a sacudiu com força. — Será que você não tem juízos?! Porquê tem que fazer essas coisas idiotas no meio de uma missão séria como a nossa?

    — Pô, solta aí! — ela tentava se desvencilhar da amiga. — Você disse que confiava em mim! Cadê a tua palavra, nyah?

    — Grr… sua boba!

    Entretanto: 

    — Vocês falaram do Tormenta?

    Uma voz foi ouvida, o que fez com que todos olhassem para a direção de onde ela proferiu.

    Ao olharem, viram um canino com pelugem marrom, usando sapatilhas, calça preta de artes marciais e uma caminha regata de cor branca. Ele também tinha cabelos longos trançados para trás, de cor loira.

    Lilac entendeu do que se tratava. 

    — Você é um lutador? 

    — Eu sou o campeão do último torneio que disputei em Parusa, a um tempo atrás — respondeu, reverenciando-a. — Sou Santino Rock, a seu dispor.

    — Ah… Você quer entrar para o time, eu presumo.

    — É o que precisam e será o que terão! Juro que honrarei o nome do seu time! 

    Carol olhou com estranheza, o suficiente para perguntar:

    — Tá, caramelo. Se tu é tudo isso aí, tem como provar que tu levantou o caneco?

    Carol não era tão desleixada assim.

    Ou era?

    Lilac aguardava impaciente pela prova.

    Será que ela viria mesmo?

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