Capítulo 64 - Mar de revolta (Parte 1): ternura incrível
Como visto no capítulo anterior, Noah desejava fazer parte do time de Lilac para disputar o Tormenta.
Sabido disso, ele passou por uma sabatina, realizada, principalmente, por Lilac.
Contudo, os outros integrantes cativos do grupo estavam céticos quanto a sua pessoa.
Por causa disso, era necessário uma prova da idoneidade do rapaz.
Ele prometeu lhe entregar o suficiente: a sua história.
Por esse motivo, iremos retornar um pouco no tempo, em um período conturbado.
Planeta Avalice, dezessete anos atrás.
Reino de Shuigang
Vila Marin D’alvy | Extremo Sul de Shuigang

Tudo começou exatamente no meio de uma das várias vilas costeiras da área gelada do Reino dos Pandas, como Shuigang também era chamada.
Com o mar tomando parte do horizonte e altos picos cobertos de neve, o cenário do vilarejo era magnífico, praticamente um presente da natureza.
Essa era a tônica de todos que lá moravam:
“A natureza sempre nos presenteia com coisas maravilhosas; como uma mãe para o próprio filho.”
As casas rústicas, mesmo para uma zona litorânea, eram a principal característica arquitetônica daquela região; pequenas, mas todas com fundações fortes e resistentes.
Nessa vila, um dos moradores se destacava. Conhecedor dos mares, herança de sua família a décadas, ele, no cais, dialogava com um grupo de avaliceanos.
— Não era à toa que maremotos e furacões sequer abalaram essa estrutura! — indagou, apontando para a barreira que protegia a área de pesca. — Tudo isso feito com muito afinco e dedicação por parte de todos nós. Então, não desanimem!
Seu nome: Yvo Hibiki.
Esse era o pai de Noah.
Ele era um panda do reino de Shuigang, capitão de um navio de hortifrutigranjeiros.
Embora de origem humilde, tinha o conhecimento de um sábio, pois sempre buscou o conhecimento, principalmente em enfrentar os mares do mundo.
Inclusive, essa era sua profissão: um exportador de produtos, que exigia conhecimentos gerais plenos.
Em uma de suas viagens por Avalice, ele encontrou sua alma gêmea, o norte que almejou.
Ele conheceu sua esposa, Rebekka Hibiki, quando visitou Shang Mu em uma entrega.
Ela era uma panda vermelha, raça essa bem comum na cidade (como Mayor Zao). Rebekka tinha como profissão a medicina científica do Instituto de Biomedicina de Shang Mu.
Os pais de Noah se conheceram ao acaso: por precisarem de um navio para pesquisar sobre a vida marinha do planeta, o instituto contratou justamente Yvo para que fossem até mar aberto, para bem longe da costa.
Rebekka ficou encarregada dessa missão.
Durante a expedição, ambos se conheceram melhor e, pelas características e interesses, a relação tomou força e o amor aflorou em seus corações.
Isso se fortificou ainda mais quando os dois se encontraram durante o Festival de Lanternas, um evento anual no calendário da cidade.
Foi naquele dia que os dois oficializaram seu relacionamento.
Meses depois, se casaram.
Rebeka deixou sua vida de pesquisadora e Yvo de exportador para se lançarem no mundo dos mares de Avalice.
Eles se tornaram exploradores, profissão muito requisitada em Avalice na época.
Pela pouca estrutura tecnológica, gemas eram pagas aos montes a pessoas destemidas e corajosas o suficiente para desbravar os quatro cantos do planeta, em busca de catalogar os diferentes pontos.
Era uma dupla apaixonada por procurar conhecimento pelas zonas remotas de Avalice.
O amor do jovem casal de aventureiros, pouco tempo depois do matrimônio, resultou em Noah Hibiki, um lindo híbrido, onde herdou as orelhas vermelhas com detalhes pretos em sua pelugem e os olhos verdes de sua mãe; de seu pai herdou sua pelugem branca em todo seu corpo.
Seus traços eram tão suaves que muitos o confundiram com um felino.
Foi neste lugar, a Vila Marin D’alvy, local pitoresco e humilde, que Noah nasceu.
E, assim, o começo de sua história em Avalice.
Cinco anos depois…
Residência da Família Hibiki | Manhã
Noah estava no início de sua infância, com seus 5 anos de idade.
Ainda criança, observava as ondas batendo contra as rochas da costa.
Dentro de sua própria casa, ele tinha uma visão privilegiada da enseada, logo a frente da residência humilde.
Já nessa época, ele já tinha fascínio pela natureza exuberante daquela região de Shuigang.
Sua pelugem, ainda mais branca, e seu rosto sereno, davam o ar da graça de sua aparência exótica.
Seus olhos eram sempre exaltados pelos aldeões.
“Parecem esmeraldas. Tão preciosos quanto.”
A força bruta da natureza o fascinava.
Ele passava horas brincando, imitando os movimentos das ondas e da vida marinha em Avalice.
E, como característica marcante: Noah sempre esboçava um sorriso. Ele transbordava vivacidade e felicidade.
Sua ternura era seu maior expoente.
Esse vislumbre, puro e de descobertas, era um comportamento que seus pais sempre observaram.
Como uma vez que, após entrarem em casa, lentamente, observavam o pequeno Noah de longe.
— Está vendo ele, querido? — disse Rebekka, de mãos dadas com seu marido.
— Sim, estou… — Yvo a acompanhava, dizendo em seguida. — Ele vai precisar de alguns verões mais, para nos acompanhar.
— Deixá-lo aqui o fez ter esse costume de observar o oceano. Além disso, o líder da vila disse que ele também gosta de seguir a linha das ondas.
— Hehe… Ele está ansioso para conhecer as terras distantes.
— E, em breve, ele terá essa oportunidade.
Como era jovem demais, ainda não tinha a idade necessária para que pudesse navegar para longe.
Era uma norma respeitada por eras e que não seriam quebradas nunca.
Pacientemente, Noah suportou a saudade quando seus pais o deixaram na vila, sendo cuidado pelo líder do local litorâneo.
Inclusive, o senhor Zhong Shu, um lontra com olhos castanhos e que usava calças marrons e camisa de manga longa da cor branca, era bastante respeitado por todo o vilarejo, o responsável pela iniciação do Aflorar de Nirvana, um acontecimento único para qualquer habitante avaliceano.
— Jovens de Marin D’alvy… — disse o ancião, no meio da praça. Várias pessoas estavam em volta enquanto falava a todos. — Livrem suas mentes de todos os pensamentos e incendeiem seu Ki com tudo que tem! Deixe seu Nirvana aflorar!
Conhecedor da pura arte da manifestação de habilidades especiais, ele iniciava jovens para que desenvolvessem suas aptidões da forma mais fácil e desinibida possível.
Junto ao grupo, lá estavam Yvo e Rebekka. E, ao centro, dando tudo de si, lá estava o pequeno Noah, que passava por esse ritual universal.
E foi deveras elogiado.
— Nossa! — se impressionou o senhor Zhong Shu. — O Nirvana do albino é estupendo! Definitivamente, seu Feng Shui1 terá alicerces firmes, seja onde ele estiver!”
Seus pais, orgulhosos, tinham certeza de que seu filho tinha todas as oportunidades para crescer e, por causa disso, fizeram de tudo para que continuasse neste caminho cheio de possibilidades.
Mas, se tinha um momento que Noah gostava mais era quando seus pais cantavam uma canção.
Era sempre antes dele ir dormir, como um hino.
Seu pai, exímio músico com seu violão, e sua mãe, com ótimo vocal, realizavam um dueto nesta ocasião íntima, sempre juntos.
♪Os ventos do amanhã são breves
♪Assim como os raios do sol, firmes
♪A estrela no céu da noite brilha
♪Nós estaremos lá um dia
♪A natureza sempre é uma mãe justa
♪Para que nunca esqueçamos de sua fúria
♪Lampejos de uma benção, jogue contra nós
♪Onde o almejar de trilhas lá teremos
♪Não se esqueça, não se esqueça
♪A vida é bela, bela é a vida
♪Enfim, o tempo passou…
Essa canção, realizada com muito amor pelos seus pais, era um ode a sua felicidade.
Noah amava muito seus pais, incondicionalmente.
Com isso, o grau empático e paternal de seus pais só cresceu, criando um vínculo de confiança e ternura incrível.
Isso influenciou no crescimento de Noah, em todas as instâncias de seu desenvolvimento.
Conforme o tempo passava, sua erudição era exemplar.
Seu trato social também era acompanhado pelos seus pais e amigos, sua gama de energia seguiu o mesmo galgar, com o estímulo de Yvo.
Dentro de casa, um pouco depois de chegar de mais uma expedição, Yvo trouxe consigo vários livros.
— Noah, querido… — disse o panda vermelho, com exemplares nas mãos. — Veja o que eu te trouxe!
— Ah… — ele olhava para os livros, um pouco confuso. — Isso são livros, igual da escola?
— Sim, são mais livros. Mas não como os da escola, querido.
— Então porque o senhor tá me mostrando?
Seu pai o incentivou à leitura.
— Com isso, você terá mais informações úteis para seu desenvolvimento, meu filho.
— Então eu vou ficar mais forte?
— Não só mais forte. Ficará mais sábio e saberá como e quando usar suas forças.
— É isso que eu quero!
Noah se moveu nessa direção.
Foi algo automático, daqui para frente.
O jovem híbrido cresceu mais, não só fisicamente.
Sua mente, preparada, se desenvolveu tão rápido quanto.
Sua mãe, cuja principal característica era sempre o apoiar e lhe fazer companhia enquanto observava o mar, certa vez lhe disse, enquanto estavam na enseada:
— Você olha para o mar todos os dias, meu filho.
— Sim. Eu adoro ver o mar, as ondas, tudo aqui. Até às montanhas — ele falou, se levantando em seguida.
O menino tentava olhar para além das planícies, como sua mãe percebeu.
— Eu já sei o que você quer me dizer… — ela entendeu bem a brincadeira. — Você quer ir além, ver o que tem no horizonte.
— Isso mesmo! Eu quero conhecer o horizonte, onde eu não consigo ver.
— E você verá, querido… — falou Rebekka, indo até seu filho e o abraçando por trás. — Até lá, você tem que estar pronto para o mundo.
— O mundo? Não sei se quero tudo isso, é muita coisa. Só queria conhecer o horizonte.
Naquele momento, pela simplicidade apresentada, Rebekka sorriu alegremente. Era uma felicidade não só pela inocência de seu filho, mas do tom filosófico que aquele gesto teve, involuntariamente.
Ela sabia que estavam fazendo tudo certo.
A vida seguiu.
Os dias na vila, através dos anos, só foram de dádivas e acertos.
A família Hibiki só tinha bons fluidos, sempre rumando para coisas novas e boas.
Os Anos passaram.
Noah cresceu saudável, ficou mais forte e mais alto.
Os verões que Noah tanto precisava finalmente foram alcançados.
- Nota: a filosofia do Feng Shui alega usar forças energéticas para harmonizar os indivíduos com o ambiente ao seu redor. O termo feng shui se traduz literalmente como “vento-água”; é uma das Cinco Artes da Metafísica Chinesa, classificada como fisiognomia (observação das aparências através de fórmulas e cálculos). A prática do Feng Shui discute termos de “forças invisíveis” que unem o universo, a terra e a humanidade, conhecidas como Ki. Em Avalice, os conceitos são parecidos.[↩]
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