Capítulo 21 - O julgamento inesperado
A prisão de Viktor trouxe uma enorme comoção nas garotas.
Imediatamente após o ocorrido, o trio seguiu a toda velocidade até o destino, que era o:
Palácio Real | Noite
Tudo estava se desenrolando da pior forma possível.
Depois do veículo patrulheiro chegar ao palácio, os guardas levaram o jovem em direção ao seu interior, porém pelo lado esquerdo.
Neste lugar, vinculado ao palácio, se encontrava a chefatura de polícia, chefiada pela tenente Neera Li.
Todos os trâmites penais foram impostos, com os guardas levando seu prisioneiro até o local de acolhimento de criminosos.
Ou seja, era uma cela. Fria e escura.
Viktor foi mantido preso por lá, enquanto aguardava sua custódia.
O jovem, desolado e confuso, ficou sentado na cama. Ele estava pensando, preocupado com seu futuro.
— “Eu nunca fui preso na minha vida antes. O que eu fiz de mal? Aquela panda revoltada me chamou de invasor, como aquele outro panda também me chamou. O que está acontecendo?”
Sua estadia na afastada cela durou alguns minutos, menos de uma hora.
Logo um quarteto de guardas aparecem, marchando até lá e, entre eles, também Neera Li.
A panda foi direto ao assunto.
— Hora da averiguação, invasor. Agora iremos descobrir todo o plano por detrás disso.
— Plano?! Mas do que você está falando, senhorita? — perguntou Viktor, se aproximando das barras da cela. — Na minha opinião, todos vocês estão loucos!
— Meça bem suas palavras quando se referir a mim, seu criminoso! Seja o que for, você é um suspeito e, até averiguarmos, tudo o que disser poderá ser usado contra você!
— Senhorita, eu não sou um criminoso! O que está fazendo é uma imensa injustiça!
— Veremos. Afaste-se da grade e fique de costas. Iremos algema-lo agora.
E ela assim o fez.
Embora Neera Li possuísse uma beleza admirável, ela exercia seu trabalho com todo o rigor e também fazia questão de se expressar como uma policial e impor sua autoridade ante seus prisioneiros.
Viktor entendeu bem esse fato e logo tratou de se calar.
De forma ordeira, o jovem saiu da cela da cadeia, andando junto aos outros guardas e sendo observado por Neera Li a todo instante.
Minutos depois…
Salão do monarca | Noite

A seguir, adentram ao salão principal, onde ficava o trono do monarca de Shang Tu, o imponente Royal Magister.
Se levantando de seu trono, ele olhou para todos, enquanto os guardas se aproximavam trazendo Viktor com eles.
Neera, caminhando até o humano, golpeou suas coisas com seu cajado, fazendo-o se ajoelhar. Foi um ato bem extremo, mas que pareceu de praxe da tenente.
— Mostre o pouco de respeito que sabe ante nosso monarca, seu patife. Abaixe sua cabeça.
Royal Magister, percebendo o excesso de Neera, precisou intervir.
— Alta Sacerdotisa, peço que não exceda na força. Um prisioneiro deve ser tratado como tal, mas sem tantas inimizades. Entendo sua posição como chefe de polícia, mas não passe do ponto do respeito.
— Eu compreendo, Royal Magister. Peço desculpas pelo meu modo de trabalho. Entretanto, Viktor, desde então, não merece tal respeito.
Royal Magister então se aproximou do jovem, dizendo:
— Qual seu nome, rapaz?
— Viktor — ele disse, sem subir seu olhar.
— Somente dessa forma? Não há linhagens?
— Me chamo Viktorius Ashem.
— Peculiar sua linhagem, jovem — o monarca olhou para a panda em seguida. — Neera, qual é o relatório da missão?
Neera Li roubou posse em um bloco de notas, retirado de um de seus bolsos do sobretudo que usava. Ao fazer a leitura, ela disse:
— Durante nossas investigações, verificamos que alguns indivíduos, que inspiravam atenção, se interessaram pela espada Bededst ao ingressarem na fila de inscrição do torneio. General Gong e eu interceptamos algumas delas, que envolviam nosso reino com o de Shuigang.
— E o que conseguiram?
— Descobrimos que um de seus comparsas de ninjas estava no torneio. Viktor, mesmo diante de General Gong e de mim, não desistiu. Então é certo que ele faz parte do plano de Spade de roubar a espada.
Viktor, que ouviu pacientemente tudo aquilo, não pôde ficar calado. Sua paciência estava no limite.
— Esperem! Deixa eu ver se entendi bem: vocês estão me acusando de eu tentar roubar a espada? E quem é esse tal Spade?
— Cale-se, Viktor! — Neera falou alto, impondo sua autoridade — Não lhe dei permissão para…
— Cala a boca você! — ele a interrompeu, ignorando as ordens. — Estou cheio de ser acusado de uma coisa que não fiz!
— Como se atreve? — Neera disse, o levantando pelo colarinho. — Isso irá ser usado contra você durante todo esse processo por desacato a uma oficial!
— Você está louca, senhorita! Eu não entrei nesse torneio para roubar!
— Não minta! Você mesmo disse que estava seguindo com o plano de vocês!
— Eu disse sim, mas não me lembro de ter dito que era para roubar!
Royal Magister tinha ciência de que haviam vieses por trás de toda a história. Se aproximando de Viktor mais uma vez, falou:
— Viktorius Ashem, creio que devo dar-lhe a oportunidade de se expressar. Mas antes que comece, devo lhe avisar que tudo o que disser a partir de agora será cuidadosamente avaliado por mim e minha Alta Sacerdotisa. Há guardas como testemunhas inclusive. Explique-se.
— Obrigado, senhor.
— Soberbo. Agora comece seu relato.
Sem rodeios, Viktor respondeu.
— Eu entrei nesse torneio para ajudar uma amiga.
— Ajudar uma amiga? A quem se refere?
— A senhorita Carol Tea. Uma gata verde amiga da senhorita Lilac.
— Haha… Eu esperava por isso – Disse Neera, com um sorriso debochado.
Magister insistiu nessa informação. Ele conhecia as garotas.
— E porque quis ajudá-la? Qual o motivo? — disse o monarca, olhando para Viktor.
— Ontem, todos nós fomos até a cidade para lazer e, do nada, as garotas precisaram procurar por resquícios de uma jóia. Eu tentei ajudar, procurando também. Só que um cara forte que tinha uma das pedras apareceu e a senhorita Lilac lutou contra ele.
— Continue, Viktorius Ashem.
— Então ela o venceu, mas o cara jogou a pedra no lixo e um monstro se formou. Eu peguei a moto da senhorita Carol e a joguei contra a criatura, destruindo tudo.
— Então você destruiu a moto da Carol? Haha… Como eu queria ter visto! — disse Neera, agora gargalhando. — Aquela delinquente teve o que merecia.
— Continue, Viktorius Ashem — Royal Magister estava dando total liberdade para que o jovem explicasse sua versão.
E assim ele o fez. Viktor voltou a relatar seu ponto de vista.
— Essa manhã, eu vi que o custo para que a senhorita Carol consertasse sua moto era muito alto. Decidi me inscrever no torneio com o desejo de ganhar a espada e conseguir dinheiro para ajudar a Carol. Esse é o motivo, não tinha intenção alguma de roubar nada!
O sábio monarca ficou imóvel por alguns instantes, raciocinando sob a ótica do rapaz. Olhando fixamente nos olhos do jovem, o Magister disse:
— Neera, traga Sash Lilac e suas amigas. Deixe que entrem. Tenho certeza que elas virão até mim a qualquer momento.
— Majestade, está certo disso? Essa história que Viktor contou é um pouco idiota demais para ser verdade.
— Eu entendo sua análise, mas precisamos comprovar a veracidade dessa história Sash. Lilac tem nossa plena confiança, embora Viktorius Ashem não desfrute deste sentimento, ainda.
— Compreendo, majestade. As trarei agora mesmo.
E, como ordenado, Neera foi pessoalmente até o saguão principal do palácio, como Royal Magister já havia previsto.
E ele estava certo.
Palácio Real | Noite
Pátio de Acesso
— Eu exijo uma audiência com o Royal Magister agora!
Lilac intimou os soldados que estavam à frente do palácio como atalaias. A dragão demonstrava um mau humor não muito comum vindo dela, assim como a de suas amigas.
Entretanto, os portões se abriram, deixando visível a aproximação de Neera Li.
A panda foi até às garotas, onde Lilac voltou a dizer.
— Neera, onde está o Viktor? Eu quero que me leve até ele agora!
— Ótimo. Me siga — falou a panda, lhe dando as costas e caminhando para dentro do palácio outra vez. — Gosto quando facilitam meu trabalho.
— Hã?! — a dragão não acreditou, pasma. — Assim, tão fácil?
— Cale-se e me siga. Royal Magister exige a presença de todas vocês.
Foi nesse ato, inesperado e surpreendente, que as garotas foram conduzidas pela panda até o salão do monarca.
Assim que chegaram ao local nobre, rapidamente a dragão, acompanhada por suas amigas Carol e Milla, se aproximaram de Viktor, o abraçando forte.
Contudo, a dragão esqueceu por alguns instantes a reunião, para reivindicar por justiça.
— Royal Magister, Viktor não é um criminoso! — Lilac falou diretamente ao monarca.
— Iremos comprovar sua tese agora, Sash Lilac. Entretanto, gostaria de fazer uma pergunta a Carol Tea.
Outra vez um acontecimento inesperado. Até mesmo a gata selvagem ficou surpresa, por mais que isso fosse redundante.
— Hã? Que tem eu, tio? Qual a treta, maja?
Neera já estava se munindo de seu cajado, possivelmente para fazer valer sua autoridade como chanceler do Reino.
Por sorte, a dragão foi ligeira.
— Carol, é o Royal Magister! Tenha respeito! — Lilac mais uma vez salvou sua amiga.
— Ih, é mesmo! Caraca, desculpa! — a gata respirou fundo, olhando para Magister. — O que posso fazer por ti, Majestade?
Ele, usando de sua voz grave, lhe fez a pergunta requerida.
— Qual vínculo nutre com Viktorius Ashem?
— Mas heim?! Tipo, o piá aí é meu parça.
A forma espontânea que a felina falou irritou Neera, mas não o suficiente para mais exaltações. Ela viu seu monarca se comportar com naturalidade ao linguajar de Carol.
— Sua linguagem rudimentar é cativante. Mas me diga: Viktorius Ashem destruiu sua moto?
— É, mas tá de boa essa parada. Mas eu pedi perdão pelo que eu fiz a ele! Eu tava muito irritada, falei?
— Hã? O que fez ao jovem?
— Bem, eu tava tão revoltada com o piá aí que deixei ele torto de moca na cachola dele e o amarrei de ponta cabeça lá no galho.
Lilac estava envergonhada com isso.
— Você precisava dizer todos os detalhes, sua tagarela?
— Pô, me perguntaram e eu respondi. Onde tu não entendeu, diva linda?
Neera Li, até então quieta, não conseguiu segurar seu comentário ácido.
— Haha… Então Carol o agrediu? — a panda se virou para o humano em seguida. — E você pensou mesmo em ganhar o torneio depois desse histórico, Viktor? Patético.
Mas Carol não ficou calada e foi em defesa de seu amigo.
— Neera! Tu tá chata pra dedéu, hein! Tu não tá ajudando, saca? Pô, o piá aí encarou de frente a responsa, tava pau a pau até a luta começar, nyah!
— Cala a boca, Carol! — Lilac gritou, irritada.
— Tá! Que saco!
Magister manteve o assunto, dirigindo questionamentos a gata verde outra vez.
— Carol Tea, você sabe o porquê de Viktorius Ashem entrar no torneio? — disse o monarca.
— Não, majestade. Tamo querendo saber disso faz tempo, mas sempre que o Viktor vai tentar dizer, vem um abençoado ou abençoada e impede do piá dizer. Até o inútil do locutor atrapalha.
(Ignorem esse comentário da tagarela!)
Milla, ao ouvir toda a conversa, fez valer seu comentário.
— Eu ajudei o Viktorius no plano dele.
— Milla Basset, do que está falando? — perguntou Royal Magister a canina.
— Eu ajudei o Viktorius a entrar no torneio, mesmo tentando convencer ele a não entrar. Mas ele queria muito ganhar a Bededst.
Lilac e Carol então se surpreendem com a notícia. A dragão, olhando para Milla, tomou a palavra.
— Milla, porquê Viktor queria tanto ganhar essa espada?
Royal Magister olhou para Lilac e ele mesmo respondeu essa pergunta.
— Para ajudar Carol Tea a pagar o conserto de sua motocicleta.
Assim que o monarca falou o motivo, Carol imediatamente arregalou seus olhos. Por instinto, ela olhou para Viktor, ficando calada em seguida.
Mostrando um pouco de surpresa, a felina falou baixo para si mesma, talvez buscando complacência.
— O piá?! Ele fez isso tudo por mim?!
Essa notícia veio com uma bomba entre os envolvidos, Lilac, principalmente.
— Viktor, porque você não nos disse antes? — perguntou a dragão púrpura.
— Peço desculpas, Lilac — o jovem disse, a olhando. — Mas eu precisava ajudar a Carol a pagar pelo conserto da moto.
Todavia, aquele início de noite tinha um clima diferente. Royal Magister havia elucidado vários pontos, que mudaram o desenrolar e entendimento da situação inteira.
O sábio monarca, intencionalmente, causou essa comoção. Por isso mesmo, ousou em levantar mais um questionamento.
Ele olhou para o humano e lhe disse:
— Tenho uma última dúvida, Viktorius Ashem.
— M-majestade?! — o rapaz gaguejou, pego de surpresa. — O que deseja de mim?
Magister foi incisivo dessa vez, o fitando com mais intensidade.
— Desejo saber sobre a borboleta.
Viktor, ao ouvir sobre o assunto, percebeu na voz do monarca um tom um pouco mais sério. E Royal Magister continuou:
— Porque a salvou?
Por mais que Lilac tivesse sim uma visão exemplar, pelos fatos que ocorreram no Coliseu, isso lhe tirou a atenção desse detalhe. Por isso mesmo ela tinha essa dúvida.
— Hã? Borboleta? Mas do que estão falando? — Lilac estava confusa.
— Durante a luta contra a senhorita Neera, no último golpe… — explicou Viktor, dessa vez olhando para a dragao. — Eu salvei uma borboleta azul. Se eu não tivesse feito isso, ela teria morrido.
Royal Magister recebeu os olhares de Viktor, que mostrou serenidade em sua voz.
O monarca o perguntou mais uma vez. Parecia curioso, mas os interesses iam além, como se fosse um teste.
— Sua atitude poderia ter lhe custado a vida. Porque a tomou?
— A borboleta era inocente. Não tinha nada a ver com a luta.
— Mas um inseto tem pouco tempo de vida, você sabe?
— Uma borboleta vive para ser bela. Ela tem um enorme caminho, desde que nasce como uma larva, se desenvolve, transformando-se numa lagarta. Passa mais da metade da sua vida se alimentando para enfim formar um casulo. Ela se preparou a vida toda para se transformar em um ser belo. Como poderia permitir que todo seu esforço fosse em vão?
— Mas uma borboleta não vive mais que um dia.
— E eu consegui que ela vivesse o suficiente para que aproveitasse cada segundo de sua jornada!
Por um bom tempo, Royal Magister fitou os olhos de Viktor, percebendo a veracidade das informações recolhidas.
Para o monarca, era o que procurava saber. Sua análise partiu deste momento e tudo que viria teria a ver com o resultado que conseguiu.
Ao fim, deu-lhe as costas e se aproximou da sacada de seu salão. Olhando para a cidade, tratou em dizer:
— Viktorius Ashem, diante das circunstâncias, eu concedo a ti um habeas corpus.
— Como é? Sério?
— Suas palavras ecoam honestidade. E creio que seus ensinamentos como artista marcial trazem-me confiança. Por ser amigo de Sash Lilac e suas amigas, não poderia esperar menos de seus vindouros aliados.
— Isso quer dizer que eu estou livre?
— Não exatamente… — disse, olhando para Neera. — Tenente, prepare a sala de reuniões. Precisamos aproveitar o contingente extra que conseguimos agora.
Assim dito, Neera se retirou, deixando o quarteto alí. Antes de sair, a panda libertou Viktor das algemas.
Lilac não entendeu ao certo o que estava acontecendo.
— Majestade, o que planeja fazer? Já foi provado que Viktor é inocente. O que deseja?
Magister se virou e, a olhando nos olhos, disse:
— No momento, temos muito que conversar, e não me refiro somente a você. Mas a todos vocês. Preciso de intrépidos viajantes e desbravadores para uma nova missão. E acho que encontrei as pessoas perfeitas.
Respeito à vida1. Era disso que Magíster se referia, afinal.
O monarca de Shang Tu tirou sua prova da índole do humano karateca. Seu coração puro o cativou.
Por causa de sua capacidade analítica, escolheu seus benfeitores para uma nova missão.
Mas qual seria?
- Nota: O respeito à vida é um princípio fundamental que reconhece o valor intrínseco de toda a vida, humana, animal e vegetal. Ele se baseia na crença de que todas as criaturas vivas merecem ser tratadas com dignidade e compaixão, independentemente de suas características, origem ou valor utilitário.
[↩]
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