Assim como na primeira vez que o quarteto se reuniu naquela clareira, Lobo se sentou sobre a mesma rocha e respirou fundo. Se todos estavam ali, era porque outros quatro membros da Ordem perderam suas vidas.

    — A primeira parte do plano foi concluída e acredito que temos a vantagem. Eles não sabem o que aconteceu com os outros, e nós fingiremos não saber. A Ordem está perto do fim, meus amigos. — Lobo comemorou.

    — Apesar disso, mantenham a cautela. Podemos ter a vantagem, mas o outro lado também é forte. Não quero que nenhum de vocês morra. — Águia alertou.

    Mesmo sendo uma das mais fortes da Ordem, ela conhecia a força do Falcão e dos outros e sabia o quanto seria difícil lutar contra eles. A mesma então se sentou no chão e criou uma fogueira enquanto os outros a olhavam.

    — Eu conheço o Falcão e Tigre desde criança. Será difícil para mim lidar com eles quando chegar a hora. Eles me deram uma casa, e por minha culpa tudo que eles tinham se foi. Mesmo assim, eles nunca me culparam nem deixaram de me tratar bem. Eu não sei se consigo fazer isso… — Ela apertava com força a grama enquanto cobria os olhos com a outra mão, tentando não chorar.

    Raposa se aproximou e a abraçou por trás, a fim de confortá-la. Coelho as fitava com certa apreensão, enquanto Lobo encarava as chamas da fogueira.

    — Você conseguirá, assim como todos nós. Não chegamos até aqui para desistir. Chegamos até aqui para lutarmos por um futuro bom de verdade. Eu disse que a Ordem era a minha casa e vocês eram os meus irmãos, e eu falei a verdade. Eu não contei a vocês, mas eu hesitei quando precisei lidar com a Morcego. — Ele revelou. — Contei a ela tudo que pretendíamos fazer na esperança de que ela mudasse de ideia, mas isso não aconteceu. Ver como ela estava decidida a ir até o fim por esse plano imbecil me fez aceitar o fato de que os meus irmãos se perderam. Cabe a nós mostrarmos a eles o caminho que a Ordem nunca deveria ter abandonado de verdade. 

    — Você fala bonito para quem também está cheio de incertezas, Lobo. Mesmo com esse discurso, você tem mais receio do que a Águia e todos nós. — Coelho pontuou, chamando as atenções para si.

    O mesmo ficava com os braços cruzados enquanto olhava para a fogueira e logo depois olhou para seu parceiro.

    — Eu não apoio o fim da Ordem, apoio apenas o fim dos maus ideais. E se forem eles que estejam ditando o rumo da minha casa, lutarei por ela até o fim. Eu tenho pessoas para proteger, como sempre tive desde que entrei na Ordem. Não temos mais espaço para duvidar de nós mesmos e do que estamos fazendo. Desistam dos seus antigos companheiros ou morrerão.

    Raposa ficou chocada com o que ouviu. Águia, por sua vez, cerrou os punhos e tentou se convencer do que teria que fazer. Lobo desviou o olhar, então Coelho se virou de costas e saiu andando.

    — Se não estão prontos para lutar, como esperam vencer?

    — Coelho! – Raposa reclamou, surpresa. — Me desculpem por isso, eu não sei o que deu nele. Vou atrás dele e lhe dar um belo puxão de orelha.

    Ela tentou amenizar a situação antes de se retirar. As palavras do Coelho foram fortes e dolorosas, mas acima de tudo eram verdadeiras. Lobo olhava para o céu onde a lua costumava ficar enquanto Águia olhava para as chamas. Era hora de aceitarem o caminho que eles tinham escolhido e as respectivas consequências em vez de fugirem. 

    Dias depois, os membros da Ordem estavam cientes do desaparecimento dos três irmãos, e para piorar, nada se sabia sobre a jovem Morcego que supostamente estava em outra cidade. Furioso, Falcão não demorou para convocar uma reunião de emergência.

    — Estamos sendo caçados! — Ele exclamou. — Irmãos, estamos enfrentando uma crise jamais vista na Ordem. Creio que os grandes líderes enfim notaram nosso poder e tenham tomado medidas drásticas para nos eliminar. Malditos!

    — O que faremos, Falcão? Com esses desfalques, a força de combate da Ordem cai em quase vinte por cento, pelos meus cálculos. Não acho que devemos continuar com essa ideia até conseguirmos repor as nossas perdas. — Tartaruga opinou, fazendo os demais trocarem olhares e opiniões.

     Se Falcão concordasse, não seria necessário lutar. Além disso, haveria mais tempo para convencê-lo a mudar de ideia. As palavras do Tartaruga poderiam mudar o rumo das coisas. Era o momento de acatar aquela ideia.

    — Também acho que devemos esperar, Falcão. Lembre-se do que aconteceu quando a Ordem não conseguiu lidar com um inimigo mais forte do que ela. Eu e você estávamos lá! Também perdemos quatro dos nossos naquela vez! — Águia protestou, aproveitando o gancho deixado por Tartaruga.

     Palavras vindas de alguém tão próximo poderiam ter sacramentado o fim daquela ambição. Falcão ficou em silêncio por alguns segundos e se levantou.

    — Nunca pensei que chegaria o dia em que a Ordem dos Cavaleiros Brancos duvidaria dela mesma. Deve ser mesmo o fim dos tempos. Vocês realmente acham que essa é a melhor saída? Vão simplesmente ignorar a morte dos nossos irmãos? O que eles significam para vocês? Não houve sentido no que eles fizeram ao nosso lado durante esses últimos anos? Desistir daquilo que eles morreram acreditando é a forma certa de dar a eles a paz que merecem? 

    Uma série de sussurros surgiu. Falcão sabia muito bem como plantar dúvidas nas pessoas. Fazê-los acreditar estar desonrando os membros perdidos era o suficiente para eles aceitarem lutar, mesmo em desvantagem. Ele queria se vingar daqueles que acreditava serem os culpados. Logo, o mesmo pediu para todos se acalmarem e voltou a falar.

    — Vejo que estão começando a entender no que nos metemos. Não podemos simplesmente desistir daquilo que sonhamos quando somos jogados para o chão pela primeira vez. Desistir é a única coisa que querem que façamos. Quando estiverem caídos, imaginem os seus irmãos estendendo as mãos para vocês. É hora de mostrar que a Ordem não tem medo de cair!

    Aos poucos, uma certa euforia começou a tomar conta de alguns deles, enquanto outros permaneceram em silêncio. Tigre então se levantou e gritou em apoio ao seu irmão. Mesmo com algum receio, todos se levantaram em apoio ao Falcão, até mesmo os traidores, para não levantar suspeitas.

    — Pela Ordem! — Falcão gritou, eufórico, e logo encerrou a reunião.

    Após se retirar, ele seguiu até seus aposentos. Antes de se deitar, no entanto, alguém bateu em sua porta. Quando a abriu, viu o velho Tartaruga.

    — Tartaruga? O que quer? Agora estou ocupado. Descanse e volte amanhã. — Ele disse, com um leve sorriso, e fechou a porta lentamente.

    Sem demora, Tartaruga colocou o pé esquerdo entre a porta e a parede.

    — Escute, esse não é momento para jogos. Mas, se o que quer dizer é tão importante, diga de uma vez. — Falcão bufou, abrindo a porta.

    — Não seja ingênuo, garoto. Você sabe o que está acontecendo, não sabe? A Ordem se partiu. — Ele afirmou, olhando por cima do ombro.

    — Do que está falando? Sei que perdemos membros, mas seguimos fortes!

    — Você é muito idiota em crer nisso. — Ele afirmou, voltando a olhara para o Falcão. — Se não consegue enxergar a verdade, eu lhe contarei. Há traidores entre nós, e creio que eles sejam os responsáveis pelo desaparecimento dos outros membros. É questão de tempo até tudo desmoronar.

    Falcão se espantou com o que Tartaruga falava. Ele ficou em silêncio por alguns segundos, pois não queria acreditar que isso estaria acontecendo, mas, depois de começar a ligar os pontos, ele olhou para o Tartaruga.

    — Eu ainda duvido muito, mas talvez você tenha razão. Mas o que eu farei? Não tenho a mínima ideia de quem possa estar por trás disso. Não posso sair acusando os outros, e eu sei que há aqueles que realmente são fiéis a mim!

    — Deixe isso comigo. Ninguém da Ordem é mais astuto que eu. Trarei os responsáveis por esse infortúnio, e caberá a você decidir o que fazer com eles. Esteja preparado, os traidores podem ser aqueles em quem você mais confia.

    Assim, Tartaruga se retirou. Quando fechou a porta, Falcão não demorou para começar a suspeitar de todos, até mesmo do próprio Tartaruga. Eram tantos suspeitos que ele passava a desacreditar até mesmo do seu irmão de sangue, Tigre, e da sua amada Águia.

    Longe dali, Lobo e seus aliados se reuniam na clareira. Todos estavam apreensivos e incertos sobre o que deveriam fazer e quando deveriam agir.

    — Isso é terrível! Se não agirmos logo, tudo será em vão! Qual o plano, Lobo? Não vai demorar para o Falcão começar a desconfiar de nós. Precisamos agir enquanto eles ainda estão com a guarda baixa! Que droga! Deveríamos ter nos oposto quando todos ainda desacreditavam na ideia. Agora é tarde! — Disse Raposa, irritada, levando as mãos à cabeça.

    Todos então olharam para Lobo, que estava de costas para os demais enquanto encarava a escuridão da noite, esperando uma resposta.

    — Já chegamos até aqui, não há mais volta. Devemos confrontá-los antes do plano entrar em ação. Se nos opuséssemos ao Falcão naquele momento, seríamos os principais suspeitos e eles poderiam descobrir tudo. Devemos atacar quando eles estiverem desprevenidos. Escutem, é isso que faremos… Lobo se aproximou dos outros e contou o novo plano. Não havia garantia de que funcionaria, ainda mais em um momento em que todos poderiam ser suspeitos, mas era necessário tentar. E, assim, foi decidido o dia em que a Ordem dos Cavaleiros Brancos cairia: o dia da tentativa de golpe de estado. Para uns, seria o dia de elevar a Ordem a outro patamar, para outros, seria o dia que marcaria o fim dos Cavaleiros Brancos.

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