Capítulo 0 — Parte 8 — Consequências Da Traição
O som da colisão ecoou pelo vale. Tigre vibrou, acreditando ter matado um dos inimigos, enquanto Raposa seguiu imóvel, em choque e com os olhos arregalados. Foi então que uma voz, fraca como um sussurro, a alcançou.
— Raposa, lute… Lembre-se da Ryruka… Lembre-se dela, por favor…
Quando se virou, ela viu Coelho, em meio a uma poça de sangue, quase morto. Falar era a única coisa que ele se sentia capaz de fazer. Lagarto, ao seu lado, estava morto. Tigre se surpreendeu com tal desfecho e recuou.
— O que?! Como isso pode ser possível?! — Disse Tigre, sem acreditar.
— Eu inverti o impacto… Fiz ele sentir o próprio ataque, mas não pude conter tudo e absorvi parte dele… Raposa, por favor. Eu não quero morrer.
Raposa olhou para Coelho, assustada. Ele lutava para viver e mesmo assim a motivava a seguir em frente. Ele queria passar seus dias com ela, ter uma família e ser feliz para todo o sempre. Raposa se enfureceu e se levantou, totalmente alterada. O cabelo ensanguentado cobriu parte do seu rosto, a deixando com uma aparência diabólica. Tigre invocou a sua lança e avançou.
— Sua vez, traidora! Não deixarei vocês estragarem os planos do meu irmão!
Ele ameaçou arremessar a lança outra vez, mas uma descarga elétrica caiu logo ao seu lado, forçando-o a recuar. A raiva em seu rosto era nítida.
— Por que errou? Acha que preciso que você pegue leve comigo? Sei o quanto você é forte, mas o pior erro do forte é subestimar o “fraco”!
Raposa aceitou o desafio e lançou vários raios. Tigre pisou com força no chão, fazendo grandes pedregulhos saltarem para protegê-lo. Enquanto ela tentava penetrar essa defesa, a parte frontal da parede rochosa foi quebrada por uma série de arremessos que Tigre fez da parte de dentro. Ao distrair sua oponente, ele correu na direção dela e arremessou outras rochas.
Mas, ao se esquivar, Raposa ficou na posição que Tigre queria: entre ele e Coelho. Ele sorriu, invocou sua lança outra vez e a arremessou. Quando percebeu a emboscada, Raposa olhou para seu amado, aflita.
— Você não pode se esquivar agora, Raposa! — Tigre exclamou.
Ele estava curioso para saber qual decisão seria tomada. Se ela ficasse entre o Coelho e a lança, morreria. Se desviasse, ele morreria. Valeria a pena sacrificá-lo para viver? Ela escolheu morrer ao lado dele e fechou os olhos.
O som da colisão entre metais a fez abrir os olhos. Coelho ressurgiu à sua frente, segurando uma espada que havia usado para rebater a lança.
— Não pense que vou ficar assistindo você morrer. Eu iria até o fim do mundo para te ter de volta. — Coelho afirmou, olhando para trás com um leve sorriso.
Suas palavras encantaram a jovem, que logo se colocou ao lado dele.
— Você inverteu a força do meu arremesso com a força do seu movimento para rebater a lança, não? Tudo isso após inverter seus ferimentos. De todos os membros da Ordem, você tem a Manifestação mais chata de lidar, Coelho. — Tigre concluiu, pegando sua lança de volta.
— Nos poupe, Tigre! Você sabe que não tem chance contra nós. Aceite a derrota e reflita sobre o que seu irmão quer fazer. Acha mesmo que é certo?! — Raposa perguntou, dando um passo à frente.
— Eu não tenho mais certeza do que é certo ou errado, Raposa. Só quero lutar para proteger quem amo, independentemente de quem eu precise matar.
Tigre elevou sua energia e emanou uma aura laranja. O casal se preparou para atacar, mas ele os surpreendeu ao chamar de volta sua lança e cravá-la no chão. A força foi tanta que uma fenda se abriu e se estendeu na direção deles, fazendo-os caírem no precipício.
Foi então que Águia, usando asas de fogo, surgiu repentinamente e mergulhou na grande fenda. Assim que os agarrou pelas mãos, ela se lançou para cima e os deixou no chão firme. Tigre se enfureceu, tirou a lança do chão e se preparou para arremessá-la, mas algo pontiagudo perfurou seu peito. Ele olhou para trás, com indiferença, como quem já esperava por isso.
— Você arquitetou tudo, não é, Lobo? Você… traiu a sua casa e matou seus irmãos… Sempre que se olhar no espelho, você verá a cor do nosso sangue…
Tigre tentou sair caminhando, mas seus sentidos falhavam e ele perdia equilíbrio. Não demorou para ele se ajoelhar no chão e cuspir sangue. Águia se aproximou dele, com lágrimas nos olhos, e olhou para Lobo. Entendendo o que ela queria, ele chamou de volta sua Relíquia, enfim dando alívio ao Tigre.
Quando caiu no chão, ele olhou para Águia com raiva, mas aos poucos se acalmou e aceitou seu destino. Parecia que ele sabia que o que Falcão estava fazendo era errado, mas mesmo assim fez de tudo pelo seu irmão.
— E-Eu esperarei vocês no “ninho”, como combinamos naquela vez… Aurea… — Ele disse, sorrindo, enquanto sua vida se esvaía.
Águia se ajoelhou ao lado dele, que mal se movia, e o beijou na bochecha, enfim derramando lágrimas. Usando suas últimas forças, Tigre colocou o braço direito em volta do pescoço dela para dar um último abraço e, enfim, fechou os olhos pela última vez.
Águia se levantou, limpando as lágrimas, e olhou para os outros.
— Só resta o Falcão. Deixem-no comigo, tenho certeza de que consigo fazer ele mudar de ideia! Ele vai me ouvir! Se ele me ama, ele vai me ouvir! Ele…!
Repentinamente, ela parou de falar. Uma presença assustadora fez todos sentirem um frio na espinha. Quando olhou para sua amiga, Lobo gritou para alertá-la, mas era tarde. Águia cuspiu uma enorme quantidade de sangue e, quando olhou para baixo, viu um braço atravessado em sua barriga.
Logo atrás dela, estava Falcão, encarando-os com frieza. Ao notar quem era, Águia acariciou a mão dele, trêmula, sentindo a pele dele misturada com seu sangue. Talvez ainda não tivesse entendido o que acabara de acontecer. Quando ela tentou olhar para trás, Falcão puxou o braço e a deixou cair no chão. Águia vomitou ainda mais sangue e agonizou ao lado do corpo de Tigre.
Quando olhou para ambos, o coração do Falcão se encheu de ódio. Eis as duas pessoas que ele mais amou na vida, o abandonando. Apesar disso, ele ainda foi capaz de sorrir quando olhou para Lobo e os demais.
— Ninguém fica entre eu e o meu sonho.
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