Capítulo 04 — O Quarto
Após a conversa com aquele homem, Kamito suspirou, ainda abalado, e seguiu até a casa de Akane. Parou diante da porta, respirou fundo, tentando controlar o nervosismo. Não podia demonstrar medo.
Ao tocar a campainha, quem atendeu foi Luise, a irmã mais nova de Akane.
— Luise? Por que não está na escola? Aconteceu alguma coisa? — perguntou Kamito, surpreso.
Luise, com seus treze anos, lembrava muito Akane quando mais nova. Era magra, de rosto arredondado e cabelos curtos que iam até os ombros.
— Acordei com febre. Mamãe disse que eu podia faltar hoje — respondeu ela, animada, fitando Kamito com um brilho travesso nos olhos.
Kamito, no entanto, não se deixava enganar. Sabia bem que aquela febre era fingida. Luise era esperta e adorava encontrar desculpas para escapar das aulas.
— Febre, é? Por que tenho a impressão de que você inventou isso? — disse ele, encarando-a com seriedade.
Ela desviou o olhar, tentando manter a farsa. Era boa em enganar a mãe e as irmãs, mas Kamito raramente caía nas suas mentiras.
— Eu jamais faria isso! Você me conhece, Kamito! — insistiu, mas não sustentou o olhar. Logo começou a rir, esperando alguma reação dele.
— Você me pegou! Isso é injusto — disse, ainda rindo.
— Eu sabia! — respondeu Kamito, agora também sorrindo.
O sorriso, no entanto, sumiu rapidamente quando Kamito lembrou de Raishi, que o aguardava. Precisava falar com Akane.
— Kamito, aconteceu algo com a Akane? Ela parecia assustada e triste. Você veio falar com ela, não foi? — perguntou Luise, agora preocupada.
A ligação entre as irmãs era forte, e Luise não suportava ver Akane triste. Seus olhos estavam fixos em Kamito, esperando por uma resposta.
— N-Não… Não foi nada. Só preciso conversar com ela. Posso entrar?
Kamito desviou o olhar, tentando esconder o receio. Não queria alarmar Luise — aquilo tudo ainda parecia inacreditável, até para ele.
— Claro. Ela está no quarto. Você sabe onde fica. Mas, olha lá, não faça nada suspeito ou ilegal com a minha irmã, senão eu chamo a polícia — disse Luise, com um sorriso maroto.
Ela sabia exatamente como deixar Kamito desconcertado.
— Ei! Não fale essas coisas! Você sabe muito bem que não é isso — rebateu ele, visivelmente envergonhado.
Sem responder, Kamito caminhou até o quarto de Akane e bateu. A voz dela veio, autorizando a entrada. Ele entrou devagar, tentando não parecer nervoso.
— Akane… Como você está? — perguntou, evitando encará-la. Vê-la triste fazia seu peito apertar.
— K-Kamito? O que está fazendo aqui? Aconteceu alguma coisa? — respondeu ela, enxugando as lágrimas e tentando se recompor. Sua voz traía o nervosismo.
— Preciso falar com você. É algo muito importante — disse Kamito, finalmente a encarando. Mas, ao notar o rubor no rosto dela, desviou o olhar de novo.
— A-algo importante? O que queria…? Está pensando em… — Akane mal conseguia terminar a frase.
A tensão entre os dois aumentava. Ela, visivelmente envergonhada, parecia entender outra coisa.
— Preciso que você venha comigo. Precisamos ir até minha casa — disse Kamito de súbito, sem encará-la.
Akane ficou ainda mais corada.
— P-pra sua casa?! Assim, tão de repente?! Você mal entrou no meu quarto! Nós nem ao menos somos…
Ela não conseguiu completar. Pegou um travesseiro e o lançou contra Kamito, escondendo o rosto logo em seguida.
— Hã?! O que você pensou que era?! — disse Kamito, assustado com a confusão. Já fazia um tempo desde que havia entrado, e o clima havia mudado.
— E-eu vou te esperar lá fora! Não demore! — disse ele, saindo apressado, o rosto em chamas.
Lá fora, ainda tentava processar tudo. Era possível que Akane realmente o visse como algo mais? Será que a proximidade entre eles alimentava esses sentimentos? Ele se perdia nesses pensamentos quando sentiu alguém cutucar seu ombro.
Assustado, virou-se — era Akane. Ainda visivelmente envergonhada.
— E-então… O que queria falar? — perguntou ela.
Kamito respirou fundo. Sabia o que ela estava esperando, mas precisava desfazer o mal-entendido.
— Preciso que venha comigo até minha casa — disse, cortando qualquer expectativa romântica.
Engoliu em seco, tentando manter-se calmo.
— Não é nada daquilo que você pensou. Há alguém… alguém que quer falar conosco.
— Tudo bem, Kamito. Eu confio em você — respondeu Akane, ainda ruborizada, mas com um sorriso sincero.
Ela caminhou até o portão, sem hesitar. Kamito a seguiu. Quando chegaram à casa dele, notaram que a porta estava aberta — e o homem não estava mais lá.
Kamito suspirou, decepcionado consigo mesmo. Claro que Raishi teria entrado. Era ingênuo de sua parte pensar que ele esperaria do lado de fora.
Entraram com cautela. Kamito andou devagar até a sala, atento a qualquer movimento.
— Você demorou, Kamito. Eu disse para não demorar — disse Raishi, surgindo da cozinha com uma xícara de café.
Com calma, passou pela dupla e sentou-se no sofá.
— D-desculpa! — disse Kamito, surpreso por não ter notado sua presença.
Akane também estava surpresa. Aquele homem parecia diferente do que os havia atacado. Mais calmo, quase refinado.
— Esqueça isso. O importante é que você a trouxe. Ela é ainda mais bonita do que imaginei. Talvez agora eu entenda por que você está sempre com ela. Enfim, é um prazer conhecê-la, senhorita. Me chamo Raishi Kurogane — disse ele, sorrindo.
— Dá pra parar com isso e ir direto ao ponto? O que você quer? — perguntou Kamito, irritado com o tom debochado.
Akane apenas sorriu sem graça, desconfortável com o elogio. Isso só fez Kamito ficar mais tenso.
— Calma, Kamito — disse Raishi, tomando um gole do café. — Mas você tem razão. Vamos direto ao que importa. Sentem-se. Vai demorar.
Ele cruzou as pernas e, desta vez, seu olhar ficou sério.
— Está na hora de explicar o motivo de vocês possuírem essas habilidades.
Kamito prendeu a respiração. Aquele era o momento que esperava. Finalmente, teria respostas.
Mas, junto da verdade, vinha o medo.
Raishi sabia tudo. Sobre os poderes, sobre o que aconteceu, e o que ainda estava por vir.
A vida deles estava prestes a mudar — e não havia mais como voltar atrás.
Kamito estava decidido: descobriria a razão por trás de tudo aquilo, por mais assustadora que fosse. Se havia uma forma de usar aqueles poderes, ele usaria. Faria o que fosse necessário para proteger Akane e sua família.
Essa era sua promessa.
Mas uma promessa como essa seria forte o suficiente para enfrentar o que estava por vir?
Por mais tola que parecesse… Kamito precisava acreditar.
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