Capítulo 42 — Luzes e Ilusões
A plataforma de gelo atrás deles se despedaçou enquanto Ryruka pulava, já com suas Vestimentas Espirituais e sua Relíquia ativada. Ela disparou uma chuva de flechas de gelo, atingindo todos os clones e fazendo-os desaparecer. Tinha acabado de lhes dar a brecha necessária para fugir dali. Assim que tocou o chão com leveza, virou-se de costas para o grupo, encarando sua adversária que surgia diante dos seus olhos. Ryruka manteve o olhar sério, firme, sem desviar. Hiena, por sua vez, a observava com um sorriso sugestivo, lambendo os dedos de forma provocante. As duas se estudavam em silêncio, aguardando a primeira ação.
— Que nobre da sua parte. — disse Hiena, com um tom debochado — Se sacrificar para ganhar tempo para seus aliados. Quanto desperdício. Sua Manifestação é incrível, possui uma luz única e você a joga fora assim.
Ela então parou de lamber os dedos e passou a encará-la com mais seriedade. Ainda demonstrava certo interesse em Ryruka, mas havia algo de revoltado em sua expressão.
— Você está se equivocando. Não me “sacrifiquei” por eles, pois tenho certeza de que irei vencer! — respondeu Ryruka, erguendo levemente o arco — E não adianta me elogiar. Seu fim está próximo, Hiena.
Sem perder tempo, ela apontou o arco e disparou várias flechas. Hiena arregalou os olhos por um instante, mas rebateu os ataques com rapidez, sem dificuldade aparente.
— Sua Manifestação é muito boa, eu admito. Principalmente sua Vestimenta. Não posso deixar de me vestir adequadamente para este combate! Me mostre sua luz, garota do gelo!
O corpo de Hiena começou a brilhar, e um roupão de tecido provocante se formou ao seu redor. As roupas eram vermelhas com detalhes pretos, e seus seios quase saltavam para fora por conta da faixa que segurava o roupão. Pelo visto, não usava nada por baixo.
— Não precisa ser tímida. — a mulher falava de forma provocativa — Por que você não me diz seu nome? Assim poderei colocá-lo no seu túmulo. É bem provável que eu te faça minha estrelinha! Vamos, brilhe para mim!!!
— Você tem algum problema mental?! Não importa, já que está tão interessada em saber o nome da pessoa que vai te derrotar, eu direi. Sou Ryruka Scarlet! — retrucou Ryruka, franzindo o cenho.
Ela avançou contra Hiena, que rapidamente empunhou seu cachimbo e tentou acertá-la. Ryruka defendeu a investida com seu arco, girando-o para afastar o golpe enquanto recuava alguns passos.
— Você é mais rápida do que eu pensei — comentou Ryruka, respirando fundo. — Vocês da Ordem realmente são fortes.
— Fico lisonjeada com seu elogio, minha estrelinha — respondeu Hiena, sorrindo com desdém. — Sendo assim, permita-me demonstrar o meu golpe.
Ela colocou o cachimbo na boca e sugou uma boa quantidade de fumaça. Rapidamente, soprou, criando outra névoa densa que tomou conta de todo o local. Então, suas risadas começaram a cercar Ryruka novamente.
— Deadly Fog!!! Prepare-se, Estrelinha, você verá como as hienas caçam!!!
Vários clones de Hiena surgiram da névoa, rindo alto e de forma ameaçadora. Ryruka saltou o mais alto que pôde e disparou várias flechas na direção delas, mas as flechas atravessaram os corpos sem causar efeito, fazendo as ilusões rirem intensamente da tentativa frustrada. As hienas então colocaram os cachimbos na boca e dispararam uma rajada de agulhas, que acertaram Ryruka em cheio, derrubando-a bruscamente no chão.
Ela se levantou em meio aos risos e analisou a posição de cada uma, buscando uma estratégia. Se as flechas passavam por elas, significava que eram ilusões, e apenas uma era a verdadeira. Porém, seria difícil adivinhar qual, já que as ilusões também conseguiam feri-la. Enquanto pensava, arrancou uma agulha presa em seu ombro direito e se ergueu. Poderia criar outra plataforma de gelo ou um vórtex, mas duvidava que isso fosse suficiente.
— O que foi?! Vai ficar parada enquanto eu me divirto?! — zombou Hiena, avançando — Isso é tedioso. E pensar que eu esperava mais de você. Enfim, vou apenas te matar e depois acabarei com seus amigos!
Todas avançaram contra Ryruka, que ainda permanecia imóvel. Hiena sorriu maliciosamente enquanto ela e suas cópias apontavam os cachimbos para ela, mas no último momento Ryruka sorriu e criou uma cúpula de gelo ao seu redor, fazendo com que todas acertassem seu escudo congelado.
— Mas já?! — provocou ela, ainda com um sorriso — Pensei que você queria se divertir mais um pouco. A diversão está apenas começando! Agora é a minha vez de atacar! Você vai pagar por ter ameaçado meus amigos!
Ryruka tocou a parede de gelo e fez surgir várias estacas afiadas que perfuraram rapidamente as ilusões. Infelizmente, a verdadeira conseguiu desviar, sofrendo apenas um arranhão na bochecha e um corte na manga de sua Vestimenta Espiritual.
— Você me cortou?! — gritou Hiena, levando a mão ao rosto ferido — Você teve a coragem de ferir o meu lindo rosto! Isso é imperdoável! Agora você conseguiu me irritar! Dessa vez irei mesmo te matar!
Furiosa, Hiena criou mais cópias e avançou contra a cúpula de gelo. As ilusões cercaram o escudo e todas começaram a lançar fumaça dos cachimbos em sua direção. Ela sorriu com crueldade e, em seguida, lançou uma nova rajada de agulhas, acompanhada pelas cópias. As agulhas se chocaram entre si, produzindo faíscas. No instante em que tocaram a fumaça, uma explosão intensa tomou conta do lugar. Parecia não haver chance de Ryruka escapar.
— O que achou disso, vadia?! — gritou Hiena, rindo alto — É o que você ganha por ter ferido meu belo rosto!
Nenhuma reação veio do local da explosão. Pelo que parecia, Ryruka havia perdido. Hiena continuou se vangloriando, rindo enquanto dava as costas para a destruição e caminhava na direção do prédio. Estava certa de sua vitória, havia eliminado um dos invasores, e mal podia esperar para se gabar disso mais tarde.
Enquanto isso, Kamito e os outros corriam por um salão abandonado. O prédio antigo parecia ser uma escola desativada há anos. Um lugar perfeito para uma base, pensou ele. Camaleão, porém, explicou que o motivo real era a fenda dimensional estar localizada ali. Se não os detivessem naquele dia, a fenda se firmaria, e tudo estaria perdido.
— Kamito, Yujiro… vocês sentiram isso?! — perguntou Akane, ofegante — Há pouco, a energia da Ryruka desapareceu… Eu… acho que deveríamos voltar para ajudá-la. Estou muito preocupada com ela.
Akane estava visivelmente abalada. Seu olhar era vago e triste. Ela não queria perder ninguém. Apesar de todos conhecerem os riscos, haviam feito uma promessa: proteger a cidade juntos e não deixar ninguém para trás.
— Não precisa se preocupar — respondeu Yujiro com firmeza, embora não olhasse para trás — Ryruka é muito poderosa. Pode não parecer, mas ela é, de nós cinco, a única capaz de manipular 90% da sua Manifestação com precisão. Sem falar que é muito inteligente. Tenha mais confiança nela.
Ele tentava manter a confiança. Mesmo sabendo que seus inimigos eram mais fortes, queria acreditar nela.
— Eu acredito em você, Yujiro — disse Kamito, com um meio sorriso — E confio na Ryruka. Não precisa se preocupar com ela, Akane. Eu mesmo já lutei contra ela uma vez… e ela quase venceu. Ryruka é bastante durona.
Ele sorriu, tentando tranquilizá-los, e Akane pareceu se acalmar um pouco. Quando ele olhou para o lado, viu que ela havia relaxado um pouco e retribuiu o sorriso que ela lhe deu. Voltou a olhar para frente, mas seus pensamentos ainda estavam tumultuados. Por mais que tentasse afastar, as dúvidas e os medos insistiam em retornar. Era como uma maldição.
— Vocês realmente confiam nela… então eu também confiarei! — exclamou Camaleão, com firmeza — A Hiena pode ser forte, mas eu tenho certeza de que a Ryruka irá vencê-la! Vamos por aqui, por esse caminho é mais rápido.
Ela falava com convicção. Camaleão estava mesmo cortando seus laços com a Ordem, e suas palavras deixavam claro que confiava sinceramente na vitória de Ryruka. Sem hesitar, correu por um corredor um pouco mais iluminado, e os outros a seguiram logo atrás.
Em outra parte do prédio, os membros restantes da Ordem estavam sentados, observando à distância o nosso avanço e a batalha da companheira contra a invasora. Falcão se mantinha em silêncio, impassível, mas atento. Após alguns segundos, ele se levantou e caminhou até a saída da sala, decidido a iniciar a junção da fenda com o artefato. Antes de sair, ordenou que os demais membros começassem a se posicionar. Se as coisas continuassem daquele jeito, não demoraria muito até que chegássemos até eles.
Na entrada do prédio, a fumaça da explosão começou a se dispersar lentamente. Hiena continuava caminhando, sem se importar com o que deixara para trás, acreditando que a luta já havia terminado. Mal sabia ela que Ryruka ainda estava de pé, embora bastante ferida e ofegante. Mesmo abalada, ela mantinha os braços estendidos e os dedos posicionados, como se estivessem tocando teclas invisíveis no ar, ela usava seu arco como se fosse um instrumento.
O clima começou a mudar. Nuvens negras se formavam rapidamente sobre o local, carregadas e densas. Hiena parou subitamente ao sentir a pressão no ar. Ao se virar, deu de cara com a cena que não esperava: Ryruka ainda viva, determinada, e reunindo energia.
— Desculpe pela demora — disse Ryruka com a respiração pesada, mas o olhar firme. — Eu precisava de tempo para preparar minha técnica mais poderosa. Só a usei uma vez… e, naquela época, ela estava incompleta. Agora você será a primeira a vê-la com todo o seu potencial!
Ela então cessou os movimentos dos dedos, pegou o arco com firmeza e o girou rapidamente antes de apontá-lo para o céu. Com um disparo preciso, lançou uma flecha em direção às nuvens. Depois, voltou a olhar para Hiena com um leve sorriso no rosto.
— Symphony of the Divine Storm!!!
— O-O que é isso?! — respondeu Hiena, surpresa — Apenas um nome bonito para uma apresentação e algumas nuvens negras?!
Ela começou a rir, debochando da técnica, sem levar aquilo a sério. Mas, em poucos segundos, as nuvens começaram a girar, se tornando cada vez mais densas e agitadas. O vento soprava gelado, e a temperatura caiu drasticamente. A grama e as árvores ao redor começaram a congelar diante dos olhos de Hiena.
— V-Você modificou o clima?! — exclamou ela, recuando um passo. — Que técnica interessante…, mas não é o bastante para me deter!
— Você é tola, Hiena. — disse Ryruka, com a voz firme apesar do cansaço — Eu não apenas modifiquei o clima, eu o dominei! Mas minha técnica não faz apenas isso. Enquanto a primeira versão apenas fazia nevar e congelar meus inimigos quase que instantaneamente, a aprimoração dela cria uma tempestade de estacas de gelo!!!
Ela então abriu os braços, emanando sua aura branca por todo o corpo. O céu começou a trovejar, e logo estacas de gelo começaram a cair violentamente das nuvens escuras. Uma delas atingiu um muro próximo, congelando-o instantaneamente antes de o despedaçar. Era o poder supremo de Ryruka: o zero absoluto.
— Droga! — exclamou Hiena, recuando — Se uma dessas coisas me acertar, será o fim. Preciso atacar agora!
Ela avançou com agilidade, desviando da chuva de estacas. Algumas atingiram sua roupa de raspão, mas mesmo assim começaram a congelar partes do tecido. Com pressa, ela pegou seu cachimbo e começou a produzir uma densa névoa, criando novas ilusões na tentativa de reverter a situação.
— Eu não irei perder num lugar como esse! Principalmente para alguém como você! Morra!!!
As duas estavam a poucos metros uma da outra. Ryruka se agachou, tocando o joelho direito no chão, e mirou com precisão o arco na direção de Hiena. Do outro lado, a inimiga trocava de lugar com suas cópias, tentando confundir a arqueira. Ryruka então sorriu de leve, puxou a corda de seu arco… e soltou, sem nenhuma flecha visível.
Hiena riu, achando que Ryruka havia errado o tempo do ataque. No entanto, ao levantar os olhos, viu uma saraivada de flechas de gelo caindo do céu, resultado do disparo anterior. Assustada, ela e suas cópias imediatamente geraram uma densa fumaça, tentando bloquear a visão e abrandar o impacto. As flechas colidiram com a fumaça, criando ainda mais névoa e dificultando qualquer percepção visual.
— A-Acabou… — murmurou Ryruka, ofegante, mal conseguindo manter-se em pé — Mesmo que ela tenha resistido a esse golpe, não adiantaria de nada. A temperatura está extremamente baixa… e todos os meus ataques são de área e a longa distância… Embora haja consequências severas, eu preciso pôr um fim nessa luta antes que eu perca o controle…
Ela encarou sua mão esquerda, que segurava o arco. Estava congelada. Tentou movê-la, mas sentiu uma dor aguda, o gelo queimava sua pele.
— Pelo visto, ainda não a domino 100% — disse em voz baixa — Mas consigo mantê-la muito bem…
— Su-Sua técnica é impressionante… — respondeu uma voz enfraquecida no meio da névoa — E-E-Eu… Eu admito isso. Sua luz é muito mais forte que a minha. Odeio ter que admitir…, mas eu perdi. Sem dúvidas, você é muito mais forte que eu…
Hiena surgiu lentamente da fumaça. Suas roupas estavam congeladas, e a perna direita e o braço esquerdo também. Ela caminhou com dificuldade até ficar próxima de Ryruka, e então, caiu de bruços no chão, vencida. Era inacreditável. A Hiena realmente havia perdido.
— N-Não seja idiota — disse Ryruka, com um sorriso cansado — Você é muito mais forte… Porém, sua Manifestação é naturalmente fraca contra a minha. Mesmo que eu tenha vencido… para mim, essa luta terminou empatada…
Assim que terminou de falar, Ryruka caiu para trás, exausta, sem forças para continuar. As nuvens negras lentamente começaram a se dissipar, e a temperatura voltou ao normal. Seu braço esquerdo continuava congelado. Ela não conseguia se mover, sentia o corpo falhar, então, lentamente, fechou os olhos, murmurando em pensamento:
— Y-Y-Yu… jiro…
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