Capítulo 55 — Membros Restantes
No terraço, Falcão ainda parecia preocupado. Ele conseguia sentir claramente a energia de Raishi vindo da lateral do prédio. Podia atacá-lo naquele instante, mas não o fazia. Por algum motivo, evitava Raishi a qualquer custo. Ele então se levantou e caminhou alguns passos, afastando-se da porta que levava às escadas. Quando se virou em direção à porta, sorriu, como se já esperasse por aquela intromissão e não estivesse nem um pouco preocupado.
Ele ergueu o braço em direção ao céu, observando a própria mão como se estivesse diante de algo grandioso.
— Em poucos minutos, a ponte estará aberta… O que você faria se visse isso?! — murmurou, quase em êxtase — Eu finalmente trarei a paz para os extra-humanos, dando a eles um novo mundo!
Abaixou o braço lentamente, ainda hipnotizado pelo próprio desejo. Nem sequer parecia se importar com a quantidade de companheiros perdidos pelo caminho.
— Há dezesseis anos, fui impedido por aqueles que um dia chamei de irmãos — disse, estreitando os olhos — Hoje, isso não se repetirá. Mesmo que, mais uma vez, haja um Lobo tentando me impedir… mais uma vez ele cairá sem completar seu desejo.
Raishi sentiu a energia de Falcão vindo do topo do prédio e apenas ergueu o olhar com calma. Não parecia preocupado; sabia que ainda não era o momento de agir, não enquanto o artefato não fosse destruído. Ruby se aproximou dele sem dizer palavra alguma, ainda não aceitava a ideia de ter a Hiena ao lado deles. Enquanto isso, Yujiro e Ryruka conversavam um pouco afastados, tentando entender o que poderiam fazer.
— Que droga! — Ryruka resmungou, jogando pequenas pedrinhas para exercitar o braço esquerdo, ainda dolorido pelo congelamento durante a luta contra a Hiena — Eu queria poder fazer alguma coisa para ajudar. Odeio ter que deixar que o Kamito e a Akane cuidem de algo tão importante, principalmente com aquele cara junto deles. Ele é uma ameaça e eles não perceberam.
Yujiro a observou com atenção e cruzou os braços.
— Não se esforce muito — alertou — Por sorte, seu braço não teve tantos danos. Já eu… consegui destroçar o meu quase por completo — ele soltou um riso cansado — Eu não achava que uma fúria pudesse ser tão forte, mas a Manifestação dela era a força, afinal.
Quando viu que ela o encarava, ele sorriu de leve. Ryruka corou e desviou o olhar imediatamente. Yujiro levantou o rosto para o céu, agora tingido de um laranja intenso pelo pôr do sol.
— Sabe… — começou ele, com a voz mais baixa — na minha luta, eu não parava de pensar em uma pessoa. Essa pessoa era você, Ryruka. Eu não queria morrer, mas também não queria imaginar que você estivesse morta. Pensei em ir atrás de você, mas sabia que você não iria querer isso. — ele respirou fundo — Não consigo imaginar meus dias sem ter você.
Ryruka corou ainda mais e ergueu o queixo, inflando o peito de orgulho.
— M-Mas é claro! Quem conseguiria imaginar como seria sem a garota número um?! — gabou-se, cruzando os braços e fazendo pose — Eu sou muito incrível e única para você não querer viver sem mim!
Apesar do tom ousado, suas bochechas continuavam levemente coradas. Ela então o olhou timidamente e acabou sorrindo ao ver o rosto dele tão próximo.
— E-Eu fico feliz que você estava bem… — murmurou, mexendo uma mecha do próprio cabelo — Fiquei preocupada quando te vi naquele estado. Apesar de eu ser mais forte que você, gosto das nossas competições… E também gosto quando você se preocupa comigo.
Yujiro arqueou a sobrancelha e soltou um riso leve.
— “Competições”? Eu não levo nada a sério nessas. Você que sempre foi competitiva. Por algum motivo, você adora ser a melhor em tudo.
Ele zombou do jeito dela, e, ao ver que Ryruka ficava imediatamente irritada, começou a rir. Com a mão esquerda, aproximou-se e acariciou lentamente o cabelo dela, como se quisesse acalmá-la.
— Não se preocupe — disse, em um tom mais suave — Eu sempre vou me preocupar com você. Até porque sou o único que te atura. — ele sorriu de canto — Você deveria ser menos grossa com o Kamito. Pensei que vocês tinham deixado as diferenças de lado… ou é por ele ser mais forte?
— Idiota… — ela resmungou, apertando a própria mão — O Kamito é um irresponsável! E ele não é mais forte que eu! Você pega leve demais com ele, mas a verdade é que, por mais que ele lute ao nosso lado, ele nunca será um de nós ou saberá como nos sentíamos… E ver a forma que ele age me irrita! Ele não pensa nas consequências, apenas age.
Ryruka abaixou a cabeça, agora mais chateada do que irritada, e começou a mover a ponta dos dedos no chão, distraída, como se tentasse organizar os próprios pensamentos. Não sabia o que dizer… nem se deveria dizer.
— Eu queria ter toda a motivação que ele tem — continuou, ainda sem erguer o olhar — Se eu fosse humana, eu não me envolveria nisso… mas ele aceitou como se não fosse nada. Às vezes eu me pergunto se o Kamito realmente é humano. Eu sinto que ele é um de nós.
Yujiro a observou com atenção, em silêncio. Ele entendia exatamente o que ela dizia. Eles se conheciam havia muitos anos; passaram pelas mesmas dores e deixaram o próprio mundo cedo demais. Agora, não se identificavam completamente com nenhum dos dois mundos. Era um fardo que carregariam para sempre. Talvez Ryruka não quisesse que Kamito o carregasse junto com Akane.
No último andar, Cascavel e Leopardo sentiram a aproximação das energias deles e se prepararam para receber quem subia. Cascavel sorriu, lambendo lentamente os lábios, enquanto Leopardo arranhava a parede à sua esquerda com as garras afiadas. Quando os três surgiram no final do corredor, ambos se surpreenderam ao perceber que, em vez de dois, haviam três, e que um deles era seu antigo aliado, Coiote.
— Ora, ora, vejam só quem estava com os inimigos… — Cascavel cantarolou, inclinando levemente a cabeça — Coiote, então você decidiu nos trair?! Eu já esperava isso desde o momento em que você poupou o cabelo azul aí. — ele estalou o pescoço, abrindo um sorriso predatório — Mas não importa. Assim, eu poderei matar vocês dois.
Cascavel inclinou lentamente a cabeça para a direita, tentando intimidá-los. Solum sorriu e deu um passo à frente enquanto o encarava seriamente.
— Não me chame assim! Meu nome é Solum! E eu tô doido para matar você. — disse ele, já começando a preparar suas Relíquias.
Antes que continuasse, Kamito tocou seu ombro direito, fazendo-o olhar para trás sem entender por que havia sido interrompido. Solum então deu um passo à frente, tirando a mão dele do ombro com um movimento brusco.
— Não se intrometa! — rosnou — Isso é um assunto antigo entre ele e eu. Faz tempo que eu quero mandar essa maldita cobra para o inferno, e agora é o momento.
— Eu sei disso — Kamito respondeu, firme — mas lembre-se de que você precisa cuidar do artefato e do Coruja. Eu e a Akane podemos cuidar deles enquanto você cumpre a sua missão. Não era isso que você queria? Agora tem a chance perfeita.
Solum o encarou por um momento, mas logo concordou. Kamito tomou a frente e encarou o homem magro de cabelos negros. A visão dele o fez lembrar do ser do seu pesadelo, e isso o deixou ainda mais apreensivo.
— Você disse que você e essa garota podem cuidar de nós dois? — Leopardo provocou, aproximando-se devagar — É um blefe? Nem você e o Coiote seriam capazes de nos enfrentar. Desistam.
Akane, ao perceber a intenção dele, ergueu uma barreira ao redor dos dois. Leopardo riu ao ver aquilo.
— Você é boa… Ainda bem que dará uma boa presa. Vamos lá, Coiote, saia já daqui. Vá morrer pelas mãos do Coruja enquanto matamos seus novos amigos. Eu vou me divertir muito os cortando.
— Não se ache tanto, Leopardo. — Solum respondeu sem sequer olhá-lo — Se eu já não tivesse um alvo, você já estaria morto. Kamito! Akane! Não morram pra esses fracassados! Eu vou cumprir minha parte do trato pra podermos terminar o que começamos, Kamito.
Solum então correu em direção à porta. Ambos os inimigos o ignoraram, mantendo os olhos fixos em Kamito e Akane. Ele abriu a porta e entrou na sala, onde viu o artefato sobre um pedestal ao fundo. Coruja estava parado no centro, esperando-o.
— Eu esperei muito por esse momento, mestre… — Solum declarou, firme — Agora eu poderei te matar! Você vai pagar por tudo que fez a mim.
— Você continua indisciplinado como sempre, Solum. — Coruja abriu os olhos, encarando-o profundamente — Eu disse que nada nem ninguém ficaria no meu caminho e dos meus sonhos… principalmente você.
Ele sorriu e afastou as pernas, ajustando a postura.
— Entendo… Você finalmente amadureceu, Solum. Pena que foi tarde demais. Prepare-se para morrer como sempre desejou, meu discípulo!
Enquanto isso, no corredor, duas das últimas lutas estavam prestes a começar. De um lado, Kamito e Akane se preparavam para enfrentar os sádicos Cascavel e Leopardo. Do outro, Solum encarava seu antigo mestre e o artefato que ligaria os dois mundos. As energias dos seis preenchiam todo o andar, fazendo o ambiente tremer.
Restavam apenas trinta minutos. Eles precisavam vencer o mais rápido possível.

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