Capítulo 61 — Caminho Concluído
De volta à batalha entre Solum e Coruja, a imensa onda de energia começava a se dissipar. A luz intensa se esvaía pouco a pouco, revelando a silhueta de Solum ainda em pé em meio à fumaça. Seu corpo estava coberto de ferimentos profundos, sangue escorria por seus braços e pedaços de suas roupas queimadas pendiam de qualquer jeito. Coruja, ainda ajoelhado, arregalou ligeiramente os olhos; não esperava que ele tivesse resistido àquele ataque.
Quando os últimos vestígios da onda desapareceram, Solum finalmente caiu de joelhos, exausto. Coruja o observou em silêncio, tentando compreender por que, mesmo naquele estado deplorável, o antigo discípulo se recusava a ceder. Pela primeira vez em anos, Coruja se perguntou se Solum estava verdadeiramente disposto a morrer por outras pessoas.
— Acabou, você perdeu. Aceite isso e morra de uma vez, Solum. Você já atingiu seu objetivo, então não precisa mais continuar de pé. — disse ele, com a voz menos firme do que antes.
O olhar de Coruja havia mudado. Havia preocupação ali, escondida sob a máscara de frieza. Por mais que fossem inimigos agora, ele não pôde deixar de admirar a determinação de Solum durante toda a luta. Isso, de alguma forma, o alegrava.
— Você lutou até o final pelo seu objetivo. — Continuou ele. — Está na hora de descansar. Não precisa se envergonhar em ter perdido.
Solum ergueu o rosto lentamente, respirando com dificuldade.
— E-Eu… Eu não perdi. Eu cumpri meu objetivo de destruir o artefato e de te derrotar. Eu não consegui te matar como eu planejava, mas nas suas condições atuais, você já não é mais uma ameaça para os outros.
Assim que terminou a frase, ele inclinou o corpo para frente e vomitou uma quantidade preocupante de sangue. Sua mão direita apoiou-se no chão para impedir que desabasse por completo. Ele sabia que, se não fosse seu rápido fator de cura, estaria morto há muito tempo.
— Infelizmente, ainda falta mais um… — murmurou, arfando. — Não posso descansar até o Falcão também ser derrotado. Só assim eu poderei dizer que completei meu objetivo.
Coruja abaixou a cabeça, com um sorriso amargo.
— Talvez eu realmente estivesse cego, Solum. Eu deixei minhas ambições falarem acima de mim mesmo. Eu havia prometido à Helenae que eu cuidaria de você e que jamais deixaria você desviar dos seus objetivos. Ao que parece, eu não cumpri com o prometido. Pelo contrário, fui eu quem me desviei dos verdadeiros objetivos. Ela te amava, Solum. Espero que você a encontre quando voltar para o Extra-Mundo. E espero que, junto dos seus novos companheiros, você possa então fazer o que nós não fomos capazes…
A voz dele falhou. Coruja começou a cuspir sangue de forma intensa, manchando o chão à sua frente. Seus ferimentos eram tão profundos quanto os de Solum; ele tremia, incapaz de manter-se de joelhos. Um instante depois, seu corpo cedeu e ele desmaiou.
Solum fechou os olhos por um momento, respirando fundo, e tentou se levantar apesar da dor pulsante que tomava todo seu corpo.
— Obrigado, Mestre. — disse ele, com sinceridade. — Espero que você não morra, e que veja o mesmo que eu vi. Embora o que estávamos fazendo parecesse ser o certo, não pensamos naqueles que estaríamos prejudicando. Eu só pude sentir isso quando lutei contra o Kamito. Ele não queria me matar, nem ao menos destruir nossos planos por escolha pessoal. Ele estava lutando pelo mesmo que nós. Então, de hoje em diante, eu lutarei pela justiça que juramos anos atrás.
Finalmente Solum se rendeu e desabou no chão, quase desmaiado. Sua respiração estava fraca, e seus olhos mal se mantinham abertos. Em sua mente, porém, ele conseguia ouvir a voz de Helenae ecoando com clareza, como se estivesse ao seu lado. A imagem dela surgia diante dele e, mesmo naquele estado deplorável, um sorriso fraco surgiu em seus lábios enquanto se perguntava se algum dia conseguiria reencontrá-la, como Coruja havia sugerido.
— Solum?! O que você está olhando?! Por que está deitado como se a luta tivesse acabado?! Francamente, levante-se de uma vez! Seus companheiros precisam de você! Uma terrível energia se aproxima deles! — a voz chamou, firme e insistente.
Ele piscou algumas vezes, confuso. Talvez fosse um delírio; talvez fosse só a mente dele tentando mantê-lo acordado. Ainda assim, a presença parecia tão real quanto o toque que veio em seguida, quando Helenae se abaixou ao seu lado e pousou a mão em seu ombro esquerdo.
— Você está me ouvindo?! Acorde, Solum! Abra seus olhos, por favor! — ela pediu, inclinando-se sobre ele.
Ele forçou a cabeça para cima, encarando-a como pôde.
— Helenae?! O que está fazendo aqui?! Eu por acaso morri? Ou isso é apenas uma ilusão?! Não importa… Eu finalmente pude te ver depois de tanto tempo. — Murmurou, com a voz fraca e trêmula.
Sua visão estava embaçada; a luz parecia forte demais, e tudo parecia distante. Ele tentou mover o braço, mas cada músculo protestou com uma dor latejante.
— É impossível. Mesmo se eu quisesse, não posso me mover. Eu preciso de tempo para me recuperar. Além disso, Kamito é forte o bastante para resistir. Me desculpe, Helenae, eu estou no meu limite.
— Esse não é seu limite, Solum! Eu sei que você consegue! De que adianta você ter se esforçado tanto se seus companheiros forem mortos?! Levante-se! — ela insistiu, apertando seu ombro com mais força, como se tentasse puxá-lo de volta à vida.
Ela ainda sorria para ele, mas seu contorno começava a ficar cada vez mais desfocado. Era como se estivesse desaparecendo aos poucos, sendo levada por uma brisa invisível.
— Levante-se, “Coiote”. Eu espero ansiosamente o dia que você voltará para me ver. Então até lá, trate de vencer e de proteger seus aliados. Boa sorte!!! — disse ela, antes de enfim sumir completamente.
A ilusão se dissipou no ar como neblina. Solum fechou os olhos, mas dessa vez não era rendição, era foco. Ele reuniu toda energia que ainda conseguia alcançar, tentando forçar seu fator de cura a despertar. Não sabia por que estava se esforçando tanto, mas seu coração insistia: ele não podia deixar apenas Akane e Kamito enfrentarem o Falcão.
Seu corpo latejava de dor, mas ele continuou, mesmo tremendo, mesmo quase apagando.
Enquanto isso, do lado de fora da sala, Falcão se aproximava. Seus passos eram pesados e ritmados, carregados de fúria. Ele esperava o momento certo para se revelar, e seu poder emanava pelo ar como uma ameaça inevitável. Solum sentiu aquela energia e soube, nem com ele ajudando seria fácil vencê-lo.
Mesmo assim, se forçou ainda mais, ativando seu fator de cura com desespero.
Foi então que Falcão finalmente apareceu.
Ele surgiu com imponência, atravessando a porta destruída e emanando um poder esmagador. Estava genuinamente furioso.
— Eu te amo, Kamito. — Ela disse, segurando o rosto dele entre as mãos. — Meu amado Kamito… eu serei a sua namorada.
Antes que ele pudesse respondê-la, uma voz fria e debochada interrompeu o momento.
— Que momento lindo. — Falcão surgiu caminhando entre as sombras do corredor, aproximando-se lentamente, com as mãos para trás. — Eu até aplaudiria, se vocês não fossem meus inimigos. Onde está o Coiote, aliás? Não importa. Vocês morrerão primeiro.
Kamito e Akane se viraram rapidamente, assustados. Falcão os encarava com uma expressão séria, mas ao mesmo tempo tranquila, como alguém que tinha plena confiança em sua vitória.
— É um prazer conhecê-los, Kamito Takeda e Akane Yagami. — Afirmou ele, inclinando levemente a cabeça enquanto continuava a caminhar na direção deles. — Vocês são mesmo uma pedra no meu sapato. Arruinaram meu plano a mando do desprezível Raishi. Será que ele se importaria se eu os matasse?!
Kamito arregalou os olhos.
— F-Falcão… — ele deu um passo para trás, instintivamente colocando-se diante de Akane. — Você veio pessoalmente até aqui?! Não era isso que deveria acontecer! O Raishi disse que você jamais sairia do seu posto!
Se o líder da Ordem estava ali, aquilo só podia significar uma coisa: Solum havia destruído o artefato, como prometera.
Falcão sorriu de forma discreta e amarga.
— E eu não viria. — Admitiu, parando a poucos metros deles. — Mas vocês acabaram com toda a minha organização e ainda destruíram o único meio pelo qual eu alcançaria o meu objetivo. Chegou a hora de pagarem por tudo que fizeram contra mim. Chegou o seu fim.
Ele continuou avançando, e então algo começou a se formar atrás dele. Lentamente, enormes asas de energia se abriram nas costas, brilhantes e ameaçadoras.
Akane engoliu seco; Kamito cerrou os punhos. Os dois sabiam que não tinham chance contra ele naquele estado. Seria o fim.
— Por que essas caras de desespero?! — Falcão questionou, abrindo os braços, como se estivesse prestes a recebê-los para a morte. — Vocês chegaram até aqui acabando com cada um dos meus subordinados. Chegou a hora de vocês tentarem o mesmo comigo. Vamos lá, Akane, Kamito! Levantem-se!!!
Então, Falcão finalmente se moveu. Sua energia transbordou pelo prédio e se espalhou pela cidade como uma onda esmagadora. Lá longe, ao senti-la, Raishi arregalou os olhos, e imediatamente se apressou para curar Harpia e Pombo, temendo pelo pior. Ele sabia que Kamito e Akane jamais seriam capazes de enfrentar Falcão naquele estado.
De volta ao último andar, Falcão os encarava enquanto suas asas de energia se abriam lentamente, iluminando o salão com um brilho ameaçador. Ele estava realmente decidido a atacá-los. Para Kamito e Akane, aquilo parecia mesmo o fim. Depois de tudo que tinham enfrentado, a morte os alcançaria ali.
Quando Falcão ergueu o braço, prestes a lançar seu primeiro ataque, o som de uma porta rangendo ecoou pelo ambiente. Dela surgiu Solum, apoiando-se na parede por um instante antes de caminhar para fora. Seu corpo estava coberto de ferimentos profundos, mas, mesmo assim, um pequeno sorriso cruzava seus lábios. Ele endireitou a postura, respirou fundo e caminhou até os dois, parando ao lado deles enquanto encarava Falcão com firmeza.
— Então você também me traiu. — disse Falcão, estreitando os olhos. Ele inclinou a cabeça, analisando Solum de cima a baixo. — Onde está o Coruja?! Você realmente o matou, Coiote?! É impressionante o feito de vocês. Eu os subestimei.
A cada palavra, as asas de Falcão se abriam mais e mais, até atingirem sua extensão total. A pressão que emanava delas era tão intensa que o ar ao redor tremia, e Kamito sentiu seus joelhos fraquejarem por reflexo. Akane deu um passo para trás, engolindo em seco.
— Estão prontos para pagarem por seus atos?! — Falcão abriu os braços, deixando uma aura violenta se expandir ao redor do corpo. — Ninguém que cruza o meu caminho e interfere nos meus planos sai impune. Esse é o seu fim. E depois que eu matar vocês, irei destruir essa cidade.
Assim, a batalha final começou. Infelizmente, o plano de Raishi não havia seguido como previsto. Três contra um deveria ser uma vantagem esmagadora, mas não quando os três estavam exaustos e quase sem energia… e o único era Falcão, o mais poderoso de toda a Ordem.
As palavras dele feriam mais do que qualquer golpe. Kamito cerrou os punhos, dando um passo à frente, irritado, sentindo o coração queimar de indignação. Ele não permitiria que Falcão simplesmente ameaçasse Akane, Solum, ou a cidade inteira daquele jeito.
Aquela luta não era mais sobre eles. Suas vidas já não importavam tanto.
O que importava era proteger a cidade, ganhar tempo, sobreviver apenas o suficiente até que Raishi aparecesse e pudesse finalizar aquilo de uma vez por todas.
Eles sabiam que talvez não saíssem vivos, mas também sabiam que não dariam um único passo para trás.

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