Capítulo 66: "Você me ama?"
12 de janeiro de 2024, sexta-feira.
O carro de Victor virou à direita, numa rua mais estreita e tranquila. Aki, olhava pela janela, curiosa, enquanto passavam por um muro colorido com pinturas de cães e gatos, caricatos e felizes. No letreiro da entrada estava escrito, com letras grandes e azuis: UNIPET. Com uma letra menor, do mesmo tom, escrito logo abaixo: Patas unidas, jamais vencidas.
— Hm… — Aki murmurou, pensativa, relacionando o que via. — Isso aqui é um abrigo? UNIPET. — Leu em voz alta, não tentando pronunciar a frase logo a seguir.
Victor, após sinalizar usando a seta e conferir o retrovisor direito, estacionou próximo ao portão, numa vaga da própria rua.
— Algo assim. É uma associação, na verdade. A UNIPET é um projeto filantrópico que visa resgatar e cuidar de animais abandonados. Além disso, tem a missão de achar novos lares para eles. E amanhã vai ter uma feira de adoção, então eu resolvi vir aqui hoje, aproveitando que estou por aqui, antes da correria.
Aki olhou novamente para a fachada, enquanto descia do veículo.
— É um projeto bonito. Mas o que viemos fazer aqui exatamente? — Aki indagou.
“Victor quer adotar um animalzinho? Mas como ele vai cuidar dele? Vai levar pro Japão?” Vários pensamentos passavam na cabeça dela.
— Apenas dar uma olhada.
Caminharam, então, até o portão e Victor tocou o interfone. Logo, o portão se abriu e eles entraram, e uma mulher de cabelos cacheados veio, em passos apressados.
— Victor! — Exclamou, animada. — Quanto tempo. Por que não avisou que viria?
— Oi, Helen. — Cumprimentou-lhe, estendendo a mão para um aperto. — Não havia necessidade de avisar. Eu vim aqui ver como estão os preparativos para a adoção amanhã.
— Está indo tudo bem. Sem imprevistos até o momento. — Ela parou seus olhos em Aki. — Olá, seja bem-vinda! Meu nome é Helen.
Aki olhou discretamente para Victor, procurando uma ajuda.
— Ela não fala português. — Ele explicou. — Aki, essa é a Helen, diretora da UNIPET, e uma amiga. Ela está te desejando boas-vindas. Helen, essa é a Aki, uma amiga que veio comigo do Japão para conhecer o Brasil.
— Apenas uma amiga, é? — Helen provocou, jogando-se quase num abraço para cima de Victor.
Aki quase deu um salto para o lado, achando que Helen iria acabar caindo em cima dela, não tendo tempo de responder às boas-vindas.
— Nem começa. — Victor a interrompeu, erguendo a mão. — Não vem com suas graças. E não incomode a Aki. — Victor advertiu, sinalizando para entrarem. — Vamos.
Helen deu de ombros, como se a advertência não fizesse muita diferença. Então, começou a caminhar.
— Tudo bem. Fiquem à vontade.
Nesse intervalo de tempo, Victor explicou algumas coisas para Aki:
— Não liguei, ela é meio doida. — Ele sorriu, como se lembrasse de alguma cena do passado. — Conheço ela desde que éramos crianças e ela sempre foi assim, e é muito melosa, tem mania de ficar abraçando e colocando a mão. Não repara.
Aki se surpreendeu, e assentiu: — Entendi.
— Essa associação é dela. Ela é a fundadora e, atualmente, diretora. E bem, sou um dos financiadores da UNIPET e também financiamos alguns projetos de expansão, que estão em desenvolvimento.
Aki piscou, quase perplexa, tentando similar todas as informações.
— Nesses últimos três anos, eu não tenho participado muito dos projetos fisicamente, mas eu sempre contribuo com os investimentos. Eu acho que é uma iniciativa muito bonita e merecedora de reconhecimento.
Nesse momento, eles já estavam dentro do prédio e foram convidados a se sentarem num dos sofás da recepção. Victor e Helen conversaram brevemente, e logo, ela saiu. Aki cruzou as pernas, automaticamente, analisando o ambiente.
As paredes brancas contrastavam com o balcão, que embora fosse branco, o acabamento e alguns detalhes eram em tom azul. Alguns quadros nas paredes com fotos e imagens de pets tinham a moldura azul.
— Aqui é muito bonito. — Ela comentou, despretensiosamente, apenas para não ficar o silêncio do local, mas logo se levantou, admirando os quadros mais de perto.
Victor apenas observou, após concordar com o comentário. Também se levantou e acompanhou elas, lendo algumas informações de alguns quadros para a garota entender melhor.
A maioria dos textos eram informações sobre a raça específica de cada quadro. Pastor Alemão, Buldogue, Border Collie, Poodle, dentre outros, inclusive, o “Caramelo”. Após ler as informações desse último, ele começou a fazer comentários e a contar para ela sobre eles, e até mostrando vídeos e memes da raça.
Aki riu, sendo surpreendida pelo conto. Não imaginava que eles fossem tão queridos pela população, ainda mais pelo alto índice de abandonos, segundo alguns dados apontavam.
Enquanto dialogavam, Helen retorna à sala, convidando-lhes para a seguir.
Já no outro local, após passar por uma porta, era possível ver a quantidade de animais que viviam ali. Havia vários canis, além de casas para gatinhos e até alguns poucos pássaros.
A maioria parecia dócil e carente e ficavam agitados conforme eles se aproximavam. Aki se aproximou de um vira-lata, de porte médio e de pelagem entre bege e marrom, que abanava o rabo sem parar, eufórico, dando saltos e latindo, chamando sua atenção.
— Parece que o Tonzinho gostou da sua amiga. — Helen comentou, em um tom que fez Victor suspirar.
“A Helen nunca muda”, Victor pensou, aproximando-se de Aki.
— O nome dele é “Tonzinho”. Parece que ele gostou de você. — Ele comentou, se abaixando ao lado da japonesa, estendendo a mão, que foi lambida pelo cachorrinho. — Tente também.
Hesitante, ela estendeu a sua mão, parando próxima do animal, que a aceitou e deu lambidas animadas nela. Aki o acariciou, enquanto ele se esfregava contra os dedos da garota.
— Ele é tão fofo. — Aki falou, com um tom manhoso.
“Nunca pensei ver essa cena.” Victor pensava, enquanto ria.
— Tem alguns gatinhos bem fofos ali também. Você quer ir lá ver?
— Quero! — Ela respondeu, se levantando. — Tenho certeza que o “Tonzinho” vai ser adotado logo, logo. Ele é muito fofo.
— Vamos torcer para que sim. Amanhã, vários deles vão encontrar novos lares. — O rapaz disse, enquanto caminhavam até uma parte destinada aos felinos.
Lá, havia uma variedade de gatos, de várias cores e raças diferentes. Era um espaço muito grande, cercado, e com várias casinhas para eles.
— Olha, Victor, aquele gatinho ali, ele se parece muito com o Yume.
— Yume? — Victor respondeu, curioso. — O gatinho que eu te dei aquele dia?! — Ele perguntou, provocativo, quase em tom de afirmação. Ele realmente não sabia do nome, mas foi fácil entender do que se tratava. — Você não tinha me contado que o nome dele era Yume.
Aki sentiu seu rosto queimar ligeiramente, então desviou o olhar, focando-se nos gatinhos.
— Não tivemos oportunidade de falar disso. — Murmurou, tímida, mexendo numa mecha de seu cabelo.
“É um nome bonito”, o brasileiro pensou.
— Não tem problema. E aquela gatinha ali, acho que lembra você. — Victor apontou para uma gata que estava brincando, dando tapas num pêndulo.
— Por quê? — Ela indagou, curiosa, mas suas bochechas levemente rosadas denunciavam que estava com vergonha.
— Bem… Ela parece ser curiosa, igual você… — Comentou. — Além disso, ela é uma fofura só.
— Para com isso… — Aki respondeu imediatamente. — Você vai me deixar toda vermelha. — Balbuciou, desviando o olhar.
“Esse Victor… Está fazendo isso só para me deixar com vergonha. Não tenho dúvidas. Seu bobo! Apesar que… eu acho que gosto disso… Não sei… Ah…!” Uma multidão de pensamentos, até conflituosos, em partes, invadiram a mente da japonesa, que tentava não demonstrar sua hesitação.
— Talvez seja a intenção… — Victor procurou o olhar dela, com um sorriso provocador. — Estou brincando com você… Apesar de não deixar de ser verdade. — Ele então se virou e caminhou, passando para outra área, chamando-a para segui-lo.
Apesar da situação, Aki o seguiu sem demonstrar sua hesitação. Eles trocaram um olhar rápido e ela desviou a atenção, tentando despistar. Seguiram até o próximo pátio, onde alguns animais estavam sendo tratados, em repartições organizadas. Alguns tomavam banhos, na área mais à direita, que tinha a parede de vidro. Olhando à esquerda, alguns cachorros estavam sendo adestrados, numa área aberta, com obstáculos.
Os dois visitantes observavam isso, quando Helen se aproximou.
— E então, o que acha desse novo espaço? — Perguntou para o rapaz.
— Está ótimo. Vocês estão de parabéns pelo projeto. — Respondeu, sinceramente. — Aquele segundo projeto, talvez avance para a próxima etapa, agora que essa reforma foi concluída.
— Seria ótimo! — Helen respondeu, empolgada. — Estou ansiosa para os resultados positivos.
— E serão. — Enquanto os dois conversavam, Aki os observou em silêncio, de soslaio, tentando entender o contexto, em vão. Ela suspirou, discretamente, e caminhou até a área de banho, olhando de pertinho pelo vidro.
Um dos funcionários estava secando e penteando os pelos de um chow-chow, de cor marrom e língua roxa. O animal parecia estar gostando do vento quente do secador, ou seria da massagem que os dentes da escova proporcionava? A japonesa se perguntou, e logo em seguida, viu outro funcionário cuidando das unhas de um labrador.
“Esses animais estão num SPA?” Se perguntou, rindo internamente. Então, percebeu que Victor se aproximava. Eles conversaram um pouco sobre o local, com Aki falando o que achou da associação.
Passaram pelo adestrador, cumprimentando-lhe e o cachorro, naquele momento, abaixou-se, rolando no chão e parando de barriga para cima, pedindo carinho. Aki não resistiu e foi acariciá-lo, após o funcionário permitir.
Passado algum tempo, eles foram embora e no caminho para o hotel, Victor perguntou se podiam passar num lugar primeiro e ela concordou. Chegaram, então, em poucos minutos, numa cafeteria.
Após se acomodarem, Aki pediu uma torta de morango e Victor uma de chocolate. Também pediram o café especial da casa, o “Black Coffe Gelatto Especial”. A japonesa adorou a combinação de sabores da bebida, elogiando bastante. O brasileiro respondeu que aquele café era um dos melhores que ele já tomou, apesar de fugir um pouco do café propriamente dito.
…
Aki tomava banho no chuveiro do hotel, com seus longos cabelos cobertos de espuma, graças ao xampu que usava. Ela massageava o couro cabeludo, enquanto seus pensamentos estavam distantes. De olhos fechados, imaginou, por um momento, dos dias recentes e do quão estranho era pensar que, no Japão, estaria nevando, provavelmente, enquanto ali estava um calor de vinte e oito graus célsius.
“Nosso mundo é incrível”, pensou, e logo, momentos com Victor, recentes, invadiam sua mente. Num deslize, quando deixou a imaginação voar, viu Victor abrindo a porta do banheiro, devagar, após um suave toque duplo, para chamar sua atenção. Então, entrou e… Aki logo balançou a cabeça, negando seus pensamentos.
“Se comporte, Aki!” Repreendeu a si mesmo.
— Para com isso… — Resmungou. — Eu preciso manter a calma.
“Por que essas sensações desconhecidas continuam me perturbando?” Reclamou, já sabendo o que era. “Você me ama?” Ela queria entender, descobrir se Victor sentia o mesmo que ela.
Enquanto pensava, a água corria pelo seu corpo e demorou mais tempo do que percebeu no banho.
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