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    26 de janeiro de 2024, sexta-feira. 

    Aki dormia, respirando com alguma dificuldade, ligada ao soro e com o rosto mais pálido do que o habitual. Uma leve expressão de cansaço marcava seus traços normalmente doces. Victor, com os olhos vermelhos pelo cansaço e o corpo curvado, permanecia acordado o máximo que podia, mas o sono o vencera pouco antes das três da manhã.

    Seu queixo descansava sobre o peito, os braços cruzados em si mesmo para suportar o frio da madrugada hospitalar. A fita com desenhos de cerejeiras e as pulseiras de miçangas em seu pulso estavam levemente tortas, como sempre que ele dormia de forma desconfortável.

    Por volta das quatro e meia, Aki começou a se mexer. Seus olhos se abriram lentamente, pesados e confusos. A claridade suave a incomodou por um instante. Ela piscou algumas vezes, tentando entender o que estava ao seu redor. As paredes brancas, o soro em seu braço… 

    A luz branca e suave da ala hospitalar desenhava sombras discretas pelas paredes. O ambiente era silencioso, salvo pelos bips compassados dos aparelhos e o zumbido leve do ar-condicionado.

    “Hospital?!” — Pensou.

    Tentou sentar-se na cama, mas seu corpo protestou com uma leve tontura e fraqueza. Foi quando ela olhou para o lado e viu Victor, adormecido ali, ao seu lado.

    — Victor?! — Ela chamou num sussurro exclamado e rouco. Sua voz falhou parcialmente. 

    Ele se mexeu quase que imediatamente, como se estivesse esperando por qualquer sinal dela. Abriu os olhos e piscou rápido, demorando um segundo para entender o que estava acontecendo.

    — Aki, você acordou… — Murmurou aliviado, levantando-se prontamente e se inclinando na direção dela. — Achei que fosse demorar mais para acordar, talvez só pela manhã… 

    — O que aconteceu? Por que estou aqui? — Perguntou com a voz fraca e arrastada.

    — Eu fui até sua casa depois do serviço, para vir junto com você no hospital, mas quando cheguei lá, você não respondeu, nem atendeu minhas ligações. Então eu entrei e te encontrei desmaiada, queimando de febre. — Explicou, com uma preocupação visível e quase amargurada na sua voz. — Você estava com quase quarenta graus de febre. Mas agora você já está sendo cuidada, só descansa, por enquanto. 

    — Já sabem o que eu tenho? — A voz da japonesa ainda soava rouca, sonolenta. 

    — Sim, mas não se preocupe com isso agora.

    — Me fala, por favor. Eu quero saber o que está acontecendo. 

    — Bem… o diagnóstico foi pneumonia.

    — Pneumonia?! — Exclamou, piscando algumas vezes tentando entender. — Pensei que era só um resfriado…

    — Eu também queria que fosse só isso… mas seu corpo já estava muito cansado. E a viagem que fizemos ao Brasil, foi cansativa e puxada, isso pode ter abaixado seu sistema imunológico, e quando retornamos, teve esse choque de temperatura, e o frio intenso acabou elevando isso… 

    Victor faz uma pausa, analisando a expressão dela, de surpresa e preocupação.

    — Não se preocupe, já iniciaram o tratamento. Logo, logo, você vai estar cem por cento novamente. Vai precisar ficar aqui alguns dias logo vai ganhar alta. 

    Ela pareceu incomodada e tentou se levantar, porém, Victor a impediu, colocando a mão sobre seu ombro. 

    — Vai com calma, Aki… Não se esforce. Apenas descanse. Está tudo bem agora. 

    — Eu te assustei, né? — Murmurou, sentindo seus olhos lacrimejando.

    Victor balançou a cabeça, em negação. 

    — Não precisa pedir desculpas… Eu só quero que você fique bem. E, se for para assumir alguma culpa, eu tenho que carregar parte dela. Eu te convidei e te levei para o outro lado do mundo, numa viagem cansativa. Acabei ficando empolgado e fizemos uma rotina puxada, saindo da nossa correria habitual. Além do clima completamente diferente, e isso tudo pode ter influenciado na sua saúde. 

    Ela o encarou, seus olhos levemente avermelhados. 

    — Bobo… Não é culpa sua… — Balbuciou. 

    Após um sorriso, Victor ajeitou a manta que a cobria, voltando para a cadeira, enquanto falava: 

    — Eu só me preocupo… porque você é importante para mim, Aki. Muito importante. Te ver naquela situação me deixou assustado. Só que agora, te ver melhor, me conforta. 

    Ela fechou os olhos por um instante, não por cansaço, mas para segurar as lágrimas. Seu peito ardia, mas não só pela tosse. Era aquele sentimento estranho, novo, quente… que crescia toda vez que ele estava por perto.

    — Obrigada… por ficar aqui… — Falou, se ajeitando na coberta e virando-se para o outro lado. Talvez pelo sentimento de vergonha, ela não queria o encarar agora. — Ei, você ainda tem que trabalhar, né? Descanse também. Se não vai estar igual um zumbi pela manhã. 

    — Isso não importa agora. O mais importante é você. Se for preciso, eu viro a noite acordado ao seu lado e trabalho no outro dia. Porque quando é para cuidar de alguém que a gente gosta, ganhamos uma “força especial” que nos permite isso.

    “Será que estou sonhando?” — Aki pensava, com as palavras dele ecoando em sua mente. 

    — Bobo… — Balbuciou, apertando a roupa de cama com mais força, enquanto ajeitava a posição da cabeça no travesseiro. — Mas é isso que eu gosto em você. Esse seu jeito único de ser… 

    Sentiu seu corpo arrepiar, quando percebeu o que disse. Talvez tenha pensado alto demais. Mas não recuou, nem tentou corrigir, como geralmente fazia. Apenas aceitou que aquilo era um fato que ela precisava dizer. 

    Só não sabia definir se a coragem para esclarecer isso era por causa dos medicamentos ou algum sentimento dando “força especial”. Ficou em um conflito de pensamentos por alguns momentos, até que conseguiu se acalmar, e aquietou. 

    Victor permaneceu ali ao lado da cama, observando-a dormir e, de vez em quando, conferia a temperatura ainda levemente elevada de sua pele. O soro pingava ritmado, e tudo à volta parecia desacelerar, como se o mundo lá fora não importasse naquele instante.

    “Esse sentimento está me sufocando!” — Pensou. “Eu quero te contar, Aki… contar que eu te amo… Mas esse não é o momento, né?”

    Continuou a olhando, lembrando de momentos recentes que passaram juntos. Seu rosto tão risonho e sempre alegre, agora tomado com uma palidez e cansaço. Seu peito doía ao vê-la assim. Seus pensamentos, porém, não ajudavam.

    “Será que estou indo longe demais? Será que estou misturando as coisas?” 

    Um sentimento conflituoso o afligia, tentando discernir o que estava fazendo naquele momento — e se isso seria certo. Ele deu uma última ajeitada na manta, antes de se acomodar na cadeira, tentando dormir, mas o sono simplesmente não pegava. Por mais que tentasse conter, o turbilhão dentro de si transbordava no olhar. A respiração dela estava calma, mas seu rosto ainda trazia os sinais da febre e do cansaço, que ele conseguia perceber ao se levantar e olhar melhor. 

    Aquietou-se, olhando para o teto por um instante, antes de baixar o olhar para suas próprias mãos. Então, em meio ao silêncio, murmurou, como se estivesse conversando apenas com seu coração:

    — Aff, eu sou um idiota, né? — Ele olhou para Aki, dormindo ali por um instante, antes de continuar: — Você me ajudou tanto… Me fez viver de novo. Sua companhia é tão agradável para mim… você me faz me sentir tão bem… eu não me importaria de ficar o resto da minha vida com você, ao seu lado… 

    Ele fez uma pausa, como quem analisava o que estava sentindo e falando. Olhou para o teto, olhou para Aki e voltou o olhar para suas mãos, agora colocando-as sobre o rosto. 

    — É tão difícil conter esse sentimento… essa vontade de te abraçar, te agradecer por tudo, por mais que eu sinta que não seria o suficiente para demonstrar minha gratidão. Eu gosto tanto de você, Aki…

    As palavras de Victor ecoavam no vazio, quase inaudível. O bip de aparelhos se misturavam em meio ao som do que dizia, quase se perdendo. Um nó na garganta parecia o impedir de continuar, mas ele queria botar para fora… precisava. 

    — Depois de tudo que aconteceu, todo aquele sentimento de perda e de vazio, aquele sentimento que me fazia querer desistir de tudo, de viver… mesmo me tornando uma pessoa inalcançável, quase inexistente, vindo para o outro lado do mundo, você conseguiu me mostrar um caminho novamente. 

    Fixou, então, seus olhos na garota, que estava de costas para ele, coberta, quieta. 

    — Eu estava num poço escuro, úmido, frio e sem qualquer expectativa. Você chegou e foi como um raio de sol iluminando e aquecendo meu coração, me mostrando um caminho colorido e claro. E apenas sendo você…

    Victor sentiu que já havia falado o que precisava, e se conteve em continuar. Logo, tentou achar uma posição na cadeira, enquanto ainda divagava sobre tudo. Sua mente, mesmo cansada, não parava… 

    Mas o que Victor não sabia era que Aki não havia adormecido por completo. Seu corpo permanecia imóvel, virado para o lado, com as costas voltadas para ele, mas sua mente estava alerta. O coração, acelerado. Cada palavra dita por Victor havia entrado direto em sua alma.

    Seus olhos se encheram de lágrimas. Ela havia escutado tudo. A confissão, a dor, o medo… e o carinho escondido em cada frase dita com voz embargada e cheia de significados.

    Ela apertou levemente o lençol com os dedos, sentindo o peso do momento. Queria se virar, queria dizer que ele não precisava ter medo… mas não conseguiu. Estava emocionada demais, assustada demais com a intensidade do que sentia — do que ouvia. As palavras dele carregavam um peso indescritível naquele momento.

    Victor, por sua vez, suspirou pesadamente e passou a mão nos cabelos, se recompondo aos poucos. Não percebeu a respiração um pouco mais acelerada de Aki, nem o brilho úmido que começava a escorrer discretamente pelos olhos dela.

    Ele achava que ela estava dormindo.

    — Me desculpa… — Murmurou, e como se falasse consigo mesmo, continuou: Acho que precisava tirar isso do peito… 

    Se acomodou na cadeira novamente. Não disse mais nada. O quarto mergulhou novamente em silêncio, quebrado apenas pelos sons dos equipamentos hospitalares e do soro pingando de forma ritmada.

    Aki permaneceu imóvel, com o coração em chamas.

    As palavras de Victor ecoavam em sua mente. Seu peito acelerado, como se queimasse, enquanto algumas lágrimas desciam em seu rosto quente e pálido. Mas, naquele momento, tudo que podia fazer era apenas ouvi-lo, ouvir aquelas palavras, em silêncio. 

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